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Drogas desagregam as tribos alagoanas

Gazeta de Alagoas-Maceió-AL
Autor: (Arnaldo Ferreira)
26 de Jan de 2003

Caciques e pajés estão preocupados com o êxodo para as favelas e o consumo de álcool e maconha nas aldeias

Desiludidos com a devastação impune dos recursos naturais, carentes de emprego, sem
perspectivas de melhoria da qualidade de vida, sem terra: os índios alagoanos abandonam
suas reservas e partem para as favelas, as grotas das cidades alagoanas e dos Estados
vizinhos. Eles vão em busca de trabalho. A maioria dos 8 mil índios do Estado vive em
situação de miséria e de abandono. O que mais chama a atenção dos caciques e dos pajés é
a substituição da identidade cultural: os mais jovens trocam costumes antigos pelo alcoolismo
e as drogas.
"O homem branco está ensinando o vício do que não presta aos índios jovens e os mais velhos
não conseguem prender os guerreiros nas comunidades, porque não há atrativos", lamentam
os pajés dentre eles Damião Ferreira, da aldeia "Cafurna de Baixo", da tribo xucuru-cariri, em
Palmeira dos Índios.
Damião sente na pele o peso das transformações sociais negativas que acontecem na sua
tribo, que se divide em seis aldeias, onde moram cerca de 2.500 índios. O filho do pajé, José
Carlos Araújo Ferreira, 24 anos, esta preso há um mês, na delegacia de Palmeira, porque
atirou numa prostituta.
"Meu filho conhece os costumes, a tradição, mas infelizmente convive com os brancos e
aprende o que não deve", lamentou o pajé Damião Ferreira.
Os oito mil índios alagoanos vivem em oito tribos: seis são reconhecidas pela Fundação
Nacional do Índio - Funai-, duas estão em fase de reconhecimento antropológico.
As lideranças das tribos assumem que a crise social nas comunidades toma proporções
preocupantes e apontam os motivos do êxodo: "as terras não foram regularizadas, a luta com
os posseiros é uma constante e em algumas comunidades o clima é tenso. A gente não tem
terra, os rios de Alagoas não têm peixe, não tem mais mata para caçar. O homem branco quer
dar maconha e outras drogas para os nossos guerreiros, então me digam: - o que é que a
gente vai ficar fazendo nas comunidades?" Questionou o pajé e conselheiro indígena da tribo
karapotó, José Ferreira, ao acrescentar que faltam meios para manter os índios jovens nas
comunidades. Entretanto, ressalva: "o problema é nacional".
Índios mendigos
O pajé Damião Ferreira e um dos caciques xucurus, Cícero Francelino, confirmam que muitos
índios das seis aldeias xucurus estão trocando as casas das comunidades para morar nas
favelas de Palmeira ou de Maceió. Geralmente, sem instrução como subempregados ou como
indigentes. O que preocupa as lideranças é que os índios migram agora para as grandes
cidades do País em busca de novas oportunidades.
Na aldeia "Cafurna de Baixo", segundo o pajé Damião, vivem 60 famílias, em torno de 300
pessoas. "A área ainda não foi demarcada. A gente vive com medo dos posseiros, por isso
muitos vão embora".
De um modo geral, os xucurus reclamam a demarcação de 13.500 hectares que continuam nas
mãos dos brancos, só saem das reservas depois que a Funai pagar as benfeitorias e
indenizá-los.
Funai
A administração da Funai de Alagoas e de Sergipe confirma a existência de oito tribos em
território alagoano. As tribos reconhecidas são: cariri-xocó, no município de Porto Real do
Colégio - região do baixo São Francisco; Karapotó, em São Sebastião - no agreste alagoano;
Tingüi Botó, em Feira Grande - Agreste; xucuru-cariri, Palmeira dos Índios, numa área
estratégica limite entre Sertão e Agreste; wassú cocal, Joaquim Gomes, na área canavieira da
zona da mata; Geripancó no município de Pariconha, no Alto Sertão.
As tribos que estão em fase de reconhecimento são caruazu e kalancó, ambas localizadas no
município de Água Branca, numa das áreas mais áridas do Estado.
Os problemas de analfabetismo e saúde, estão sendo resolvidos entre a Funai e prefeituras.
Porém, prefeitos como Albérico Cordeiro (PTB) de Palmeira, acusam a Funai de abandonar os
índios nordestinos. "Gostaria que a Funai fizesse apenas o que faz para os índios do Mato
Grosso do Sul, onde eles têm condições dignas de vida e terras", frisou Cordeiro.
O administrador-substituto da Funai, José Heleno de Souza- filho do cacique José Cícero de
Souza, da tribo cariri-xocó, admitiu que as tribos reclamam a demarcação das terras. "O
problema da Funai é falta de recursos para resolver as questões fundiárias".
Enquanto a Funai se perde na burocracia e na falta de recursos para resolver o problema
agrário do índio brasileiro, em especial o alagoano, o pajé Antônio Izidoro, da tribo karapotó,
alerta para a descaracterização da identidade cultural nas comunidades. "Sem perspectiva de
vida, sem terra para plantar, sem caça e sem pesca, o índio que fica na aldeia se envolve com
a bebida e com a droga. "O alcoolismo nas comunidades é um problema muito sério e que
precisa ser revertido rapidamente", frisou Izidoro.
São esses problemas que levaram a índia cariri-xocó, Irene Pires, a deixar sua comunidade,
que fica no município de Porto Real do Colégio, às margens do Rio São Francisco, há oito
anos. Hoje, casada com um trabalhador branco, tem três filhos e trabalha para ajudar o
marido. Irene é prestadora de serviço, ganha R$ 207,00. Triste ironia do destino da índia: o
salário mínimo que recebe por mês é para varrer, passar cera no chão e limpar os banheiros da
sede da Funai em Maceió, onde o administrador-substituto é o filho do cacique de sua aldeia

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