VOLTAR

Disputa por terras entre indígenas e agricultores em quatro cidades do Vale do Itajaí e Norte catarinense completará 20 anos

Hora de Santa Catarina - http://www.clicrbs.com.br
Autor: Ânderson Silva
12 de Nov de 2013

A agonia dos agricultores de Vitor Meirelles, José Boiteux, Itaiópolis e Doutor Pedrinho soma-se à expectativa da terra prometida dos índios da Reserva Duque de Caxias para protagonizar um embate que completará 20 anos em 2014. Desde 1994, quando a Fundação Nacional do Índio (Funai) fez o estudo que apontou o aumento da demarcação da área ocupada atualmente pelos indígenas na região, de 14 mil hectares para 37 mil hectares, a tranquilidade entre as duas partes jamais foi o mesma.

Constantemente, como ocorre desde metade de outubro, os índios protagonizam bloqueios de rodovias - desta vez é a SC-477 - e ocupação de terrenos em protesto contra a demora para liberação das áreas.

Para aumentar a espera de agricultores e indígenas, a discussão da posse das terras está desde 2007 no Supremo Tribunal Federal (STF). Produtores contestam uma portaria do Ministério da Justiça que demarcou as terras na região e deu aos índios os hectares pretendidos. Somente com a decisão judicial, o histórico de confrontos pode ter fim e acabar com um enfrentamento movido pela história.

A divergência nas cidades do Alto Vale do Itajaí e Norte está enraizada na história do país. O ambientalista e cientista social, Leocarlos Sieves auxiliou na perícia judicial antropológica requerida pelo STF que levantou informações das áreas em disputa.

DISPUTA DE TERRAS

Segundo Sieves, há registros históricos de movimentos dos índios pela região antes mesmo da chegada dos descendentes europeus no local. Em grupos, circulavam na linha entre Porto Alegre e Curitiba. No começo de 1900, o Estado contratou uma colonizadora para negociar as áreas existentes onde atualmente há disputas entre índios e produtores rurais.

Aos poucos, as áreas foram vendidas e ocupadas por agricultores. Adotando a política de colocar os índios em grupos, o governo federal criou reservas como a Duque de Caxias, em José Boiteux, em 1926. O espaço dado a eles tinha 20 mil hectares, que foram reduzidos a 14 mil em 1952, quando o Estado repassou o restante para colonos.

Com a construção da Barragem Norte, em José Boiteux, em 1977, os índios tiveram a área diminuída mais uma vez, o que causou revolta. O estudo da demarcação de terras da Funai de 1994 acendeu a discussão e colocou em xeque a boa convivência antes existente entre índios e agricultores. Hoje, os indígenas pedem os 37 mil hectares prometidos e os produtores contestam o levantamento temendo perder as propriedades conquistadas.

- Acho que não precisa de imediato dar toda esta área. Mas, pensando no futuro, a reserva não terá muito espaço aos índios. A reivindicação é justa. Por outro lado, os colonos compraram as áreas de boa fé, tudo feito dentro da legalidade - opinou Sieves.

O grande temor dos agricultores é que a Funai prevê apenas a indenização das benfeitorias aos proprietários e não paga o valor das áreas.

DUAS VERSÕES

Apesar de o clima ser pesado nas áreas em disputa, o discurso dos envolvidos está longe de ser de embate. A representante da Funai na Reserva Duque de Caxias, Natalina Vergueiro, confirma que os índios pedem as terras devido à construção da barragem. Segundo ela, as ocupações servem como pressão:

- Desde que não haja vandalismo, pode haver o protesto. Cada um questiona o seu direito, assim como os índios precisam da terra, os agricultores também.

O presidente do Sindicato Rural de Vitor Meirelles, Faustino Cardozo, concorda que com o estudo da Funai e demarcação das áreas do Ministério da Justiça, a situação mudou. Constantemente, Cardozo acompanha o processo que tramita no STF à espera de uma decisão.

- Os produtores adquiriram as terras da colonizadora e não invadiram as áreas - defende o presidente do sindicato.

CASO NÃO É PRIORIDADE

O ministro Ricardo Lewandowski é o relator do processo judicial que tramita no STF. O caso foi parar em Brasília em 2007 porque há conflito de interesses entre União e Estado. Há dois anos, o juiz federal da 2ª Vara de Blumenau, Adamastor Nicolau Turnes, foi designado para coordenar as perícias antropológica e cartográfica da área que seria dos índios. O estudo, segundo Turnes, demorou um ano para ser feito e servirá de base para a decisão do ministro:

- Um dos objetivos da perícia era estabelecer características específicas da realidade da terra indígena e dos arredores dela. Evidentemente, é uma questão que envolve um conjunto grande de interesses. De um lado, pessoas estabelecidas há 100 anos. De outro, o hábito dos índios de percorrer largas distâncias de acordo com a estação e disponibilidade para alimentação - resumiu Turnes.

Atualmente, o caso está na Procuradora Geral da União (PGR), que se posicionará sobre a questão. Porém, há processos parados na PGR desde 2006. Segundo Turnes, os gabinetes dos ministros do STF atendem milhares de processos. E casos como o dos indígenas do Vale e do Norte não se encaixam na lista de prioridades. Até que a decisão judicial seja dada, as disputas e sentimentos de expectativa e agonia devem continuar:

- É cíclico. Tem momento de maior tensão e depois diminui. O processo é um detalhe numa história de conflitos. Não é simples para ser decidido - avalia o juiz federal blumenauense.

MINISTRO PROMETE DIÁLOGO

Uma reunião dia 6 de novembro, em Brasília, deu esperança aos agricultores. Aproximadamente 200 produtores rurais de Santa Catarina e do Rio Grande do Sul se encontraram com o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, para debater a demarcação de terras indígenas. Ao fim, ficou decidido que Cardozo irá aos dois estados em breve para instalar mesas de diálogos com os governos locais e evitar novos conflitos.

O Ministério da Justiça está elaborando uma portaria de aprimoramento do processo demarcatório das terras indígenas.

http://www.clicrbs.com.br/especial/sc/horadesantacatarina/19,792,433103…

As notícias aqui publicadas são pesquisadas diariamente em diferentes fontes e transcritas tal qual apresentadas em seu canal de origem. O Instituto Socioambiental não se responsabiliza pelas opiniões ou erros publicados nestes textos. Caso você encontre alguma inconsistência nas notícias, por favor, entre em contato diretamente com a fonte.