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Diretor da PF é convidado a chefiar Ibama

FSP, Brasil, p. A6
26 de Abr de 2007

Diretor da PF é convidado a chefiar Ibama
Ministra do Meio Ambiente confirma convite a Paulo Lacerda, que afirma, em nota, ter havido apenas uma "sondagem"
"Projetos importantes não podem passar por cima da legislação", afirma Marina, que negou relação entre as mudanças na pasta e o PAC

Marta Salomon
Da sucursal de Brasília

A ministra Marina Silva (Meio Ambiente) confirmou ontem o convite ao diretor da Polícia Federal, Paulo Lacerda, para presidir o Ibama. Alvo de pressões contra o atraso no licenciamento de duas usinas hidrelétricas na Amazônia, Marina negou relação entre as mudanças no ministério e as obras do PAC (Programa de Aceleração do Crescimento).
"As mudanças não podem ser associadas a coisas conjunturais", disse a ministra, numa referência à demora no licenciamento das hidrelétricas Santo Antônio e Jirau, no rio Madeira, em Rondônia.
No final de março, diante de um parecer técnico que negava licença prévia ao empreendimento, o Ibama decidiu pedir informações complementares. Prevista para o início de fevereiro, a licença foi adiada indefinidamente.
A indicação de Lacerda para a presidência do Ibama não foi formalizada por Marina porque ainda não está acertada sua saída do comando da PF.
"Ele me ajudou de forma fantástica, prendeu 500 pessoas envolvidas em crimes ambientais e tem capacidade de operar com lógica de Estado", afirmou a ministra. Segundo ela, o convite já foi aceito por ele.
Lacerda, no entanto, não foi tão assertivo oficialmente, segundo sua assessoria. "Não houve convite, apenas uma sondagem. A definição dependerá dos ministros Tarso Genro (Justiça) e Marina Silva". Marcus Barros, atual titular do Ibama, havia pedido para sair no ano passado.
Tarso Genro disse ontem que não pretende retirar Lacerda da PF. Afirmou ainda que "não existe nenhuma providência" para substitui-lo no cargo.
"Não existe nenhuma providência para substitui-lo. Ele está cumprindo muito bem as suas funções e vai continuar cumprindo. Se, eventualmente, mais tarde, ocorrer uma discussão para mudança, essa discussão será feita com ele. Nós não temos a pretensão de mudá-lo. Ele é um homem de Estado e está trabalhando muito bem", disse Tarso, que participou de evento sobre segurança ontem em Belo Horizonte.

Divisão do Ibama
Marina aproveitou a reunião de ontem do Conama (Conselho Nacional do Meio Ambiente) para anunciar mudanças no ministério. Uma das novas secretarias cuidará dos efeitos do aquecimento global.
As mudanças incluem a divisão do Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis) e a criação do Inbio (sigla provisória do Instituto Brasileiro de Conservação da Biodiversidade), que ficará responsável pelos 50 milhões de hectares de áreas protegidas no país.
"As mudanças são necessárias para que possamos proteger nossos imensos recursos naturais e cuidar do desenvolvimento sustentável, uma agenda que o Brasil tem obrigação de liderar pelo exemplo", disse ontem Marina.
Segundo a ministra do Meio Ambiente, não haverá nenhuma modificação na estrutura do licenciamento ambiental.
"Esse país tem uma legislação ambiental; projetos importantes não podem passar por cima da legislação", disse Marina, em apoio ao pedido de informações complementares a que o Ibama condicionou a análise da licença ambiental para as hidrelétricas.
O parecer do Ibama identificou "elevado grau de incerteza" em relação ao acúmulo de sedimentos que poderiam provocar transbordamento do rio e à sobrevivência de peixes grandes no rio Madeira.

Ambientalistas apóiam reforma, mas temem por pressão política

Kátia Brasil
Da agência Folha, em Manaus

ONGs ambientalistas com atuação na Amazônia aprovaram a reestruturação da área ambiental do governo federal, mas são reticentes ao relacionar as mudanças a eventuais pressões para apressar obras do PAC (Programa de Aceleração do Crescimento).
"O que nos causa preocupação é que todo esse processo de discussão esteja ocorrendo exatamente quando o licenciamento ambiental [de usinas no rio Madeira] está na mídia. Não nos parece ser um momento oportuno", afirmou Mauro Armelin, da WWF-Brasil.
Para Adilson Vieira, secretário-executivo do GTA (Grupo de Trabalho da Amazônia), havia insatisfação da sociedade e várias críticas à gestão da equipe de Marina. "Mas não acredito que ela tenha sido obrigada [a reestruturar o ministério]."
Carlos Durigan, coordenador-executivo da FVA (Fundação Vitória Amazônia), vê ligação entre as mudanças e o cenário político em torno do PAC para destravar o país. "Não sabemos aonde isso nos levará."
Segundo o presidente da Associação dos Fiscais Federais do Meio Ambiente, Geraldo Figueiredo, a fiscalização do Ibama será "esfacelada". "Com o PAC, a demanda será maior."
A decisão deverá produzir abalos no PT. "Não entendi. O Gilnei é técnica e politicamente da maior capacidade", disse a deputada Maria do Rosário (RS), referindo-se à substituição do secretário de Desenvolvimento Sustentável, Gilnei Viana. Viana, por sua vez, classificou a decisão de "autoritarismo" de Marina. "É o tipo de negociação que não está clara", criticou, dizendo-se "tão qualificado quanto o substituto".

Não há pressão por boas novas, diz secretário

Da redação

Não existe pressão no governo por respostas positivas do Ibama sobre licenciamento de obras, e a "flexibilização" dos critérios do instituto só poderia ser feita se a lei fosse mudada. Quem diz é João Paulo Capobianco, recém-empossado secretário-executivo do Ministério do Meio Ambiente.
Biólogo e militante ambientalista convertido em cão-de-guarda da ministra Marina Silva, Capobianco reafirmou à Folha que a reestruturação da pasta já vinha sendo planejada desde 2004, e que Marina só estava esperando ser reconfirmada para colocá-la em prática.
As mudanças no Ibama, diz, não vão alterar o esquema de licenciamento atual. "Quem falou em acelerar? Do ponto de vista legal, o Ibama é o único responsável pelo licenciamento. A única forma de "flexibilizar" isso seria mudar a lei, e esse enquadramento a ministra não aceitaria", afirmou.
Segundo Capobianco, com o novo Ibama, mais "focado", a expectativa é que a gestão fique mais ágil. Uma diretoria será criada para conduzir avaliações ambientais estratégicas antes da concepção das obras. "Queremos nos antecipar e direcionar as prioridades de empreendimentos para as áreas ambientalmente menos complexas." (CA)

memória

Ibama alertou sobre supostas falhas em 2006

Da sucursal de Brasília

As duas maiores supostas falhas apresentadas pelos técnicos do Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis) contra o licenciamento das hidrelétricas do rio Madeira já haviam sido objeto de alerta aos empreendedores -Furnas Centrais Elétricas e a Construtora Norberto Odebrecht- em fevereiro do ano passado.
Documentos do licenciamento mostram que há mais de um ano, o Ibama havia pedido estudos complementares sobre o acúmulo de sedimentos no rio, que poderiam provocar transbordamento e inundações, e as ameaças a grandes peixes migradores. Em 30 de março, o diretor de licenciamento ambiental do Ibama, Luiz Felippe Kunz Júnior, pediu mais informações aos empreendedores. "Concordo com a impossibilidade de emissão de licença prévia neste momento", disse no despacho que originou a mais recente pressão contra a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva.
O despacho do diretor do Ibama rejeitara, por sua vez, um parecer assinado por oito técnicos que recomendava a não-emissão de licença às hidrelétricas. O parecer reclama do Estudo de Impacto Ambiental apresentado pelos empreendedores e diz que impactos potenciais foram negados ou sub-dimensionados. (MS)

Para Odebrecht, técnicos do Ibama são inexperientes

Da sucursal de Brasília

A Odebrecht, empreiteira que, juntamente com Furnas, fez os estudos ambientais das hidrelétricas do rio Madeira (RO), avalia que o impasse na liberação das licenças é causado pela inexperiência dos técnicos do Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis).
A empresa avalia que a inexperiência e o medo da responsabilização judicial fizeram com que os técnicos do Ibama adotassem posição excessivamente cautelosa. Outro aspecto levantado pela empresa é o fato de o tipo de usina planejado -com turbinas "bulbo", horizontais em relação ao leito do rio- ser pouco usado no Brasil.
"Houve excesso de cautela. Isso precisa ser revisto, de uma forma mais experiente. Os técnicos que analisaram são muito jovens. Há pareceres de especialistas muito mais experientes que descartam os riscos apontados por eles", disse Sérgio França Leão, diretor de Meio Ambiente da Odebrecht. Na avaliação da Odebrecht, o licenciamento não foi negado, porque o diretor do Ibama não acatou o parecer dos técnicos.
O presidente da CBIC (Câmara Brasileira da Indústria da Construção), Paulo Safady, disse ontem que a demora na concessão de licenciamentos ambientais dificultam que o setor privado efetive os investimentos previstos em grandes projetos de infra-estrutura.
"A demora, a incerteza, a burocracia - tudo isso atravanca o crescimento do país e a oferta de empregos em regiões pobres, que precisam muito de desenvolvimento econômico", afirmou Safady: "O governo precisa urgentemente resolver o nó que ele mesmo criou".

FSP, 26/04/2007, Brasil, p. A6

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