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Diferenças regionais

CB, Brasil, p. 10
20 de Nov de 2007

Diferenças regionais
Delegações da Região Norte lutam na Conferência Nacional de Saúde pelo reajuste nas verbas federais para a Amazônia. Temporão apóia reivindicação e jura que PAC vai compensar os estados mais pobres

Ullisses Campbell
Da equipe do Correio

Na hora de distribuir recursos para a Saúde, o governo federal terá que pensar duas vezes. Estados da Amazônia aprovaram na 13ª Conferência Nacional de Saúde seis projetos pedindo que as verbas para o setor sejam reajustadas por conta das diferenças regionais existentes no Brasil. As propostas foram enviadas por todas as delegações da Região Norte e aprovadas quase que por unanimidade. Agora, a conferência vai encaminhá-las ao governo federal. As delegações do Pará, Amazonas, Acre, Rondônia e Roraima também propuseram que seja incluído no chamado PAC da Saúde o reajuste do valor per capita anual usado pelo governo para calcular o financiamento da atenção básica de saúde, que inclui consultas e pequenos procedimentos cirúrgicos. Para os estados da Região Sudeste, por exemplo, o valor é R$ 112. Para o Norte, R$ 76. "A diferença (de 47%) revela que o governo dá tratamento desigual para as regiões", disse Joaquim Alves Barros Neto, da delegação do Amazonas.
Os estados da Amazônia também aprovaram propostas de fortalecimento do Programa Saúde da Família e reclamaram da falta de médicos, dentistas e assistentes sociais nos municípios mais distantes dos grandes centros. Na localidade paraense de Afuá, no limite com o Amapá, por exemplo, só há cirurgião-geral disponível uma vez por semana. No município de Pimenta Bueno (RO), quem precisar de um cirurgião cardíaco terá de seguir para a capital, Porto Velho. "Em Roraima, só se encontram médicos e dentistas nos municípios ao longo da rodovia Cuiabá-Rio Branco (BR-364).
Nas localidades distantes, as pessoas morrem por falta de pronto-socorro", reclama Edson Raimundo Pereira, da delegação de Roraima.
O ministro da Saúde, José Gomes Temporão, apóia as reivindicações das delegações nortistas. Ele disse que o PAC contempla para a Amazônia "um forte incremento" do Saúde da Família e de odontólogos para o Programa Brasil Sorridente. Temporão garantiu que o programa de aceleração prevê mais recursos para o Norte e Nordeste justamente para diminuir as diferenças regionais. Segundo o ministro, as verbas contemplarão a atenção básica de saúde e os procedimentos de média e alta complexidades. "O PAC será lançado no início de dezembro, talvez no dia 3. Ele atrasou três meses por conta da indefinição das fontes de financiamentos", justificou Temporão.
As diferenças regionais estão evidenciadas no relatório do Ministério da Saúde usado para definir as metas do PAC.
Denominado "vazios assistenciais", esse documento revela que, para cada 100 mil habitantes, há 0,33 mamógrafos disponíveis pelo Sistema Único de Saúde (SUS) na Região Norte. É a menor taxa nacional. No Sudeste, o índice fica em 0,62, enquanto no Nordeste, 0,41; Centro-Oeste, 0,49; e Sul, 0,67.
Os equipamentos de hemodiálise disponíveis pelo SUS também são mais escassos na Amazônia, onde há 2,76 máquinas por 100 mil habitantes. No Sul, a taxa ficou em 9,18; no Nordeste, 4,65; no Centro Oeste, 7,23; e, no Sul, 7,86. "O PAC vai corrigir essas distorções", garante Temporão.
Exclusão
A índia tucuxi Vanda Domingos, 49 anos, da delegação de Roraima, levou à conferencia queixas de falta de recursos e discriminação. Segundo relatou numa das plenárias, na Amazônia, os servidores do SUS se recusam a atender índios que não moram mais em aldeias. "Nos postos de saúde, os atendentes mandam a gente procurar a Fundação Nacional de Saúde (Funasa), órgão encarregado da saúde indígena.
Na Funasa, eles argumentam que não somos aldeados e que temos que ser atendidos pelo SUS. Com essa indefinição, acabamos sem atendimento médico", reclama. Uma das propostas que foi reprovada na plenária de sexta-feira pedia para que a saúde indígena não fosse mais administrada pela Funasa. "Somos excluídos do SUS e da Funasa", queixou-se o índio arara Barnabé Santos, 48 anos, da delegação do Pará.
A delegação de Roraima levou à conferência 120 propostas. Até sexta-feira já haviam sido aprovadas 50. Os delegados pediram mais médicos e enfermeiros para os municípios isolados e reclamaram que os profissionais de saúde que atuam no interior moram na capital e trabalham apenas três dias por semana. "Os médicos não querem morar no interior por causa dos baixos salários e falta de estrutura", aponta Luiz Carlos Schwinden, da delegação de Roraima. Ele também reclamou da falta de dentistas nas localidades distantes. "Há municípios que não têm um odontólogo sequer", denuncia.
Segundo o presidente do Conselho Nacional de Saúde, Francisco Batista Júnior, o maior problema da Amazônia, quando se fala em saúde pública, são as distâncias. "Ao distribuir verbas, o governo não leva em conta que se deslocar na Região Norte é muito mais complicado. Há municípios que não têm médicos nem farmacêuticos", relata.
Ele conta que nos estados onde há queimadas a situação é bem pior por conta de doenças respiratórias e problemas de pele. Na Ilha do Marajó (PA), por exemplo, foram identificadas seis localidades sem hospitais públicos.
Algumas prefeituras do interior do Amazonas e do Pará se propõem a pagar salários de até R$ 5 mil para médicos.
Ainda assim, esses profissionais não fixam residência no interior por falta de estrutura de lazer. "Os médicos vão atraídos pelos altos salários, fazem um pé de meia, mas acabam voltando para a capital, onde conseguem cinco empregos e ganham a mesma coisa", lamenta Francisco Batista Júnior.

Encontro histórico

Durante os cinco dias, as 30 plenárias da 13ª Conferência Nacional de Saúde avaliaram 575 propostas enviadas pelos estados e aprovaram 420.
Segundo balanço da coordenação, cerca de 3,5 mil delegados estavam aptos a votar e pelo menos 5 mil pessoas transitaram pela conferência. Para o presidente do Conselho Nacional de Saúde (CNS), Francisco Batista Júnior, foi o maior encontro já realizado até agora. O próximo ocorrerá em 2011.
Entre as principais propostas aprovadas e que serão encaminhadas ao Executivo uma estabelece que o Ministério da Saúde e as secretarias estaduais de segurança pública desenvolvam projetos para conter as mortes por acidentes de trânsito e violência doméstica. "O governo gasta R$ 28 bilhões com acidentes por ano. É um absurdo", disse Batista Júnior.(UC)

Pressão
Reajuste dos recursos da saúde para os estados da Região Norte Aumento do valor per capita usado para calcular os repasses para atenção básica de saúde
Contratação de mais médicos, dentistas e enfermeiras para os municípios do interior
Autorização para que índios que moram fora das aldeias sejam atendidos pelo SUS sem discriminação
Aumento do número de profissionais do Programa Saúde da Família

CB, 20/11/2007, Brasil, p. 10

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