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Desinformação gera insegurança em Alcântara

OESP, Vida, p. A9
06 de Dez de 2004

Desinformação gera insegurança em Alcântara
Comunidade teme que projetos para a base de lançamento de foguetes obrigue as famílias a abandonar o local

Flávia Moura

Após o anúncio da Presidência da República em agosto - um ano após o acidente com o Veículo Lançador de Satélites, que deixou 21 mortos - referente a um crédito de R$ 36 milhões para investimento no Centro de Lançamento de Alcântara (CLA), além dos acordos internacionais firmados com Ucrânia, Rússia e Alemanha, moradores vizinhos da base militar começam a se preocupar com os novos deslocamentos de famílias que residem dentro da área de segurança.
Ainda não há informações oficiais sobre novas transferências no local e a própria desinformação causa um clima de insegurança entre os moradores.
"Os mais velhos afirmam que não saem de jeito nenhum, caso haja mais deslocamentos. Eles presenciaram o sofrimento das famílias que foram morar nas agrovilas (vilas construídas por militares), na década de 80", informa o coordenador do Movimento dos Atingidos pela Base Espacial (Mabe), Inaldo Diniz Silva.
De acordo com o plano de implantação da base espacial, ainda há previsão de uma terceira fase de deslocamentos, no qual deverão ser transferidas mais 261 famílias de 16 povoados. A quarta fase deverá resultar na transferência de 215 famílias atualmente residentes em 13 povoados. O que não está previsto no documento é a data para que as novas transferências aconteçam.
Para a antropóloga Maristela de Paula Andrade, professora da Universidade Federal do Maranhão (UFMA) e pesquisadora do Grupo de Estudos Rurais e Urbanos (Gerur), o problema social é grave, já que serão retiradas mais famílias de remanescentes de quilombos de seus territórios, agora por conta do aluguel do CLA para a Ucrânia. "Nos últimos 20 anos, as centenas de famílias que foram arrancadas de seus locais e jogadas nas agrovilas nunca tiveram nenhum apoio oficial. Trata-se de uma situação de etnocídio."
Ação
Em agosto de 2003, o Ministério Público moveu uma ação civil pública contra a Fundação Palmares e a União baseado no laudo do antropólogo Alfredo Wagner Berno de Almeida, realizado em Alcântara, em 2002.
O objetivo da ação é questionar os órgãos sobre a omissão em reconhecer as comunidades remanescentes de quilombos. Os fundamentos da ação civil pública residem no fato de que a Constituinte reconheceu a diversidade étnica como elemento singular na formação do povo brasileiro e elegeu como um dos objetivos fundamentais da República do Brasil a promoção do bem-estar de todos, sem preconceitos de origem, raça, seco, cor, idade ou quaisquer formas de discriminação.
De acordo com a ação, a implantação do CLA ainda não cessou. Também estão previstas outras fases de expansão do projeto e, conseqüentemente, o deslocamento de outras comunidades, muitas delas de remanescentes de quilombos.
Segundo o laudo antropológico, existem hoje 139 povoados referidos às comunidades remanescentes de quilombos no município de Alcântara, sendo que, desse total, 90 encontram-se localizados na área desapropriada por utilidade pública para a instalação da base de lançamento de foguetes do governo. Esses povoados totalizam 12.941 habitantes, ou seja, 83% da população rural do município.
Segundo a procuradora Débora Duprat, do Ministério Público Federal, o centro de lançamento de foguetes perdeu seu fundamento legal, o da desapropriação por utilidade pública, já que agora caracteriza-se como um empreendimento comercial. "Trata-se, agora, de alugar o CLA a outros países. Trata-se de negócio", afirma.
Segundo informações da assessoria do CLA, não há data marcada para efetuar a transferência de novas famílias.

OESP, 06/12/2004, Vida, p. A9

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