O Liberal (Belém - PA)
23 de Jul de 1995
Demarcação de terra indígena será mudada
O Ministério da Justiça apresentará ao presidente Fernando Henrique Cardoso, no início de agosto, a alteração no decreto 22191, que trata do processo administrativo de demarcação de terras indígenas. Apesar da mudança no decreto, o ministro da Justiça, Nelson Jobim, garante que o "governo não irá rever nenhuma das demarcações já consolidadas". O principal argumento do Ministério para mudar o decreto, que vem provocando a revolta de entidades de defesa dos índios até no Exterior e o aumento da violência nas áreas em conflito, é evitar que todo o processo de demarcação desencadeado pelo decreto venha a ser questionado por julgamento do Supremo Tribunal Federal. No entanto, o STF já julgou o decreto constitucional em 93, em ação propôs ta pelo governo do Pará. Nesta ação, o parecer pedindo a inconstitucionalidade de decreto foi elaborada pelo escritório do então deputado Nelson Jobim.
O que o ministro pretende é introduzir o "princípio do contraditório" (defesa de quem reivindica a terra) no decreto, para as demarcações futuras. O que se discute no Ministério da Justiça é o "momento jurídico" em que a demarcação é considerada consolidada: na identificação pela Funai, depois da portaria do Ministério, na homologação pelo presidente Fernando Henrique Cardoso, ou no ato do registro em cartório. Atualmente, já silo dadas como consolidadas as áreas até agora homologadas pelo presidente da República.
O secretário executivo do Instituto Ambiental, Carlos Alberto Ricardo, lembra que as entidades de defesa dos índios não são contra a introdução do contraditório, mas sim contra a sua retroatividade. "O que nos preocupa é a intenção do governo de instituir a figura do contraditório para as reservas já demarcadas" - diz. Segundo assessores de ministro Nelson Jobim, a polêmica que se formou em tomo das mudanças neste decreto é fruto da desinformação sobre o que o Ministério realmente pretende fazer. Eles garantem que o decreto não será revogado e que a intenção é encontrar uma fórmula que garanta aos que se sentirem lesados com a demarcação de terras o direito de apresentar sua defesa. "Se a idéia fosse rever todas as demarcações, o presidente Fernando Henrique Cardoso não teria homologado oito áreas no último dia 28" - argumenta um assessor.
Hoje, existem 557 áreas indígenas no Brasil. Desse total, 189 áreas foram demarcadas, homologadas e já possuem registro em cartório, e 27 estão em fase final de registro (já homologadas pelo presidente da República). A dúvida surge em relação às 133 áreas indígenas já identificadas pela Funai - algumas inclusive foram demarcadas por
portarias de ex-ministros da Justiça -, que ainda não foram homologadas pela Presidência da República, nem registradas em cartório. Existem ainda 208 áreas indígenas não identificadas pela Funai.
Carlos Alberto também revela preocupação com a disposição do governo de só considerar como terras indígenas somente aquelas registradas em cartório. "O que nos preocupa é a revisão de limites de todas as terras indígenas já delimitadas, demarcadas e homologadas por governos anteriores, pelo simples fato de não estarem registradas nos Serviços de Patrimônio da União e nos cartórios de registros imobiliários" - afirma o secretário executivo do Instituto Ambiental.
O decreto 22/91 estabelece que o primeiro passo para a demarcação de terras indígenas é a identificação feita por um grupo técnico da Funai, composto de antropólogos. Eles traçam um limite preliminar, baseado em estudos históricos, sociológicos, cartográficos e fundiários, publicado posteriormente no "Diário Oficial". Em seguida, o ministro da Justiça analisa o processo e publica portaria determinando os limites para a demarcação. A Funai faz a demarcação física e a submete à homologação do presidente da República. O último passo é o registro em cartório imobiliário, como área de domínio da União para usufruto dos povos indígenas.
O Liberal, 23/07/1995
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