VOLTAR

Brasil rejeita projeto dos EUA de criar exercito continental

FSP, Brasil, p.A9
19 de Nov de 2004

Ministros da Argentina e do Chile apóiam posição do ministro José Alencar
Brasil rejeita projeto dos EUA de criar exército continental
Eliana Cantanhède
Enviada especial A Quito
O Brasil aliou-se à Argentina e ao Chile contra as duas principais propostas dos Estados Unidos: a criação de um Exército único no continente e a ampliação do papel constitucional das Forças Armadas de cada país, para que atuem como polícia no combate ao terrorismo e ao crime organizado.
Essas eram as questões mais polêmicas na definição do texto final da "Declaração de Quito", que será divulgada hoje, último dia da 6ª Conferência dos Ministros da Defesa das Américas. O Brasil e a maioria dos sul-americanos consideram que uma força militar comum seria comandada pelos EUA e que as Forças Armadas devem se ater às ações de defesa.
A posição do Brasil, segundo o vice-presidente e ministro da Defesa, José Alencar, é "o fortalecimento da defesa, preservando os objetivos tradicionais das Forças Armadas, de preservação da soberania nacional e da integridade territorial de cada país".
Os EUA consideram que os militares não podem continuar impassíveis e distantes, enquanto o terrorismo se espalha pelo mundo e as grandes cidades estão ameaçadas pelo narcotráfico e a violência urbana. Querem, assim, aproximar os conceitos de defesa (militar) e de segurança (polícia).
Brasil, Argentina e Chile articularam uma reação dos países latino-americanos para evitar isso. Alegam que todos eles têm Forças Armadas profissionais e com funções de defesa. "Nossas Forças Armadas já atuam na segurança de fronteiras, por exemplo, mas são ações pontuais. Exército, Marinha e Aeronáutica atuam ali em relação a drogas, ilícitos em geral e crime organizado como forma de defesa da integridade territorial", declarou Alencar.
Os ministros de Argentina e Chile têm discurso muito semelhante. Do argentino José Juan Bautista Pampuro: "Somos contra uma força multilateral militar e não queremos impor um critério único comum. Terrorismo é uma preocupação, e podemos colaborar uns com os outros com a troca de dados e informações, sem interferir diretamente".
Do chileno Jaime Javinet, admitindo que os três países não aceitavam, até ontem, a pressão dos EUA para centralizar o documento final na questão do combate ao terrorismo: "Nós queremos uma posição mais ampla, ratificando que nossa realidade é de paz e que o desenvolvimento, o progresso e a justiça social devem ser consideradas também como questões de segurança". Segundo ele, "afortunadamente", Brasil, Argentina e Chile falam a mesma língua.
Num dos momentos tensos das reuniões temáticas, a portas fechadas, a delegação chegou a bater boca com a americana, que tinha cerca de 500 das 1.400 pessoas credenciadas para a conferência e ocupava não apenas três andares do Suissôtel, onde se realizavam os trabalhos, mas apartamentos nos principais hotéis de Quito.
Os americanos insistiam em incluir no documento final uma referência ao combate ao narcotráfico na Colômbia. O Brasil rejeitou, sob alegação de que se trata de uma questão de segurança, ou seja, policial, e não de defesa. Prevaleceu a posição brasileira -que ameaçava destacar a questão da miséria como questão de defesa. Havia dúvidas se a citação à Colômbia acabaria ou não sendo acatada em outros grupos temáticos ao longo do dia ou da noite.
s EUA apresentaram 24 alterações de cunho político ao esboço original da "Declaração de Quito", mas o Brasil, a Argentina e o Chile, conforme confidenciavam seus negociadores, tinham o apoio de Uruguai, Paraguai, Bolívia, Peru, Venezuela e México.
Os principais aliados dos EUA eram Colômbia (que abriga tropas americanas), Equador (que dolarizou sua moeda) e Canadá. Tentando contemporizar, o ministro da Defesa da Colômbia, Jorge Alberto Uribe Echavarría, disse que não havia "nem polarização nem pressão para formação de um bloco único" e que a idéia não é criar um exército comum para "operar nos países", mas para identificar ameaças aos países.

FSP, 19/11/2004, p. A9

As notícias aqui publicadas são pesquisadas diariamente em diferentes fontes e transcritas tal qual apresentadas em seu canal de origem. O Instituto Socioambiental não se responsabiliza pelas opiniões ou erros publicados nestes textos. Caso você encontre alguma inconsistência nas notícias, por favor, entre em contato diretamente com a fonte.