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Brasil já registra mais de 11 mil casos de suicídios por ano

O Globo, Sociedade, p. 33
22 de Set de 2017

Brasil já registra mais de 11 mil casos de suicídios por ano
Frequência é maior entre homens jovens, e taxa entre indígenas é três vezes a média nacional

Renata Mariz

Tabu na sociedade, o suicídio vem crescendo como problema de saúde pública no Brasil. O número de pessoas que tiraram a própria vida no país subiu 11% entre 2011 e 2015, passando de 10.490 para 11.736, segundo dados inéditos do Ministério da Saúde divulgados ontem. Em termos proporcionais à população, a taxa foi de 5,3 para 5,7 mortes por 100 mil habitantes.
A alta vai na contramão do compromisso firmado pelo governo com a Organização Mundial da Saúde, que tem meta de reduzir o índice em 10% até 2020 no mundo. O ponto de partida para a medição é 2013, quando o país registrou 5,6 mortes por 100 mil habitantes. Para fazer frente ao desafio, o Ministério da Saúde deu um passo com a divulgação, pela primeira vez, de um boletim epidemiológico sobre mortes autoprovocadas e pretende lançar um Plano Nacional de Prevenção ao Suicídio. As ações fazem parte da campanha "Setembro Amarelo".
Segundo Maria de Fátima Marinho, diretora da Secretaria de Vigilância em Saúde do Ministério da Saúde, o aumento tem relação com a melhoria nos sistemas de registro. Ela aponta, porém, que os dados ainda estão subnotificados. Fogem às estatísticas principalmente casos ocorridos nas classes mais altas, em que a causa da morte é ocultada devido ao estigma e à existência de seguros de vida a receber.
Mortes por suicídio são mais frequentes entre homens no Brasil: são 79% dos casos entre 2011 e 2016, com uma taxa de mortalidade de 8,7 por 100 mil habitantes - quatro vezes maior que a das mulheres, de 2,4 por 100 mil habitantes. O suicídio é a terceira maior causa de óbitos entre homens de 15 a 29 anos (9 por 100 mil habitantes), perdendo apenas para agressões (110,6) e acidentes de trânsito (41,3).
- São dados que não tiram a importância do suicídio, mas falam muito do problema da violência no nosso país. Homens e jovens não vão morrer por suicídio porque já morreram antes por homicídio - diz Maria de Fátima.
Entre as mulheres de 15 a 29 anos, o suicídio é a oitava causa de morte, superada por óbitos decorrentes de gravidez, parto e pós-parto (8), de acidentes de trânsito (7,4), e de agressões (7), entre outros. IDOSOS NA FRENTE EM ÍNDICE PROPORCIONAL O suicídio se concentra na faixa etária de 30 a 39 anos (21,2% dos casos de 2015) e, em segundo lugar, na de 20 a 29 anos (19,7%). Mas, em termos proporcionais à população, o pico está entre os idosos de 70 anos ou mais. Eles respondem por menos de 10% do total, mas têm a maior taxa (de 8,9 por 100 mil) entre todos os recortes de idade.
- Essa concentração nos idosos está relacionada a depressão, doenças crônicas e abandono familiar - explica Maria de Fátima.
Já a taxa de mortalidade por suicídio entre indígenas é quase o triplo da média nacional: 15,2 a cada 100 mil pessoas. E 44,8% das mortes ocorrem na faixa etária de 10 a 19 anos, ao contrário do panorama geral, em que os adultos de 30 a 39 anos respondem pela maior proporção dos registros.
Lívia Vitenti, da Secretaria Especial de Saúde Indígena aponta que, embora o suicídio seja um fenômeno multifatorial, questões relacionadas à disputa por território têm impacto, ainda que indiretamente, em determinadas etnias. Segundo ela, o povo guarani-kaiowá é um dos mais atingidos:
- É uma população que ficou confinada em um território muito pequeno e que vive um problema fundiário constante, o que leva a desavenças, alcoolismo e desestrutura.
Além dos guarani-kaiowás, os tikunas e os carajás são apontados como etnias com taxas mais elevadas de suicídio. O fenômeno não é exclusividade do Brasil. Para todos os países com dados, os indígenas aparecem com índices preocupantes, afirma Lívia. A particularidade do Brasil está nas dificuldades para prestar assistência.
- A terra indígena às vezes é muito longe, e faltam também profissionais preparados para lidar com tema nesse contexto. Nós estamos capacitando as pessoas e indo aos territórios mapeados para preparar ações mais focadas - diz Lívia.

Más condições nas aldeias motivam mortes

Uma das tribos indígenas com mais alto índice de suicídios é a dos guarani-kaiowá, de Mato Grosso do Sul. Envolvidos em disputas de terra com produtores rurais - acusados de tentar tirá-los à força de suas áreas tradicionais - muitos índios não suportaram o confinamento em pequenos territórios e as péssimas condições de vida nas aldeias e se mataram, quase todos por enforcamento.
Pelos dados do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), da Igreja Católica, apenas no período entre 2000 e 2011 foram registrados 555 suicídios entre os kaiowá, motivados por situações de falta de perspectiva, violência aguda e variada, afastamento das terras tradicionais, e vida em acampamentos às margens de estradas. Há muitos relatos de alcoolismo e outros problemas.
De 1991 a 2012, só oito terras indígenas foram homologadas para os guarani-kaiowá, que compõem o segundo maior povo indígena do país, com 43 mil pessoas. O número de suicídios entre os kaiowá foi, nas últimas duas décadas, 22 vezes maior que no conjunto da população brasileira. No período, a violência de fazendeiros contra esses índios foi amplamente denunciada.
Em 2012, causou polêmica internacional uma carta de kaiowás da comunidade Pyelito kue, de Iguatemi, no Sul do MS, que falava em morte coletiva de índios após receberem ordem de despejo do lugar onde estavam acampados, à margem de um rio.
A carta foi interpretada como uma ameaça de suicídio em massa - o que não ocorreu. Desde então, as disputas de terra na região só aumentaram.

O Globo, 22/09/2017, Sociedade, p. 33

https://oglobo.globo.com/sociedade/saude/brasil-registra-cerca-de-11-mi…

https://oglobo.globo.com/sociedade/saude/taxa-de-suicidio-entre-indigen…

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