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Brasil ainda tem 1 milhão de crianças que trabalham

FSP, Poder, p. A4
28 de Dez de 2011

Brasil ainda tem 1 milhão de crianças que trabalham
Dados do IBGE mostram que o problema é mais grave na região Norte
Renato Mendes, da OIT, diz que é preciso cobrar dos municípios papel mais ativo no combate à mão de obra infantil

ANTONIO GOIS
DO RIO
luiza bandeira
MATHEUS MAGENTA
DE SÃO PAULO

Apesar dos avanços registrados na década passada, mais de 1 milhão de crianças de 10 a 14 anos, ou 6% do total, ainda trabalhavam no Brasil em 2010.
Tabulações feitas pela Folha no Censo do IBGE mostram que o problema é mais grave no Norte, onde praticamente uma em cada dez crianças exerce atividade econômica remunerada ou não.
Especialistas afirmam que, para cumprir a meta assumida internacionalmente de erradicar o trabalho infantil do país até 2020, será necessário um esforço adicional.
Isso porque as formas de trabalho infantil que mais persistem no país são mais difíceis de serem fiscalizadas. É o caso de atividades domésticas ou em propriedades agrícolas e familiares.
Por serem preliminares, os dados do Censo de 2010 ainda não permitem investigar mais detalhes sobre as características das crianças ocupadas ou fazer comparações precisas com 2000.
Isso pode ser feito pela Pnad (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios), também do IBGE, que mostra que a proporção de crianças trabalhando caiu de 11,6% para 7,2% de 2001 a 2009.
Considerando-se o Censo, o trabalho infantil na década caiu de 6,6% para 6,2%.
No entanto, técnicos do IBGE explicam que o dado de 2000 está provavelmente subestimado, pois em 2010 o levantamento de informações a respeito de domicílios sem rendimento foi mais preciso.
AGRICULTURA
A pesquisa revela também que as ocupações mais comuns de crianças estão na agricultura e na pecuária.
Luiz Henrique Lopes, chefe da Divisão de Fiscalização do Trabalho Infantil do Ministério do Trabalho, diz que as ações do governo têm diminuído o número de crianças ocupadas na área rural.
Mas ele admite que a verificação é mais difícil, e há o agravante de o uso da mão de obra infantil ser culturalmente mais aceito no campo.
"A fiscalização é mais remota nessas áreas não só por seu custo -que demanda viaturas, motoristas, diárias, passagens-, mas também pelo tempo de deslocamento, o que faz com que haja um número menor de ações."
Outra área que apresenta difícil fiscalização é a dos serviços domésticos.
"Enfrentamos o problema do trabalho infantil invisível, onde é difícil chegar por questões de distância [nas áreas rurais] ou legais, de entrar na casa [no trabalho doméstico]", diz Marcos Calixto, da Superintendência Regional do Trabalho do Tocantins.
O coordenador do programa para eliminação do trabalho infantil da OIT (Organização Internacional do Trabalho), Renato Mendes, afirma que é preciso fortalecer e cobrar dos municípios um papel mais ativo no combate à ocupação de crianças.
"Os documentos e as diretrizes do governo federal para atacar o problema são claros e contundentes. No nível municipal, essa política nem sempre é implementada com qualidade", diz Mendes.

No Amazonas, garoto trabalha 11 horas por dia

KÁTIA BRASIL
DE MANAUS

No comércio popular da periferia de Manaus, muitas crianças e adolescentes trabalham longe da fiscalização.
Quando os pais ou empregadores são abordados, dizem que é melhor a criança trabalhar que ficar nas ruas.
No bairro do Zumbi, na zona leste da cidade, L., 11, trabalha lavando peixes em um box na feira. São dois turnos: das 7h às 12h e das 14h às 20h.
O garoto recebe R$ 20 por dia. Ele afirma que estuda. Cursa o 5o ano do ensino fundamental. "Com o dinheiro, eu compro roupas e dou para minha mãe", diz L.
O empregador do garoto, um peixeiro que se identificou como Elson, 29, afirma que emprega L,. mas não é trabalho infantil. "Melhor do que 'tá' na rua perambulando, pedindo dinheiro", disse.
No açougue Esperança, os meninos N., 8, e A., 10, trabalham com desenvoltura cortando nacos de carne e dando troco aos clientes.
Por um minuto, N. esquece o trabalho e liga a pequena TV. Mas a mãe, Mariluce Lopes, 29, dona do açougue, manda desligar.
O garoto volta para o balcão. Sem falar em pagamentos, ela disse que traz as crianças para trabalhar porque não tem quem cuide delas em casa. "Eles ficariam sozinhos, é perigoso", disse.
Em Rondônia, Estado que apresenta maiores taxas de trabalho infantil no país, a maioria das crianças estão nas formas mais "invisíveis" de trabalho: agricultura familiar e funções domésticas.
Em outubro, o Conselho Tutelar de Porto Velho descobriu que uma garota de oito anos fazia trabalho doméstico em sua casa obrigada pelo pai e pela madrasta.
Estava com o rosto parcialmente queimado por óleo por causa de acidentes. Hoje, ela mora com uma tia e voltou a frequentar a escola.
Colaborou MATHEUS MAGENTA, enviado especial a Rondônia

Cenário
95% dos que trabalham estudam
Não basta matricular crianças na escola para evitar que elas trabalhem. Para especialistas, é preciso aperfeiçoar o Bolsa Família, que fez os pais se preocuparem com a matrícula em vez da erradicação do trabalho.

FSP, 28/12/2011, Poder, p. A4

http://www1.folha.uol.com.br/fsp/poder/17207-brasil-ainda-tem-1-milhao-…
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http://www1.folha.uol.com.br/fsp/poder/17208-95-dos-que-trabalham-estud…

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