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Bom senso

O Globo, Opinião, p. 6
07 de Jun de 2006

Bom senso

A estrada Cuiabá-Santarém, a BR-163, aberta pelo regime militar em Mato Grosso e no Pará, na década de 70, serviria, com a Transamazônica, de eixo colonizador da Amazônia. O plano estratégico de ocupação da região não deu certo e a estrada terminou quase toda abandonada. A crise econômica acelerada pelo segundo choque mundial do petróleo atingiu as finanças do Estado, e a falta de dinheiro público para tocar e manter a obra tornou intransitável boa parte dos 1.900 quilômetros da estrada. Apenas 800 quilômetros, em Mato Grosso, foram asfaltados.
A ministra Marina Silva, do Meio Ambiente, anunciou que afinal o governo Lula decidiu asfaltar toda a extensão da BR-163. Parece fora de propósito uma obra rodoviária ser tratada pela Pasta do Meio Ambiente. Não nesse caso. Pois a estrada foi demonizada pelos movimentos ecológicos radicais e passou até a ser tema recorrente na imprensa internacional de reportagens catastrofistas sobre o futuro da Amazônia. São compreensíveis os cuidados com a ocupação daquela área. Mas era ingênua a tese da preservação da região pelo abandono da BR-163. Ao curvar-se a essa verdade e conceder licença ambiental à obra, a ministra demonstrou um bom senso que lhe falta na questão dos transgênicos. Mas, pelo menos nesse caso, ela entendeu não poder ser contra o progresso, e que a melhor alternativa para a área, como para a Amazônia, é ocupá-la de forma racional, para que não seja invadida de maneira predatória. Como vem sendo.
A expansão da fronteira agrícola em direção à Amazônia é inexorável e disso depende em boa medida o fortalecimento do país como potência agroindustrial e exportadora. Asfaltada, a BR-163 permitirá que produtores de grãos do Centro-Oeste deixem de depender de portos no Sul/Sudeste, como o de Paranaguá, a aproximadamente três mil quilômetros de distância. Pela estrada, poderão utilizar o terminal de Santarém, bem mais próximo e caminho mais curto para os mercados europeu e americano. Em fevereiro havia sido criado por decreto, naquela região, um distrito para explorar as florestas de maneira sustentável. Medida adequada, mas que precisará ser executada com um mínimo de competência. O fim do dogma ambientalista dentro do governo em torno da BR-163 é um avanço. No entanto, de fato não basta apenas asfaltar a rodovia.

O Globo, 07/06/2006, Opinião, p. 6

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