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Bendita água!

CB, Opinião, p. 19
Autor: FALCÃO, Dom José Freire
06 de Mar de 2004

Bendita água!

Dom José Freire Falcão
Cardeal

Conta Saint-Exupéry, em Terra dos Homens, que os franceses levaram, certo dia, três mouros para conhecer a França. 0 guia os conduziu a uma grande cascata e lhes disse:
- Bebam.
A água que os meninos mouros mendigam pelas ruas, esta água tão avara da qual não caiu uma gota em Port-Étienne, durante dez anos, essa água roncava ali como se de uma cisterna arrebentada soltassem todas provisões do mundo.
-Vamos embora, disse o guia.
Mas, eles não se mexiam.
-Vamos ficar um pouco mais...
Deus, ali, se manifestava: não se lhe podia virar as costas. Deus abria suas represas e mostrava sua potência: os três mouros permaneciam imóveis.
- Que querem ver mais? Vamos embora...
-Vamos esperar.
- Esperar o quê?
- 0 fim.
Queriam esperar a hora em que Deus se cansasse de sua loucura.
Sim. A água é um precioso dom de Deus.
Sem ela não há vida na terra, menos ainda vida humana. Um dom que deveríamos usá-lo com sentido reverencial e quase sagrado.
Paulo VI dizia: "Oh, água! Terrível, quando inimiga; providencial e bendita, quando amiga".
Inimiga quando ceifa vidas, destrói lavouras e bens materiais.
Amiga quando rega o campo, faz germinar a semente, sacia a sede da criatura humana, é alimento e vida.
Para os hebreus, a água corrente era chamada de água viva, em oposição à água dos mares e das cisternas.
Água viva, porque portadora de vida. Vida para os vegetais, os animais e a criatura humana.
Água viva, em sentido simbólico e espiritual. Judá é ameaçado de destruição e de exílio, porque deixou Javé: "A fonte das águas
vivas" (Jeremias,2,13).
Ezequiel (47, 1-12) evoca um rio que, saindo do Templo, dá fertilidade extraordinária ao deserto de Judá. Rio, símbolo da nova Jerusalém, do novo Israel.
Zacarias (14,8) chama de água viva as águas que saem de Jerusalém e correrão no inverno como no verão. Penhor de fertilidade para a terra de Israel.
0 tema é retomado por João no Apocalipse (22,1). Aplicado à Jerusalém celeste, à Igreja de Cristo, fonte de água viva.
No diálogo com a samaritana (Jô 14,10), Jeus compara a água viva ao dom de Deus aos homens. Dom que é graça e verdade. Água que sacia o coração humano, sempre inquieto, enquanto não repousa em Deus. Agua que jorra para a vida eterna.
0 simbolismo da água viva é utilizado com freqüência pela Igreja. Assim, na purificação das mãos, na celebração da Missa, no lavapés, na quinta-feira santa.
A água benta é empregada nas bênçãos. No batismo é o símbolo do nascimento novo, da nova vida que irrompe no batizado, purificando-o de todas as faltas. Na água batismal o cristão recebe a fonte de vida.
Bendita seja a água que banha nossas cidades, se esparrama pelo sertão, a terra fecunda e alegra o coração da gente. A água, que, neste ano, cai sem cessar. Enche reservatórios. Corre impetuosa nos rios. É esperança de espigas recheadas e colheitas abundantes. Segurança de pão na mesa de todos. Bendita, a irmã água, fonte de vida, como proclama a Campanha da Fraternidade deste ano. Objeto de reflexão neste tempo da quaresma.

CB, 06/03/2004, Opinião, p. 19

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