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Amazônia: querem tomar essa riqueza

Isto É Dinheiro, p. 28-31
01 de Jun de 2005

Amazônia: querem tomar essa riqueza

01/06/2005

A semana que passou entrará para a história do Brasil como uma daquelas em que o País mais foi atacado pela imprensa mundial. Diante de estatísticas mostrando um recrudescimento anômalo no desmatamento amazônico - esperava-se um crescimento de 2% no ritmo da derrubada entre 2003 e 2004, mas registrou-se um percentual de 6% - jornais, organizações ecológicas e até diplomatas do mundo desenvolvido reagiram com pedras na mão. Contra o Brasil. "É impossível encontrar qualquer argumento coerente em defesa da contínua destruição da floresta equatorial brasileira", escreveu, em Londres, o diário Independent. "Eles estão transformando a floresta tropical em pastagens. É asqueroso", proclamou John Sauven, líder do Greenpeace. Mas partiu de Peter Mandelson, comissário europeu de comércio, o comentário mais agressivo da semana. ?O Brasil tem que assumir as suas responsabilidades. Algo grave está acontecendo?, disse ele, enfatizando que é preciso frear a destruição de ?um bem público?. Essas afirmações maliciosas ecoaram o que já fora dito, em fevereiro, por Pascal Lamy, antecessor de Mandelson na União Européia e atual diretor-geral da Organização Mundial do Comércio. Com imensa cara de pau, Lamy, o príncipe do protecionismo europeu, defendeu a internacionalização da Amazônia. Como se a floresta mais pujante do planeta, que ocupa 58% do território brasileiro, já não tivesse dono. Como se os europeus já não tivessem destruído 90% de suas próprias florestas.
Desta vez, porém, a grita ecológica tinha um alvo preciso: a soja e, através dela, a exploração das riquezas naturais do Brasil. Não é por outro motivo que a cobertura mais agressiva sobre o desflorestamento concentrou-se na pessoa de Blairo Maggi, governador do Mato Grosso e maior plantador de soja do planeta. A revista britânica The Economist referiu-se a ele como ?o estuprador da floresta" e "rei do desflorestamento", explicando que o Mato Grosso foi responsável por 40% do desmatamento registrado no último biênio. O governo federal limitou-se a defender seus planos para a região ? que são bons, diga-se de passagem " sem confrontar a histeria dos ambientalistas e seus patrocinadores no Hemisfério Norte. "Atacam a nossa soberania e ninguém sai em nossa defesa. Assim vão permitir o esquartejamento da Amazônia", revolta-se Maggi. O general Luiz Gonzaga Lessa, presidente do Clube Militar e ex-comandante militar da Amazônia, também sentiu cheiro de fumaça. "Isso é lobby econômico disfarçado de ideologia ambientalista", resume. O historiador Luiz Alberto Moniz Bandeira, autor de "As Relações Perigosas: Brasil-Estados Unidos", também vê interesses escusos na grita da semana passada. "Essas ONGs não são inocentes. Servem aos interesses das transnacionais que estão sendo afetadas pela competição agrícola do Brasil", afirma o professor. "Essa celeuma visa apresentar à ONU um projeto de internacionalização da Amazônia."
Para entender os interesses em jogo na floresta, é preciso ter em conta que o Brasil tornou-se, nos últimos anos, o maior exportador de soja do mundo, com 36,2 milhões de toneladas. Ultrapassou os Estados Unidos. O Mato Grosso de Maggi lidera a produção nacional, sua soja esbarra na chamada Amazônia Legal e invade a zona de transição botânica entre o cerrado e a floresta equatorial. Os agricultores dizem que esse território é cerrado e insistem em plantar 50% da área de suas propriedades. O governo diz que é floresta e admite o plantio de apenas 20%. Adilton Sachetti, prefeito de Rondonópolis e um dos maiores plantadores de algodão do Mato Grosso, lembra que o Estado tem área de 90 milhões de hectares, dos quais apenas 8 milhões são de plantio. Outros 50 milhões de hectares são cobertos por florestas intocadas. Ele pondera que os americanos, a despeito das suas ONGs, têm 33% do seu PIB ancorado na agricultura: "Falar que a soja é responsável pela degradação do ambiente é fachada. Eles temem é que o Brasil roube mercado dos americanos". Há outro mercado em jogo, o da madeira. Nos últimos três anos, a Amazônia multiplicou por cinco a sua área para exploração de madeira certificada, com selo verde para exportação legal. Mas a tese do Greenpeace é a de que a madeira da Amazônia não deve ser explorada nem mesmo como manejo florestal. No fundo desse debate, está o fato de que o Brasil caminha, rapidamente, para dominar tanto o mercado internacional de móveis e madeiras quanto o de papel e celulose. Há no segmento 40 projetos em andamento, com investimentos previstos de R$ 6,7 bilhões. "Muita gente não se conforma com o fato de uma área com o tamanho e o potencial da Amazônia ser controlada por um país subdesenvolvido como o Brasil", afirma Lorenzzo Carrasco, organizador do best-seller "Máfia Verde". "Algumas ONGs funcionam como forças de guerra irregulares e o governo brasileiro tem sido excessivamente submisso a essas pressões."
Na tarde da terça-feira 24, houve uma reunião no Palácio do Planalto para tratar da pressão internacional. Coordenada por José Dirceu, ministro-chefe da Casa Civil, contou com cinco ministros em pessoa, como Marina Silva, do Meio Ambiente, e Aldo Rebello, da Coordenação Política. Dirceu abriu o encontro dizendo que estava efetivamente preocupado com as pressões internacionais. Ao final, o grupo concluiu que o problema pode ser resolvido caso o Brasil explique de forma detalhada nos foros internacionais todas as boas medidas que estão sendo tomadas pelo governo de um ano para cá, quando colocou em prática o Plano de Combate ao Desmatamento da Amazônia. Inaugurado em março do ano passado, esse plano prevê 149 ações de 13 ministérios e investimentos de R$ 390 milhões até 2007. Um dos focos do plano diz respeito à fiscalização da região, com intensificação da presença do Exército e a contratação de mais 600 fiscais do Ibama, ainda este ano. Outro foco é a criação de áreas de proteção para conter o desmatamento. Nos últimos dois anos, o governo reservou 376 mil km2 de florestas exclusivamente para projetos de assentamentos sustentáveis e extrativismo. A área é maior que a Alemanha. Também homologou 93 mil km2 de reservas indígenas e criou mais 83 mil km2 de reservas florestais. Equivale a uma Áustria. O plano é que essas reservas contenham a derrubada das árvores. A próxima meta é tentar aprovar no Congresso o projeto de lei que cria o Serviço Florestal Brasileiro, espécie de agência reguladora da floresta. A idéia central é que o governo faça concessões para exploração por manejo " da mesma forma que emite concessões de telecomunicações ou jazidas minerais. O SFB define a área de exploração, o Ibama fiscaliza. O projeto está pronto para ser votado em uma comissão da Câmara. Ao final da reunião de terça-feira, os ministros decidiram trabalhar melhor em quatro pontos: intensificar o policiamento, criar um selo verde para os produtos da Amazônia, efetivar a idéia de um pacto com os Estados (estabelecendo metas de redução da devastação) e, por fim, propor à equipe econômica uma linha de crédito subsidiada para os projetos verdes. "Não podemos ser simplesmente contra a soja", diz a ministra Marina Silva, do Meio Ambiente. "Temos de defender que as atividades produtivas, de qualquer natureza, sejam feitas em bases sustentáveis." Essa é um conversa que os brasileiros podem entender, os produtores podem apoiar e o futuro não tratará como simples capitulação a interesses internacionais.

5 milhões de Km2 é o tamanho total da Amazônia brasileira
390 milhões de reais é orçamento do governo para a Amazônia até 2007
55 mil espécies vegetais já foram cadastradas na Amazônia
O que acontece na floresta
As reservas florestais e indígenas eram 29% da Amazônia em 2002. Subiram para 31% em 2004. Esses dois pontos percentuais representam um território do tamanho da Áustria.
As terras devolutas e griladas, onde acontecem 90% dos desmatamento,seram 47% da Amazônia em 2002. Caíram para 44% em 2004.
14 mil km2 é a área de exploração de madeira com manejo certificado para exportação. Equivale ao Kuait e a Sergipe. Em 2002, a área era cinco vezes menor. A meta do governo é ter 30% da produção da madeira da Amazônia com selo verde até 2007.
376 mil km2 de florestas foram reservados para projetos de assentamentos sustentáveis e extrativismo entre 2003 e 2004. A área é maior que a Alemanha.
O Estado do Amazonas conseguiu reduzir em 39% a sua área desmatada em 2004 com a implantação do programa Zona Franca Verde, que subsidia populações indígenas e ribeirinhas.
80 mil km2 ao longo da BR 163, entre Cuiabá e Santarém, estão preservados do desmatamento. O governo vai apresentar um projeto de exploração de agro-florestas para toda a região da rodovia.

Isto É Dinheiro, 01/06/2005, Economia, p. 28-31

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