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Yanomamis alertam para volta do garimpo e aumento do crime organizado nas aldeias

Carta Capital - https://www.cartacapital.com.br/
03 de Ago de 2023

Yanomamis alertam para volta do garimpo e aumento do crime organizado nas aldeias
O baixo efetivo da Força Nacional e agentes despreparados, destacam, dificulta a execução de ações protetivas nas regiões mais afastadas do território

Caio César

03/08/2023

Após seis meses da operação Escudo Yanomami, implementada pelo governo Lula para conter a crise humanitária em terras indígenas, organizações e líderes denunciam o ressurgimento do garimpo, a persistência do crime organizado e a ineficácia de medidas de proteção em áreas-chave.

Em entrevista exclusiva a CartaCapital, Maurício Ye'kwana, liderança da associação indígena Hutukara, sustenta que o crime organizado continua operando em terras Yanomami inacessíveis para a Força Nacional. A escassez de agentes no local, destaca, permitiu a volta parcial dos garimpeiros à região.

"Aproximadamente 70% da mineração ilegal recuou, voluntariamente, no território. O que está mais difícil agora é a presença de grupos criminosos e facções dentro das nossas terras", ressalta. "Esses grupos possuem força para confrontar os agentes militares. Nos últimos meses, tivemos vários conflitos e tiroteios nas regiões."

Outro problema apontado por Maurício é a ameaça constante do recrutamento de jovens indígenas para o tráfico. Segundo o líder, as facções se aproveitam da ausência do estado e oferecem roupas, comida e até bebida alcoólica para indígenas em situação de vulnerabilidade social. "Cresce o temor de que possam recrutar esses jovens e fornecer armas pesadas. Nós sabemos do que eles são capazes."

Vale lembrar que nenhum tipo de bebida alcoólica faz parte do consumo e do estilo de vida Yanomami. Sem familiaridade com essas substâncias, há episódios agudos de agressividade e adoecimento de membros das comunidades isoladas - que atualmente enfrentam dificuldades para conseguir a ajuda médica garantida pela Operação Escudo.

A persistência do crime organizado e novos pontos de mineração ilegal podem ser observados principalmente nas regiões dos rios Apiáu e Couto Magalhães. As acusações constam em um relatório entregue a órgãos governamentais na quarta-feira 2.

Ações do governo não chegam a áreas críticas

O documento enfatiza que, além do retorno das atividades de mineração ilegal à região, a infraestrutura das equipes de saúde deslocadas para as comunidades ainda é precária. Dos seis territórios analisados pelo relatório, três não possuem unidade de saúde e em cinco a equipe de saúde não visita as aldeias. A violência provocada pelo crime organizado e pela mineração ilegal também gera uma situação de insegurança, que dificulta ainda mais a atuação e a permanência de médicos voluntários nas regiões mais remotas.

O relatório aponta seis áreas classificadas como "em situação crítica" pelos líderes. São elas: as comunidades de Parafuri, Xitei, Haxiu, Homoxi, Parima e Kayanau. Esses territórios também sofrem com o aumento progressivo de malária, com mortes recentes associadas à falta de tratamento completo e doenças de fácil erradicação, como a diarreia.

Maurício também ressalta que, nos territórios onde a assistência à saúde consegue chegar, as equipes médicas voluntárias não receberam treinamento específico para atuar nas comunidades indígenas. "Chegam médicos voluntários de todos os estados, mas eles não estão preparados. Enfrentam uma realidade muito triste e urgente, mas nem sempre sabem como atuar", pontua. "Faltou um planejamento que envolva as lideranças indígenas para conduzir esse trabalho adequadamente. O governo tentou mitigar a questão da saúde, mas não está alcançando quem precisa."

Outro aspecto destacado pelo líder indígena é que a conduta militar empregada pelos agentes da Força Nacional também é questionável. Segundo Maurício, os agentes muitas vezes não sabem gerenciar a distribuição adequada dos mantimentos enviados pelo governo, que se acumulam nas áreas de fácil acesso e são escassos em aldeias remotas, com alimentos perecíveis estragados pela demora na distribuição. "Eles são autoritários e seguem ordens, se a ordem é deixar os mantimentos em uma comunidade, eles deixam. Não há diálogo, não há conversa com os líderes locais e nem instrução. Eles simplesmente jogam [os mantimentos] na região e pronto."

Além da ausência de um treinamento humanizado e focado na assistência aos povos indígenas, a necessidade de mais agentes atuantes na região também é afetada pelo conflito de interesses pessoais.

As forças militares vindas dos governos locais acendem um alerta às lideranças indígenas. Maurício destaca que agentes oriundos das cidades próximas podem ter conexões familiares e outras relações com mineiros atuantes na região.

"Não podemos colocar o exército local ou regional para atuar no território Yanomami. Eles podem facilitar a atividade criminosa e a mineração ilegal. Às vezes é um parente deles que está lá, eles veem isso [a mineração ilegal] como um trabalho. Nós percebemos muito isso."

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