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Viana melhora texto de novo Código Florestal, mas questões centrais continuam inalteradas

ISA - http://www.socioambiental.org
21 de Nov de 2011

Relator da reforma do Código Florestal na Comissão de Meio Ambiente do Senado, Jorge Viana apresentou seu parecer ontem. Votação está marcada para esta quarta. Ainda não há acordo sobre o texto e possibilidade de novos retrocessos não está afastada. Anistia está mantida e APPs sofrem corte.

O senador Jorge Viana (PT-AC) reduziu alguns dos prejuízos já incorporados à reforma do Código Florestal, mas manteve a estrutura do projeto vindo da Câmara dos Deputados.

Ele leu seu relatório sobre a matéria na manhã de ontem (21/11) na CMA (Comissão de Meio Ambiente) do Senado. Ainda não há acordo sobre o texto, mas sua votação na comissão está marcada para esta quarta (23/11), dois dias depois de sua leitura. Os senadores terão menos de 48h para apresentar emendas ao texto.

Não está afastada a possibilidade de novos retrocessos na reforma, como ocorreu na semana passada, quando os ruralistas quebraram um acordo feito com o governo e conquistaram mais concessões sem fazer nenhuma, aumentando a possibilidade de anistias a desmatamentos ilegais.

A bancada ruralista sinalizou que pode voltar a usar a maioria que vem obtendo até agora, com o beneplácito do governo, para ampliar anistias.

"Ainda estou batalhando para que o relatório agrade a maioria da CMA e depois a do plenário", admitiu Jorge Viana. O parecer do relator recebeu elogios de todos os senadores que se manifestaram na sessão da CMA.

Na semana passada, Viana conseguiu um pouco mais de tempo, adiando a apresentação de seu relatório. Acabou prevalecendo, porém, a estratégia ruralista de apressar a tramitação do projeto.

A expectativa no Senado é que a votação dos destaques ao texto de Viana ocorra no máximo até quinta e que ele seja apreciado pelo Plenário antes do final do mês.

Assim, seria possível que retornasse à Câmara e seguisse para sanção presidencial antes de 11 de dezembro, data prevista para que comece a valer o decreto que determina a aplicação de sanções para quem não recuperar APPs (Áreas de Preservação Permanente) desmatadas ou averbar a RL (Reserva Legal) de sua propriedade. A entrada em vigor da norma foi um dos fatores que desencadeou a reforma do Código Florestal (veja box no final da notícia).

Anistia e APPs

Jorge Viana informou que até quarta-feira ainda fará ajustes no texto. Durante a sessão da CMA, foi definido o prazo de até as 18h de hoje (22/11) para a apresentação de emendas.

Atendendo a pressão dos ruralistas, o relator manteve a data de julho de 2008 para concessão de anistia a quem desmatou irregularmente.

Para fins de recuperação, o parecer define em 15 metros os limites de APPs de beira de rios com até dez metros de largura. Para rios maiores, o texto estabelece APPs com pelo menos a metade da largura do curso de água, com no mínimo 30 metros e no máximo 100 metros. Hoje, a legislação prevê APPs de no mínimo 30 metros e no máximo 500 metros.

Para pequenos produtores (com áreas de até quatro módulos fiscais ou 440 hectares até julho de 2008, dependendo do município), a área a ser recomposta nas beiras de rio não poderá exceder a RL. Para os médios produtores (com até 15 módulos fiscais), os Conselhos Estaduais de Meio Ambiente poderão definir a área mínima a ser recuperada, observados os parâmetros mínimos da lei nacional.

Um dos problemas mais graves do relatório diz respeito às nascentes: não há uma regra clara determinando que aquelas que foram desmatadas irregularmente terão de ser recuperadas, nem mesmo parcialmente. Pelo contrário, ao manter a redação básica da Emenda 164 da Câmara (leia mais), o texto dá a entender que elas não devem ser recompostas.

Viana também manteve em seu parecer a possibilidade de recomposição de até 50% da RL das propriedades com espécies exóticas. De acordo com seu parecer, proprietários que tinham várias pequenas propriedades (até os 440 hectares) até julho de 2008, não serão obrigados a recuperar suas RLs, como se fossem pequenos produtores.

"Segundo o relatório, o proprietário que, com uma simples declaração, alegar que a área já havia sido desmatada anteriormente à exigência de uma RL maior (na Amazônia, essa exigência subiu de 50% para 80% do imóvel em 1996), não precisará recuperá-la para os percentuais atuais, ou para nenhum, caso alegue que a área já havia sido desmatada antes de 1934, data do primeiro Código florestal, quando a figura foi instituída", analisa Raul do Valle, coordenador adjunto de Política e Direito Socioambiental do ISA.

Ele avalia que, somando-se esse mecanismo à possibilidade de cômputo da APP no cálculo da RL já incorporada ao texto, pouquíssimos serão os casos de recuperação de RLs irregularmente desmatadas. "Ponto para os ruralistas, cuja demanda central sempre foi acabar com a RL, considerada por eles como uma 'aberração' por impedir o uso agrícola de 100% do imóvel", finaliza.

"[O relatório de Viana] melhorou em relação aos relatórios anteriores, mas ainda tem muita coisa para melhorar. Está sendo mantida a anistia em vários aspectos. Este é o tema mais grave", avaliou Rodolfe Rodrigues (PSOL-AP).

Na quarta, ele proporá emendas, mas avisou que não apresentará um voto em separado, como fez com o parecer de Luiz Henrique (PMDB-SC) na CCJ (Comissão de Constituição e Justiça). Rodrigues é um dos poucos senadores que vem criticando abertamente a reforma do Código Florestal.

Avanços

Entre os avanços promovidos por Viana em seu relatório, as Veredas voltaram a ser APPs e a entrada dos produtores rurais que cometeram desmates ilegais nos PRA (Programas de Regularização Ambiental) foi limitada a no máximo quatro anos. Isso poderá impedir que ela seja prorrogada indefinidamente e, por consequência, que seja concedida anistia ilimitada a esses produtores. No texto do senador Luiz Henrique, enquanto não vencesse esse prazo ninguém poderia ser multado pelos danos ambientais cometidos até 2008.

Jorge Viana aperfeiçoou a definição das hipóteses em que poderá haver novos desmatamentos em APPs. A versão de Luiz Henrique autorizava o plantio de espécies exóticas produtoras de sementes em APPs, como a soja. O substitutivo de Viana resgata a Resolução 369 do Conama (Conselho Nacional do Meio Ambiente) e determina que nessas áreas só será permitido o cultivo de espécies nativas produtoras de sementes.

A polêmica Emenda 164 aprovada na Câmara dos Deputados previa que que qualquer atividade agropecuária poderia ser autorizada em APP, o que, na prática, acabaria com essa figura legal.

Viana estabeleceu ainda que 30% da cobrança feita pelo uso da água e que 1% do faturamento de empresas de abastecimento e de geração de hidroeletricidade sejam usados para a recuperação de APPs. Este é o único incentivo concreto mantido no texto com essa finalidade.

O relatório definiu um prazo de cinco anos para que os produtores que desmataram sua RL depois de 2008 a recuperem. Viana redigiu também um capítulo específico para os pequenos produtores e agricultores familiares. Segundo o relatório, eles terão direito a procedimentos simplificados para autorização de desmatamento, cadastramento rural, licenciamento e registro de RL, por exemplo. Poderão ainda recuperar sua RL com cultivo intercalado entre espécies exóticas e nativas.

O Decreto 6514/2008

Em 2008, o Governo Federal editou o Decreto 6514, que aprovou um novo regulamento para a Lei de Crimes Ambientais. Dentre as novidades, ele finalmente estabeleceu uma penalidade administrativa ao proprietário que se recusasse a averbar sua RL e a recuperar suas APPs. Embora desde 1934 fosse proibido desmatar essas áreas, até então só havia penalidades para o desmatamento em si, mas não havia formas administrativas de coagir o desmatador a recuperar a área, que, assim, passava a lucrar com o seu uso irregular. Era necessário ir à Justiça para tanto.

A edição do decreto trouxe imensa insatisfação ao setor agropecuário, que contava com a leniência do Poder Público para manter a situação. Em função do Decreto, os ruralistas passaram a pressionar por uma mudança na lei que deixasse claro que os desmatamentos ilegais não precisariam ser recuperados. Como resultado dessa pressão, o projeto aprovado na Câmara dos Deputados, e agora em fase final de votação no Senado Federal, estabelece a data de 2008 como referência para a anistia, ou seja, para a dispensa de recuperação, na íntegra, das áreas desmatadas.

A bancada ruralista vem usando o prazo de 11 de dezembro - quando entra em vigor o decreto, após duas prorrogações - como justificativa para apressar a tramitação da reforma do Código Florestal. No entanto, é impossível que até junho de 2012 qualquer produtor seja multado já que, pelo Decreto, o proprietário terá 180 dias, a partir da autuação, para assinar um termo de compromisso de recuperação. Se até lá a lei mudar, o termo será assinado com base na nova lei. A pressa, portanto, não se justifica.

http://www.socioambiental.org/noticias/nsa/detalhe?id=3459

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