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Vazio no comando do clima

O Globo, Ciência, p. 36
19 de Fev de 2010

Vazio no comando do clima
Substituto de De Boer na ONU terá desafio de costurar acordo contra aquecimento

Carlos Albuquerque

Procura-se um político habilidoso, paciente e obstinado para ajudar a costurar, em alguns meses, um dos maiores acordos da história da Humanidade.

Os currículos devem ser enviados à sede da ONU, onde, desde ontem, encontra-se em aberto o cargo de secretário-executivo da Convenção da ONU sobre o Clima. O sucesso da missão que terá pela frente, no entanto, é incerto.

Num gesto interpretado como político, o holandês Yvo de Boer, há quatro anos no cargo, anunciou a sua renúncia, frustrado pelo fracasso das negociações na Conferência do Clima da ONU, em dezembro, em Copenhague.
Comunicado cita desapontamento
De Boer - que vai atuar como consultor na iniciativa privada - deixará o cargo, oficialmente, no primeiro dia de julho, a poucos meses da próxima reunião climática da ONU, a COP-16, que acontecerá em novembro, em Cancun, no México.

Na ocasião, será feita uma nova tentativa de unificar as divergentes posições dos maiores poluentes do planeta- China e Estados Unidos à frente - para que o mundo consiga, enfim, chegar a um novo acordo para suceder o Protocolo de Kioto, que expira em 2012.

- É difícil imaginar que a saída dele não tenha nada a ver com a frustração que todos sentimos pelos fracos resultados de Copenhague - afirma Carlos Nobre, pesquisador do Inpe e integrante do Painel Intergovernamental para Mudanças Climáticas da ONU (IPCC). - Me parece que seu gesto é uma afirmação política, indicando que talvez se deva buscar um presidente com outra abordagem, capaz de levar a um acordo no México Apesar da enorme expectativa pela presença de 110 chefes de Estado e governo - entre os quais Barack Obama, dos EUA, e Wen Jiabao, da China -, o que Copenhague produziu foi apenas um acordo político fraco, sem valor legal, para a redução das emissões de CO2. A COP-15 também falhou em apresentar formas de financiamento através das quais as nações ricas - maiores responsáveis pelo aquecimento global - ajudariam as mais pobres a se adaptarem a um mundo mais quente.

No comunicado em que anunciou a renúncia, De Boer assume seu "desapontamento" com a falta de um acordo em Copenhague, mas destaca também que a COP-15 revelou "um comprometimento político geral de combate às emissões de CO2, que dá uma direção para as futuras negociações".

De fato, apesar do fracasso da conferência, 55 países - entre eles, EUA e emergentes como Brasil, China e Índia - confirmaram, junto à ONU os seus compromissos com o chamado Acordo de Copenhague.

Assinado no final do encontro, o documento estabelece metas não-obrigatórias para a redução dos gases que contribuem para o aquecimento global.

- É estranho ele não ter renunciado logo após o fim da conferência, o que seria até normal - diz José Eli da Veiga, professor da USP e especialista em desenvolvimento sustentável. - A impressão é que ele sentiu que as perspectivas para o México não eram das melhores, o que é um péssimo sinal.

Em recente entrevista ao GLOBO, na qual avaliou os acertos e os erros de Copenhague, De Boer - que passou esses quatro anos visitando diversos países, preparando o terreno para um acordo - disse que não arriscaria a apostar num entendimento no encontro sobre clima, no México. "Só aposto quando acho que vou ganhar", afirmou.

- Na verdade, já estão sendo tomadas medidas para que o alerta dado por De Boer não seja em vão - garante o ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc. - Na recente reunião de ministros do Meio Ambiente do grupo chamado Basic (Brasil, África do Sul, Índia e China), em Nova Délhi, acertamos uma reunião com o presidente e o ministro do Meio Ambiente do México, para evitarmos que ocorra a mesma falta de comando que aconteceu com o governo da Dinamarca durante a COP-15.

O Globo, 19/02/2010, Ciência, p. 36

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