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Um novo pacto com a sociedade

FSP, Tendências/Debates, p. A3
Autor: KLABIN, Roberto
26 de Mai de 2006

Um novo pacto com a sociedade

Roberto Klabin

Manifesto SOS Mata Atlântica:
"Acreditamos... Que a responsabilidade da preservação é de toda a sociedade, com ações praticadas no seu dia-a-dia (...) Nosso compromisso: (...) A contribuição da SOS Mata Atlântica é alertar, informar, educar, mobilizar e capacitar para o exercício da cidadania, catalisando as melhores práticas, os conhecimentos e as alianças."
(Trecho do livro "A Mata Atlântica É Aqui. E Daí?")

EM DUAS décadas de luta e realizações pela conservação da mata atlântica, entendeu-se chegada a hora de se fazer um novo pacto com a sociedade. Expresso neste manifesto, esse novo acordo tem como proposta mostrar que o que há para ser defendido (a natureza) não está lá distante, na mata, em uma visão romântica, entre as estradas, depois dos rios, das cachoeiras e das trilhas a serem percorridas nos finais de semana. A mata atlântica é aqui. E neste local onde trabalhamos, nos divertimos, nos relacionamos com o mundo em que vivemos é que preservamos ou destruímos a fauna, a flora, todo o ecossistema.
Desde 1986 -quando nasceu a SOS Mata Atlântica- até agora, adotamos a bandeira "Estão tirando o verde da nossa Terra", alerta enriquecido por essa nova perspectiva, mas que permanece mais do que atual: da vegetação original da mata atlântica, que ocupava uma área de 1,3 milhão de km2, restam apenas 7%, o que a coloca na posição de um dos conjuntos de ecossistemas mais ameaçados do mundo. Não tenho dúvida de que nossa inspiração inicial era totalmente correta. O que propomos é aprofundá-la ainda mais, a partir do que já se prenunciava em nossa luta pela preservação do "verde da nossa Terra". Refiro-me à associação natural de ideais da preservação aos valores da sustentabilidade, conceito que surgiria no fim da década de 80 do século 20 como resultado do êxito do movimento conservacionista de então. É, pois, na linha de continuidade de nossas ações que trazemos o tema da preservação para o dia-a-dia das pessoas. Com a nova perspectiva de defesa da vida no cotidiano, a luta pela preservação da mata atlântica torna-se sinônimo de adesão aos valores da sustentabilidade, nela incluída a sua dimensão social, que é a defesa da qualidade de vida dos 110 milhões de pessoas que dependem de seus serviços ambientais, como o abastecimento de água -uma das grandes questões que teremos de enfrentar. O novo pacto veio para assinalar que, na visão da sustentabilidade, já não se pode dissociar o local do global -o que significa dizer que as atividades em prol da conservação da mata atlântica já não se dissociam da agenda mundial. Desde então, sustentabilidade, mudanças climáticas e biodiversidade deixaram de ser palavras de ordem de uso exclusivo do movimento ambientalista para incorporar-se a toda a sociedade -do cotidiano das pessoas às políticas públicas e ao mundo dos negócios. Esse é o significado pleno da expressão "A Mata Atlântica é aqui" -"aqui" onde estivermos, já que a interdependência recíproca dos desafios ambientais vincula num único compromisso o de todos os dias e de todas as horas a responsabilidade e o ideal da sustentabilidade em escala local e planetária. Para nós (inicialmente um grupo pequeno de pessoas, que, no final da década de 70, criava a Oikos - União dos Defensores da Terra, nome que fazia alusão ao planeta, à nossa casa), a proposta do novo pacto é também um retorno ao ponto de partida, depois de duas décadas de atuação bem-sucedida. Do propósito inicial de lutar pela proteção dos remanescentes florestais da mata atlântica, o leque de atuação da entidade abriu-se para a restauração de muitas áreas com plantio de espécies nativas, para o monitoramento da qualidade da água e para a educação ambiental. Lançamos o "Atlas da Mata Atlântica", em parceria com o Inpe. Graças à parceria com o Bradesco, cerca de 14 milhões de mudas de árvores nativas já foram doadas para o programa Clickarvore até março/2006. Criamos o Núcleo União Pró-Tietê. Estabelecemos parceria com a Conservação Internacional, criando a Aliança para a Conservação da Mata Atlântica. O Projeto de Lei da Mata Atlântica (no 3.285/92) foi aprovado pelo Senado e está em via de ser votado na Câmara. Essa pendência faz com que a comemoração não seja maior. Mas continuamos com a mobilização permanente realizada nos últimos 13 anos. O bioma é patrimônio nacional, e a lei é garantia jurídica imprescindível. Nesse contexto, propomos um pacto que nos relembre todos os dias a nossa condição de seres da natureza, do desafio da convivência harmônica, e, principalmente, da responsabilidade que nos cabe a todos: a sustentabilidade da sociedade e da vida depende de cada um, todos os dias.

ROBERTO KLABIN , 50, empresário e administrador, é o presidente da Fundação SOS Mata Atlântica.

FSP, 26/05/2006, Tendências/Debates, p. A3

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