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A última fronteira

OESP, Novo Mapa do Brasil, p. H1-H14
02 de Out de 2005

A última fronteira
Durante muito tempo uma parte esquecida do Brasil, a Região Norte cresce com novos investimentos e enfrenta o desafio do desenvolvimento sustentado

O ambiente econômico tem sido, nos últimos anos, palco de uma das mais marcantes transformações já vividas em toda a história do Brasil. Ao largo da crise política que atinge Brasília, existe um País que trabalha, produz, gera riqueza e prospera. Enquanto uma nova cultura de prestação de serviços se fortalece nos grandes centros, muitas cidades, principalmente médias e pequenas, espalhadas pelas diferentes regiões macroeconômicas, manifestam vocações industriais insuspeitadas até bem pouco tempo atrás - e não apenas no entorno do bilionário agronegócio. Nota-se, portanto, que um novo mapa econômico está sendo desenhado no Brasil e ele será mostrado - região por região - numa série de cadernos especiais que o Estado publica a partir desta edição. O objetivo é dar aos leitores uma visão das mudanças na economia que estão ocorrendo de Norte a Sul do País graças, sobretudo, à ação da iniciativa privada.
A primeira a ser retratada é a Região Norte. A maior e menos povoada extensão do território brasileiro vive um momento de transformações intensas. A Zona Franca de Manaus, hoje menos estigmatizada, consolida seu pólo industrial que, entre empregos diretos e indiretos, envolve 500 mil pessoas. No ano passado, as empresas locais faturaram US$ 13,5 bilhões - valor que deve ser superado com folga até o final deste ano. Ao mesmo tempo, na mesma região Norte, estão em curso investimentos bilionários na área de mineração - só a Companhia Vale do Rio Doce programa aplicar cerca de R$ 24 bilhões na região até 2010.
Há, evidentemente, muitas mazelas a serem enfrentadas. A infra-estrutura é precária em diversos pontos - no caso do Norte, então, as carências assumem dimensões gigantescas principalmente nos sistemas de energia e transporte. E o crescimento econômico acelerado tem levado à criação de bolsões de pobreza, exigindo uma atenção especial à questão social. Da mesma forma, o problema ambiental continua sério. A despeito da queda recente no ritmo, o contínuo desmatamento da floresta e as queimadas despertam indignação e condenação da opinião pública mundial. A boa notícia é que aumenta o número de investidores e empresários dispostos a romper com essas práticas predatórias e a adequar seus projetos e empreendimento às normas do desenvolvimento sustentado. Graças a isso, a biodiversidade amazônica começa a ser explorada de forma racional e legal, sobretudo nas áreas de farmácia e cosmética.

Conheça o mapa dos investimentos
A mais extensa e menos povoada das regiões brasileiras aprende a transformar seus recursos naturais em riqueza
Ricardo Galuppo
Quem quiser localizar as raízes do momento promissor vivido pela Região Norte nos últimos anos deve, em primeiro lugar, ignorar quase tudo o que se afirmava sobre a economia amazônica cerca de 15 ou 20 anos atrás. Dizia-se, por exemplo, que a indústria de Manaus desabaria como um castelo de cartas diante do primeiro sopro de abertura comercial. O que se viu a partir da segunda metade dos anos 90 foi exatamente o contrário. Passado o susto inicial, as empresas da Zona Franca tornaram-se mais fortes e competitivas do que nos tempos da reserva de mercado.
Os defensores do modelo de Manaus, concebido há quase 40 anos, estavam errados. Mas os críticos - que consideravam absurda a idéia de um enclave industrial movido a subsídios no coração da floresta - também se equivocaram. Na economia globalizada do século 21, quando produtos chineses e coreanos estão em todas as esquinas, descobriu-se que Manaus não fica tão distante assim dos centros consumidores do País e do resto do mundo . Quanto aos subsídios, bem... A indústria de Manaus responde por 64,5% de todos os impostos recolhidos pelo governo federal na região.
Um outro detalhe: a Zona Franca gerou um benefício que jamais esteve entre as intenções de seus idealizadores. Eles sonhavam com uma indústria que servisse de trampolim para a ocupação da floresta. Aconteceu o contrário. "O pólo industrial tem sido importante para que possamos evitar o desmatamento no interior", diz o governador do Amazonas, Eduardo Braga. Entre empregos diretos e indiretos, informa Braga, 500 mil pessoas trabalham em torno da indústria de Manaus. Em 2004, as empresas locais faturaram cerca de US$ 13,5 bilhões - valor que deve ser superado com folga até o final deste ano.
Bons exemplos como esse estão por toda parte e alguns foram destacados no mapa acima. Ele diz respeito não só às experiências mais modernas - relacionadas com a biodiversidade ou com o manejo sustentável da floresta -, mas até mesmo às atividades mais tradicionais.
Novos projetos de mineração começam a funcionar conforme rigorosas exigências ambientais. Técnicas modernas de cultivo mostram que o destino das áreas degradadas não precisa ser, obrigatoriamente, o de se tornar desertos.
"Áreas já desmatadas podem ser usadas para a agricultura, desde que os responsáveis pela exploração assumam o compromisso de preservar partes da floresta", diz o governador do Pará, Simão Jatene. A floresta ainda sofre a ameaça da exploração irresponsável. Mas chega a ser um alívio saber que a preservação passou a ser vista com outros olhos. Está deixando de ser uma causa apenas ecológica para tornar-se uma bandeira econômica da mais alta relevância.

Crescimento acelerado convive com bolsões de pobreza
Com 13,7 milhões de habitantes (6% da população do País) o PIB do Norte representa 5% da economia brasileira. Mesmo tendo registrado taxas de crescimento superiores à média nacional nos últimos anos, é preciso muito fôlego para encurtar a distância que afasta Manaus de outras localidades. Há muitos bolsões de pobreza e, em alguns pontos, as taxas do Índice de Desenvolvimento Humano são parecidas com as de rincões africanos. A renda per capita da Região equivale a 65% da média nacional.
De onde tirar o oxigênio? A resposta talvez esteja diante do nariz de todos e não deixa de ser mais uma forma de contrariar o que foi dito a respeito da Amazônia. No passado, era comum olhar para a floresta como a barreira que impedia o desenvolvimento. Com a desculpa de transpô-la, era aceitável passar a motosserra em toda árvore que surgisse pela frente .
A floresta ainda está ameaçada, mas aquela visão míope, felizmente, vai sendo superada. Sabe-se hoje em dia que a mata vale muito mais em pé do que abatida e que a exploração racional de seus recursos gera fontes de renda mais sólidas do que o lucro fugaz obtido com a devastação. No rastro das exigências do Protocolo de Kyoto, empresas do mundo inteiro estão dispostas a pagar caro para preservar áreas da Amazônia em troca do direito de lançar gás carbônico na atmosfera. É o chamado "Crédito de Carbono", que já está sendo negociado. Em outras palavras: tem gente interessada em pagar caro para manter as árvores intactas.

A decolagem da Zona Franca
Às vésperas de completar 40 anos, o Pólo Industrial de Manaus vive seu melhor momento e puxa o crescimento da região
João Paulo Nucci
No início dos anos 90, penalizada pela abertura do País às importações, a Zona Franca foi dada como praticamente morta. A invasão de produtos estrangeiros provocou a maior crise desde sua criação, em 1967, levando ao fechamento de linhas de produção e ao desemprego em massa. Em 1993, a mão-de-obra empregada em suas fábricas havia se reduzido a 37 mil trabalhadores, menos da metade da existente três anos antes.
Pouco mais de uma década depois, o quadro mudou. Superada a depressão e contra todas as previsões, o pólo produtivo da capital amazonense amadureceu e se consolidou, exibindo os números mais exuberantes dos seus 38 anos de vida. Expresso nos resultados dos últimos anos, esse movimento parece longe de se interromper - na verdade, a produção no Pólo Industrial de Manaus vem aumentando há 11 trimestres consecutivos desde o início de 2003. Puxado pela Zona Franca, o Amazonas tem a indústria de melhor desempenho no País: no primeiro semestre deste ano, foram 20,2% de crescimento, quatro vezes acima da média nacional.
Tamanho vigor, naturalmente, resulta em mais oportunidades de trabalho. Em algum momento da virada de 2005 para 2006, o marco histórico de 100 mil empregos diretos será atingido. Esse contingente representará o dobro do empregado há apenas quatro anos. A geração de novos postos de trabalho também é conseqüência da aceleração do ritmo de investimentos, que nunca foi tão intenso como agora. Entre janeiro e agosto deste ano, foram aprovados 222 novos projetos, no valor de US$ 3,4 bilhões - o que inclui desde a implantação de fábricas novas, construídas a partir do zero, até modificações e modernizações nas linhas já existentes.
Com isso, a receita total das mais de 450 empresas instaladas na Zona Franca deverá chegar a US$ 15 bilhões, 50% acima do registrado em 2002. "Tudo isso mostra que a Zona Franca é um modelo que deu certo, gerando e distribuindo riqueza, sob a forma de empregos e impostos", afirma Flávia Skrobot Grosso, primeira mulher no cargo de superintendente da Suframa. Flávia tem sob sua jurisdição uma área de 2,3 milhões de quilômetros quadrados, que inclui os Estados do Amazonas, Acre, Amapá, Rondônia e Roraima, equivalente a quatro vezes o território da França.
Números tão favoráveis contribuem para reduzir o volume das críticas à Zona Franca, vista até recentemente como um sorvedouro de dinheiro público, via incentivos fiscais, e uma espécie de maquiadora no estilo mexicano, pouco criadora de valor. "Hoje temos um verdadeiro pólo industrial, com infra-estrutura e fornecedores", afirma o empresário Eugênio Staub, presidente da Gradiente, que instalou sua primeira fábrica em Manaus em 1973. Essa mudança de humores permitiu que a Emenda Constitucional que prorrogou por mais dez anos o modelo de incentivos, votada pelo Senado Federal, em 2003, fosse aprovada folgadamente, por 55 votos contra 1. "Reconheço meu caipirismo paulista", diz Paulo Saab, presidente da Associação Nacional de Fabricantes de Produtos Eletroeletrônicos (Eletros) e antigo crítico do modelo. "Aquela Zona Franca não existe mais."
CONCENTRAÇÃO
Responsável por dois terços de tudo o que o governo federal arrecada na Região Norte, a Zona Franca de Manaus concentra toda a produção brasileira de televisores (8,7 milhões de unidades em 2004), motocicletas (1 milhão) e relógios (4,8 milhões), e a maioria absoluta da de disquetes (45 milhões), CDs (235 milhões), tocadores de DVDs (3,5 milhões), celulares (25 milhões), telefones fixos (2,6 milhões) e bicicletas (1,1 milhão), entre outros. Tudo isso alcançado com altos índices de produtividade. Na Honda, a líder do mercado nacional de motocicletas, por exemplo, a montagem de uma unidade leva exatos 22 segundos. Na mesma direção, a Nokia de Manaus orgulha-se de praticar níveis de produtividade em sua linha de celulares idênticos ou até melhores do que os das outras 15 fábricas do grupo finlandês espalhadas pelo mundo. A vizinha e concorrente Siemens, por seu turno, investiu US$ 110 milhões na construção de um Centro de Pesquisa e Desenvolvimento da tecnologia e do software empregados em seus telefones.
A influência do pólo de Manaus - costumeiramente vista como um enclave isolado no meio da selva - ultrapassa as fronteiras amazônicas. "A Zona Franca é uma grande consumidora de serviços e componentes com origem em outras regiões do Brasil, inclusive do Sudeste", diz o economista Aristides da Rocha Oliveira Júnior, assessor da direção da Suframa. Alguns desses fornecedores acabam se rendendo à atração do Pólo Industrial e decidem ir ao encontro da clientela, em Manaus. É o caso da catarinense Weg, de Jaraguá do Sul, que está prestes a inaugurar uma fábrica de motores para aparelhos de ar-condicionado na Zona Franca. "A cidade está virando um cluster do setor", diz o empresário Décio da Silva, presidente da Weg. "Não havia como deixar de ir para Manaus." Segundo ele, o investimento inicial na fábrica é de R$ 25 milhões para uma produção anual estimada em 1 milhão de motores.

A China pode estragar a festa da indústria
Gigante asiático provoca perdas de US$ 412 milhões por ano e corta 4 mil empregos
Os chineses desembarcaram em Manaus, para o bem e para o mal. Na pele de investidores, geram empregos, trazem tecnologia e contribuem para a diversidade do Pólo Industrial. É o caso da fabricante de aparelhos de ar-condicionado Gree, que desembarcou em 2001 com um investimento de US$ 20 milhões. A empresa produz atualmente 200 mil unidades por ano e só faz crescer desde que chegou.
Já na pele de competidores, as compatriotas da Gree representam a principal ameaça à Zona Franca. Um estudo da Suframa mostra que a importação e o contrabando de aparelhos de som, rádios automotivos, câmeras de vídeo, aparelhos de ar-condicionado e tocadores de DVDs produzidos pelo gigante asiático deverão subtrair cerca de US$ 412 milhões do faturamento das empresas instaladas no pólo em 2005. Em termos de empregos, calcula-se que 4 mil vagas deixariam de ser criadas. A ameaça chinesa levou o Centro da Indústria do Estado do Amazonas (Ciam) a reivindicar medidas de proteção do governo federal, como o estabelecimento de cotas de importação para os produtos chineses.
O estudo é sombrio ao prever o futuro, afirmando que, à exceção dos aparelhos celulares, os fabricantes nacionais não têm condições de enfrentar os concorrentes asiáticos nos demais produtos. A mão-de-obra baratíssima, os incentivos oficiais às exportações e o câmbio mantido em patamares artificiais pelo governo chinês são apontados como exemplo de concorrência desleal. Segundo o estudo, uma câmera de vídeo fabricada em Manaus chega ao mercado consumidor brasileiro por US$ 540, enquanto a importada sai por US$ 81.
Para fazer frente à ameaça dos produtos chineses e de outros eventuais competidores globais, a Suframa resolveu deslanchar um programa de internacionalização da Zona Franca. O primeiro passo foi a construção do Centro Logístico Avançado de Distribuição (Clad) na Flórida, nos Estados Unidos, inaugurado em 2003. O Clad deverá servir de base para que os produtos saídos das fábricas de Manaus atinjam os mercados desenvolvidos do Hemisfério Norte.
As empresas do pólo são incentivadas a participar de feiras no exterior, ao mesmo tempo que, a cada dois anos, é realizada a Feira Internacional da Amazônia. Os resultados desse trabalho já apareceram. As exportações das empresas da Zona Franca aumentaram de US$ 851 milhões em 2001 para US$ 1,15 bilhão em 2004. Nos primeiros seis meses de 2005, praticamente igualaram a marca do ano passado, chegando a US$ 1 bilhão. "Nosso limite é o mundo", afirma Flávia Skrobot Grosso, superintendente da Suframa.

No interior, atraso econômico ainda é regra
Com um olho, Manaus vislumbra o acesso ao mercado global. Com o outro, planeja a interiorização do desenvolvimento. A concentração da atividade industrial na capital relegou o restante do Estado ao extrativismo pouco organizado. Com exceção dos pontos onde a Petrobrás já atua, como o município de Coari, o atraso econômico é regra. "A Zona Franca esvaziou o interior", reconhece o governador do Amazonas, Eduardo Braga. "É preciso valorizar alternativas como a cultura da juta e da malva, a pecuária de várzea, a piscicultura, o guaraná."
Inspirado no exemplo do Pólo Industrial, o governo reduziu o ICMS dos produtos extraídos da selva - desde que em conformidade com as leis ambientais. A idéia é incentivar e organizar comunidades produtivas nos rincões. O programa, batizado de Zona Franca Verde, propõe que as políticas preservacionistas sejam acompanhadas de uma lógica econômica. "Ninguém desmata por irracionalidade. O caboclo recorre à selva para sobreviver", diz Virgilio Viana, secretário do Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável do Amazonas e idealizador do projeto.
Um lugar onde o programa avançou é o município de Maués, a 20 horas de barco da capital, "adotado" pela AmBev. Desde 2001, a cervejaria vem prestando assistência e treinamento aos produtores locais de guaraná, além de garantir a compra da safra pelo dobro do valor de mercado.
Animada pelos bons resultados, a AmBev decidiu investir R$ 61 milhões em Maués até 2013. Esse dinheiro ajudará a criar alternativas para os habitantes da cidade, cuja economia ainda depende do guaraná. A AmBev doou máquinas para uma cooperativa de costureiras, financiou casas populares e estimulou outras culturas, como a criação de abelhas, peixes e ovinos.

Em busca do tesouro escondido
Depois de correr o risco de não sair do papel, o Centro de Biotecnologia da Amazônia começa a seguir o mapa da natureza
João Paulo Nucci
MANAUS - O ciclo da borracha, o mais vigoroso da história econômica da Região Norte, teve origem na biodiversidade da floresta amazônica. Repetir a saga da Hevea brasiliensis, a popular seringueira, que no início do século 20 levou Manaus a um surto de prosperidade, é o objetivo de empresários e pesquisadores. A selva é um manancial de riquezas escondidas cujo potencial, para ser aproveitado, exige muita pesquisa e tecnologia. "Não conhecemos o nosso mundo. A biodiversidade é algo difuso como um ser invertebrado gasoso no vácuo", diz o coordenador do Centro de Biotecnologia da Amazônia (CBA), Imar César de Araújo. "O que tem valor é o conhecimento, não a floresta em si."
À frente do CBA, que entrou em operação no ano passado após sete anos de percalços, Araújo tem a responsabilidade de comandar uma equipe que contará em breve com 120 pesquisadores dedicados em tempo integral a dar sentido comercial ao vasto cartel de substâncias naturais oferecido pela selva. A equipe foi recrutada nas universidades e instituições científicas de diversos pontos do País. O trabalho que os aguarda não é pequeno. Os pesquisadores terão a incumbência de investigar as 20 mil espécies que só existem na Amazônia, conhecidas como endêmicas. Estima-se que 5 mil moléculas com princípios ativos - ou seja, substâncias com efeito medicinal ou cosmético - estejam disponíveis nesse conjunto. As possibilidades econômicas são enormes. Cálculos feitos há alguns anos pelo biólogo Moacir Bueno Arruda, do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente (Ibama), apontavam um potencial de até US$ 2 trilhões. Só a indústria farmacêutica - consumidora potencial desse tipo de substância - movimenta US$ 200 bilhões por ano.
FUTURO
A intenção do CBA é fazer o meio-de-campo entre o conhecimento científico, produzido pelas universidades e por entidades como o Instituto Nacional de Pesquisa da Amazônia (Inpa), e as empresas interessadas. "A Zona Franca do futuro vai nascer no CBA", diz a superintendente da Suframa, Flávia Skrobot Grosso.
A autarquia é a principal financiadora do Centro, instalado num edifício de arquitetura arrojada no coração do distrito industrial. A obra estava ganhando a fama de elefante branco quando a Suframa resolveu, há dois anos, assumir sozinha os custos de um projeto que se arrastava.
O pior momento foi em 2002, quando a Bioamazônia, organização montada para gerir o projeto, fechou acordo de pesquisa com a suíça Novartis. Recebeu uma carga pesada de críticas e terminou extinta.

O difícil é comprovar que o medicamento funciona
EFICIÊNCIA: Agora que já existe algum movimento nos 24 laboratórios do CBA, cresce a chance de se confirmar a eficiência terapêutica de plantas utilizadas como remédio pelos nativos há séculos. "O folclore serve de referência para as pesquisas", afirma o farmacêutico Evandro de Araújo da Silva, dono da Pronatus, uma empresa de cosméticos de Manaus que explora a flora local na composição de seus produtos. "O complicado é comprovar cientificamente o que a cultura popular consagrou." O mulateiro, uma árvore encontrada nas várzeas amazônicas, serve de exemplo: sabe-se que o extrato de sua casca tem fama de enrijecer e clarear a pele. Evandro desenvolveu então um hidratante a partir da substância, e agora quer começar a vendê-lo como um creme anti-rugas. Para receber autorização, precisa provar ao Ministério da Saúde que o mulateiro estica a cútis. Os testes, agora, poderão ser feitos em Manaus. No caso dos remédios, o caminho é ainda mais longo. "Cada medicamento representa até US$ 1 bilhão em investimentos", diz Daniel do Amaral, dono da Magama, fabricante de extratos vegetais. Amaral aponta uma outra dificuldade: muitos dos cosméticos que utilizam o nome Amazônia contêm, na verdade, quantidades irrisórias de produtos naturais em suas fórmulas. Esse tipo de prática teria frustrado a tentativa de estabelecimento de um pólo do setor na cidade.

Madeira com certificado de origem
João Mauricio Rosa
Uma placa comunica a proibição de visitas sem autorização à fábrica da Aver Amazônia, instalada em dois galpões do Pólo de Indústrias Florestais de Xapuri. A restrição faz sentido. Ali dentro são produzidas peças em madeira com design exclusivo. São vasos, biombos, mesas e revisteiras com a marca da designer paulista Etel Carmona, sócia da Aver.
Os móveis são fabricados por 16 jovens marceneiros com madeiras como cedro, ipê, tauari e timbaúba. Elas recebem a certificação de origem do Forest Stewardship Council (FSC), ONG que autentica a atividade madeireira não predatória.
O selo, além da assinatura de Etel, torna as peças da Aver valiosas como jóias raras . "Todas saem daqui vendidas", diz o oficial marceneiro Francisco Evangelista Bezerra, de 28 anos, um dos jovens que tiveram seu destino mudado graças à idéia de Etel de instalar a fábrica em Xapuri. Cada um ganha três salários mínimos por mês.

Ferro para abastecer o mundo
Até 2010, a Vale do Rio Doce deverá gerar 4 mil empregos diretos no Pará. Atrás deles virão 9 mil postos indiretos
Nely Caixeta
CARAJÁS - Depois de deixar Brasília e voar por mais de duas horas sobre pastagens secas, campos queimados e trechos de floresta com sinais de desmatamento, o avião faz uma curva enquanto se prepara para pousar no pequeno aeroporto de Serra dos Carajás, no sudeste do Pará. Espalhada por 396 mil hectares da Floresta Nacional de Carajás, ali está a mais rica província mineral do planeta. Com recursos geológicos estimados em 17 bilhões de toneladas, Carajás contém ferro suficiente para abastecer o mundo nos próximos 190 anos.
A demanda da China por minério de ferro, aço ou qualquer outro insumo essencial, nos últimos quatro anos, mereceu da Companhia Vale do Rio Doce uma resposta imediata. Nos últimos três anos, a Vale investiu R$ 18,3 bilhões em todo o País. Desse total, R$ 4,6 bilhões foram aplicados no Pará. Neste ano, o investimento previsto até dezembro é o maior da história da mineradora - um total de R$ 10,8 bilhões. Aproximadamente 80% desses recursos serão destinados à implantação de novos projetos, pesquisa e desenvolvimento, boa parte dos quais (R$ 3,4 bilhões) no Pará.
Passadas duas décadas desde o início das operações em Carajás, a Vale recorre às reservas da região para consolidar sua posição de terceira maior empresa de mineração do mundo, com um valor de mercado de US$ 40 bilhões, cotado em Nova York. Para manter essa posição, a ordem é diversificar a produção de minérios no Pará. Se no início era o ferro e o manganês, agora é a vez do cobre, da bauxita e do níquel.
O símbolo dessa nova fase é a mina de Sossego, inaugurada há um ano em Canaã dos Carajás, a 90 quilômetros das serras onde se localizam as quatro minas do minério de ferro. Descoberta em 1997, Sossego foi implantada em tempo recorde. Apenas dois anos separam o início dos trabalhos e o primeiro embarque do minério, em 2004.
Com reservas comprovadas da ordem de 245 milhões de toneladas, Sossego foi o primeiro dos cinco depósitos de cobre programados para operar no sudeste do Pará até 2010. A descoberta dessas jazidas é estratégica também para as contas externas do País. A expectativa é de que as 650 mil toneladas anuais de minério a serem lavradas na região, até o final da década, tornem o Brasil auto-suficiente na produção de cobre.
RINCÃO ESQUECIDO
Na companhia, causa preocupação a demora dos órgãos ambientais em conceder as licenças necessárias para iniciar a lavra das novas minas. O projeto 118, uma expansão da mina de cobre de Sossego, é um dos três investimentos, no valor de US$ 2,4 bilhões, à espera da licença prévia do Ibama.
Até o início das operações nas minas de ferro de Carajás, em meados da década de 80, o sudeste do Pará era um daqueles rincões esquecidos do Brasil que sobreviviam da pecuária extensiva, da exploração da floresta e do garimpo de ouro - Serra Pelada fica a apenas 80 quilômetros de Carajás. Diante das necessidades locais, é fácil imaginar o impacto que os investimentos bilionários da Vale do Rio Doce vêm provocando sobre a economia da região.
Tanto Parauapebas, uma cidade de 100 mil habitantes fincada nos pés da Serra de Carajás, como na vizinha Canaã, de 18 mil habitantes, localizada nas proximidades da mina de Sossego, apresentam todas aquelas cenas típicas de localidades que atravessam um surto de crescimento acelerado. A presença da Vale movimentou o mercado de trabalho, trouxe novo ânimo para o comércio local, multiplicou o número de pousadas e pequenos hotéis e fez aumentar a arrecadação de impostos e a geração de renda. Se essa efervescência da economia é um sinal animador, por outro lado atraiu para as duas cidades levas de imigrantes sem formação profissional, que desembarcam na esperança de encontrar emprego ou de fazer um bom dinheiro em pouco tempo.
Empregos existem. Mas, como em qualquer lugar, só para quem tem experiência nas áreas demandadas pelo futuro empregador. "Recebemos cerca de 3 mil solicitações de emprego por semestre", diz Aldo Lima, consultor de Recursos Humanos da Vale do Rio Doce em Carajás. "Dessas, só aproveitamos 100. Para nós é um desafio manter as minas numa região tão isolada", afirma. Para formar mão-de-obra de nível superior voltada para as atividades de mineração, a empresa investiu R$ 6 milhões na criação, em parceria com a Universidade Federal do Pará, de cursos de geologia, engenharia de minas e meio ambiente e engenharia de materiais no campus de Marabá. "Queremos formar um pulmão de pessoas preparadas nesta região."
Para minimizar a escassez de mão-de-obra de nível técnico, a Vale do Rio Doce também investe na criação de centros de formação profissional em Canaã dos Carajás e em Parauapebas. A demanda por funcionários de nível técnico é crescente. E não parte só da Vale. Na região de Carajás existem cerca de 150 empresas de serviços de limpeza, hotelaria, construção civil e outros setores.
As vagas mais cobiçadas, no entanto, são as oferecidas pela Vale. A maranhense Sinara Gomes, de 23 anos, é uma entre os 1,2 mil jovens aprendizes contratados pela empresa desde 2001. A pequenina Sinara faz parte do grupo de 16 mulheres que operam caminhões fora de estrada na mina de cobre de Sossego. É uma máquina enorme, com capacidade para transportar em uma só viagem uma carga equivalente à de oito jamantas. "A primeira vez que subi no caminhão, me assustei um pouco, mas logo me acostumei", diz Sinara, que recebe cerca de R$ 1,8 mil por mês. "Agora, quero fazer faculdade e progredir."
Até 2010, a Vale terá de recrutar um total de 4 mil funcionários diretos no Pará. No mesmo período, estima-se que sejam criados outros 9 mil empregos indiretos.

A capital do cobre precisa de mais moradias
Canaã de Carajás não consegue atender à demanda gerada por quem segue as pegadas dos investimentos bilionários
Antes de iniciar a operação da mina de cobre em Sossego, no ano passado, a Companhia Vale do Rio Doce contratou uma empresa de consultoria de São Paulo para fazer um diagnóstico socioeconômico de Canaã de Carajás, a cidade vizinha ao empreendimento, a 835 quilômetros de Belém. A intenção era conhecer as necessidades da cidade para evitar o modelo de ocupação urbana seguido nos anos 80, quando a Vale se instalou na Serra dos Carajás. Na época, sem nenhuma cidade próxima para lhe servir de apoio, a direção da Vale do Rio Doce criou um núcleo urbano no alto da serra, nos moldes de um condomínio fechado. "Hoje, nossa visão é o oposto disso", diz Jareston Nunes, responsável pelos projetos sociais da Vale. "Nosso esforço é para integrar a empresa à comunidade."
Tomada essa decisão, a Vale do Rio Doce iniciou um trabalho para colocar Canaã dos Carajás em condições de responder aos desafios impostos pelos altos investimentos que a região continuará a receber nos próximos anos. Foram investidos R$ 129 milhões em obras de infra-estrutura, construção de creches, escola, um hospital, casa de cultura e programas de formação profissional. Em parceria com a prefeitura da cidade, a companhia cuidou da implantação de rede de energia elétrica, do sistema de saneamento básico e de outros serviços públicos .
Com cerca de 18 mil habitantes, quase o dobro da população existente há quatro anos, Canaã cresce à espera dos benefícios que a mineração do cobre deve trazer para a região. Perto de 64% das famílias que vivem na cidade chegaram ali há menos de um ano.
Diante da falta de casas para alugar, empresas como Andrade Gutierrez, Odebrecht e Queiroz Galvão usam os hotéis da cidade como moradia para seus empregados. A efervescência nos negócios é grande. Investidores locais constroem dois hotéis e um distrito industrial está, finalmente, saindo do papel. O empresário Valmir Queiroz Mariano, dono da Integral, que faz manutenção industrial e montagem eletromecânica para a Vale do Rio Doce está se beneficiando desse movimento.
Natural de Sertãozinho, no interior paulista, Mariano, há 20 anos radicado no Pará, está iniciando a construção de uma fábrica de estruturas metálicas numa área afastada do centro de Parauapebas. Cerca de 80% dos R$ 25 milhões que sua empresa fatura por ano vêm de contratos assinados com a Vale. "Fico preocupado com as pessoas que chegam pensando no lucro rápido", diz. "É preciso estar muito bem preparado e ter perseverança para vencer aqui."

A busca do eldorado na terra de Canaã
"FOI UM TIRO NO ESCURO": É assim que Daniel Batista Peres define a decisão tomada há três anos de deixar a cidade de Uberlândia, no Triângulo Mineiro, para buscar novas oportunidades de negócios no sul do Pará. No início, pensou em comprar terras e algumas cabeças de gado no município de Canaã dos Carajás, àquela altura uma cidade de ruas empoeiradas de 10 mil habitantes, localizada naquela parte do Brasil onde a floresta amazônica foi derrubada para ceder lugar ao gado de corte. A idéia, no entanto, foi rapidamente abandonada. Em conversas com moradores da região, Daniel soube dos investimentos programados pela Vale. Percebeu que havia uma grande oportunidade à sua frente e convidou o irmão Rafael, dois anos mais moço, para também arriscar a sorte no Pará. Pouco tempo depois, em março de 2003, Rafael chegou a Canaã dos Carajás acompanhado de sua mulher Denise, de 29 anos, formada em contabilidade. "Tínhamos apenas uma Saveiro e o dinheiro arrecadado com a venda de um pequeno apartamento que havíamos suado para comprar", conta Rafael.
Parte dos recursos foi usada na compra de um terreno na rua principal da cidade, onde Daniel e Rafael construíram o galpão que abrigaria o novo negócio da família, o supermercado Barretos. No início, a oferta de produtos era acanhada. "A maioria dos nossos clientes nunca tinha visto um vidro de alcaparras", diz Rafael. Passados pouco mais de dois anos, o supermercado oferece 8 mil itens, entre os quais alguns inimagináveis no início da operação, como cereais para o café da manhã, bebidas isotônicas e ração para cães e gatos. "Com o crescimento, surgiu a cultura de consumo na cidade", diz Rafael. O faturamento médio mensal, atualmente por volta de R$ 350 mil, cresceu mais de cinco vezes desde o início do negócio. "Nunca tivemos um mês em que as vendas tenham sido inferiores às do mês anterior", diz Rafael. O supermercado, que no início contava com apenas 4 funcionários, hoje emprega 24. Nas próximas semanas, iniciam-se as obras de ampliação da loja, que contará com projetos modernos de iluminação e climatização. Para expandir o imóvel, Peres pagou R$ 130 mil por um pequeno terreno anexo ao seu. "Os preços de aluguel desta região são irreais", diz Jorge Vieira, presidente da Associação Comercial e Industrial de Parauapebas, cidade vizinha a Canaã. Antiga colônia de assentamento do Incra, Canaã padece ainda de uma dificuldade típica da região: a falta de titulação das terras. "Não há nenhuma garantia de escriturar as terras."

O grandão que puxa ferro nas minas de Carajás
O nome do gigante é Caterpillar 793-C e sua utilidade é puxar o minério de ferro das jazidas de Carajás e o cobre da mina de Sossego. Cada um deles custa nada menos do que US$ 3 milhões e é capaz de carregar em uma única viagem cerca de 240 toneladas. Isso é mais do que o peso da Estátua da Liberdade, de Nova York. Essa capacidade de carga é equivalente à de 30 dessas jamantas que circulam pelas estradas do Brasil. Todos os números que envolvem o caminhão são impressionantes. Apenas o pneu tem mais ou menos 2,5 metros de diâmetro. O veículo mede 7 metros de altura, 8 de largura e 13 de comprimento. Na mina de Sossego, no complexo de Carajás, 16 mulheres trabalham na operação dessas máquinas.

Qualidade de vida no alto da serra
O único perigo, o ataque de onças, foi afastado com a construção de uma cerca em volta da Vila de Carajás. Os 5 mil moradores são funcionários da Vale do Rio Doce ou seus parentes. Alguns, como Luciana Pereira, andam de bicicleta entre alamedas bem cuidadas. Parece um condomínio, mas o modelo de moradia pertence ao passado. Para as novas minas, a Vale quer que os funcionários se integrem às comunidades locais.

Mais de 3 quilômetros de locomotivas e vagões
Pelos 892 quilômetros de extensão da Estrada de Ferro Carajás, boa parte deles no Pará, passaram no mês de julho deste ano quase 19 milhões de toneladas de minério de ferro, de manganês e de cobre, além de ferro-gusa, soja e outras cargas. Mais: entre os meses de abril e junho deste ano, mais de 71 mil pessoas viajaram nos trens de passageiros da ferrovia. Está em curso um programa de modernização que permitirá, em meados de 2006, a circulação do trem de maior capacidade das Américas e segundo maior do mundo. Os atuais trens da ferrovia contam com 208 vagões e sua extensão é de 2,3 quilômetros. Os novos terão 312 vagões, 3,2 quilômetros de extensão e capacidade para transportar 39 mil toneladas em uma única viagem .

O minério brota da terra e atrai novos investimentos
A expansão da economia mundial aumenta a demanda pela produção da região
A economia brasileira deve uma boa parcela de seu vigor ao setor mineral. Apenas no segundo trimestre deste ano, a atividade cresceu 17,5% em relação ao trimestre anterior, enquanto o PIB apresentou variação de 1,4%. Foi a alta mais forte registrada desde o último trimestre de 2000, quando houve um salto de 20,4%. Para a Região Norte, que concentra algumas das maiores reservas do mundo em vários tipos de minérios, os bons ventos do mercado estão provocando uma avalanche de investimentos.
O crescimento da economia mundial transformou o Brasil num grande exportador de produtos metalúrgicos, consumidores intensivos do minério de ferro. De 2003 para 2004, as exportações cresceram 41%, atingindo inéditos US$ 10,2 bilhões. O minério em estado bruto representou outros US$ 5,2 bilhões em vendas externas, alta de 43,7%. As duas modalidades, juntas, representam 16,1% das exportações brasileiras.
Apenas o subsolo de Carajás, no sudeste paraense, tem ferro suficiente para abastecer o mundo durante várias gerações. "Isso contando apenas o que já se conhece", diz o professor Celso Pinto Ferraz, ex-diretor do Instituto de Geociências da Unicamp. "A região é pouco conhecida do ponto de vista geológico. Existe um potencial impossível de se calcular."
EXPANSÃO
A Companhia Vale do Rio Doce planeja, só para 2005, investimentos de R$ 10,8 bilhões - 12% dos recursos aplicados em mineração no mundo todo. Barcarena e Paragominas estão entre os municípios da região beneficiados pela estratégia expansionista da Vale. Em Paragominas, localizado na província mineral de Carajás, a Vale pretende extrair anualmente 4,5 milhões de toneladas de bauxita, a matéria-prima do alumínio. Elas serão levadas por um mineroduto, com 244 quilômetros de extensão, até o Porto de Barcarena, onde irão alimentar uma unidade de fabricação de alumina da Alunorte, empresa controlada pela Vale.
A produção da Alunorte vai abastecer uma fábrica de alumínio da vizinha Albras, que também pertence ao grupo Vale. Em Juriti, na região oeste do Estado, quem planeja investimentos de porte é a americana Alcoa, que aplicará R$ 1 bilhão numa mina de bauxita.
O sul do Pará, por sua vez, sediará um dos maiores projetos de mineração de níquel do mundo. A Mineração Onça Puma, subsidiária da canadense Canico Resource Corp., está investindo US$ 860 milhões para montar duas linhas de produção. A extração do minério deve começar em 2007. A Vale do Rio Doce está disposta a arrematar o negócio. A mineradora brasileira já apresentou aos controladores canadenses uma proposta de compra da Canico por cerca de US$ 650 milhões.
"Temos uma fantástica produção mineral", diz o governador do Pará, Simão Jatene. "O setor dá um enorme empurrão às exportações."

Do primeiro quilo de ouro a gente nunca esquece
Eike Batista investiu US$ 100 milhões na mina de Pedra Branca, no Amapá, e espera produzir 6 toneladas por ano
Consuelo Dieguez
No final de agosto, o empresário Eike Batista, de 49 anos, comemorou com alguns executivos da sua empresa, a MPX, o primeiro quilo de ouro extraído de Pedra Branca do Amapari, no Amapá. A mina foi comprada da sul-africana Anglo American, em janeiro do ano passado, por US$ 100 milhões. Um quilo pode não ser lá uma quantidade muito expressiva para ser comemorada. Só que, desde então, Pedra Branca está em atividade frenética. "Semanalmente estamos aumentando a produção", diz Batista.
Suas estimativas são de que, até outubro de 2006, a produção atinja 6 toneladas, o que a transformará na terceira maior produtora de ouro do Brasil, superada apenas por Morro Velho, com 10 toneladas ao ano, e Paracatu, com 7 toneladas, ambas em Minas Gerais. Batista diz que, até agora, só tem motivos para comemorar o investimento. A onça do ouro teve uma valorização de 40% em 18 meses. "Tivemos muita sorte em comprar uma mina como Pedra Branca num momento excelente para o mercado de ouro", diz ele.
Os cálculos indicam que, em três anos, o investimento começará a dar retorno. A partir do próximo ano, o faturamento anual de Pedra Branca, onde trabalham 1,2 mil pessoas, deverá chegar a US$ 40 milhões. Por que então a Anglo American decidiu se desfazer de um negócio tão promissor? A razão, segundo Batista, foi a dificuldade da mineradora em conseguir as licenças ambientais. "A Anglo American simplesmente cansou", diz.
Batista deu garantias aos órgãos ambientais de que as medidas adotadas minimizariam os riscos da exploração. Haverá, também, benefícios sociais para as comunidades de Amapari (que dá o nome à mina) e de Serra do Navio. Durante 40 anos, os 7 mil habitantes desses lugares viveram basicamente em função da extração de manganês pela mineradora Caemi. Em 1998, o minério se esgotou e a mineradora fechou as portas. Sem seu ganha-pão, os municípios entraram em decadência. Agora, com o início das atividades de Pedra Branca, Amapari e Serra do Navio estão renascendo.

O contrabando e a sonegação sobrevivem em Rondônia
Nilton Salina
PORTO VELHOAo mesmo tempo que se anunciam investimentos milionários para os próximos anos, o setor de mineração convive com uma faceta sombria e incômoda : o garimpo ilegal. Um dos templos da contravenção é Rondônia, Estado privilegiado em reservas minerais - há de ametista, diamante e topázio, a manganês, urânio e columbita.
Um bom exemplo dos descaminhos gerados pela garimpagem é o que ocorre com a columbita, de onde se extrai o nióbio, componente de uma superliga empregada na indústria aeroespacial. Um dos principais redutos de produção de columbita em Rondônia é o garimpo Cachoeirinha, em Itapuã do Oeste, a 100 quilômetros de Porto Velho. Segundo a Companhia de Mineração de Rondônia (CMR), em média, 100 toneladas de columbita saem dali ilegalmente todo mês, deixando de recolher cerca de R$ 1,2 milhão de ICMS por ano.
Há exceções nesse quadro. É o caso da cassiterita, explorada por empresas como a CSN e Metalmige. A produção do Estado chega a 3,6 mil toneladas por mês.

É dura a vida de quem quer ir e vir na Amazônia
O sistema de transportes precisa de recursos urgentes para aumentar a competitividade da economia regional
João Paulo Nucci
MANAUS - As dimensões continentais e a densa cobertura vegetal complicam o transporte de pessoas e cargas na Região Norte. O Pará, que tem saída para o mar e conta com a Rodovia Belém-Brasília para fazer a ligação com o restante do País, é privilegiado em relação aos outros seis Estados. Já o Amazonas vive uma situação diferente. Manaus, a capital e principal pólo industrial da região, está completamente isolada, cercada de selva e sem ligação significativa por rodovia com nenhum outro Estado.
"Nossos rios são nossas estradas", diz o ministro dos Transportes, Alfredo Nascimento, um potiguar que vive em Manaus há 30 anos. Quem precisa cumprir o trecho Manaus-Belém e não tem dinheiro para pagar uma passagem aérea é obrigado a passar sete dias navegando pelo rio Amazonas - muitas vezes em embarcações precárias e superlotadas. A Transamazônica, principal aposta do regime militar para resolver a questão, hoje tem a maioria dos trechos fechados pela floresta. O Rio Amazonas também serve de rota para grande parte da produção da Zona Franca. A Honda, que fabrica 1 milhão de motocicletas por ano, despacha 60 contêineres por dia até Belém. Da capital paraense, a produção segue por terra para diversas partes do Brasil.
O que não sai de Manaus de barco obrigatoriamente tem de ser transportado por avião, o que faz do Aeroporto Eduardo Gomes o terceiro mais movimentado do País em cargas, atrás apenas de Guarulhos e Viracopos, em São Paulo. No ano passado, foram embarcadas 135 mil toneladas de mercadorias. O aeroporto foi reformado e ganhou um terceiro terminal de cargas em 2004, o que desafogou o escoamento.
O gargalo agora está no Porto de Manaus, construído no início do século passado, cuja capacidade há muito está esgotada. "Os problemas são muito graves", diz o diretor de Telecomunicações da Siemens, Humberto Cagno. "Apesar de todas as limitações, estamos ampliando a produção de celulares constantemente. Mas é preciso que o governo invista urgentemente para facilitar o trânsito de mercadorias."
Projetos existem. A Suframa planeja construir um porto e um entreposto - que diminuiria a burocracia do comércio exterior - junto ao Distrito Industrial. "Já estamos perdendo competitividade", afirma o secretário do Planejamento do Amazonas, Ozias Rodrigues. "O atual porto não tem mais condições. É preciso construir um novo logo." A Suframa tem mais de R$ 300 milhões em caixa - dinheiro gerado por uma taxa de administração cobrada das empresas da Zona Franca - mas não pode utilizá-los porque os investimentos estão congelados pelo governo federal.
A falta de recursos torna impraticáveis as poucas estradas da região, com exceção da Belém-Brasília, transitável ao longo do ano todo. Na época das chuvas, trechos das rodovias que ligam Manaus a capitais como Boa Vista(RR) ou Porto Velho (RO), precários desde que foram traçados, ficam simplesmente intransitáveis. Mais ao sul, na Cuiabá-Santarém, a lama traga os poucos caminhões que insistem em circular entre novembro e janeiro - o inverno amazônico.
Ainda no campo dos planos, existe também a construção do chamado Arco Norte, que ligaria Belém a Macapá (AP) e seguiria até Boa Vista em direção à Venezuela. Outro projeto indica que de Rio Branco, no Acre, sairá, um dia, a estrada que vai ligar a região ao Pacífico - o Brasil, na verdade, já fez sua parte e está terminando de construir uma ponte sobre o Rio Acre, na fronteira com o Peru. Falta o governo peruano construir mais de mil quilômetros para superar os Andes e atingir a costa.
A boa notícia é que, caso não surjam novos congelamentos para reforçar o superávit primário, deverá haver dinheiro para mitigar a situação. Estão consignados no Orçamento da União para 2006 cerca de R$ 500 milhões para obras no sistema de transportes da região.

A preciosa ajuda do Big Brother da selva
MANAUS: Desde que entrou em funcionamento, em 2003, o Sistema de Proteção da Amazônia (Sipam), do qual faz parte o Sivam, deixou para trás os tempos em que a sigla era relacionada ao escândalo que derrubou um ministro, em 1995, e provocou a criação de uma CPI para investigar os contratos com a fornecedora norte-americana Rayethon. Hoje, está provada a eficiência do sistema. Só no ano passado, os equipamentos que monitoram cada centímetro do território amazônico em busca de ações de desmatamento, narcotráfico e movimentações na fronteira participaram de 42 operações integradas com órgãos como o Ibama e a Polícia Federal. Este ano, o projeto vai receber mais R$ 65 milhões em investimentos.

Gasoduto que corta selva só sai com ajuda militar
Quando concluída, obra que vai levar o gás de Urucu a Manaus vai baratear energia e levar auto-suficiência para a região
Marcos Coronato
MANACAPURU - A Petrobrás resolveu chamar o Exército. Desde fevereiro deste ano, os militares vêm ajudando a empresa a abrir caminho e instalar tubos pelo meio da Amazônia. Mais recentemente, os militares foram chamados para resolver problemas de telecomunicações, que dificultam os testes de sondas de monitoramento ambiental na floresta. O apelo à experiência militar justifica-se diante das adversidades da selva equatorial e também da pressa: a Petrobrás precisa iniciar, ainda neste ano, as obras do gasoduto Coari-Manaus, um empreendimento de US$ 480 milhões. "O gasoduto deverá es tar em testes no final de 2006", afirma o gerente de Empreendimentos da Petrobrás na Região Norte, Mauro Loureiro.
Nesse caso, pressa tem de rimar com perfeição, dados os cuidados especiais exigidos por uma obra desse porte na floresta amazônica, provavelmente o ecossistema que mais recebe atenção da mídia e de ambientalistas em todo o mundo. E precisa ser de alta prioridade. É o caso. O duto permitirá o escoamento do gás natural produzido na bacia do Rio Urucu, no município de Coari, distante 650 quilômetros de Manaus. Trata-se da maior reserva brasileira em terra, capaz de gerar 9,5 milhões de metros cúbicos diários pelos próximos 30 anos. Atualmente, a Petrobrás não consegue fazer chegar todo esse gás aos mercados consumidores. Parte dele é transformada em GLP (o gás de cozinha), em Urucu mesmo, na maior unidade de processamento do gênero no Brasil. A produção viaja para Manaus, parte do caminho pelo duto Urucu-Coari (279 quilômetros) e o restante por balsa. Outra parcela significativa do gás de Urucu recebe fins menos nobres. É reinjetada no solo, para forçar a saída do petróleo, ou queimada.
O projeto do duto Coari-Manaus, que resolverá o problema, existe desde 1996, mas o início das obras foi adiado várias vezes, até que a Petrobrás se adequasse às exigências ambientais por intermédio de um programa de monitoramento e de desenvolvimento sócioeconômico da região. Agora, a licitação está aberta. As propostas serão recebidas até o final de outubro.
Quando o gás natural chegar a Manaus, substituirá o óleo diesel n as duas termoelétricas já existentes (Mauá e Aparecida),da Manaus Energia, e possivelmente fornecerá a uma terceira, em estudos. A nova alternativa energética será mais barata que o diesel. De imediato, dará mais segurança aos consumidores e aos investimentos produtivos na região, já que a rede de energia local é isolada do restante do País.
Uma segunda conseqüência deverá ser a redução das contas de eletricidade e a economia de US$ 365 milhões em subsídios anuais, pagos por consumidores de todo o país para garantir o fornecimento de energia na Amazônia. "Será possível mudar a matriz energética do Norte", diz Loureiro. Segundo ele, além de Manaus, outros sete municípios vão se beneficiar com a energia gerada com o gás de Urucu.
A Petrobrás calcula em até US$ 1 bilhão o investimento a ser feito no trajeto completo do duto (Urucu-Coari-Manaus) e numa eventual nova termoelétrica em Manaus. Paralelamente, a empresa construirá um novo duto somente para GLP, entre Urucu e Coari, e um gasoduto entre Urucu e Porto Velho (RO), de 516 quilômetros de extensão, que consumirá US$ 400 milhões para levar energia a Rondônia e Acre.

A Norte-Sul abre caminho para a produção agrícola
Geraldo Krunk
PALMAS - Implantada para impulsionar o desenvolvimento do agronegócio no Centro-Oeste e no Norte do Brasil, a Ferrovia Norte-Sul, que chegou a ser considerada uma via que ligava o nada a lugar nenhum, foi incluída entre os projetos prioritários do governo federal acordados com o Fundo Monetário Internacional (FMI), além de estar inserida no Programa de Parcerias Público-Privadas (PPPs). O trecho já concluído, de 226 quilômetros, liga Estreito a Açailândia, no Maranhão, onde se conecta à Estrada de Ferro Carajás até o Porto de Itaqui, em São Luís. O transbordo da soja que sai do Tocantins e de outras regiões produtoras, como o sudeste do Pará e o nordeste de Mato Grosso, é feito no pátio intermodal de Porto Franco (MA). A ferrovia é operada pela Vale do Rio Doce.
Os estudos sobre a Norte-Sul, realizados pela Coordenação de Projetos Ferroviários do Ministério do Planejamento, revelam que o avanço da ferrovia amplia significativamente a competitividade da produção de grãos e oleaginosas, como é o caso da soja. Mesmo com a Norte-Sul operando ainda só a partir do Maranhão, o avanço da soja já pode ser observado pelo aumento da área plantada em Estados como Tocantins e Pará. De acordo com a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), esse crescimento do cultivo chegou a 743% nos últimos cinco anos. "Além da logística de transporte, fatores como o preço baixo das terras, o clima bem definido e um mercado favorável contribuíram para esse incremento", afirma Francisco Machado Júnior, técnico da Conab no Tocantins.
A maior procura por terras ocorre em torno de Pedro Afonso, na região central do Estado, mas as lavouras se espalharam por todo o cerrado tocantinense, inclusive na região do Jalapão, no sudeste, mais conhecida pela fragilidade de seus solos e pelas belezas naturais que encantam turistas do mundo inteiro. A disparada da produção estadual pode ser vista a olho nu: entre as safras de 2000 e 2005, a colheita de soja multiplicou-se por cinco, batendo na casa das 887 mil toneladas. O preço da terra acompanhou a expansão da produção: entre o final de 2001 e meados de 2004, a valorização média atingiu 163%.
Tocantins é o principal produtor da oleaginosa da Região Norte, respondendo por 65% da produção total. Atualmente se encontra em fase de construção, no Estado, o trecho Aguiarnópolis-Darcinópolis, de 38 quilômetros, e a extensão até Babaçulância, de 53 quilômetros.

O longo aprendizado rumo ao desenvolvimento
Alessandro Carlucci
Desde muito pequenos, fomos acostumados a olhar a floresta amazônica como um gigante exótico, inatingível e impenetrável. À medida que crescemos, pouco a pouco percebemos que essa região misteriosa tem contornos nítidos, se mantém viva graças a intrincadas relações de troca entre homens, animais e plantas e guarda, em seu interior, recursos naturais de valor ainda incalculável para usos diversos na medicina, na alimentação e na cosmética.
Aprender a interagir com essa biodiversidade de forma sustentável e responsável foi o caminho que escolhemos para colocar em prática, no ano 2000, o projeto de uma linha de produtos inteiramente apoiada no uso de recursos naturais. Mas, entre a idéia e a ação, existe uma distância "amazônica", sobretudo na maneira de colocar esse projeto em andamento.
Se por um lado nós, da Natura, já tínhamos a certeza de que a região amazônica nos oferecia uma oportunidade única, graças à sua dimensão (22% de todas as espécies do planeta estão ali) e ao imenso potencial inexplorado (apenas 1% das espécies teve suas propriedades terapêuticas analisadas), por outro sabíamos que, sem o conhecimento e a colaboração das comunidades tradicionais, toda nossa boa intenção acabaria resultando em fracasso.
Outra certeza era que em hipótese alguma utilizaríamos processos de extração que pudessem afetar a sustentabilidade dos ecossistemas brasileiros. Nossos valores deveriam ser mantidos: uso de princípios ativos naturais, consciência e responsabilidade com o presente e com o futuro.
Optamos então por adotar o compromisso de criar com essas comunidades (em sua maioria carentes de recursos básicos, como água limpa, postos de saúde e energia elétrica) um modelo de desenvolvimento que fosse ambientalmente correto, socialmente justo e economicamente viável. Essa decisão, aliada a uma postura transparente, aos poucos foi abrindo caminho, clareando objetivos e nos ajudando a vencer as barreiras da desconfiança que naturalmente se impõem no estabelecimento deste tipo de relação.
Em vez de importar um modelo pronto e acabado, preferimos envolver não apenas os habitantes da floresta, nossos principais parceiros, mas também organizações não-governamentais ligadas ao manejo ambientalmente correto, representantes dos governos da região, além de empresas e estudiosos.
Cada um dos agentes desta teia de relações deveria, como premissa, partilhar de nossos compromissos na obtenção de ativos de maneira sustentável. Assim seríamos capazes de garantir sua conservação e preservação para as gerações futuras, além de gerar recursos para a população local a fim de proporcionar uma melhor qualidade de vida. Tudo isso de forma a promover o desenvolvimento sustentável.
Um exemplo de como transportamos do campo das idéias para a prática todos esses compromissos é o trabalho desenvolvido com a comunidade de São Francisco do Iratapuru, localizada a 420 quilômetros de Macapá (AP).
Ali, trabalhamos com uma cooperativa local, formada por cerca de 30 famílias que há gerações vivem da extração da copaíba, do breu branco e da castanha-do-brasil, cujo óleo é utilizado na formulação de nossos produtos.
A cooperativa extrai de maneira sustentável os ativos naturais e é remunerada logo quando entrega os produtos. Também foi constituído um Fundo de Desenvolvimento Sustentável composto por parte da receita líquida obtida com a venda dos produtos feitos com os ativos fornecidos pela cooperativa. A renda desse fundo pode ser empregada em melhorias na comunidade.
Para legitimar os princípios que norteavam a produção dessa linha de produtos, decidimos buscar a certificação do processo da cadeia produtiva segundo as normas mundiais do FSC (Forest Stewardship Council).
Nossos objetivos agora são acompanhar a evolução desse processo e aprender e buscar oportunidades cada vez mais inovadoras de nos relacionarmos com os parceiros, contribuindo para o aperfeiçoamento da legislação.
Nesta jornada, que sabemos será longa, contamos com a inestimável colaboração de um grupo comprometido com nossa visão de mundo de mais de 40 mil consultoras que atuam na Região Norte, responsáveis por levar nossos produtos e conceitos aos consumidores. Temos consciência das dificuldades, das árduas condições de vida daqueles que atuam no início desta cadeia produtiva, das diferenças culturais e das intrincadas relações que deveremos estabelecer, mas estamos certos de que este é o caminho a ser trilhado na busca de um modelo baseado no desenvolvimento sustentável.

Alessandro Carlucci é presidente-executivo da Natura Cosméticos

A verdadeira sustentabilidade
Etel Carmona Viana
As coisas não são exatamente como parecem ser. Felizmente. A Amazônia, ao contrário do que muita gente pensa, não é um mar verde só com cobras, jacarés, insetos e macacos. A floresta é toda habitada por milhares de comunidades de ribeirinhos, extrativistas, indígenas e, mais recentemente, colonos e fazendeiros. A maior parte da população é urbana.
O triste é que não percebemos o óbvio: só conseguiremos manter a floresta em pé fazendo com que a produção de madeira e de produtos florestais não-madeireiros seja feita de forma ecologicamente saudável, gerando riquezas para as pessoas que vivem lá. A floresta pode e deve dar mais renda em pé do que transformada em cinzas para pastos e plantações.
Felizmente, o Brasil tem uma competência empresarial e tecnológica que alimenta nossa esperança de sucesso. Precisamos direcionar esta competência para negócios sustentáveis na Amazônia, tanto para a área urbana quanto para a rural. Temos a maior floresta do mundo e estamos colocando fogo nela como se fosse um lixo sem valor, repetindo a história da mata atlântica.
Chegou a hora de percebermos o óbvio. Não vamos salvar a Amazônia apenas com mais polícia, fiscalização, parques e reservas - ainda que isto seja fundamental e extremamente importante. Nem, tampouco, culpando os estrangeiros que estariam querendo invadir a Região Norte. O vilão da história somos nós mesmos. É nossa incapacidade de mobilizar o talento nacional para transformar esse patrimônio em riqueza utilizada de forma coerente.
Precisamos apoiar negócios sustentáveis com políticas públicas sensatas e eficientes. Passou da hora de tratarmos o manejo florestal como algo benéfico, que deve contar com licenças ambientais mais simplificadas do que o desmatamento para agricultura e pecuária.
Os resultados do Programa Zona Franca Verde, implantado nos últimos anos no Estado do Amazonas, mostram que isso é possível. Precisamos capitalizar o interesse do mundo na Amazônia. Devemos substituir a xenofobia pela inteligência. Vamos cobrar abertura de mercado em todo o mundo para os produtos da Amazônia. Se o mundo quer conservar esse "patrimônio da humanidade", não precisamos de esmolas.
Precisamos sim de financiamento diferenciado para ampliar os investimentos capazes de gerar riqueza, combater a pobreza e conservar a floresta.
Etel Carmona Viana é empresária do setor moveleiro em São Paulo. Virgilio Viana é secretário de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável do Amazonas

A vocação da Amazônia é ser floresta
Paulo Adario
A Amazônia, de todas as regiões brasileiras, é a que abriga mais visivelmente os paradoxos e contradições decorrentes da imensa desigualdade existente no Brasil. De um lado, concentra o maior estoque de riquezas do País em recursos minerais e biodiversidade. É o principal reservatório do planeta de um bem escasso e essencial à vida, a água. E, como se não bastasse, tem papel fundamental na regulação do clima regional e global.
A maior parte da enorme riqueza biológica da Amazônia é ainda desconhecida pela ciência. São também desconhecidos cerca de 50 grupos indígenas cuja cultura, religião e conhecimento são um belíssimo mistério. Convivendo com esse inestimável tesouro ambiental, cultural e espiritual, há 20 milhões de brasileiros. Em sua maioria, vivem em condições de pobreza extrema, com baixíssimos indicadores de saúde e educação.
Esse tesouro amazônico está sendo saqueado e destruído sem que se tenha tempo de conhecê-lo e sem gerar o necessário desenvolvimento para os povos da floresta. A cada ano, milhares de quilômetros quadrados de inestimável biodiversidade viram fumaça.
No ano passado, uma área equivalente a seis campos de futebol foi destruída por minuto, para dar lugar a pastos empobrecidos e campos de soja e outros grãos. A população, expulsa de suas terras por uma agricultura altamente mecanizada, cada vez mais se amontoa nas violentas favelas das metrópoles amazônicas.
É a isso que chamam desenvolvimento?
A chegada da soja nos últimos anos ajudou a dizimar a floresta, junto com as fazendas de gado que surgiram com as estradas abertas pelo regime militar nos anos 70. O comércio internacional desse grão gerou bolsões de riqueza para poucos em algumas áreas do Mato Grosso - mas também provocou mais desmatamento, mais terras públicas invadidas, mais populações tradicionais desalojadas.
A soja é a parte mais visível do processo acelerado de globalização da economia mundial. Produzimos no Brasil a soja que vai servir de alimento aos rebanhos de gado europeu. É como se a cada ano exportássemos 6 milhões de hectares de pasto para as vacas européias. Quando começou a ser produzida em larga escala no País, nos mesmos anos 70, dizia-se que a soja jamais chegaria à Amazônia. Hoje, após maciços investimentos federais em pesquisa e tecnologia, sobretudo na Embrapa, a soja ocupou os cerrados e já é produzida até mesmo em Santarém, às margens do Rio Amazonas. A economia globalizada atraiu para a região as grandes traders que monopolizam o agronegócio mundial, como Cargill, Bunge e ADM, e beneficiou o Grupo André Maggi, do governador do Mato Grosso, Blairo Maggi.
Nesses últimos 30 anos, o Brasil fez uma opção: investiu em produtos exóticos como a soja, em setores que geram o desmatamento, mas não investiu no desenvolvimento de pacotes tecnológicos para produtos tradicionais da Amazônia, que podem garantir emprego e renda mantendo a floresta de pé. É o caso, por exemplo, dos óleos de copaíba e andiroba, de larga aplicação industrial, e que podem substituir o diesel.
Gradativamente, a floresta vai abaixo em nome de um velho modelo econômico, fruto da eterna dependência brasileira. Exportam-se commodities agrícolas para gerar superávit na balança comercial e ajudar o Brasil a pagar sua gigantesca dívida externa. Uma dívida que é conseqüência do próprio modelo econômico equivocado. Para reverter esse quadro que leva à destruição, não são necessários apenas projetos bem-intencionados que busquem o manejo dos recursos florestais. É preciso inverter a percepção de que as regiões mais ricas do País são o Sul e o Sudeste.
É necessário olhar para a Amazônia e enxergar a verdadeira riqueza que ela contém. E fortalecer as instituições federais encarregadas de zelar por esse patrimônio, como o Ibama, a Polícia Federal, o Incra, a Funai, órgãos estaduais e municipais.
É importante proteger os recursos naturais e organizar o acesso a eles. É preciso colocar a região no centro do debate nacional, para que os brasileiros possam decidir o modelo de desenvolvimento que realmente sirva, preservando esse gigantesco patrimônio ambiental.
A vocação da Amazônia não é ser o celeiro do planeta. A vocação da Amazônia é ser a maior floresta do mundo, o maior estoque de biodiversidade e a maior reserva de água doce do planeta. Para proteger esse patrimônio, o Estado brasileiro precisa se fazer presente e impor o predomínio da lei e da ordem sobre os interesses econômicos escusos daqueles que se julgam donos da Amazônia.
Paulo Adario é coordenador internacional do Greenpeace na Amazônia

As vantagens de estar no Hemisfério Norte
Roraima está descobrindo as vantagens de ser a única área de produção rural expressiva do País localizada acima da linha do Equador. Além da lavoura, os produtores locais se deram conta de que é vantajoso estar num lugar onde o inverno não passa de uma data no calendário e que a safras são invertidas em relação aos Estados mais ao Sul. Dentro de dois ou três anos a fruticultura local estará pronta para inundar o mercado do Sudeste com limões-taiti justamente no período da entressafra paulista. Já foram feitos investimentos para a produção de uvas itália, niagara e rubi. Há cerca de três anos foram feitos os primeiros experimentos para a produção de mangas tipo exportação. A idéia é fazer do Estado, em dois anos, um dos maiores produtores da fruta.

O capim-dourado se transforma em brincos
O capim-dourado, que sempre cresceu na região do Jalapão, no Tocantins, transformou-se na fonte de renda de mais de 500 artesãos do lugar. E com vantagens. Utilizado na produção de bolsas, brincos e colares, o capim começa a ser visto como um recurso importante. O motivo é simples: quatro bolsas de capim-dourado podem ser feitas em uma semana e rendem o mesmo lucro de um boi, depois de três anos de engorda.

A velha castanha se transforma em insumo de cosmético e leva renda para a pequena Iratapuru

Há várias gerações, os moradores de Iratapuru, no sul do Estado do Amapá, vivem da extração da castanha-do-pará. O produto era utilizado como ingrediente de pratos especiais sobretudo nas festas de fim de ano. A sazonalidade, que perdurou até pouco tempo, felizmente ficou no passado. Assim como faz com outros frutos da Amazônia - como o cupuaçu, a andiroba, o murumuru e o guaraná -, a Natura, maior fabricante nacional de cosméticos, utiliza a castanha como insumo de sua linha Ekos. Seus fornecedores são alguns dos 152 moradores de Iratapuru, comunidade encravada numa reserva florestal de mais de 800 mil hectares na margem direita do Rio Jari. A extração do óleo de castanha adquirido pela Natura segue as melhores normas ambientais , respeitando o ciclo completo de reprodução do fruto. No ano passado, a Natura investiu cerca de R$ 31 milhões em 43 projetos da linha de biodiversidade.

A soja cruza a linha do Equador
Com terras baratas, produtividade elevada e baixos custos, Roraima se transforma na novíssima fronteira agrícola
José Aparecido da Silva
BOA VISTA - O gaúcho Afrânio Vebber deixou Getúlio Vargas, no Rio Grande do Sul, aos 13 anos, em 1984. Acompanhava os pais, agricultores minifundiários que se mudavam de mala e cuia para o município de Rio Verde, então um modorrento lugarejo perdido no cerrado goiano. Os Vebber, que queriam construir uma nova vida no Centro-Oeste, não se deixaram impressionar pelas aparências. Acreditaram no potencial da região e se deram bem, fazendo dinheiro em Rio Verde, hoje a base de um dos principais pólos agroindustriais do País.
Dezoito anos depois, já casado, coube a Vebber tomar a iniciativa de uma nova mudança. Junto com a mulher, Vera, e um irmão, transferiu-se em 2002 para Roraima, que conhecera três anos antes numa visita com um grupo de produtores de Goiás.
Vebber encantou-se com o que viu, fez as contas na ponta do lápis e resolveu comprar 11 mil hectares nas proximidades de Boa Vista, a capital de Roraima. "Foi uma pechincha", lembra Vebber, que à época pagou R$ 45 por hectare, menos de 5% do praticado em Rio Verde. Com a valorização recente das terras, os preços estão mais elevados - R$ 1 mil por hectare - mas, mesmo assim, continuam baratos comparados a outros centros produtores, como Mato Grosso (R$ 9 mil) e Mato Grosso do Sul (R$ 12 mil).
Vebber transferiu parte do maquinário - tratores, cultivadores e colheitadeiras - da fazenda de Rio Verde para Boa Vista e começou a plantar soja numa área de 1,1 mil hectares, correspondente a apenas 10% de suas terras. Os resultados superaram as expectativas: no ano passado, sua lavoura rendeu 3 mil quilos de soja por hectare, uma marca superior à média nacional (2,5 mil quilos) e só comparável à de Estados campeões de produtividade do Sul, como o Paraná.
Maior produtor individual de soja de Roraima, Vebber espera repetir a dose na produção deste ano, que já começou a ser colhida - por estar localizado no Hemisfério Norte, Roraima produz na contramão dos demais Estados, que recém estão iniciando o plantio. Para dar conta do trabalho, Vebber acaba de investir R$ 680 mil numa nova colheitadeira. "É um compromisso elevado, mas compensa com a boa colheita", afirma.
SEGUNDA GERAÇÃO
A história de Vebber retrata à perfeição o que está ocorrendo em Roraima, a última fronteira agrícola do Brasil. Como ele, algumas centenas de agricultores estão deixando as terras do cerrado do Centro-Oeste, onde chegaram há 20 ou 30 anos, para se estabelecer no extremo Norte do País. Essa segunda geração de migrantes agrícolas - geralmente com raízes nos Estados sulinos - está desenhando os contornos de um novo mapa no campo brasileiro. "Roraima deve se transformar num novo celeiro para o País", afirma o economista agrícola André Pessoa, da consultoria Agroconsult, de Florianópolis (SC).
À primeira vista, pode soar um pouco exagerado. Afinal, as estatísticas da participação de Roraima na produção agrícola nacional ainda são pouco expressivas: embora tenha se multiplicado por sete desde a primeira colheita contabilizada, na safra 2001/2002, a produção de soja roraimense ainda é pequena. Pouco mais de 56 mil toneladas foram colhidas na safra passada. A área cultivada também é modesta: menos de 20 mil hectares, o equivalente a uma fazenda de bom porte no Mato Grosso ou em Goiás.
"O que importa é a tendência", diz Pessoa. Segundo ele, uma série de fatores faz de Roraima o Estado do momento na agricultura. Além do baixo preço das terras e da produtividade elevada, a região dispõe de imensas áreas prontas para o cultivo - estão mapeados pelo menos 3 milhões de hectares de "lavrado", nome dado ao cerrado de Roraima. "Não precisamos desmatar e degradar um milímetro sequer", diz José Dirceu Vinhal, presidente da Cooperativa Grão Norte, que agrupa os agricultores do Estado. Com uma vantagem adicional: as terras agricultáveis estão fora da área de demarcação da reserva indígena Raposa Serra do Sol, foco de conflitos agrários nos últimos anos.
Os custos de preparo da terra são também favoráveis se cotejados com os dos outros centros produtores. A vegetação do lavrado, formada por um tipo de capim, o "fura-bucho", muito ralo e rarefeito, permite o plantio direto, exigindo menos gastos na correção do solo.
LOCALIZAÇÃO
A tecnologia de produção, com o emprego de sementes especialmente desenvolvidas para as peculiaridades regionais pela Embrapa, também é outro ponto positivo, de acordo com Pessoa. "As espécies de sementes já estão adaptadas para a agricultura equatorial", afirma. Finalmente, a própria localização geográfica, que o coloca mais próximo dos mercados dos Estados Unidos e da Europa, representa um fator de atração para Roraima. O escoamento tanto pode ser feito por via rodoviária até os portos de países como a Venezuela e a Guiana, como por transporte fluvial, pelo terminal de Itacoatiara, a 36 quilômetros de Manaus.
A localização privilegiada e as próprias potencialidades da novíssima fronteira agrícola brasileira, que levaram Afrânio Vebber a subir o mapa do Brasil, já foram captadas lá fora. Um grupo de 70 agricultores de Ohio, nos Estados Unidos, está adquirindo uma área de 7,7 mil hectares em Roraima. O grupo, batizado de Goodview (Boa Vista, em inglês), pretende começar a produzir já na safra de 2007. Além da soja, vão tentar a sorte com arroz e algodão.

Está mais fácil produzir
Rondônia investe em tecnologia e melhoria das estradas
Nilton Salina
PORTO VELHO - Amparado no tripé investimento em tecnologia, qualidade da terra e condições climáticas, Rondônia é um dos principais produtores agrícolas da Região Norte. Terceiro na produção de arroz, segundo na de soja e milho, o Estado, com 2,1 milhões de sacas, é o maior em café, com mais de 80% de participação. Isso parecia impossível no início da década de 80, quando o então território federal foi transformado em Estado. Na época, nenhuma das pouquíssimas rodovias existentes era asfaltada e praticamente toda a área era coberta por densa floresta. Era difícil ter acesso aos 16 municípios, espalhados em uma área de 238,5 mil quilômetros quadrados, um pouco menor que o Estado de São Paulo. Desde então, muita coisa mudou naquela que, no final dos anos 90, era a nova fronteira agrícola do País e atraía levas de agricultores de outras regiões. Agora, a maior parte dos municípios produtores está ligada por estradas em boas condições.
Órgãos como a Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural (Emater) elaboram gratuitamente projetos para que os pequenos produtores (cerca de 85% das quase 80 mil propriedades rurais têm até 240 hectares) possam ter acesso a recursos do Banco da Amazônia e do Banco do Brasil.
Além disso, a Emater também garante o apoio tecnológico aos produtores, com a assistência técnica de veterinários e agrônomos e o fornecimento de sementes selecionada.
"Com esse investimento, a produção aumentou", afirma Luiz Cláudio Pereira Alves, secretário de Agricultura de Rondônia. Isso pode ser visto no desempenho da soja: em cinco anos, a produção triplicou, passando de 76,5 mil toneladas, na safra 2000/2001, para 222 mil toneladas ano passado.

Desmatamento ainda é problema sem solução
O ritmo da ação dos predadores diminuiu, mas a devastação da floresta amazônica ainda é um problema sem solução. Entre agosto de 2004 e julho de 2005, pouco mais de 9 mil quilômetros quadrados de vegetação desapareceram. No período anterior, registrou-se mais que o dobro de desmatamento: 18,7 mil quilômetros quadrados. Os números são do Ministério do Meio Ambiente.
O problema é mais grave na borda sul da Amazônia, onde a floresta está sendo substituída por plantações de soja - a queda da cotação internacional da oleaginosa foi apontada, inclusive, como responsável pelo menor índice de desmatamento.
Em outras localidades, principalmente no Pará, a soja é considerada uma alternativa para reativar áreas há muito devastadas. A idéia é ocupar com a produção agrícola as largas porções de terra que já não têm condições de recuperar a cobertura vegetal nativa. O risco é perder o controle da ocupação das áreas e provocar ainda mais desmatamento. Nas palavras do engenheiro agrônomo Alfredo Kingo Oyama Homma, da Embrapa Amazônia Oriental, é preciso criar uma estratégia de "desenvolvimento sem crescimento" para aproveitar o que ele chama de "benefício da destruição."
Duas cidades do Pará já experimentam a sensação de criar riqueza sobre paisagens desoladoras: Santarém e Paragominas. A primeira, estabelecida onde os Rios Tapajós e Amazonas se encontram, está conseguindo reverter a decadência econômica graças às culturas da soja e do arroz. Tanto a produção quanto o valor das terras crescem exponencialmente - o preço do hectare saltou de R$ 25 para R$ 1 mil em cinco anos. Já em Paragominas, a produção de grãos deve chegar a 350 mil toneladas neste ano, um crescimento de 20% sobre 2004.

Cooperativa tira negócio da falência
Há cinco anos, as 800 famílias de Benevides, município a 20 quilômetros de Belém, que viviam em função da Amafrutas, fabricante de suco concentrado de maracujá, de repente ficaram sem fonte de renda. A empresa faliu, após um mal sucedido processo de transferência de controle. A saída, para as famílias, foi assumir o que restou do negócio, formando uma cooperativa. Elas também mudaram o nome da empresa para Nova Amafrutas. A operação de salvamento rendeu frutos, literalmente. No final de 2004, a capacidade de produção foi ampliada de 26 mil toneladas para 59 mil toneladas, com a inauguração de uma nova fábrica, na qual foram investidos R$ 15,8 milhões. Além do maracujá, a Nova Amafrutas passou a trabalhar com laranja, acerola e abacaxi. Este ano, a Nova Amafrutas deve faturar R$ 17 milhões. Em 2009, a meta é obter R$ 41 milhões, com a produção de 86 mil toneladas.

O espírito nômade de Pizzonia não resistiu a Manaus
Pai de Antônio Pizzonia, da Fórmula 1, Reginaldo rodou pelo País antes de fazer fortuna com a reciclagem de lixo
João Paulo Nucci
MANAUS - Antônio Reginaldo Pizzonia gosta de acelerar. "Só ando chutado", diz o pai de Antônio Pizzonia Jr., piloto da equipe Williams de Fórmula 1. Todos os dias, por volta das 6 da manhã - mesmo aos sábados e domingos -, o empresário de 58 anos corta as ruas de Manaus ao volante de seu Passat blindado. As avenidas que dão acesso ao distrito industrial o ajudam a extravasar seu instinto veloz (embora jamais ultrapasse os limites de velocidade, garante). Pizzonia quer ser sempre o primeiro a chegar na sede da Coplast, a empresa que construiu a partir do nada nos últimos 28 anos. "Isso aqui é minha vida. Trabalho 16 horas por dia com prazer."
A Coplast é a maior recicladora de resíduos plásticos de Manaus. A fábrica tem 503 funcionários e presta um serviço importante a clientes como Gillette, Honda, Philips, CCE, Gradiente e Semp Toshiba. Ela recolhe todos os resíduos - de lâmpadas queimadas a produtos tóxicos - e recicla todo tipo de plástico. Na Riolimpo, outra de suas empresas, ele recicla pneus usados e metais. Pizzonia é do tipo de empresário que tem medo de revelar seu faturamento. Mas percebe-se pelo ritmo de trabalho nas empresas e pelos sinais exteriores de prosperidade das organizações que o dinheiro não tem faltado.
Pizzonia não tem dívidas. Só investe com recursos próprios. Nos dois últimos anos, aplicou US$ 2,3 milhões, à vista, nas máquinas e equipamentos de uma nova empresa, a Injetados da Amazônia, fornecedora de peças plásticas para a Honda. Este ano, planeja crescer 5% em relação a 2004.
PORTA ABERTA
O empresário não gosta de ostentar. Vai trabalhar de camiseta e seu escritório improvisado - o oficial está em reformas - é mais despojado do que o de uma repartição pública. A porta está sempre aberta e o movimento é intenso. Enquanto atende um comprador, discute algum assunto pelo telefone ou negocia com o vendedor que há 25 anos fornece medicamentos para os funcionários da empresa.
Rico e de bem com a vida, o empresário tem uma trajetória movimentada. Filho de italianos, nasceu em São Carlos, interior de São Paulo. Aos 13, saiu de casa para trabalhar numa lanchonete em Campinas. Abandonou os estudos na sexta série. Aos 15, vendia quadros de santos em Londrina. Depois, vendeu enciclopédias de cidade em cidade. Passou por Campo Grande, Cuiabá, Ji-Paraná e outras, sempre no rumo norte.
Apaixonou-se em Manaus pela mulher que lhe daria cinco filhos (duas mulheres e três rapazes) e resolveu ficar. Na época, 1976, a Zona Franca estava começando a decolar. Seu primeiro negócio no Amazonas - uma distribuidora de doces - faliu na primeira semana. "Tentei trazer a mercadoria de São Paulo e chegou tudo estragado."
Passou, então, a percorrer o distrito industrial em busca de lixo. "Comecei como catador", lembra. Deu certo. Hoje, é tratado como fornecedor pelas mesmas grandes empresas que um dia o receberam como catador. Sair de Manaus? "Nunca. Essa cidade me deu tudo. É aqui que eu quero deixar meus ossos."

O combustível que brota no coração da floresta
No coração da maior floresta tropical do mundo nasceu, em 1982, a Agropalma, um investimento feito pelo empresário Aloysio Faria, então dono do Banco Real, hoje à frente do Banco Alfa. Nos primeiros dez anos, a empresa instalada em Tailândia, a 150 quilômetros de Belém, transformou-se no maior fabricante de óleo de palma da América Latina.
De origem africana, o produto, também conhecido como óleo de dendê, é usado pela indústria alimentícia para fritura ou como componente de algumas receitas.
A empresa, que faturou R$ 440 milhões no ano passado, descobriu há pouco tempo um novo filão, o biodiesel. Os subprodutos da palma passaram a ser transformados em combustível vegetal. "Vendíamos o resíduo para a indústria saboeira", diz César Augusto de Abreu, gerente operacional da Agropalma. Numa parceria com a Universidade Federal do Rio de Janeiro, dona da patente, chegou-se ao processo do biodiesel.
As perspectivas são promissoras. A partir de 2008, todo diesel vendido no país será obrigatoriamente misturado com 2% de biodiesel. Só esse passo pode gerar uma demanda de 700 milhões de litros por ano. A Agropalma tem capacidade para produzir 60 milhões de litros por ano, o equivalente a quase 10% do consumo nacional previsto . Dos 82 mil hectares da área ocupada pela Agropalma, 50 mil são destinados às reservas florestais e 32 mil à extração da palma. O cultivo de 5 milhões de palmeiras é intensivo e exige o emprego de cerca de 4 mil trabalhadores.
Todo o processamento do produto é físico, sem o uso de componentes químicos. Em tempos de valorização da alimentação saudável e ambientalmente sustentável, isso acaba se revelando um apelo importante para os importadores europeus e americanos .

A nova alvorada do velho Projeto Jari
O Orsa já investiu R$ 24 milhões em projetos sociais na região
Amauri Segalla
Durante mais de 30 anos, o Projeto Jari foi um sinônimo de fracasso. A ambição de transformar em pólo agroindustrial a região às margens do Rio Jari, na divisa do Amapá com o Pará, consumiu fortunas, devastou florestas e deixou em situação precária milhares de moradores nos arredores do empreendimento. Hoje, os novos proprietários do Jari tentam torná-lo, enfim, rentável. E querem fazer isso sem agredir a natureza e melhorando a qualidade de vida dos habitantes.
O desafio de recuperar o Jari, criado pelo milionário americano Daniel Ludwig, está nas mãos do empresário Sérgio Amoroso, do Grupo Orsa, um dos maiores fabricantes de papelão ondulado do País, com receitas anuais de US$ 500 milhões. Em 2000, o Orsa adquiriu o Jari, então vergado por uma dívida de US$ 415 milhões. Obteve dos credores a redução da dívida a 27% do total e dez anos para o pagamento. Desde então, o empreendimento, que hoje oferece 770 empregos diretos e 3 mil indiretos, vem se expandindo. No ano passado, foram fabricadas 358 mil toneladas de celulose de eucalipto, um crescimento de quase 20% em relação a 2000. Em 2005, a expectativa é de que a receita atinja US$ 175 milhões, contra US$ 168 milhões registrados em 2004. O crescimento é resultado da alta demanda mundial por celulose e dos investimentos de US$ 28 milhões feito no ano passado.
Os indicadores econômicos são positivos, mas a situação financeira ainda é desconfortável. A dívida está atualmente em US$ 104 milhões. Cerca de US$ 8 milhões foram pagos até agora. Faltam quatro anos para o fim do prazo. Desde que assumiu o Jari, o Orsa focou-se na preservação ambiental e na recuperação social da região. Do 1,7 milhão de hectares da Jari Celulose, cerca de 430 mil foram certificados no ano passado pelo Forest Stewardship Council (FSC). O diploma FSC garante que o produto final (a celulose) é resultado de procedimentos que respeitam a natureza. Os Estados Unidos e alguns países europeus só compram produtos que possuam a certificação FSC. As exportações respondem por mais de 90% do faturamento da Jari Celulose.
"Em 2004, a celulose que produzimos foi retirada de uma área de 52 mil hectares, o que equivale a menos de 5% das nossas terras", diz Amoroso. Nos últimos cinco anos, a Fundação Orsa investiu R$ 24 milhões em programas sociais na região. Foram criados cursos profissionalizantes, oficinas de arte e intercâmbios culturais com outros países. Recentemente, um grupo de jovens foi enviado à Holanda para um curso profissionalizante.
Tais investimentos têm uma explicação. Amoroso incluiu no contrato de compra do Jari uma cláusula que o obriga a destinar 1% do seu faturamento para a Fundação Orsa. "Uma consultoria recomendou a retirada da cláusula, sob o risco de a compra naufragar", diz o empresário. Por ironia, o BNDES só aceitou a proposta por causa desse 1%.

Do coco do Pará nada se perde, nem a casca
A paraense Poematec produz assentos para automóveis
Célia Chaim
ANANINDEUA - Um coco do Pará, aparentemente, só entraria num carro Daimler-Chrysler como um delicioso produto de consumo. Mas não é isso que acontece no Distrito Industrial de Ananindeua, na região metropolitana de Belém. Processada, a fibra da casca do coco vira a base do assento e do encosto de veículos. A Poematec, empresa de pequeno porte e grandes ambições, faz isso. Era fornecedora para o modelo Classe A, que deixou de ser produzido na fábrica de Juiz de Fora (MG), da Mercedes-Benz, subsidiária brasileira da Daimler-Chrysler, mas continua produzindo assentos e encostos para os caminhões da empresa, em São Bernardo do Campo (SP). Trata-se de um bem-sucedido empreendimento de caráter público-privado: uma parceria entre o setor privado, a DaimlerChrysler, que investiu R$ 8 milhões na aquisição das máquinas da fábrica (cedidas em comodato), e o setor público, por intermédio do Governo do Pará, do Banco da Amazônia e da Universidade Federal do Pará.
O modelo de negócios da Poematec procura aliar o respeito ao meio ambiente ao respeito social. A matéria-prima utilizada na fábrica é fornecida por oito unidades de processamento de fibras, todas localizadas no Pará, administradas por cooperativas comunitárias e por uma plantação de seringa revitalizada. Situada em área de assentamento da reforma agrária, a plantação gera trabalho para 500 famílias na coleta da seringa. Até 2006, serão cerca de 3 mil seringueiros em atividade.
A linha de produção da Poematec não se restringe em atender ao setor automotivo. Com a fibra do coco, a Poematec produz vasos, placas, estacas, adubo de pó de coco, lâminas para colchões e mantas de fibra de coco. Segundo Oscar Donizeti Lavine, diretor de Tecnologia da Poematec, todas as peças contêm tanino natural da fibra de coco (fungicida), que substitui produtos procedentes de fontes não sustentáveis.
O faturamento da empresa é de R$ 3 milhões por ano. Em agosto, a Poematec embarcou o primeiro contêiner de vasos e placas montadas da linha Amazon Garden para os Estados Unidos (o uso da fibra de coco é uma alternativa sustentável para substituir o xaxim, hoje ameaçado de extinção). No total serão exportados 10 mil itens. O material foi comprado pela Universal Taste, uma empresa sediada em Miami, que vende produtos de origem amazônica. Valor aproximado do negócio: US$ 30 mil."Ainda é pouco", diz Lavine. "Mas é o começo de alguma coisa que pode crescer muito."
Capacidade para crescer a Poematec tem. Sua fábrica é equipada com máquinas de tecnologia de ponta, em parte compradas da empresa alemã F.S. Fehrer, e está instalada em uma área construída de 3,1 mil metros quadrados. Atualmente, a fábrica produz 20 toneladas por mês, podendo chegar a 80 toneladas caso crie o terceiro turno de trabalho. Isso significaria 120 postos de trabalho a mais.

Obras restauram porto e recuperam vista histórica
O processo de restauro do Porto de Belém, concluído em 2000, entregou à cidade não apenas um complexo de entretenimento com bares, restaurantes e casas de show, conhecido como Estação das Docas; devolveu também aos habitantes da capital paraense a vista da Baía do Guajará, antes interrompida pelas abandonadas instalações portuárias. Sem alterar a estrutura dos edifícios, pré-fabricados na Inglaterra e montados na cidade no princípio do século passado, as obras de recuperação abusaram dos vidros para permitir o contato visual da população com o mar. A vista, além de bela, é histórica. Foi pela baía que os portugueses chegaram a Belém, em 1616. Recomenda-se acompanhar o amanhecer do lugar.

Uma praia 'nordestina' em plena Amazônia
A região de Salinas fica a 200 quilômetros de Belém e é sede de um dos mais belos conjuntos de praias oceânicas da Amazônia. A praia de Maracanã tem areias brancas, águas calmas e uma beleza só comparável aos melhores pontos do litoral do Nordeste. A cidade conta com uma boa infra-estrutura para receber turistas. Com uma vantagem para os banhistas: o clima é quente e úmido durante o ano todo.

Palmas serve de entrada aos turistas no Tocantins
Última cidade planejada do século 20, Palmas foi estrategicamente implantada na margem direita do Rio Tocantins para desenvolver a região, uma das mais pobres do País. Construída em um cenário de cartão postal, tendo de um lado a Serra do Carmo e, de outro, o lago formado pela barragem da usina hidrelétrica Lajeado, foi inaugurada em 20 de maio de 1989. Hoje, serve de apoio à crescente indústria turística do Estado. O roteiro mais comum é o deserto do Jalapão, destino preferencial de ecoturistas do Brasil e de todas as partes do mundo. Formado por chapadões de arenito intercalados por alguns "oásis" de vegetação, o Jalapão tem um visual dos mais peculiares. Encontros com emas e tamanduás não são raros na rotina de quem se aventura no lugar.

As redes hoteleiras encontram o Norte
Região vai receber R$ 150 milhões em novos empreendimentos até 2007
A Região Norte está, finalmente, entrando no radar dos investidores no setor de turismo. Pelo menos R$ 150 milhões já estão reservados apenas para o setor hoteleiro até 2007, de acordo com informações do Mapa dos Investimentos do Ministério do Turismo. Os 11 novos empreendimentos adicionarão 1,6 mil novas acomodações ao parque atual. O Amazonas é o Estado contemplado com mais projetos: cinco ao todo, três deles em Manaus. A seguir vem o Pará e Rondônia, ambos com dois.
A onda de investimentos beneficia também endereços menos badalados. É o caso do município de Novo Airão, a 115 quilômetros de Manaus. Ali serão construídos dois novos hotéis, com investimentos somados de R$ 52 milhões. O mais expressivo é o Hilton Amazon Eco Lodge, que receberá R$ 40 milhões. O hotel, com 196 apartamentos, tem como público-alvo os turistas estrangeiros interessados em visitar o Parque Nacional do Jaú, o maior parque de floresta tropical do mundo, e o arquipélago das Anavilhanas, formado por 400 ilhas fluviais. No ano passado, o Amazonas recebeu 40 mil visitantes de outros países. Em primeiro lugar, aparecem os norte-americanos, com 22% do total.
Serão contempladas também com investimentos Palmas (TO) e Macapá (AP). O francês Accor é o grupo do setor que deverá operar o maior número de novos hotéis: cinco, em cinco cidades diferentes (Belém, Palmas, Porto Velho, Novo Airão e Macapá). A seguir vem o grupo Atlantica Hotels, com três unidades em Manaus e uma em Porto Velho. Embora ainda não esteja contabilizado no Mapa dos Investimentos do Ministério do Turismo, um projeto em gestação no Pará deverá se destacar pelo seu porte, sem similar até hoje na Região: R$ 500 milhões.
Trata-se do Parque Amazônia, que prevê a construção do maior parque de ecoturismo do mundo, no município de Marituba, próximo a Belém. Construído numa área de 7,3 mil hectares ocupados por uma antiga fazenda da fabricante de pneus Pirelli adquirida pelo governo paraense em 1997, o empreendimento pretende atrair novas redes hoteleiras ao Estado.
À primeira vista, deverá conseguir: no primeiro semestre deste ano, um grupo norte-americano procurou o presidente da Paratur, Adenauer Góes, em busca de detalhes do projeto. "Ainda não colocamos o parque na vitrine", diz Góes. "Mas a sondagem do mercado demonstra um grande interesse."

A aventura e o conforto fazem a diferença em cruzeiro fluvial
Com o navio Grand Amazon, a Iberostar investe no turismo de luxo na Amazônia
Liége Albuquerque
MANAUS - Competindo com mais de 200 barcos regionais, que fazem passeios pelos Rios Amazonas, Negro e Solimões, o navio Grand Amazon, da empresa espanhola Iberostar, foi lançado, em maio, para servir a um público que não tinha uma opção: a do cinco estrelas flutuante.
Construído em um estaleiro de Manaus, o Grand Amazon custou R$ 30 milhões ao Iberostar, um grupo presente em 24 países, com faturamento anual de 2,2 bilhões. "Sempre quis conhecer a Amazônia, mas não em um barco sem os confortos de hotéis de luxo", afirma o dono do restaurante Fellini, do Rio de Janeiro, Nélson Fellini, de 49 anos, que embarcou no dia 4 de setembro para uma viagem de cinco dias. Em seu 19o cruzeiro pelo mundo, o empresário quer ficar longe dos mosquitos e perto do ar-condicionado.
De acordo com Orlando Giglio, diretor comercial do Iberostar no Brasil, a maioria dos turistas é estrangeira. Dos 40 mil visitantes do exterior que estiveram no Amazonas, no ano passado, 74% se declararam atraídos pela selva, justamente a principal atração das viagens do Grand Amazon. O barco também é usado por grandes empresas. Em junho, a Coca-Cola levou 150 executivos da matriz, em Atlanta, para participar do Festival de Parintins, a maior festa folclórica regional.
São 85 metros de comprimento de conforto. O Grand Amazon conta com biblioteca, sala de massagem, academia, loja de souvenirs , discoteca, auditório com 150 lugares e um restaurante, o Kuarup. As cabines, 72 no total, têm 23 metros quadrados de área. Decoradas com motivos indígenas, todas dispõem de varanda, televisão, camas king size, frigobar abastecido, um banheiro espaçoso e o indispensável ar-condicionado.
Há dois roteiros básicos: um, de três dias, pelos Rios Solimões e Amazonas. O segundo, de quatro dias, percorre o Rio Negro. Há, ainda, a possibilidade de juntar os dois roteiros, ampliando a viagem para uma semana.

Acre começa a ganhar suas primeiras pousadas de selva
Aldeias e seringais passam a figurar no roteiro turístico do Estado, repetindo um fenômeno já consolidado no Amazonas
João Maurício Rosa
RIO BRANCO - De olho nos turistas estrangeiros que visitam Machu Picchu, no vizinho Peru, o governo do Acre está investindo R$ 1,1 milhão na construção de três pousadas ecológicas nos seringais Bom Destino e Cachoeira e na aldeia Ashaninka. As duas primeiras já estão funcionando. A Bom Destino está instalada na sede de um seringal sagrado para os acreanos. Foi ali que o coronel Plácido de Castro instalou o quartel-general de seu exército de seringueiros que iria travar a última batalha contra os bolivianos para anexar o território do Acre ao Brasil, em 24 de janeiro de 1904.
Localizada às margens do Rio Acre, no município de Porto Acre, a pousada dispõe de infra-estrutura para hospedar até 52 turistas em seis chalés e dois dormitórios comunitários. Conta com energia solar e uma torre de 24 metros de altura para telefonia fixa.
A chegada dos hotéis de selva ao Acre repete um movimento já ocorrido nos arredores em Manaus nos últimos dez anos.
Empreendimentos como o Ariaú Amazon Towers, o Acajatuba Jungle Lodge e o Tiwa Resort, todos nas cercanias da capital amazonense, atraem turistas interessados em ter um contato mais próximo com a floresta. Sofisticados, esses hotéis oferecem instalações dignas de hotéis cinco estrelas.
Ainda não é o caso das opções de hospedagem na selva no Acre. Os chalés da Bom Destino, por exemplo, contam com aparelhos de ar-condicionado, frigobar, televisor, telefone e ducha quente, além do serviço de quarto até 22 horas, mas estão longe de ser luxuosos. Já a Pousada Ashaninka, da aldeia homônima, está localizada no município de Marechal Thaumaturgo, no Vale do Juruá, cujo acesso só pode ser feito de barco ou avião. Além de viver o cotidiano dos índios e seus rituais, os turistas podem conhecer parte do Parque Nacional da Serra do Divisor.
A Pousada Cachoeira, prestes a ser inaugurada, foi construída no Seringal Cachoeira, em Xapuri, a 180 quilômetros de Rio Branco, última morada do líder seringueiro e ambientalista Chico Mendes e onde ainda vivem seus parentes.
A Cachoeira será a terceira pousada aberta em Xapuri nos últimos anos. Uma de suas concorrentes é a Pousada Villa Verde, do italiano Michele Vattollo, mais conhecido como Miguel.
Nascido na região de Udine, Vattollo veio parar em Xapuri depois de rodar por cerca de 90 países. O negócio é tocado com a ajuda da mulher e cinco empregados. Vattollo é uma espécie de faz-tudo, de gerente do negócio a chefe de cozinha. A especialidade do restaurante? Massas, naturalmente.
Seus clientes são viajantes que se dirigem à Zona Franca da cidade boliviana de Cobija, a 40 quilômetros de Xapuri, além, é claro, de estudantes e pesquisadores que vão prestar suas homenagens a Chico Mendes.

OESP, 02/10/2005, Novo mapa do Brasil, p. H1-H14

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