VOLTAR

Travamento ambiental

OESP, Economia, p.B2
Autor: MING, Celso
10 de Jul de 2004

Travamento ambiental
A sociedade brasileira precisa decidir que limites devem prevalecer na preservação ambiental. Como andam as coisas, nada mais se poderá fazer no País, porque sempre algum impacto ambiental haverá de existir.
Relatório da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) revela que, de um total de 48 usinas que deveriam entrar em operação de 2004 a 2010, para acrescentar ao parque energético brasileiro potência equivalente à de uma Itaipu (12,7 mil MW), nada menos que 20 (3,1 mil MW) vêm enfrentando problemas de licenciamento ambiental. E, no entanto, a energia hidrelétrica está entre as menos poluidoras.
Alguns casos ilustram o problema. Em 12 de julho de 2002, a Aneel licitou a construção das usinas de Caçu (65 MW), Barra dos Coqueiros (90 MW), Salto (108 MW), Olho D'Água (33 MW) e Salto do Rio Verdinho (93 MW), a serem construídas em afluentes do Rio Paranaíba, no sul de Goiás.
Dois anos depois, onde deveriam estar sendo construídas as barragens não há sinal de canteiro de obras, não há máquinas nem acampamento de barrageiros.
As obras não saíram do papel por falta de licenciamento ambiental.
O Ministério Público obteve da Justiça sentença liminar que suspendeu as licitações, sob argumento de que deveriam apresentar Estudo de Impacto Ambiental (EIA-Rima) não apenas para os rios sobre os quais as usinas seriam construídas, como foi feito, mas para toda a Bacia do Paranaíba.
Atrasos - Esse caso dá uma idéia do quadro de incertezas. "É uma situação que impede previsões. Antes de passar por todas as etapas do licenciamento, não há como avaliar os custos da construção de uma usina", queixa-se o advogado ambientalista Werner Grau, da Pinheiro Neto Advogados.
O licenciamento ambiental tem três etapas: licença prévia, que atesta a viabilidade ambiental do empreendimento; licença de instalação, que permite o início das obras; e licença de operação, que autoriza o enchimento do lago.
A Usina Sérgio Motta, antiga Porto Primavera, no Rio Paraná, teve seu início de operação atrasado em 10 meses por força de ações na Justiça interpostas pelo Ministério Público de São Paulo e pelo governo de Mato Grosso do Sul.
Alegavam que a Cesp, responsável pela construção, não cumpriria os compromissos estabelecidos no EIA-Rima destinados a compensar por danos ambientais. Entre eles estão o pagamento de indenizações às famílias que perderam terras e o plantio de árvores para compensar a inundação de florestas.
"O Ministério Público tem agido como se fosse partido político radical, para o qual a questão se resume a conflitos entre os defensores da natureza e as grandes corporações", diz o advogado ambientalista Antonio Fernando Pinheiro Pedro. O presidente-executivo do Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável (CEBDS), Fernando Almeida, denuncia a falta de racionalidade na metodologia do EIA-Rima.
Agilidade - A construção da Usina de Estreito, uma grande hidrelétrica, de 1.087 MW, no rio Tocantins, está atrasada em dois anos porque o Ibama ainda não concedeu o licenciamento. Em outubro do ano passado, dois anos após o encaminhamento do EIA-Rima, a entidade solicitou a realização de mais duas campanhas de fauna, alegando que as duas primeiras não identificaram claramente as espécies existentes na área a ser inundada. "O Ibama também exigiu mais cinco audiências públicas para discutir o projeto além das cinco que já haviam sido realizadas", lembra o presidente do Consórcio Estreito, Vitor Paranhos.
O presidente da Associação Brasileira da Infra-Estrutura e Indústrias de Base (Abdib), Paulo Godoy, reconhece que algumas medidas têm sido tomadas para garantir agilidade e reduzir riscos. Uma delas está incorporada ao novo marco regulatório do setor energético. É a decisão de que as próximas hidrelétricas sejam licitadas com licenciamento ambiental já concedido. Mas os investidores querem mais. Querem reduzir de 20 meses para 8 meses o prazo máximo para que os organismos ambientais se pronunciem sobre os pedidos de licenciamento.
O aumento da oferta de energia que, em última análise, poderá significar a diferença entre garantir o crescimento sustentado do País e o risco de uma nova crise de abastecimento não deve sobrepor-se à preocupação com o meio ambiente. Mas é preciso definir com mais clareza até que ponto essa preocupação terá de prevalecer sobre os investimentos.
Com Danilo Vivan

OESP, 10/07/2004, p. B2 (Economia - Celso Ming)

As notícias aqui publicadas são pesquisadas diariamente em diferentes fontes e transcritas tal qual apresentadas em seu canal de origem. O Instituto Socioambiental não se responsabiliza pelas opiniões ou erros publicados nestes textos. Caso você encontre alguma inconsistência nas notícias, por favor, entre em contato diretamente com a fonte.