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Autor: Juliana Radler e Victor Pires
12 de Set de 2017
Foi publicada, ontem (11/09), no Diário Oficial da União (DOU), a portaria que declara a posse permanente da Terra Indígena (TI) Jurubaxi-Téa para os povos Arapaso, Baniwa, Baré, Desana, Nadöb, Kuripaco, Pira-Tapuya, Tariana, Tikuna e Tukano. A TI fica nos municípios de Barcelos e Santa Isabel do Rio Negro, no Médio Rio Negro (AM).
Assinada pelo ministro da Justiça, Torquato Jardim, a portaria representa uma grande vitória para os povos indígenas do Rio Negro, que vêm lutando pela demarcação da área há mais de uma década. "É uma obrigação do Estado brasileiro reconhecer os direitos originários dos povos indígenas. Precisamos continuar lutando para acelerar os processos de demarcação na região", ressalta Marivelton Barroso Baré, presidente da Federação das Organizações Indígenas do Rio Negro (Foirn).
A declaração de posse ocorreu sem que houvesse nenhuma contestação ao relatório de identificação da área. Para Barroso, essa conquista deve estimular o governo a acelerar o processo de reconhecimento de outras áreas indígenas em Barcelos. "Os povos indígenas dessa região precisam ter suas terras protegidas e reconhecidas para ter o seu direito à consulta respeitado. E não ficar mais sofrendo com invasão e todo tipo de atividade desordenada que ocorre sem nenhum monitoramento", enfatiza.
Por causa da morosidade do processo de reconhecimento da Jurubaxi-Téa, a Foirn solicitou ao Ministério Público Federal (MPF), em 2011, que acompanhasse o processo de demarcação das TIs do Médio e Baixo Rio Negro. Atendendo à reivindicação da Foirn, o MPF judicializou o processo de demarcação das TIs de Barcelos e Santa Isabel, em 2014, demandando da Funai a conclusão em um prazo de dois anos.
"A assinatura da portaria declaratória vai permitir uma garantia para todos os entes presentes na área, não só as organizações e comunidades indígenas, como os municípios adjacentes à TI ou a programação de desenvolvimento econômico, social, cultural em excelentes condições, porque cada órgão, cada entidade, vai ter o conhecimento de qual é a sua área de responsabilidade", afirma o presidente da Fundação Nacional do Índio (Funai), Franklimberg de Freitas.
A antropóloga Lúcia Van Velthem, coordenadora do Grupo de Trabalho responsável pelo Relatório Circunstanciado de Identificação e Delimitação (RCID) da TI, comemora o avanço na demarcação. Ela lembra, porém, que o governo precisa cumprir ainda duas etapas para a finalização do processo: a demarcação física da terra e a homologação. "Ainda tem dois percursos bastante grandes e difíceis", diz.
Com a declaração da TI Jurubaxi-Téa, passa para oito o número das TIs no Rio Negro, que formam um mosaico de quase 13 milhões de hectares protegidos. Juntas, elas concentram população de mais de 30 mil pessoas. As TIs da região são: Alto Rio Negro, Médio Rio Negro 1, Médio Rio Negro 2, Balaio, Cué- Cué/Marabitanas, Rio Apapóris, Rio Tea e, agora, Jurubaxi-Téa.
Sustentabilidade e gestão territorial na TI Jurubaxi-Téa
O reconhecimento da Jurubaxi-Téa chega para coroar atividades sustentáveis que vêm sendo implementadas pelos índios na região. Com o intuito de alavancar alternativas econômicas sustentáveis e relacionadas à cultura local, as comunidades avançaram nas discussões sobre gestão ambiental e territorial, apesar da demora no processo de demarcação. A Associação das Comunidades Indígenas do Médio Rio Negro (ACIMRN) e a Foirn vêm promovendo diversas iniciativas, como, por exemplo, a pesquisa que levou o Sistema Agrícola Tradicional do Rio Negro a ser reconhecido como patrimônio da cultura brasileira pelo IPHAN/Minc em 2010.
Carlos Nery Pira-Tapuya, presidente da ACIMRN, destaca que esse é um momento de concretização de antigas reivindicações do movimento indígena. "As ameaças e o desrespeito com as comunidades ainda são frequentes. Acreditamos que a demarcação possa frear as invasões e assim as comunidades possam trabalhar a gestão do seu próprio território", comemora a liderança.
Turismo de pesca esportiva
A TI Jurubaxi-Téa também é cenário de um projeto inovador de turismo de pesca esportiva de base comunitária, implantado com a total participação das comunidades indígenas. Com a aprovação de planos de manejo e a parceria inédita entre Funai, Ibama, ISA e prefeitura de Santa Isabel do Rio Negro, a atividade turística traz uma nova perspectiva de geração de renda para os povos indígenas da região.
A declaração de posse permanente da TI traz clareza e segurança jurídica para todos os envolvidos no processo de ordenamento pesqueiro, de acordo com os planos de manejo formulados pelas comunidades e técnicos parceiros. A pesca esportiva será fiscalizada por vigilantes indígenas capacitados, orientados pela Funai e pela Secretaria Municipal de Meio Ambiente a partir do plano territorial aprovado. O recurso oriundo da atividade irá viabilizar a fiscalização, a melhoria da estrutura de comunicação entre as comunidades e o acompanhamento da atividade com monitores indígenas treinados conforme programa de monitoramento desenvolvido pelo Ibama.
Morosidade nas demarcações
Apesar da publicação da portaria declaratória, a gestão Temer é marcada pela morosidade no reconhecimento de territórios indígenas e por ataques recorrentes aos direitos dos povos originários. Em um ano e quatro meses de administração, Temer publicou apenas duas portarias declaratórias e nenhum decreto de homologação - uma das últimas e a principal etapa do processo demarcatório. Desde a redemocratização, este é o governo com pior desempenho para os direitos indígenas.
"A declaração dos limites da TI Jurubaxi-Téa eleva o desempenho do ministro Torquato Jardim para um pouco acima do zero, o que já é alguma coisa no governo Temer, que ainda não homologou qualquer demarcação até agora", avalia Márcio Santilli, sócio fundador do ISA.
O presidente da Funai diz que existe um esforço tanto do órgão indigenista quanto do MJ no sentido de avançar com a demarcação. "As demais terras indígenas do Alto Rio Negro, da Amazônia como um todo, estão em processo de estudo para sua demarcação", garante.
O outro território declarado pelo MJ, na semana passada, é a TI Tapeba, que fica na zona metropolitana de Fortaleza (CE). A declaração só aconteceu depois de acordo com uma família influente na política local, o que resultou na retirada de uma área de 544 hectares, cerca de 10% da extensão total prevista originalmente no relatório de identificação da Fundação Nacional do Índio (Funai).
Além da demora no avanço das demarcações, o MJ anulou a portaria declaratória que reconhecia 532 hectares de posse indígena na TI Jaraguá, em São Paulo. O ato atende a pressões de atores interessados no território, principalmente o governo paulista, que gere o Parque Estadual do Jaraguá, sobreposto à área da TI. Assim, os Guarani que lá vivem voltam a ficar confinados à menor TI do país, com área de 1,7 hectares, aproximadamente dois campos de futebol.
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