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Soja invade a Amazônia

Estação Vida. org
15 de Out de 2004

A soja, que desperta a ira dos ambientalistas pela esmagadora expansão de suas variedades transgênicas, soma uma nova acusação: pressionar as florestas amazônicas brasileiras. Embora os cultivos dessa oleaginosa não substituam diretamente áreas de mata da Amazônia, sua expansão em zonas próximas eleva o preço da terra e "empurra" outras atividades menos rentáveis que avançam sobre a mata, como a pecuária, explicou Roberto Smeraldi, coordenador da organização não-governamental Amigos da Terra-Amazônia Brasileira.

Além disso, o cultivo da soja, atualmente o principal produto de exportação brasileiro, progride acompanhado pela criação de infra-estrutura para transporte, que é um grande vetor de desmatamento. A Amazônia perde a cada ano 25 mil quilômetros quadrados de florestas. A soja entrou no Brasil nos anos 60 pelo extremo sul do país, onde o clima mais se aproxima do da China, seu país de origem. Em seguida, seguiu para o norte, adaptando-se ao clima tropical graças a variedades desenvolvidas pela Embrapa - Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária, um conjunto de 40 centros especializados que teve papel decisivo no desenvolvimento agrícola do país nas últimas três décadas.

As ongs denunciam a expansão do cultivo de soja na área de transição entre o cerrado e a floresta amazônica, cujo desmatamento afeta gravemente o clima e a biodiversidade dos dois biomas. Há um "crescimento explosivo" da soja em alguns pontos da Amazônia, como a região de Santarém, no oeste do Estado do Pará, afirmou Ane Alencar, pesquisadora do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia. Santarém, cercada de florestas secundárias, encontra-se em áreas desmatadas há três séculos, perto de um porto exportador de soja, e é um "bolsão de seca" com a topografia ideal para a mecanização, ressaltou.

A área plantada ainda é pequena, perto de 30 mil hectares no ano passado, mas a previsão é de que se somarão outros 20 mil este ano, "invadindo florestas nativas, e não sabemos que impacto terá o monocultivo no ecossistema", advertiu Alencar. A Amigos da Terra aponta outras oito áreas de expansão dentro da Amazônia ou em suas fronteiras, em geral em regiões de savana, que ameaçam a floresta. Além disso, a exportação de soja valorizou a estrada que liga Cuiabá, capital do Estado do Mato Grosso, a Santarém, e isso estimulou a ocupação ilegal de terras públicas, cortes para confirmar a posse, com expulsão de moradores.

Entretanto, Homero Pereira, presidente da Federação da Agricultura do Mato Grosso, nega que a soja cause prejuízos. E vai além, afirmando que os que a produzem são "os maiores ambientalistas" e fazem "conservação na prática", porque a oleaginosa cresce em áreas antes desmatadas ou de pastagem degradada, e fixa o nitrogênio, fertilizando a terra. Além disso, quase todos os produtores praticam a "semeadura direta", sem remover a terra, uma técnica desenvolvida no Brasil que reduz a erosão e retém umidade. A soja "não é monocultivo", porque se alterna com o algodão, o milho e o arroz, afirma Pereira.

O Estado do Mato Grosso, onde ao norte começam as florestas amazônicas, é hoje o maior produtor de soja no Brasil, tendo colhido 15 milhões de toneladas este ano, 30% do total nacional. Há dez anos, produziu apenas cinco milhões de toneladas. Desde os anos 80, o cultivo de soja também se expande de forma acelerada no cerrado, a savana com árvores baixas que ocupa uma extensa área central do Brasil e algumas "ilhas" na Amazônia. Devido às suas terras pouco férteis e ácidas, demorou para se converter em uma próspera fronteira agrícola. Hoje, é uma apreciada região, pois seu perfil produtivo mudou graças à aplicação de fertilizantes. O cerrado oferece a vantagem de ter "períodos bem definidos de chuva" e uma topografia que permite a mecanização, explicou ao Terramérica Paulo Roberto Galerani, pesquisador do centro da Embrapa dedicado à soja, com sede em Londrina.

A "vocação do cerrado" e o clima favorável permitem a todo o Mato Grosso colher "de 3,1 mil a 3,2 mil quilos de soja por hectare", uma produtividade superior à média nacional de 1,5 mil quilos, observou o presidente da Federação da Agricultura. Atualmente o cultivo ocupa cinco milhões de hectares, e essa área pode duplicar "somente com a recuperação de pastagens degradadas", de modo que não é necessário avançar sobre a Amazônia, "onde a soja não prospera" devido ao "solo fraco" e ao excesso de umidade, ressaltou Pereira.

Geraldo Eugênio de França, superintendente de Pesquisa e Desenvolvimento da Embrapa, afirmou que o Brasil pode usar racionalmente cerca de 60 milhões de hectares em degradação, duplicando a área semeada. Assim, seria possível dobrar a produção de alimentos, fibras e outros produtos agrícolas, sem desmatar a Amazônia, assegurou. A Embrapa é "o braço do desenvolvimento sustentável", acrescentou, e rejeitou tanto o "agronegócio desmedido", quanto o "ambientalismo radical".

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