VOLTAR

Sobre a responsabilidade socioambiental dos bancos

Valor Econômico, Opinião, p. A12
Autor: FUJIHARA, Marco; PARANHOS, Marcela
12 de Mai de 2014

Sobre a responsabilidade socioambiental dos bancos

Por Marco Fujihara e Marcela Paranhos

O Banco Central anunciou em março uma nova regulamentação para instituições financeiras que estabelece a responsabilidade socioambiental como parte do processo dessas instituições. A gestão dos impactos socioambientais não deve ser vista como um custo adicional, mas como um instrumento eficiente de redução dos riscos e elevação da previsibilidade dos retornos das instituições financeiras. É uma tendência global que está prestes a sair do papel no Brasil.
A nova regulamentação, cuja data de publicação ainda não foi divulgada, está em discussão desde a Rio+20, em 2012, quando o Banco Central anunciou a aprovação de audiência pública de dois atos normativos que tratavam respectivamente de: 1- estabelecimento de política de responsabilidade socioambiental por instituições financeiras; e 2- elaboração e divulgação de relatório de responsabilidade socioambiental. No mesmo ano, a Corporação Financeira Internacional (IFC, a sigla em inglês) organizou um fórum na China, o International Green Credit Forum, para discutir as iniciativas regulatórias em países emergentes, os princípios do Equador, entre outros instrumentos de promoção da responsabilidade socioambiental por meio das instituições financeiras. O Banco Central participa das discussões relativas a práticas de sustentabilidade no ambiente financeiro desde 1995.
Recentemente, a Febraban informou que está preocupada com essa nova regulamentação, visto que os grandes bancos enxergam um potencial encarecimento do crédito e redução da oferta. As bases utilizadas pela Febraban para tais afirmativas são contestáveis, pois a adoção de uma politica e instrumentos de responsabilidade socioambiental são direcionados primeiramente à redução dos riscos para as próprias instituições. Portanto, mesmo que tenham como reflexo de curto prazo uma elevação dos custos relacionados aos processos de concessão de crédito e investimento, no médio e longo prazo é esperada uma redução significativa dos riscos de crédito e aumento da confiança no fluxo de caixa projetado para os investimentos.
No caso, por exemplo, de um investimento em uma indústria, localizada em uma área adjacente a uma reserva indígena, que tenha parte do investimento proveniente de uma linha de crédito em um banco comercial e outra parte proveniente de recursos de um fundo de investimento. Partindo da premissa de que as instituições financeiras não tenham realizado uma avaliação sobre a responsabilidade socioambiental do empreendimento, o mesmo pode apresentar riscos relacionados à reclamação de direitos indígenas ou interferência indireta em áreas protegidas que impactariam, na melhor das hipóteses, no prazo do projeto. Ou seja, o tempo necessário para contornar as situações imprevistas. Esse impacto no cronograma de implantação tem reflexos diretos no início da produção, ampliando o período necessário para geração de receitas, influenciando a capacidade de amortização da dívida, o "pay back" e taxas de retorno aos acionistas e investidores.
Trata-se de um exemplo básico e hipotético, mas que pode ser pensado em quase todos os setores da economia, como agronegócio, infraestrutura, óleo e gás, mineração, florestal, energia elétrica, indústria química, indústria manufatureira e serviços. Os impactos, para as instituições financeiras, decorrentes de fatores socioambientais podem afetar também a lucratividade, as garantias das operações financeiras como recebíveis e a reputação dessas instituições, influenciando no resultado econômico.
Quando analisado sob a perspectiva de redução de riscos, o gerenciamento da responsabilidade socioambiental deixa de ser um fator de encarecimento do crédito e apresenta-se como um eficaz instrumento de redução dos riscos e elevação da previsibilidade dos retornos dessas instituições.
O IFC estabeleceu seu quadro de referência em sustentabilidade em 2006 e desde então investe na construção e disseminação de conhecimento entre instituições financeiras ao redor do mundo. Em 2007, lançou um estudo sobre as oportunidades socioambientais em mercados emergentes. Já naquela época dois bancos comerciais brasileiros foram mencionados entre os que tinham as melhores práticas.
A tendência global pela adoção dos princípios defendidos pelo IFC se intensificou a partir de 2012, quando esses princípios e boas práticas observadas foram consolidados em uma revisão que trouxe a responsabilidade socioambiental para o centro das discussões relativas à gestão de riscos. Os conceitos e ferramentas recomendados pelo IFC para gestão socioambiental foram consolidados em um portal que pretende ser uma referência para as instituições financeiras que desejam obter informações práticas sobre a importância do gerenciamento do risco socioambiental e sua implantação.
Analisando as vantagens da adoção de sistemas baseados em responsabilidade socioambiental, as instituições financeiras brasileiras têm a oportunidade de ampliar sua participação de mercado por meio de novas linhas, reduzir os riscos de seu portfólio, melhorar a reputação da instituição e ampliar o acesso a linhas de financiamento internacional. Segundo o próprio IFC, os bancos estariam deixando uma postura defensiva, onde a gestão dos impactos socioambientais é encarada como um custo adicional, e direcionando seu crescimento para um sistema sustentável a partir de vantagens colocadas pelo aproveitamento das novas demandas do mercado.
Atualmente no Brasil algumas instituições financeiras já são demandadas para a implantação de sistemas de gerenciamento socioambiental de suas operações, quando requerem recursos de outras instituições no âmbito internacional, principalmente as sediadas nos Estados Unidos e na Europa, como é o caso de bancos de fomento e desenvolvimento. Podemos citar exemplos como o Banco Mundial, o DEG (braço de investimentos em private equity do banco de desenvolvimento alemão), o próprio IFC e outros.

Marco Antonio Fujihara é diretor da Key Associados e consultor do Banco Mundial.
Marcela Paranhos é economista e consultora sênior da Key Associados.

Valor Econômico, 12/05/2014, Opinião, p. A12

http://www.valor.com.br/opiniao/3543858/sobre-responsabilidade-socioamb…

As notícias aqui publicadas são pesquisadas diariamente em diferentes fontes e transcritas tal qual apresentadas em seu canal de origem. O Instituto Socioambiental não se responsabiliza pelas opiniões ou erros publicados nestes textos. Caso você encontre alguma inconsistência nas notícias, por favor, entre em contato diretamente com a fonte.