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São 273 tipos de passarinhos. Eles cantam por São Paulo

OESP, Cidades, p. C8
31 de Mar de 2004

São 273 tipos de passarinhos. Eles cantam por São Paulo
Biólogo e fotógrafo acabam de lançar o guia 'Aves da Grande São Paulo'

Mauro Mug

A jacutinga desapareceu de vez. A saíra-lagarta e o anambé-branco quase não são mais vistos na área urbana. Em compensação, o pica-pau-do-campo, a pomba de asa branca e o maracanã-nobre, que não são nativos daqui, invadiram a cidade. Hoje, São Paulo abriga 273 espécies de pássaros, que podem ser vistos nos bairros e parques mais arborizados e nos arredores das reservas florestais. O bem-te-vi, o periquito e o sabiá-laranjeira são as espécies mais comuns.
A alta diversidade de aves foi constatada durante dez anos de observação pelo biólogo e professor de Ecologia da Universidade de São Paulo (USP) Pedro Develey, de 35 anos, e pelo fotógrafo Edson Endrigo, de 37, que há 8 se especializou no registro de aves.
Esse levantamento consta do guia de campo Aves da Grande São Paulo, recém-lançado em homenagem aos 450 anos da capital. "A idéia era fazer um folheto com a 60 espécies mais comuns na cidade e distribuí-lo aos freqüentadores do Ibirapuera e do campus da USP", diz Develey. "Depois prosperou para 100, até que, há dois anos, decidimos acrescentar as aves que vivem nas matas do entorno de São Paulo."
Além de fotos coloridas, o guia contém informações em português e inglês sobre as espécies. "A publicação é extremamente oportuna, pois mostra à população que o ambiente urbano também pode ser rico em vida silvestre", elogia a professora Elizabeth Höfling, do Instituto de Biociências da USP.
"O guia não é destinado só ao público acadêmico ou estudante de biologia, mas à dona de casa e às pessoas que fazem caminhada pela cidade, para entenderem que as aves fazem parte do cotidiano de suas vidas", destaca o biólogo Develey.
Ele explica que, durante a urbanização, houve uma alteração drástica, com quase toda a vegetação original - florestas, campos e ambientes aquáticos - substituída por outra, mais exótica. "Muitas aves desapareceram ou se tornaram raras. Outras foram capazes de colonizar ou se adaptar às novas condições."
Munido de binóculo e gravador, Develey percorreu, nos últimos dez anos, bairros e parques para identificar as aves. A variedade de espécies é explicada pela heterogeneidade de hábitats, que permitem a vida de aves com exigências ecológicas distintas. Exemplo disso é a mata do Parque da Cantareira, na zona norte, que abriga a tesourinha-da-mata, já em extinção.
O mesmo acontece no Morro Grande, região do Alto Cotia, zona sul, e nas áreas próximas às Represas Billings e Guarapiranga. "As matas e vegetações desses locais foram mantidas para preservar os mananciais. A preocupação era com a água, mas por tabela acabou contribuindo para abrigar as aves."
Volta - No fim dos anos 80, com a ampliação da arborização urbana, oferecendo frutos e flores e atraindo insetos, os pássaros voltaram. "No centro expandido há áreas abertas, como os gramados do Ibirapuera e do campus da USP, no Butantã", cita. "E também ambientes aquáticos, como os brejos do Parque Ecológico do Tietê, as margens dos Rios Pinheiros e Tietê e bairros arborizados, que fornecem alimento e abrigo."
Há também casos como o do maracanã-nobre. Originária da região amazônica e do Centro-Oeste do País, essa ave, semelhante a um papagaio, pode ser vista em casais ou, fora da época reprodutiva, em bandos com até 20 pássaros.
"Essa espécie se colonizou recentemente na cidade, provavelmente por causa da soltura ou fuga de gaiolas."
Os periquitos, do Brasil central, podem ser encontrados até em bairros pouco arborizados. São vistos voando em bandos na Cidade Universitária, no Parque D. Pedro II e Pompéia.
As matas nos arredores de São Paulo explicam a ocorrência eventual de aves florestais na cidade. Em julho do ano passado, o professor ficou surpreso ao ver pequenos bandos de cuiú-cuiús sobrevoando o campus da USP. "Essa ave vive em matas bem preservadas, no alto das serras. Mas no inverno aparecem por aqui, para comer sementes de paineira."
Há uma semana, outra surpresa. Perto do lago ao lado da Avenida Miguel Stefano, Água Funda, um tranqüilo carão - ave aquática do Pantanal - procurava, com seu bico longo, insetos no meio da grama. Minutos depois chegou à euforia, ao ver uma fêmea se aproximar, com cinco filhotes.
Colhereiros, também do Pantanal, podem ser vistos no Parque Ecológico do Tietê. Nas margens do Tietê e do Pinheiros, além das garças, há gaviões carcará, e, no Parque do Trianon, na Avenida Paulista, pica-paus da cabeça amarela.
"O nosso guia nem bem acabou de sair e já está desatualizado", disse Develey há poucos dias em telefonema a Endrigo, que estava no Nordeste. "Acabei de ver da varanda do meu apartamento (na Rua Cotoxó, Pompéia) o sobrevôo de um gavião de cauda curta, que não consta do guia." O livro custa R$ 50 e o site do fotógrafo é o www.avesfoto.com.br.
Lévi-Strauss se emociona com 'Piratininga'
Lançado em fevereiro, o livro São Paulo de Piratininga: de pouso de tropas a metrópole fez grande sucesso. Com 270 imagens, tiradas entre 1860 e 1930, mostra a transformação da cidade.
O editor do livro, o jornalista Ruy Mesquita Filho, enviou um exemplar de presente ao antropólogo francês Claude Lévi-Strauss, de 95 anos, que viveu no Brasil em 1935 e 1938, deu aulas na USP e ficou "apaixonado" pelas fotos.
Sua última visita ao País foi em 1985. Em agradecimento, enviou uma carta ao jornalista:
"Acabo de receber sua carta de 6 de fevereiro, juntamente com a obra que o sr. teve a gentileza de me enviar. O livro me deixou imediatamente apaixonado. As fotografias datam de épocas diversas, todas anteriores àquela em que eu vivi em São Paulo. Mas muitos aspectos antigos da cidade eram ainda visíveis no meu tempo, e eu os reconheci com profunda emoção, por que esta São Paulo de antanho me é muito querida, não só porque eu era jovem, então, mas também em lembrança da generosa acolhida que me foi dada, antes de mais nada por sua família.
Em nome desse passado, expresso, por seu intermédio, o meu reconhecimento e, agradecendo novamente o precioso presente, eu lhe peço, prezado sr., que receba os melhores votos do seu Claude Lévi-Strauss."

OESP, 31/03/2004, Cidades, p. C8

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