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Roraima tem quase três apagões por mês

OESP, Economia, p. B6
09 de Jul de 2017

Roraima tem quase três apagões por mês
Ameaçado pela crise na Venezuela, de onde importa 85% da energia, Estado é o único totalmente isolado do sistema elétrico brasileiro

Pablo Pereira, O Estado de São Paulo
08 Julho 2017 | 17h00

Enquanto o setor elétrico brasileiro discute um plano de privatização de hidrelétricas até 2019, com a abertura nesta semana de uma consulta pública pelo Ministério de Minas e Energia, o produtor rural Teotônio Vieira de Matos, dono de um laticínio em Cantá, município 100 quilômetros ao sul de Boa Vista, a capital de Roraima (RR), lamenta os apagões de até 84 horas que o impedem de fazer a ordenha de suas vacas. É que Roraima é o único Estado brasileiro que não é ligado ao Sistema Integrado Nacional (SIN) de energia e vive com seus 515 mil habitantes sob risco dos cortes de luz ameaçado pela atual crise política e econômica que assola o país vizinho.
O governo brasileiro importa da Venezuela 85% da energia consumida em Roraima pagando R$ 146 milhões (maio de 2016 a maio/2017). O Estado ainda tem de queimar R$ 1 bilhão por ano em óleo diesel com termoelétricas para tentar garantir o abastecimento comercial e doméstico. Segundo dados da Empresa de Pesquisas de Energia (EPE), do Ministério de Minas e Energia (MME), Roraima registrou 36 apagões em 2016 e já teve 17 cortes em 2017.
O MME reconhece os blecautes, mas registra somente 13 apagões no ano, ante 17 do período de janeiro a junho de 2016. "Houve uma redução de 20% nos cortes", informou o MME, explicando que as quedas demoravam em média 1h05 e agora têm duração (média) de 37 minutos. De acordo com o MME, entre 2015 e 2017, 90% das interrupções ocorreram na linha Brasil-Venezuela, sendo que em 2017 o linhão da barragem de El Guri foi responsável por 93% dos cortes.
Pelos dados da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), o tempo de duração das quedas de energia em Boa Vista, medido pelo indicador de qualidade DEC (Duração Equivalente de Interrupção por Unidade Consumidora), é o dobro do limite para a região. E o índice FEC (Frequência Equivalente de Interrupções por Unidade Consumidora), ou seja, a quantidade de cortes no sistema, também supera o limite tolerado. Entre maio de 2016 e maio deste ano, o consumidor de Boa Vista ficou 27 horas sem luz em 54 cortes de energia.
Outro indicador da baixa qualidade do fornecimento de energia no Estado é o ranking IASC, da própria Aneel. Ele mede a satisfação do consumidor com o serviço. Entre 101 empresas fornecedoras de energia no País, em 2016, a Eletronorte de Roraima, administradora da energia entregue pela estatal venezuelana Corpoelec, responsável pela geração na usina do Rio Caroni, ocupou a posição 85 do ranking de satisfação com nota 58,61. A primeira colocada foi a Cermissões, com nota 89,38.
Ainda de acordo com a avaliação de quem paga a conta de luz, Roraima também é dona da empresa que está em pior situação na lista, a CERR, que ficou na posição 101, com apenas 22 pontos. De tão ruim, a CERR teve a concessão cassada pela Aneel no ano passado e foi extinta em dezembro.
Com apenas uma das fases energizada na propriedade, o que o impede de usar equipamentos e o obriga a também ligar o gerador a diesel, o dono do laticínio contou que a crise de energia é um dos principais entraves à produção rural.
Abandono. "Essa situação aqui é muito difícil. Estamos abandonados", disse, por telefone. E acrescentou que, quando tem luz, "a oscilação ainda provoca a queima dos aparelhos, o que também é comum em Boa Vista", onde mora. Por causa dos cortes de energia elétrica, ele tem de meter a mão no bolso duas vezes: para pagar a conta de R$ 600, cobrada religiosa e mensalmente, com ou sem luz, e mais R$ 3 mil de diesel para alimentar um gerador na tentativa de evitar a perda do leite e dos queijos que fabrica.
O contrato de fornecimento de energia da Venezuela para o Brasil, assinado no governo de Fernando Henrique Cardoso, tem duração prevista de 20 anos, terminando, portanto, em 2021. O acordo prevê a transmissão de até 230 KW para abastecer Boa Vista, mas desde 2016 Roraima recebe 130 KW. Segundo o MME, o Brasil paga uma tarifa de R$ 150 por MWh da energia venezuelana.
Para atender à demanda, o jeito é torrar óleo diesel em termoelétricas, encarecendo o processo em até três vezes. Procurada para comentar o contrato de abastecimento via linhão de El Guri, a embaixada da Venezuela não respondeu aos pedidos de entrevista.

'É caso crítico, sob controle', diz Eletrobrás
Presidente da distribuidora argumentou a necessidade de atender a equipamentos federais de fronteira, como pelotões do Exército

Pablo Pereira, O Estado de São Paulo
08 Julho 2017 | 17h00

O presidente da Eletrobrás Distribuição em Roraima, Anselmo de Santana Brasil, disse ao Estado, por telefone, que Roraima tem situação "crítica" no abastecimento de energia. Ele argumentou a necessidade de atender, por exemplo, a equipamentos federais de fronteira, como pelotões do Exército. "Temos essa preocupação com a Venezuela", disse o presidente da distribuidora.
"É uma situação crítica sob controle", ponderou, acrescentando que a empresa está preparada para suprir eventuais desligamentos do sistema de El Guri. Segundo o dirigente, Roraima teve no ano 14 incidentes de falta de energia, "todos por motivos técnicos".
Sucuri. Ele lembrou que houve até um episódio de queda de energia por uma cobra que estava caçando pássaros nos fios e provocou o desligamento. "Foi próximo de Boa Vista, com uma sucuri", contou. Outros dois casos de queda de luz foram "de nossa responsabilidade mesmo", prosseguiu. As demais 11 ocorrências, segundo ele, foram provocadas por cortes na rede em Las Claritas, na Venezuela, onde passa o linhão de Guri, que vai até Boa Vista. "Há muita ocorrência de raios na região e as descargas desligam o sistema por segurança", alegou.
Brasil explicou que Roraima precisa de uma carga de 180 MW por dia e que a hidrelétrica venezuelana fornece 130 MW. O restante da demanda é atendido por geração termoelétrica em três estações principais - Floresta, Distrito e Monte Cristo, que completam o consumo exigido com mais 50 MW. O problema dessa geração a diesel é o custo. O gasto pode triplicar com uso do óleo no lugar da produção em hidrelétrica.

OESP, 09/07/2017, Economia, p. B6

http://economia.estadao.com.br/noticias/geral,roraima-tem-quase-3-apago…

http://www.estadao.com.br/noticias/geral,e-caso-critico-sob-controle-di…

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