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Refugiados "invadem" a Amazônia pela fronteira colombiana

FSP, Mundo, p. A19
05 de Mar de 2006

Refugiados "invadem" a Amazônia pela fronteira colombiana
Segundo órgão da ONU, são cerca de 4.000 pessoas sem proteção oficial, muitas fugindo das Farc

Sandra Silva

O número oficial de refugiados no Brasil é de 3.200 pessoas, que vivem principalmente nas cidades de São Paulo e Rio de Janeiro. Os africanos representam 75% desse total, mas um outro grupo que cresce a margem das estatísticas oficiais já supera esse número: são os colombianos, que vivem na região amazônica e entram livremente no país pela fronteira.
Uma missão do Alto Comissariado da ONU para Refugiados (Acnur), realizada no mês passado na Amazônia brasileira, constatou que apenas naquela região há cerca de 4.000 colombianos, vivendo sem qualquer documentação brasileira e fugindo da guerrilha das Farc (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia).
Com o apoio da Polícia Federal, a missão identificou ainda outros mil índios colombianos que também atravessaram a fronteira para viver com tribos irmãs no país. Em Tabatinga (AM), por exemplo, 50 índios da tribo Ticuna se arriscaram a vir para o Brasil para viver com brasileiros da etnia.
O padre Gonzalo Franco, que é representante no Brasil da Pastoral de Mobilidade Humana da Diocese do Alto Solimões, explica que, para fugir da Colômbia, eles utilizam uma rede de solidariedade ligada à Igreja Católica e têm Tabatinga como a principal porta de entrada.
A saída da Colômbia é por Letícia, na Amazônia colombiana. É da própria paróquia da cidade que veio a denúncia do crescimento expressivo no número de colombianos em busca de uma nova vida no Brasil.
Segundo o Acnur, famílias inteiras fogem da Colômbia. Muitas vezes, mulheres grávidas e crianças. O sustento vem de atividades informais. "Eles vivem sem nenhuma proteção oficial, apenas fazendo bicos e recebendo ajuda de famílias locais", afirmou um funcionário do Acnur que esteve na região.
A entrada no país não é complicada, já que não é exigido visto para colombianos. Para o Acnur, o problema é o fato de não procurarem ajuda e viverem ilegalmente. Para a igreja, o temor é o de que cresça a marginalidade na região pela falta de dinheiro dos recém-chegados.
Conexões
O padre Franco trabalha na integração à sociedade brasileira dos colombianos que fugiram das Farc. Na semana passada, por exemplo, estava envolvido com um grupo de 13 colombianos que iam para Manaus; na semana anterior, ajudou outras seis famílias que chegaram a Tabatinga, num total de 22 pessoas.
"Não temos nenhuma casa de abrigo oficial, e nosso trabalho está apenas começando, então procuramos famílias da igreja para hospedar esses colombianos. Eu recebo telefonemas de padres da Colômbia e começo a procurar casas, roupas, fogão e trabalho para os que vão chegar. Meu trabalho é acolher essas pessoas", disse o padre.
Além de Tabatinga, eles vivem em outras cidades na fronteira, como Benjamin Constant e Atalaia. Muitas vezes chegam sem dinheiro. Muitos são profissionais com curso superior que tiveram de abandonar suas casas e profissões por conta da guerrilha.
"Os que entram com pedido de refugiado têm de esperar meses por uma reposta", disse Franco. Sem dinheiro e com medo, os colombianos se recusam a conceder entrevistas. Contam apenas com a boa vontade dos amazonenses.
Franco conta algumas histórias, como a de uma família colombiana que teve de fugir do sítio onde morava por ter sido acusada pelos paramilitares de colaborar com as Farc. "A guerrilha ficou quatro ou cinco dias na casa deles, e eles não resistiram, mas depois sofreram essa perseguição. Tiveram de abandonar tudo. Até a casa."
Alguns colombianos acabam retornando para viver na fronteira, em Letícia. "Um militar teve de fugir de sua casa depois que a guerrilha descobriu sua profissão. Agora ele está em Letícia, mas poderá voltar para o Brasil a qualquer momento. Estou recolhendo roupas, colchões e alimentos para quando refugiados como ele voltarem", afirmou Franco.

FSP, 05/03/2006, Mundo, p. A19

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