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Reforma tira árvores da Paulista

OESP, Metrópole, p. C4
14 de Set de 2009

Reforma tira árvores da Paulista
Após obras, avenida símbolo da cidade ficou com 108 exemplares a menos; 10 foram cortadas sem permissão
Vitor Sorano
Jornal da Tarde

Na reforma de R$ 10,7 milhões das calçadas da Paulista, a Prefeitura tirou mais árvores e plantou menos mudas do que deveria, segundo a Secretaria Municipal do Verde e do Meio Ambiente. A escassez de arborização é um dos motivos de o cartão-postal parecer mais gelado em dias frios e mais quente no calor.

A dívida é de 108 exemplares. Número que faz diferença em uma via que tem cerca de 250 árvores - a reportagem contou uma a uma na semana passada. A secretaria não forneceu o número oficial.

Nas obras, a Subprefeitura da Sé foi autorizada a tirar da Paulista 151 árvores. Em compensação, deveria plantar 180 mudas. No entanto, retirou 161 plantas - 10 que tinham de ser preservadas, aparentemente foram cortadas. Segundo a Secretaria do Verde, foram plantadas 82.

A Subprefeitura da Sé afirma que plantou 24 mudas na Paulista e as outras 156 no canteiro central da Avenida 23 de Maio porque faltava área permeável para o plantio do tipo de muda exigida.

Pedestres já perceberam que o número de árvores diminuiu com a reforma das calçadas. "Eu vi que tiraram umas três grandes na esquina da Padre João Manoel e não recolocaram", diz o funcionário de uma banca de jornais da Paulista Edson Souza Dantas. "Árvore tinha de ter em todo lugar."

No lugar de cinco árvores foram plantadas duas mudas em dois abrigos de ponto de ônibus, em frente ao número 1.904. Apenas três árvores deveriam ser retiradas e outras 13 mudas, plantadas. "Perdeu a beleza. Só colocaram aquelas duas, mas que não adiantam muito", diz o fiscal da lanchonete em frente, Sérgio Ferreira Galvão. "É visível que piorou, e muito", diz Célia Marcondes, presidente da Sociedade dos Amigos e Moradores do Bairro Cerqueira César (Samorcc).

As árvores ajudam a moderar a temperatura. Elas umidificam o ar, funcionando como canais entre o solo coberto de cimento e asfalto e a atmosfera. "A árvore absorve a energia no calor e a libera no frio", diz o doutor em Geociência Edmilson Freitas, professor do Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas da USP. Como exemplo, ele sugere sair da calçada em um dia quente e entrar no Parque Trianon, na própria Paulista. "É outro planeta." Não que uma centena de árvores cause mudança drástica no clima. "Mas interfere."

FISCAL

Quem percebeu a falta das plantas foi um engenheiro florestal da Secretaria do Verde, que elaborou os termos de compromisso ambiental (TCAs) a serem cumpridos pelas construtoras - desde as calçadas da Paulista até a ampliação da Marginal do Tietê, tocada pelo governo Serra (PSDB). Solicitada, a Prefeitura enviou parte dos TCAs da Paulista. Nos documentos não constam os locais onde os cortes foram permitidos e onde as mudas foram plantadas.

A Secretaria do Verde diz que fiscaliza "rigorosamente" o cumprimento dos TCAs. Mas não quis dizer se, quando e como pode aplicar multa à Subprefeitura da Sé, que tem 30 dias para se manifestar sobre a possível irregularidade no replantio das árvores.

Sem verde, avenida tem ar mais quente, seco e poluído

A falta de árvores na Paulista pode trazer dois principais problemas: a temperatura na região aumenta e a quantidade de poluentes acumulada também. Isso porque as árvores regulam o clima e funcionam como barreira física contra o avanço de poluentes - já que absorvem partículas de poluição. Para perceber isso, pare durante dois minutos na via e observe como o organismo se comporta: o ar incomoda ao entrar pelas narinas, a atmosfera é seca e os poluentes, embora não possam ser vistos, grudam na pele, nos cabelos e seguem para os pulmões.

"As árvores prestam um serviço ambiental", diz a engenheira florestal Ana Paula Martins, do Laboratório de Poluição Atmosférica da USP. Um dos benefícios do verde é um ambiente menos poluído. "Elas (árvores) sequestram gás carbônico e monóxido de carbono. Sem árvores, o que não fica retido no tronco, folhas e cascas ficará na atmosfera", disse a pesquisadora. Ela descobriu que as árvores tomam para si os poluentes após fazer um estudo no Parque Trianon, no qual constatou que, nas árvores instaladas na esquina da Rua Peixoto Gomide, por exemplo, a concentração de poluentes, como o bário, é 3 a 5 vezes maior do que as existentes no interior da floresta urbana. "As árvores protegem as que ficam no centro, impedindo o avanço da poluição."

Para ela, a solução é arborizar avenidas com grande fluxo de veículos. No caso da Paulista, ela recomenda que, além de mudas, sejam plantadas árvores adultas. Para a professora Helena Ribeiro, da Faculdade de Saúde Pública da USP, árvores com copas largas são as mais indicadas para arborização da Paulista, porque a chance de o exemplar sobreviver é maior e porque a área de sombra aumenta, evitando o aquecimento da superfície.

Esse aquecimento forma ilhas de calor - título que a Paulista detém -, provocadas pela pavimentação e falta de área verde. O resultado é radiação solar armazenada no concreto e asfalto, elevando a temperatura. "Se houvesse verde, a vegetação devolveria a radiação por meio de evapotranspiração e manteria o ar úmido", diz Helena.

OESP, 14/09/2009, Metrópole, p. C4

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