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Primatologista brasileiro é símbolo de conservação

Valor Econômico, Especial, p. F4
30 de Jan de 2014

Primatologista brasileiro é símbolo de conservação

Por Liana Melo
Para o Valor, do Rio

Impossível abrir um livro sobre primatologia e não encontrar o nome de Adelmar F. Coimbra-Filho entre as referências bibliográficas. Se o assunto em questão for os lions tamaris, como é conhecida a família brasileira dos micos-leões, mais improvável ainda. Porta-voz para a conservação brasileira por quase meio século no mundo, esse cearense, de 89 anos, acaba de aumentar a já extensa lista de espécies da fauna e da flora brasileiras batizada com seu nome.
A mais recente homenagem foi feita pelos cientistas americanos Lauren Halenar e Alfred Rosenberger. A dupla descobriu recentemente um fóssil de macaco na caverna Toca da Boa Vista, em Minas Gerais. O primata entrou para os anais da ciência, em setembro, com o nome de Cartelles coimbrafilhoi. Coimbra-Filho já havia batizado outro símio brasileiro. Há 14 anos emprestou seu nome para o registro do Callicebus coimbrai, endêmico da Mata Atlântica. Seu nome também aparece no registro de um percevejo (Taedia coimbrai), de um cacto (Monvillea adelmari) e de uma bromélia (Neoregelia coimbrai).
Considerado o maior conservacionista vivo brasileiro, ele é referenciado como o "pai" de um dos grandes casos de sucesso na história da conservação mundial ao salvar o mico-leão-dourado da rota da extinção. O animal é endêmico da Mata Atlântica. Sua cruzada começou nos anos 60 e catapultou o mico ao estrelato: ele virou símbolo da Mata Atlântica e ícone da preservação da floresta.
O bicho já esteve classificado como "criticamente ameaçado" e se contavam nos dedos os exemplares na natureza: não mais do que 200 indivíduos nos anos 80. Hoje, mico-leão-dourado mudou de status e aparece como "em perigo", no Livro Vermelho da Fauna Brasileira Ameaçada de Extinção. A população gira em torno de 1.600 indivíduos.
"Salvei as três espécies de mico-leão", orgulha-se Coimbra-Filho, referindo-se ao mico-leão-dourado, ao mico-leão-preto e ao mico-leão-da-cara-dourada.
A trajetória do mico-leão-dourado acabou se confundindo com a história da primatologia no Brasil e com a do Centro de Primatologia do Rio de Janeiro (CPRJ), que foi concebido, fundado e dirigido por duas décadas e meia por Coimbra-Filho. Localizado na Reserva Ecológia Paraíso, em Guapimirim, o centro é a primeira instituição no mundo voltado prioritariamente para a preservação de primatas. Em 2014, ele completa 35 anos. À frente do CPRJ está o veterinário Alcides Pissinatti, considerado herdeiro intelectual de Coimbra-Filho, que já está aposentado.
Vinculado ao Instituto Estadual do Ambiente (Inea), o centro abriga atualmente 230 primatas de 33 espécies, entre eles o mico-leão-da-cara-dourada, que está sendo alvo de um projeto de remoção de Niterói, no Rio de Janeiro, para o sul da Bahia.
Se o local é uma referência internacional, o Brasil tem tudo para tornar-se o epicentro da primatologia mundial. Aqui está a mais rica fauna primatológica do mundo. Das 270 espécies de símios catalogadas no mundo, 135 são endêmicas da Mata Atlântica ou da Floresta Amazônica.
Listado como um dos poucos cientistas brasileiros a receber a medalha Augusto Ruschi, Coimbra-Filho foi homenageado pela Academia Brasileira de Ciências pelo trabalho desenvolvido em defesa dos primatas brasileiros e pela redescoberta do mico-leão-preto no Morro do Diabo, nas matas de Teodoro Sampaio, em São Paulo, na década de 70. Antes de ser encontrado pelo primatólogo, o bicho era considerado extinto na natureza. A medalha foi concedida há dez anos.
Dois primatólogos de renome internacional já dedicaram livros a Coimbra-Filho. Nas dedicatórias, o presidente mundial da ONG Conservação Internacional (CI), Russell Mittermeier, refere-se a ele, em um dos seus livros, como "líder e visionário" e o australiano Colin Groves o chama de "lenda viva da primatologia".
Autor de cerca de 200 trabalhos científicos, publicados na forma de livros e artigos, Coimbra-Filho assina a primeira lista de animais brasileiros em extinção. Ele também assinou com Pissinatti textos alertando para os problemas de hibridação entre o mico-leão-dourado e o mico-leão-da-cara-dourada. Artigos assinados com Mittermeier foram publicados na revista "Nature". Até experiências iniciadas pelo primatólogo de forma voluntária viraram assunto de artigo técnico.
É o caso, por exemplo, dos tucanos-de-bico-preto que soltou no Jardim Botânico. Ele repovoou o local com 47 indivíduos, numa época em que a ave estava extinta nas zonas Norte e Sul do Rio de Janeiro. Em meados do século XX só existia tucano-de-bico-preto na zona Oeste da cidade. Seu inventário pessoal de animais liberados na natureza soma 919 aves, 59 mamíferos e cinco répteis.

Valor Econômico, 30/01/2014, Especial, p. F4

http://www.valor.com.br/agro/3412798/primatologista-brasileiro-e-simbol…

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