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Presos 19 por fraudes na área ambiental

O Globo, Rio, p. 24
25 de Out de 2007

Presos 19 por fraudes na área ambiental
Acusados incluem empresários, políticos e funcionários da Feema do Sul Fluminense. Prejuízo chegou a R$ 80 milhões

Elenilce Bottari, Ronaldo Braga e Sérgio Ramalho

A Delegacia de Proteção ao Meio Ambiente (DPMA) deteve ontem 19 pessoas na primeira etapa da Operação Carta Marcada, que teve por objetivo cumprir 33 mandados de busca e 29 de prisão contra empresários, secretários municipais, funcionários da Feema e políticos da Região Sul Fluminense, envolvidos com fraudes que deram um prejuízo de R$ 80 milhões nos últimos dois anos. Entre os presos, estão o ex-presidente da Câmara de Vereadores de Angra dos Reis e líder do governo, Carlos Augusto Pinheiro, o Carlinhos Santo Antônio; o presidente da Fundação de Saúde do município, João Domingos Rosa Machado; e o secretário de Meio Ambiente de Paraty, Marco Antônio de Paula Silva. Com Domingos, a polícia apreendeu R$ 95 mil. Duas lanchas e sete carros foram apreendidos, entre eles uma Dodge Ram 2500, placa KWA-1420, avaliada em R$ 160 mil.
Os três e os demais denunciados são acusados de participar de esquemas que envolvem fraudes em licitações, corrupção, lavagem de dinheiro, concussão, venda irregular de licenças ambientais, favorecimento e cartelização. As investigações da Delegacia de Proteção ao Meio Ambiente começaram em março passado, a partir de denúncias encaminhadas pelo presidente da Feema, Axel Grael. Segundo ele, funcionários da fundação, lotados nas agências da Baía de Ilha Grande e de Petrópolis, cobravam propinas para liberar licenças ambientais.

Rede funcionava com pelo menos 8 esquemas de fraude
De acordo com a polícia, os funcionários da regional da Feema em Angra Sílvio Pinheiro (Silvinho), Dennys da Rosa Rocha e Francisco de Almeida Costa Junior (Chiquinho) recebiam propinas por intermédio da empresa Telmax Consultoria Ambiental, que pertence a Alex Fabiani Alamo de Freitas e Nilo Dias de Freitas, ligados aos fiscais responsáveis por emitir as licenças da fundação.

A partir de investigações feitas em campo e de interceptações autorizadas pela Justiça, a polícia descobriu uma rede com pelo menos oito esquemas de fraudes nos municípios de Paraty, Angra dos Reis, Itaguaí, Barra Mansa e Petrópolis.
- Nós havíamos feito um levantamento ouvindo inclusive empresários e encaminhamos as denúncias ao delegado de Meio Ambiente. Mesmo assim, o resultado causou surpresa.

Nós estávamos tratando de denúncias de crimes ambientais e o efeito colateral dessas denúncias foi a descoberta de uma rede corrupção - afirmou Grael.

A primeira etapa da operação contou com a participação de 150 policiais e dez delegados de 12 delegacias especializadas do estado. Segundo a polícia, alguns dos indiciados foram beneficiados por vazamentos de informações, flagrados em escutas. Entre os considerados foragidos estão os secretários de Angra dos Reis Cláudio de Lima Sírio Ferreti (de Obras), Bento José Pousa Costa (de Integração Governamental) e José Nicodemos Amorim (da Fazenda), além dos empresários Henrique Valle e seu filho, Sebastião Emílio do Valle Neto. De acordo com o levantamento, a prefeitura de Angra tem contratos que somam R$ 38 milhões com a empresa Valle Sul, uma das seis empreiteiras beneficiadas com os esquemas.

Secretário de Angra foragido teria saído de casa domingo
Segundo o chefe de Gabinete da prefeitura de Angra, João Massad Neto, o secretário Cláudio Sírio estaria viajando e ainda não havia sido localizado, enquanto o secretário Bento Pousa estaria se recuperando de uma cirurgia no joelho, fora do município.

- O governo sempre se pautou pela honestidade e isso nos preocupa - disse, informando que procuradores do município estão no Rio para tentar apurar as denúncias contra o alto escalão da prefeitura de Angra.

Por volta das 6h de ontem, na casa de Bento, na Estrada do Contorno 3.281, em Vila Velha, Angra, os policiais foram informados de que ele tinha saído de casa, apressadamente, na noite de domingo, levando algumas malas. Na residência, além dos dois caseiros, um policial militar fazia "bico" como segurança do secretário.

Segundo o delegado de Meio Ambiente, Luiz Marcelo Xavier, a operação deve continuar e outras pessoas, inclusive, autoridades municipais, poderão ser indiciadas.

A análise dos dados continua. Ainda temos muito trabalho para fazer em cima das provas coletadas até agora, além das apreensões feitas que, com certeza, trarão novas provas contra os já indiciados e outros que aparecem em várias interceptações - afirmou o delegado.

Policiais apreendem carro e colete à prova de balas
Entre os presos na primeira etapa da operação, estão Marco Antonio Barbosa, Silvinho Pinheiro, Sonia Maria Cabral Ostrowsky, Nilo Dias de Freitas, Roseani Cassiano da Silva Venâncio, Esdras Mecides Venâncio, Mauricio Martins Mellado, Luís Paulo Pereira, Flávia Teles de Souza, Felipe Carlos Felipe Larrosa Arias, Francisco de Almeida Costa Júnior e José Otoni Jordão.
No Condomínio do Frade, investigadores encontraram vazia a residência do filho do empresário Henrique Valle, Sebastião Emilio do Valle Neto.
Um advogado, que chegou logo depois, por volta das 6h30m, dizendo ser amigo de Sebastião, alegou que o filho do empresário tinha viajado e que não sabia seu paradeiro.
Ele foi obrigado a abrir a casa para que os policiais realizassem uma busca. A Dodge Ram 2500 que estava na garagem foi apreendida pelos policiais.

Foi recolhido ainda um colete à prova de balas.

Minc: 'Outras operações vão acontecer'
O advogado do empresário, que tinha chegado numa Hillux 4x4, avaliada em R$ 130 mil, também teve o carro apreendido, já que o veículo estava em nome de Inimar Valle Machado, empresário que conseguiu fugir e que seria "laranja" do grupo. O casal Esdras Medices Venâncio e Roseane Cassiano da Silva foram presos também numa casa no Condomínio do Frade. O computador da residência foi apreendido.

- A Secretaria estadual do Ambiente detectou há seis meses problemas em Petrópolis e Angra dos Reis envolvendo funcionários da Feema - disse o secretário do Ambiente, Carlos Minc. - Encaminhamos então uma denúncia, com pedido de investigação, ao delegado titular da DPMA, Luiz Marcelo Xavier, que está fazendo um trabalho maravilhoso. A operação foi um sucesso. Nossa estratégia é aprofundar o uso da inteligência para descobrir e combater os tentáculos da corrupção e despoluir a área ambiental dos corruptos. Outras operações vão acontecer.

Segundo Minc, a secretaria está simplificando os processos de licenciamento ambiental no estado, para diminuir as dificuldades e a burocracia, que são caldos de cultivo da corrupção.

Propina é discuta em telefonema
Interceptações telefônicas realizadas pela Delegacia de Proteção ao Meio Ambiente durante os últimos sete meses revelaram o grau de comprometimento entre empresários, lobistas, fiscais da Feema e autoridades municipais, em pelo menos oito esquemas criminosos.

Um deles incluía, além de funcionários da Feema e dos sócios da empresa Telmax Consultoria Ambiental, Heráclito Fernandes de Oliveira, que intermediava as negociações entre o órgão estadual e os empresários. A Telmax teria ganhado uma licitação para fazer relatórios ambientais para a prefeitura de Angra e empresários pagariam propinas para conseguir licenças da Feema para obras no município. Numa escuta do dia 28 de agosto, Heráclito discute valores de propina com o funcionário da Feema Silvinho Pinheiro:

Heráclito: "Escuta só! Quanto tinha no coisa?" 0 SILVINHO: "Tinha 10."

Heráclito: "Não! Tinha 12.500!" 0 SILVINHO: "Só recebi 10!"

Heráclito: "12.500, é um bolinho de 10 e um enroladinho de 2.500."

Silvinho: "Não!"

Heráclito: "Então, meu camarada... Eu entreguei aí na mão do Dênis! Entreguei para o Dênis! Era 15! Eu tirei 2.500, que é aquele, entendeu? Certo? Então, 12.500?"

Silvinho: "Sabe o que ele falou para mim?"

Heráclito: "Era 15 e tirei 2.500 daquilo, 12.500."

Silvinho: "Vou ver como é que vou resolver isso aí então!"
O inquérito também apurou que um grupo de empresas detêm a maioria dos contratos de municípios do Sul Fluminense.

Segundo relatório da polícia, "as empresas promoveram um verdadeiro loteamento das concorrências públicas". Entre as empresas beneficiadas, estão a Santa Serra, de Inimar Valle, e a Construtora Cortein, de Maurício Mellado. Numa conversa de 10 de setembro, Maurício aparece discutindo com Inimar detalhes de uma licitação.

Maurício: "Olha só! A minha menina já saiu daqui, tá? E eu tô com duas propostas, então tu vai fazer o seguinte: é o Morro da Carioca, tu tem que entrar cheio! Cheio! Cheio! Que eu tô tirando R$ 2.900. Falou?"

Inimar: "Cheio, cheio, cheio!"

O Globo, 25/10/2007, Rio, p. 24

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