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Possibilidade de agradar a todos é zero

OESP, Nacional, p. A7
Autor: MESSIAS, Roberto
13 de Out de 2009

''Possibilidade de agradar a todos é zero''
Roberto Messias: presidente do Ibama; Messias defende Ibama, se queixa de falta de estrutura, mas diz que problemas apontados pelo TCU serão cada vez menores

Marcelo de Moraes e Leonardo Goy, Brasília

Presidente do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) desde o ano passado, o geógrafo Roberto Messias, 62 anos, vê o órgão voltar de novo ao centro das atenções, com críticas ao seu desempenho feitas pelo Tribunal de Contas da União (TCU). No relatório de fiscalização de obras do governo federal para 2009, o TCU afirma que o Ibama "não avalia e não acompanha sistematicamente os impactos ambientais das obras licenciadas".

Além disso, o governo federal também cobra flexibilização do Ibama na fiscalização de obras consideradas especiais, como as da Copa do Mundo de 2014, Jogos Olímpicos de 2016 e exploração de petróleo na área do pré-sal. Messias diz que as tarefas do órgão "já são monstruosamente grandes" e sua estrutura é limitada. Mas ele acredita que o órgão está se aperfeiçoando. A seguir, os principais trechos da entrevista ao Estado:

Tem sido recorrente o Ibama receber críticas do governo e do setor empresarial, por demorar a conceder licenciamentos ambientais, enquanto ouve também reclamações dos ambientalistas por supostamente ceder às pressões desses setores. Quem tem a razão nessa discussão?

A possibilidade de agradar a todo mundo é zero. Porque você tem as duas pontas da curva. De um lado, estão aqueles que querem que haja um crescimento porque o Brasil tem um déficit de estrutura. E é verdade que tem. O Brasil não tem porto, ferrovia, hidrovia, gasoduto, oleoduto, alcoolduto, linha de transmissão, geração. Então, de um lado, temos de fazer isso. Você pega o programa Luz para Todos: ninguém pode dizer que seja injusto fornecer energia elétrica para uma pessoa que não tem luz.

E na outra ponta?

Tem o outro extremo, que fala assim: temos de evitar tudo, não pode ter mais geração de energia, por exemplo. Eu concordo que temos de ser econômicos com a energia. Acho que não pode desperdiçar. Mas dizer que o Brasil, hoje, com o que tem gerado, já consegue ter energia para um processo de desenvolvimento, isso é maluquice. Todas as formas de energia, da hidrelétrica à térmica, têm lugar para um mix onde cada uma faz o seu papel. E na matriz energética brasileira, que é invejada pelo mundo inteiro, o que é que predomina? A hidrelétrica. Oitenta por cento de geração de energia é hidrelétrica. Ela tem impacto? Tem. Mas, ao mesmo tempo, ela gera o menor custo e sem emissão de gases. Então, como é que você resolve isso? A responsabilidade por essa decisão toda, quando vem para cima do órgão licenciador ambiental, é enorme. É por isso que a gente fica nessa situação.

No caso do empresariado, o sr. acha que existe má vontade?

Primeiro, tem alguns setores empresariais com má vontade. Que fazem aquilo para cumprir tabela, que acham que é dispensável. Segundo, tem aqueles que, ainda que com boa vontade, na hora de contratar empresas para fazer relatório de impacto ambiental, contratam mal. Empresários já me disseram aqui: "Gastei uma baba de dinheiro para fazer um relatório de impacto ambiental que eu reconheço que está uma porcaria." Quer dizer, ele tenta, mas não consegue.

O estudo de impacto acaba sendo feito por empresas ruins?

Tem uma quantidade enorme de picaretas que fazem o serviço e cobram caro. E é de tão má qualidade que quando chega aqui o pessoal diz: "Devolve, porque não dá para partir dessa porcariada."

Como resolver isso?

Para vencer isso não é uma portaria, uma lei, não é nada que pode resolver. É uma melhoria paulatina que tem de acontecer. Tem de criar a capacidade. Pega o caso dos analistas que entraram no licenciamento ambiental no Ibama. Bem formados do ponto de vista conceitual, intelectual e com uma garra tremenda para trabalhar. Só que tem média de idade menor do que 30 anos. É uma meninada muito nova. Põe um deles para analisar um projeto com influência sobre áreas grandes, população grande, custando bilhões de reais, e diz para ele analisar e fazer num prazo de cinco dias. Isso é desumano. Então, temos de ir com calma porque é uma aprendizagem que eles têm de fazer.

Para casos especiais, como Copa do Mundo, Jogos Olímpicos e exploração do pré-sal, o governo está defendendo um tratamento diferenciado nas fiscalizações. Como o órgão pretende atuar?

A sorte, para nós do Ibama, é que a Copa e os Jogos Olímpicos são obras estaduais. O impacto é local e caberá às autoridades estaduais. Mas o pré-sal é totalmente do Ibama. E nesse caso a coisa não passa por flexibilização. Acho que o termo correto não é esse. É a calibração das exigências ao que é efetivamente necessário. Porque flexibilização dá a ideia de que vamos abrir a porteira, fingir que não estamos vendo. Não é isso. Por exemplo, nós estamos evoluindo no sistema de licenciamento no caso de exploração de petróleo no mar para, em vez de pedir estudo ambiental para cada poço, para cada concessão, fazer o licenciamento por bacias, por campos, por regiões.

Relatório do TCU aponta problemas na fiscalização ambiental feita pelo Ibama e cita que o órgão tem carência de parâmetros de avaliação do processo de licenciamento. Qual é sua avaliação sobre isso?

Cada vez mais esses problemas apontados serão menores. Estamos melhorando em relação as nossas metodologias. Temos uma equipe tão pequena e com muita coisa para ser feita As tarefas são monstruosamente grandes.

OESP, 13/10/2009, Nacional, p. A7

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