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Pondo o ovo em pé

CB, Economia, p. 15
Autor: MACHADO, Antônio
22 de Fev de 2008

Pondo o ovo em pé
Estudo da McKinsey sobre o efeito estufa também é solução contra a ameaça de apagão no país

Por Antônio Machado
cidadebiz@correioweb.com.br

Se não for por prudência, há um argumento igualmente sólido a que o governo pode recorrer para preparar um programa de produtividade da geração e consumo de energia elétrica, que nos próximos anos, e por muito tempo à frente, será um insumo escasso, por isso caro - e muito provavelmente limitador do crescimento econômico.

As barreiras ao crescimento estão na medida justa da oferta sobre a demanda, esta crescendo mais que aquela, no aumento das tarifas, que serão maiores quanto maior o estrangulamento da capacidade de geração e o uso de usinas térmicas em complemento às hidrelétricas - cujas possibilidades de expansão escasseiam devido à proteção do meio ambiente. Tudo joga contra o crescimento robusto da economia e da renda, ambas agindo como múltiplos para o consumo de energia.

São também oportunidades, se assim forem tratados os desafios e o governo for proativo. O consumo racional de energia, para que não se desperdice nem se tenha de pagar mais pelo que tende a ser um bem finito, é sempre um conselho sábio. Não será necessário o que mais se teme, o racionamento explícito, que implicitamente já está aí com a disparada das tarifas no segmento livre do mercado de energia. Hoje, várias indústrias autoprodutoras podem lucrar mais revendendo a energia não consumida que com a atividade principal.

Quanto mais cara a energia maiores os riscos para a trajetória da inflação e a amortização dos projetos de expansão industrial, que poderá ou ser reduzida ou adiada. Não há nada que impeça o governo de induzir um programa que racionalize o consumo de energia. É um pleito dos empresários, e bom para a sociedade. O que o trava é o medo de ser acusado pela oposição de disfarçar com isso um apagão.

Bobagem! Pior é ficar à mercê das chuvas e da instável Bolívia, o único fornecedor atualmente viável do gás usado em termelétricas, além de obrigar a sociedade a pagar mais pela energia consumida.

Qualquer insumo energético é mais caro, poluente e danoso ao meio ambiente, que a água captada para mover as hidrelétricas. E então?

Caminho das pedras

Um minucioso estudo do McKinsey Institute, ramo sem fim lucrativo da afamada consultoria, pode inspirar a solução. Ela está no que já se discute há tempos, por exemplo, no BNDES: implantar um amplo programa para aumentar a produtividade da energia. O estudo não é específico para o Brasil, mas para aplicação global. O que propõe, porém, é válido para qualquer país. E com uma vantagem expressiva: é, segundo a consultoria, a maneira mais rápida e eficiente, além de menos onerosa e invasiva dos hábitos sociais e dos processos de produção, para viabilizar as metas ambiciosas de redução dos gases responsáveis pelo efeito estufa na atmosfera.

Plano ganha-ganha

O plano é um caso raro de estratégia win-win, sem perdedores. Com o investimento de US$ 170 bilhões anual pelos próximos 13 anos em programas que reduzam a energia consumida por unidade de consumo, sem que isso implique qualquer desconforto ao usuário ou a ruptura de processos de produção, se poderá cortar à metade a emissão dos gases do efeito estufa até 2020. A taxa de retorno do investimento chegaria a 17%, permitindo economias anuais de US$ 900 bilhões ao fim do período. Que medidas? Coisas como obrigar a construção de residências expostas à iluminação do dia e adequadas às mudanças climáticas: quente no inverno, fria no verão. A troca de lâmpadas comuns por fluorescentes (CFLs) ou diodos (LEDs).

Crescer sem susto

As conversões em escala global na indústria foram estimadas em US$ 83 bilhões/ano. Residências tomariam US$ 40 bilhões. Imóveis comerciais, US$ 22 bilhões. Transportes, US$ 25 bilhões. Por país, a China teria de investir US$ 28 bilhões/ano. EUA, US$ 38 bilhões.

Números volumosos, mas equivalentes à metade comparados às opções disponíveis para cortar a emissão de carbono por outro método que não o aumento da produtividade. O plano da McKinsey não prevê, por exemplo, nenhum investimento em "energias alternativas".

A economia projetada de energia equivale a abater à metade, 550 partes por milhão, as emissões de gases em relação ao previsto se nada for feito e o consumo crescer 2,2%/ano. Tal resultado seria o suficiente para conter o aumento da temperatura no mundo temido pelos cientistas: 2 graus. No Brasil, além disso, seria a solução para o crescimento sem susto da economia e da renda.

Distorções como preços de combustíveis subsidiados, como os há em países produtores de petróleo, não podem coexistir num ambiente em que a eficiência energética seja uma prioridade de Estado de longo prazo. Só com o fim dessas distorções já se teria um grande avanço de eficiência, segundo o estudo da McKinsey. Outras medidas, como regras de produção de máquinas e bens de consumo menos intensivos em energia, também formam parte apreciável dos resultados.

Medidas de cunho regulatório, com ações que eliminem distorções econômicas, tenderiam a encorajar o investidor e os consumidores a embarcar numa nova onda. Algo que por si produziria outros choques de inovação e de investimentos industriais. Insere-se aí, por exemplo, a proposta levada a Lula para substituição de geladeiras antigas junto à população de baixa renda. A idéia tem um conteúdo eleitoral. Mas são coisas assim que reduzem o consumo de energia.

CB, 22/02/2008, Economia, p. 15

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