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Polícia tira mulheres da área de multinacional no RS

OESP, Nacional, p. A8
05 de Mar de 2008

Polícia tira mulheres da área de multinacional no RS
Integrantes da Via Campesina havia invadido fazenda da Stora Enso em Rosário do Sul

Sandra Hanh e Elder Ogliari, Porto Alegre

A Brigada Militar (a Polícia Militar gaúcha) fez ontem a retirada forçada de mulheres ligadas à Via Campesina que haviam invadido a Fazenda Tarumã, da multinacional sueco-finlandesa de papel e celulose Stora Enso, em Rosário do Sul (RS).

De acordo com o grupo de manifestantes, a Brigada usou balas de borracha e bombas na operação, realizada por volta das 17h. O comandante da corporação em Santana do Livramento, Lauro Binsfield, disse que levou um golpe de foice no braço. A operação também teria causado ferimentos em manifestantes.

O delegado Hotelo Caiaffo, da delegacia regional de Santana do Livramento, afirmou que as mulheres foram autuadas em flagrante e presas por invasão de terra com violência, corrupção de menores (havia crianças no grupo) e lesões corporais. Cerca de 500 mulheres participaram da invasão, que começou na madrugada.

Protesto

Segundo nota distribuída à imprensa pela Via Campesina, à tarde, a ocupação foi um protesto contra o plantio de florestas da multinacional na região e os projetos que tramitam no Congresso propondo a redução da faixa de fronteira do Brasil de 150 para 50 quilômetros.

O grupo chegou durante a madrugada, entrou na propriedade de 2,075 mil hectares, arrancou os eucaliptos que estavam plantados em cerca de quatro hectares e montou acampamento.

A Brigada Militar colocou um destacamento diante da área e apreendeu 13 ônibus que haviam feito o transporte das ativistas. Antes da desocupação a situação já havia ficado tensa algumas vezes durante o dia. Numa delas, dez policiais militares tentaram dispersar um grupo maior de mulheres. Houve agressões de parte a parte, mas ninguém ficou ferido.

Como há um interdito proibitório emitido previamente pela Justiça, a Brigada Militar não precisou de nova ordem de reintegração de posse para desocupar a área.

A Via Campesina combate o plantio de eucaliptos que a Stora Enso e outras duas empresas de papel e celulose, a Aracruz e a Votorantim, estão fazendo na metade sul do Rio Grande do Sul para abastecer futuras fábricas de celulose. "Estamos iniciando uma jornada de lutas por soberania alimentar e contra o agronegócio e suas monoculturas", explicou o porta-voz da Via Campesina, Miguel Stedile. A Stora Enso não se manifestou.

Para Incra, compra de terra na fronteira é proibida pelas leis do País

Roldão Arruda

A disputa travada no Rio Grande do Sul entre o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) e a Stora Enso, empresa líder no mercado mundial de papel e celulose, caminha para o impasse. Em entrevista ao Estado, o presidente do instituto, Rolf Hackbart, disse ontem que a instalação de uma nova indústria de papel em território gaúcho, próxima à fronteira com o Uruguai, afronta a legislação brasileira.

Hackbart negou as acusações de perseguição política, feitas por executivos da Stora Enso. O entrave, disse ele, está relacionado à compra de 110 mil hectares de terras para reflorestamento com eucalipto - matéria-prima da futura indústria, que teria um investimento inicial de US$ 250 milhões.

"O ponto mais importante da discussão é a soberania, o controle sobre o território", disse Hackbart, referindo-se à Lei de Faixa de Fronteiras, que impede a compra de terras por estrangeiros nessa área. "O Incra segue o que determina a lei."

Em Porto Alegre, o superintendente regional do Incra, Mozar Dietrich, também negou qualquer tipo de perseguição à empresa, que desde 2005 tenta sem sucesso levar adiante o projeto da indústria. "Embora os procuradores do Incra tenham alertado sobre a ilegalidade da compra de terras por estrangeiros em faixa de fronteira, a empresa começou a comprar fazendas e a plantar eucaliptos", afirmou o superintendente.

"Acusam-nos de atraso na análise dos processos de compra de terras, mas na prática ocorre o contrário", disse. "Dos 46 mil hectares que já adquiriu, a empresa só entregou os documentos de 17 mil."

Dietrich é categórico: com a legislação em vigor é impossível a aprovação da compra de terra. Em reportagem publicada ontem, o Estado mostrou que o projeto causa polêmica entre os gaúchos.

Diante da resistência do Incra, as esperanças da Stora Enso voltam-se para uma proposta que tramita no Congresso. Ela já passou pela Comissão de Constituição e Justiça do Senado e, se for aprovada, a atual faixa de fronteira, delimitada em 150 quilômetros, será reduzida para 50 quilômetros. Com essa mudança, proposta pelo senador Sérgio Zambiasi (PTB-RS), a Stora Enso poderia realizar o projeto.

Instalação da indústria opõe Dilma a ministro do Desenvolvimento Agrário

Roldão Arruda

A polêmica sobre a instalação da nova indústria da Stora Enso no Rio Grande do Sul divide o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e seu partido, o PT. Existe uma ala que apóia o desembarque da multinacional no território gaúcho - região marcada pela pecuária extensiva e o plantio de arroz, considerada decadente; e outra que se opõe à iniciativa.

No primeiro grupo, a favor, estariam alinhados desde a ministra Dilma Rousseff, chefe da Casa Civil, a deputados da bancada estadual do PT em Porto Alegre e prefeitos petistas das cidades na área do projeto. Suas atenções no momento estão voltadas para o Congresso, onde tramita projeto que propõe a redução da faixa de fronteira vedada a estrangeiros. Seria a melhor maneira de contornar os entraves do projeto.

A proposta foi apresentada por um senador da base aliada do governo, Sérgio Zambiasi (PTB-RS), e conta com o apoio da governadora do Rio Grande do Sul, a tucana Yeda Crusius.

Do outro lado, contra a fábrica, estariam os ministérios do Meio Ambiente e do Desenvolvimento Agrário, representados na linha de frente pelo Ibama e o Incra. O grupo também conta com o apoio de deputados , prefeitos e, principalmente, do Movimento dos Sem-Terra (MST) e de organizações ambientalistas.

Balança e ambiente

Os defensores do projeto vêem nele benefícios para a balança comercial (quase toda a produção da Stora Enso é exportada) e chances de desenvolvimento da região. Os opositores vêem riscos ambientais e de concentração de terras.

OESP, 05/03/2008, Nacional, p. A8

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