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Planeta Terra morto ou vivo?

CB, Especial Meio Ambiente, p. 1-8
05 de Jun de 2004

Planeta Terra Morto ou Vivo?

O planeta comemora hoje mais um Dia Mundial do Meio Ambiente. A data, criada em 1972 pela Organização das Nações Unidas (ONU), é um dos mais importantes meios usados pela instituição para lançar um alerta global sobre as principais questões ambientais e mobilizar nações e pessoas para, juntas, adotarem políticas de proteção ambiental e agirem em defesa da Terra.
O tema da versão 2004 do dia 5 de junho é Procuram-se! Mares e Oceanos - Mortos ou Vivos? É um grito de advertência sobre as condições dessas extensas porções de água salgada que cobrem 70% da Terra e sobre como queremos tratá-las.
"Os fatos são evidentes", afirmou o secretário-geral das Nações Unidas, Kofi Annan, em sua mensagem para o Dia Mundial do Meio Ambiente. Segundo ele, os mares e oceanos de todo o planeta estão cada vez mais atingidos e ameaçados pela, poluição, sedimentos, águas residuais não tratadas, dejetos industriais e esgotos, entre outras fontes de contaminação. O excesso de nitrogênio presente nos fertilizantes químicos está criando um número cada vez maior de zonas costeiras mortas em todo o planeta. "Com mais de 40% da população global vivendo numa faixa de 60 quilômetros ou menos da costa, e com essa propor., ao aumentando, os problemas também tendem a se agrave r", disse Anan.
Outros graves problemas: a mortalidade e as doenças causadas pela contaminação das águas costeiras custam US$ 12,8 bilhões por ano à economia mundial. Toneladas de h rodutos de plástico vão parar anualmente nos oceanos, causando ~i morte de centenas de milhares de mamíferos marinhos, aves oceânicas e um número incalculável de peixes. Acrescenta- se, ainda, o aquecimento atmosférico, que está elevando o nível dos mares e as temperaturas. A mudança climática ameaça destruir a maior pane dos arrecifes de coral do mundo, causar estragos nas frágeis economias dos pequenos países insulares em desenvolvimento e devastar a vida de bilhões de pessoas que vivem em zonas castigadas por tempestades, furacões e tufões cada vez mais ferozes que estão atingindo as costas de todos os continentes.
A soma de todos esses fatos configura o quadro de um ecossistema em crise. Os problemas ambientais estão interligados e não podem ser vistos nem tratados separadamente: mudanças climáticas, aquecimento global, desmatamento, desertificação, escassez de recursos hídricos, poluição do ar e das águas (doces e salgadas), contaminação dos solos, resíduos tóxicos... Tudo faz parte do mesmo debate.
Está cada vez mais presente na agenda das discussões sobre o meio ambiente a questão da qualidade de vida do ser humano e a necessidade de se promover o crescimento econômico e o desenvolvimento sustentável, utilizando de forma racional os recursos naturais que o planeta oferece.
O Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA) enfatiza a importância de dar uma face humana à discussão sobre as questões ambientais: habilitar as pessoas para que elas se tornem agentes ativos do desenvolvimento justo e sustentável, estimulando o seu comprometimento e a iniciativa de países em busca de um futuro próspero e saudável.
Proteger os mares e oceanos, sim, mas cuidando essencialmente do ser humano. Desta forma, a redução da fome e da pobreza, assim como o melhoramento da saúde, da educação e das oportunidades para os seres humanos - sobretudo mulheres e crianças -, também contribuiria para reduzir a carga que pesa sobre mares e oceanos e demais ecossistemas.
É com esse olhar contemporâneo e pragmático sobre as questões ambientais que se pode, enfim, estabelecer uma reversão do processo de destruição do planeta. Proteger o meio ambiente deixou, definitivamente, de ser uma atitude de "alfacinhas" ou "ecochatos". Passou a ser uma ação obrigatória e concertada de governos, empresas, organizações e pessoas.

Pressão pela sustentabilidade
Ambientalistas afirmam que sem planejamento sócio-econômico não há futuro para o meio ambiente

Salvem o mico-leão dourado, as baleias, os golfinhos, o lobo-guará! Se há 20 anos essas eram as grandes bandeiras do movimento ambientalista, ou pelo menos as mais visíveis, hoje a consciência ambiental ultrapassa o caráter protecionista que a notabilizou. Não é mais possível pensar o meio ambiente de forma isolada, separando-o do contexto sócio-econômico em que está inserido.
Por isso, o conceito de desenvolvimento sustentável ganha cada vez mais importância no debate sobre o meio ambiente. Como define Adriana Ramos, coordenadora da ONG Instituto Sócio-Ambiental, a sustentabilidade "é a busca do equilíbrio entre a necessidade de desenvolvimento do país e a necessidade de garantir um meio ambiente saudável para todos". Essa visão mais abrangente coloca em discussão como utilizar os recursos naturais de forma a promover o desenvolvimento econômico, ao mesmo tempo provocando o menor impacto possível no meio ambiente e preservando os ecossistemas para que as gerações futuras possam continuar usufruindo deles.
Nessa equação, é preciso levar em conta também o fator humano. Não basta pensar nos chamados povos da floresta ou naqueles que vivem no campo, mas também nos habitantes das grandes cidades. Como explica Gabriel Azevedo, coordenador do Banco Mundial pára a área de desenvolvimento sustentável, a degradação ambiental, de forma geral, tem um enorme impacto sobre os mais pobres, porque são eles os mais dependentes de recursos naturais. Ele cita como exemplo a falta de saneamento básico que, além de provocar a poluição do meio ambiente, se traduz em índices de mortalidade infantil, de doenças, reduzindo a capacidade do homem de ter um dia produtivo de trabalho. "Promover o desenvolvimento sustentável é importante para a economia local e para a melhoria da condição de vida das populações mais pobres", afirma.
Pensar o desenvolvimento sustentável E pensar numa outra forma de economia, que leve em consideração a relação custo-benefício da exploração dos recursos naturais. Quando, como ocorre hoje, se devasta a Floresta Amazônica para plantar soja, não há dúvida; de que é uma atividade rentável para o fazendeiro. "Ele tem lucro porque o custo daquel destruição é rateado por milhões de brasileiros, então nós não sentimos essa destruição pelo menos no curto prazo", explica Azevedo "Mas se ele está lucrando US$ 130 por hectare existem vários estudos recentes que mostram que os custos sociais são maiores do que esse valor" , explica.
Quando o Brasil vende a soja para o merca do internacional, não está exportando apenas o grão, e sim água, energia e solo, ou seja, re cursos naturais que poderiam ser aproveitado de maneira mais eficiente. "Nesse caso, esta mos abrindo mão de utilizar o nosso território para a produção de alimentos para o nosso povo e para a geração de mais empregos, já que essa é uma atividade altamente mecanizada' diz Adriana Ramos. "É preciso pensar o que es ta área poderia gerar em termos de madeira de recursos da biodiversidade, de frutos. Além disso, é necessário avaliar o impacto ambiental, de como aquela parte da floresta vai ajuda a manter o microclima daquela região, qual se rã o impacto na qualidade da água, se for um área perto de um rio."

Artigo / Laura Valente Macedo

Um entrave para o desenvolvimento?

Decorridos mais de 30 anos da primeira grande conferência da ONU sobre meio ambiente e desenvolvimento realizada em Estocolmo, em 1972, a polêmica entre ambientalistas e defensores do desenvolvimento no seu sentido mais restrito ainda encontra espaço, por incrível que pareça. Depois da Rio-92, a maior conferência internacional já realizada sobre o tema, acreditava-se que a discussão estaria superada graças à disseminação do conceito de desenvolvimento sustentável, onde os recursos naturais seriam utilizados no presente, deforma a garantir sua disponibilidade para as gerações futuras. A internalização desta perspectiva conciliatória permitiria a definição de metas e estratégias rumo a um mundo mais justo e mais saudável para as futuras gerações. Bem ou mal, o conceito vem se incorporando a políticas públicas e práticas de produção e consumo, ainda que aos poucos. Então, por que ainda se justifica degradação ambiental com necessidade de desenvolvimento, ou melhor, crescimento econômico?
Na verdade, proteção dos recursos naturais e desenvolvimento são dois lados da mesma moeda. A polêmica só existe para aqueles que não percebem na mudança de paradigma uma oportunidade de crescimento, de melhora de qualidade de vida e, por que não dizer, de desenvolvimento econômico. Não faltam exemplos de benefícios econômicos e sociais resultantes de ações que respeitam a natureza.
Uma tendência que vem se firmando é a do consumo sustentável, que utiliza o poder de compra como instrumento pela sustentabilidade, na medida em que norteia a decisão de comprar uni produto ou serviço pelo seu impacto ambiental e social. Compradores institucionais, tais como governos e empresas, consomem grandes quantidades e podem ter impacto significativo. Na Europa, uma pesquisa realizada pelo ICLEI - Governos Locais pela Sustentabilidade constatou que as compras públicas chegam a representar 14% do PIB. Reconhecendo seu papel de liderança, governos estão implementando práticas de compras públicas que incorporam critérios de sustentabilidade. Dessa maneira, estimulam o surgimento de produção mais limpa, incentivam tecnologias inovadoras e reduzem o impacto ambiental do consumo. 0 uso de energia solar e eólica, por exemplo, tem crescido a um taxa de 30% ao ano desde 1998, em países como Alemanha, Japão e Espanha.
Substituir produtos também compensa e, no final das contas, todos saem ganhando. Lâmpadas compactas fluorescentes custam mais caro, mas duram dez vezes mais do que as incandescentes; combustíveis mais limpos, como o etanol e o biodiesel, custam menos do que a gasolina e poluem menos; usar madeira de reflorestamento é mais barato e evita o desmatamento; usar alimentos orgânicos na merenda escolar estimula produtores locais e contribui para melhorar a dieta das crianças; usar computadores de baixo consumo energético, além de economizar no custo, contribui para reduzir as emissões de gases de efeito estufa, que agravam o aquecimento global.
A propósito, um exemplo promissor nesse sentido pode ser encontrado aqui mesmo no Brasil. Já estamos gerando energia da queima de metano - um poderoso gás de efeito estufa (GEE) - em aterros sanitários. Desde o início deste ano, o aterro Bandeirantes, em São Paulo, está fornecendo energia elétrica da ordem de 170 mil MW-hora/ano, o que daria para abastecer uma cidade de 400 mil habitantes durante dez anos. Além de desonerara rede, a usina contribuirá para reduziras emissões de GEE e gerar créditos de carbono para o Brasil. Outras usinas semelhantes no Rio de Janeiro e em Salvador estarão operando em breve. Enfim, diferentemente do que dizem os que não querem mudar para melhor, cuidado meio ambiente favorece o desenvolvimento, melhora a qualidade de vida das pessoas e é bom para os negócios.
LauraValente de Macedo é diretora regional do ICLEI - Governos Locais pela Sustentabilidade para a América Latina e Caribe

Marcos da consciência ambiental
1937
Criação do Parque do Itatiaia. Situado na Serra da Mantiqueira, na divisa dos estados do Rio de Janeiro e de Minas Gerais. 0 Parque Nacional do Itatiaia é considerado a primeira área natural a ser protegida no Brasil.
1962
Edição do livro Silent Spring (Primavera Silenciosa), de Rachel Carson. Foi uma das primeiras obras a lançar luz sobre o problema da degradação ambiental, relatando os efeitos causados no meio ambiente pelo uso de agrotóxicos.
1971
Lançamento do disco What's Going On, de Marvin Gaye.
O disco trazia a faixa Mercy Mercy Me (The Ecology), uma das primeiras canções a inserir o tema ambiental no mundo da música pop.
1971
Surge no Canadá o movimento ambientalista Greenpeace. O grupo se torna nos anos 70 e 80 a mais combativa e conhecida organização não governamental internacional de defesa do meio ambiente. A grande visibilidade da Greenpeace se deu por suas estratégias de realizar ações diretas de protesto e proteção de baleias, golfinhos e bebês foca. Hoje é ferrenha adversária da energia nuclear e transgênicos.
1972
Conferência de Estocolmo, a primeira internacional sobre o meio ambiente, promovida pela ONU. O encontro introduziu na agenda política internacional a dimensão ambiental como condicionadora e limitadora do crescimento econômico. Durante a conferência é lançado o Dia Mundial do Meio Ambiente, em 5 de junho, e é anunciada a criação do PNUMA - Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente.
1972
Publicação do estudo limites do Crescimento. Elaborado por pesquisadores do chamado Clube de Roma, o estudo concluía que, mantidos os níveis de exploração dos recursos naturais,o limite de desenvolvimento do planeta seria atingido em no máximo 100 anos. Ou seja, em 2072.

CB, 05/06/2004, p. 1-8

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