Pesquisa revela novas espécies das profundezas

Pesquisa revela novas espécies das profundezas
Estudos do projeto Revizee na costa sul catalogaram mais de 400 tipos de peixe

HERTON ESCOBAR

Se algum pesquisador do projeto Revizee o convidar para jantar, fique atento. No cardápio podem estar algumas das mais de 400 espécies de peixes catalogadas pelo programa em águas profundas da costa sul brasileira nos últimos anos. Muitas delas, de aparência bizarra, nunca foram vistas no Brasil. Outras são totalmente desconhecidas da ciência.
"Nunca tínhamos ido tão longe", diz o oceanógrafo Roberto Ávila Bernardes, um dos integrantes do Revizee, ou Programa de Avaliação do Potencial Sustentável dos Recursos Vivos da Zona Econômica Exclusiva Brasileira.
"Quando saímos para a primeira viagem, não tínhamos a mínima idéia do que iríamos encontrar lá fora." Desde 1996, os pesquisadores prospectaram uma área de 700 mil quilômetros quadrados entre o Chuí (RS) e o Cabo de São Tomé, no norte do Rio, que corresponde à região Costa Sul do programa.
Os resultados foram organizados em dois livros, com fotos e descrições detalhadas de cada espécie. O primeiro, publicado em 2002 (Edusp), inclui 185 peixes do tipo pelágico, que vivem na coluna d'água entre o fundo e a superfície. As coletas foram feitas com redes, entre 100 e 1.500 metros de profundidade. Já o segundo, que está para ser publicado este ano, é uma coleção de 225 espécies do tipo demersal, que vivem junto ao fundo. Essas foram capturadas com armadilhas, anzóis e redes, entre 100 e 600 metros.
O reconhecimento de cada espécie exigiu um trabalho de detetive por parte dos pesquisadores, que, em muitos casos, tiveram de buscar referências escassas em museus distantes para saber o que é que estavam olhando. Algumas espécies só puderam ser reconhecidas por conta de detalhes, como número de espinhas ou raios nas nadadeiras. Ao final, nove do próximo livro foram consideradas novas espécies.
O catálogo inclui uma série de criaturas estranhas, com dentes protuberantes, grandes olhos e órgãos luminescentes, adaptadas para sobreviver em um ambiente de escuridão absoluta e pouquíssimo alimento.
Banquete - A dedicação dos pesquisadores foi tão grande que, apesar das bizarrices, o trabalho incluiu até mesmo uma avaliação gastronômica. "Fizemos questão de experimentar todos; porque um dos objetivos é justamente procurar novos recursos para o desenvolvimento da pesca", disse Bernardes, que recomenda o "saborosíssimo" Hoplostethus occidentalis. Mas deixe de fora os peixes-cara-de-rato, que até as gaivotas rejeitam.
O Revizee, iniciado em 1995, está previsto para terminar no início de 2005, com o levantamento completo do todos os recursos marinhos da zona econômica exclusiva brasileira (até 200 milhas náuticas). O projeto envolve centenas de pesquisadores e já recebeu R$ 30 milhões.
Os livros incluem diversos autores da Universidade de São Paulo (USP) e da Fundação Universidade Federal do Rio Grande (Furg).

OESP, 01/05/2004, Geral, p. A19