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Pesquisa fraudou tradução

CB, Brasil, p. 15
09 de Mar de 2006

Pesquisa fraudou tradução
Coordenador de estudo com cobaias humanas no Amapá admite ter omitido informações

Responsável pela pesquisa que utilizou moradores como cobaias em pesquisa com mosquitos transmissores da malária, no Amapá, o biólogo Allan Kardec Gallardo admitiu ontem o erro, três meses após o trabalho ter sido suspenso. Os ribeirinhos recebiam R$ 20 por uma noite de captura e alimentação dos mosquitos. O estudo foi descoberto pelo Ministério Público do Amapá, que abriu investigação sobre o caso. "Houve erro no pagamento de pessoal e na tradução do documento, que não foi feita por mim. A gente errou por ter pago, mas as pessoas passam fome, não têm casa, comida", alegou.
A declaração do biólogo foi feita em audiência pública à Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa do Senado Federal (CDH). Ele reconheceu a omissão de informações na tradução para o português do documento da Universidade da Flórida (EUA) que os moradores assinavam para participar da pesquisa.
O estudo coordenado e financiado pela universidade americana tem parceria com a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), Universidade de São Paulo (USP), Fundação Nacional de Saúde (Funasa) e Secretaria de Vigilância em Saúde do Amapá. O projeto foi aprovado pelo Conselho Nacional de Ética em Pesquisa (Conep), órgão do Ministério da Saúde. Esta semana, o Conselho Nacional de Saúde suspendeu a análise de dados já colhidos.
De acordo com relatório do senador Cristovam Buarque (PDT - DF), presidente da Comissão de Direitos Humanos do Senado, a aprovação da pesquisa ocorreu em função de uma "fraude". Segundo o documento, "tanto o Conep, quanto as entidades brasileiras que participaram da pesquisa foram enganadas por quem fez a tradução do projeto do inglês para o português."
Apesar de não considerar correto, Gallardo disse que o pagamento era uma forma de ajudar as pessoas. Durante depoimento, o biólogo repassou a responsabilidade à USP que já estava no local desde 2001. "Só entrei no projeto em 2003. O que fizemos foi melhorar o pagamento. Passar de R$ 10 para R$ 20", justificou.
"Rato de laboratório"
Presente à audiência, o líder da comunidade de São Raimundo do Pirativa (AP), onde foi realizada a pesquisa, o agente de saúde Sidnei Siqueira disse que dois filhos seus contraíram malária depois que chegaram em casa picados pelos mosquitos transmissores da doença. "Eu me senti como um rato de laboratório", relatou.
Para o senador, as declarações do pesquisador deixam clara a ilegalidade da pesquisa. "Usar pessoas para capturar e alimentar mosquitos com o próprio sangue, pagá-las para isso e não oferecer atendimento médico são indícios graves de violação dos direitos humanos", alertou.
As pesquisas foram suspensas pelo Ministério Público estadual em dezembro de 2005, quando o caso foi denunciado pelo promotor Haroldo Franco, da Promotoria de Justiça da Comarca de Santana (AP).

CB, 09/03/2006, Brasil, p. 15

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