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Pasto amazônico

CB, Opinião, p. 24
17 de Jun de 2008

Pasto amazônico

A ocupação desordenada da Amazônia vai além da ambição de madeireiros com suas incansáveis motosserras. Alia-se a ela o crescimento da pecuária, que desempenha papel importante no processo de devastação. Levantamento feito pela organização Amigos da Terra mostra cifras assustadoras. Em 2007, pela primeira vez na história do Brasil, o número de animais abatidos nos nove estados da Amazônia Legal ultrapassou os 10 milhões de cabeças - quase a metade do total registrado no país.

Segundo o estudo, a pecuária abre trilhas para o avanço descontrolado da agricultura. O boi se instala às bordas da floresta. Plantadores de soja e de cana - a exemplo dos bandeirantes que seguiam o curso dos rios - perseguem as pegadas do gado e empurram as fazendas para adiante, em geral áreas protegidas. Tiram proveito, assim, da infra-estrutura instalada. Sem fiscalização, o negócio corre célere. Entre 1990 e 2006, a produção bovina na floresta passou de 18% para 36% do plantel nacional.

A apuração comprova suspeita que há muito figura entre as preocupações dos brasileiros: a Amazônia está sendo tratada da maneira convencional. Adota-se ali o conceito de desenvolvimento econômico aplicado ao país desde a chegada dos colonizadores europeus há 500 anos. Esse ponto de vista levou à devastação de 93% da Mata Atlântida e à perda de rios no Nordeste. É verdade que o crescimento a qualquer preço gerou riqueza rápida, mas para poucos e a custo impossível de calcular.

A pergunta que se impõe é se queremos desenvolver a Amazônia com base no modelo ultrapassado. Vale lembrar que, até meados do século passado, não havia preocupação com o meio ambiente. A partir da década de 60, a ciência ambiental evoluiu muito. Com o conhecimento que temos hoje, é inadmissível adotar o conceito antigo e ultrapassado de desenvolvimento aplicado a outros biomas. Caso se insista, só se beneficiará da fórmula falida quem busca lucro imediato, indiferente à devastação que trará prejuízo irrecuperável ao país.

Não se questiona se a Amazônia tem de se desenvolver. Questiona-se, sim, o caminho a seguir. A atividade econômica deve seguir políticas públicas que garantam a sustentabilidade do modelo. Precisa-se tratar a região de maneira nova, baseada na expansão do conhecimento das comunidades regionais. Pra dar escala às experiências exitosas, é imprescindível o concurso do Estado. Sem isso, instala-se a lei da selva. Quem pode mais avança mais. Deixa, atrás de si, rastro de destruição e morte. Não é esse modelo superado que o Brasil e o mundo esperam seja aplicado à floresta amazônica.

CB, 17/06/2008, Opinião, p. 24

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