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Parque sitiado

O Globo, Rio, p. 16
19 de Dez de 2007

Parque sitiado
Morros crescem e ameaçam Maciço da Tijuca, cercado por 48 comunidades

Fernanda Pontes, Luiz Ernesto Magalhães e Selma Schmidt

Vistas do alto, favelas que avançam sobre uma das maiores florestas urbanas do mundo ameaçam o Parque Nacional da Tijuca, onde estão localizados cartões-postais do Rio, como o Corcovado e a Pedra da Gávea. Durante sobrevôo feito ontem, o superintendente regional do Ibama, Rogério Rocco, identificou três áreas em Jacarepaguá, Água Santa e Méier onde é visível o crescimento de construções irregulares sobre o verde. Das 48 favelas que estão próximas de limites do parque, o Ibama também se mostra preocupado com outras 11 comunidades, entre as quais Cerro-Corá e Guararapes (Cosme Velho), e o trecho da Rocinha conhecido como Laboriaux.

- O fato de as favelas estarem consumindo a floresta nos deixa apreensivos. Há uma omissão grande da prefeitura. Essa área de mata tem que ser cuidada. Há os efeitos de borda sobre o parque, que acaba sendo atingido. Ou seja, a proximidade da favela leva lixo, fogo, esgoto e animais para dentro da reserva, o que é nefasto - afirma Rocco.
No sobrevôo de ontem, foram marcados cinco pontos geo-referenciados.

De helicóptero e usando os recursos de GPS e uma câmera fotográfica, a cada dois meses os mesmos ângulos serão monitorados. Dessa maneira, será possível fazer um acompanhamento para identificar áreas sobre as quais existe pressão.

Ritmo intenso de construções
O panorama não é diferente visto do asfalto. No Cosme Velho, o CerroCorá e o Guararapes já tomaram conta da encosta, tendo como limites muros que cercam propriedades particulares e vias. Nessas duas comunidades, o adensamento é visível e o ritmo de construção de novos andares é intenso. Em alguns pontos é possível observar casas que, de tão próximas, disputam a paisagem com o Cristo.

Ao contrário do que o prefeito Cesar Maia diz, a expansão das favelas no Cosme Velho também é horizontal. Isso acontece, inclusive, na encosta do Túnel Rebouças, aos pés do Corcovado. Se nada for feito, teremos toda a encosta ocupada. Esta é a herança que vamos deixar para os cariocas? - pergunta Sávio Neves, diretor da empresa Trem do Corcovado.

Apesar do crescimento das favelas, Rocco garante que os 3.953 hectares do Parque Nacional da Tijuca ainda estão preservados. Segundo ele, dentro da região de proteção existem algumas casas de funcionários e ex-empregados do parque. Além disso, há cinco casas no alto do Morro Dona Marta que ultrapassaram os limites, entrando na área do parque.

- Há uma pressão grande de favelas e condomínios na direção do parque. Por isso, a necessidade permanente de controle. Se não houver articulação com prefeitura e governo do estado, certamente teremos problema futuros - avalia Rocco, que alega ser o Ibama encarregado de fiscalizar o parque, cabendo à prefeitura coibir invasões no seu entorno.

O Dona Marta é uma das 11 favelas que preocupam o Ibama. Outras são Nova Divinéia, no Grajaú; Formiga, Salgueiro, Turano, Borel e Casa Branca, na Tijuca. As duas últimas se juntaram fisicamente. Uma favela próxima à impressionante Cachoeira Grande, perto da Estrada de Furnas, no Alto da Boa Vista, também está na lista daquelas consideradas motivo de apreensão. Junto a essa favela há ainda casas de classe média subindo a encosta.

Já a Inácio Dias, em Jacarepaguá, é uma das três favelas que representam mais ameaça ao parque, por causa do crescimento visível. O analista ambiental e chefe substituto do Parque Nacional da Tijuca, Bernardo Issa, conta que, no fim de 2006, um trabalho de reflorestamento que estava sendo feito no local teve de ser interrompido, quando a favela, que era controlada por traficantes, passou a ser dominada por uma milícia. Moradores que executavam o projeto foram expulsos. O Ibama espera retomar o programa ano que vem.

Camarista Méier é outra favela que se expande. O Ibama identificou crescimento ainda, durante o sobrevôo, numa favela na altura do Túnel da Covanca, em Água Santa. Na encosta, observam-se algumas casas construídas recentemente.

Embora sem impacto direto no Parque Nacional da Tijuca, durante o sobrevôo foi possível constatar que a Favela do Vidigal desce em direção ao condomínio das Yucas, em São Conrado. Do lado da Gávea, a Favela Parque da Cidade aparece como um aglomerado de prédios e casas. Mas é ao longo das encostas da Auto-Estrada Grajaú-Jacarepaguá que se vê a maior quantidade de novas construções.

Em meio a críticas, Cesar Maia decidiu ontem culpar a União e o estado pelo cenário. Cesar reconheceu que a favela Chácara do Céu (Leblon) está crescendo, mas apenas na vertical. O prefeito admitiu que os moradores do Alto Leblon têm razão para reclamar da situação. E que, se morasse no bairro, certamente também se queixaria.

Cesar criticou os projetos do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). Ele condenou a proposta de implantar um elevador ligando o PavãoPavãozinho ao Cantagalo, que poderia se tornar um risco à segurança. Diz que atiradores poderiam aproveitar o equipamento para atingir inimigos. Na Rocinha, a crítica é ao projeto da via interligando a favela, que facilitaria o deslocamento de caminhões com material de construção.

Opinião
Caminho

A Constituição de 88 assegurou ao Ministério Público independência em relação aos três
Poderes.
E É no seu papel de ministério encarregado de defender a sociedade de agravos do poder público que deve ser entendida, e aplaudida, a decisão do MP de processar a prefeitura por inércia diante da expansão da Chácara do Céu.
Como o município, dispondo de instrumentos legais, não exerce o seu poder de polícia, parece não restar outro caminho para conter a degradação do Morro Dois Irmãos.

O Globo, 19/12/2007, Rio, p. 16

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