VOLTAR

Para compensar o dano, benefício local

O Globo, Razão Social, p. 18
19 de Out de 2010

Para compensar o dano, benefício local
TAC com a Perdigão, dá à Rio Verde (GO) mapeamento de Satélite

Camila Nobrega
camila.nobrega@oglobo.com.br

Em 1997, toda a cidade de Rio Verde, em Goiás, teve o abastecimento de água interrompido por quase 12 horas, devido a um vazamento de gordura para a rede de águas pluviais causado pela Perdigão. A água foi totalmente limpa pela companhia em poucos dias, mas a dívida com o município ficou. O pagamento, fruto de um Termo de Ajuste de Conduta (TAC) firmado com o Ministério Público do estado, está surtindo efeito agora. Trata-se, segundo o MP, do maior mapeamento por satélite de uma cidade da região. Com ele, a prefeitura descobriu, por exemplo, que a área de Reserva Legal da cidade é de apenas 5%, em vez dos 20% estabelecidos por lei. E tem munição para atacar o problema.
O responsável pelo TAC com a Perdigão foi o promotor de Justiça do município de Rio Verde, Lúcio Cândido Oliveira Júnior, autor do inquérito civil público sobre as atividades da empresa. Para determinar os termos do ajuste, ele levou em conta uma necessidade do município, que há anos tentava obter imagens de satélite para fazer um bom georreferenciamento das propriedades. Na região, assim como em boa parte do Norte e do resto do Centro-Oeste brasileiros, os registros em cartório e os levantamentos sobre áreas de floresta não acompanham nem de longe a realidade. Mas, segundo Oliveira Júnior, faltavam verbas para tocar o projeto, o que foi solucionado pelo acordo com a Perdigão: - O laboratório de geoprocessamento era uma pretensão antiga do MP goiano, mas dependia de orçamento.
Agora teremos um cadastro com todas as propriedades rurais e seus proprietários, coisa que não existia até então, permitindo, por exemplo, a cobrança do IPTU de forma mais justa.
A Perdigão foi responsável pela compra de fotos de satélite de todo o território do município. Nelas, foram colocadas as coordenadas registradas por técnicos que utilizam GPS em trabalhos de campo. De casa em casa, eles vão registrando e anotando os limites das propriedades, que, em muitos casos, já foram até divididas entre várias gerações de famílias e nunca tiveram o registro atualizado em cartório.
Juntando tudo, o resultado se mostrou muito diferente do que aparecia em dados oficiais. No lugar dos 2.900 terrenos estimados, havia quase quatro mil propriedades. E, dessas, apenas 42% possuíam uma área de Reserva Legal, diferentemente do que está estabelecido em lei, cuja determinação é de 20% em cada terreno. Somando todo o território, apenas 5% correspondem a Reservas Legais e 4,8% a Áreas de Preservação Permanente (APPs). A partir dos dados, o próximo passo será chamar os proprietários e delimitar prazos para que cada um regularize sua situação, segundo o promotor Oliveira Júnior. Para cumprir o Código Florestal Brasileiro, falta um longo caminho. E o objetivo do MP agora é estabelecer um planejamento para recuperação de áreas degradadas.
Embora o TAC não apague o dano gerado pelas duas horas de vazamento, ele funciona como um mecanismo de compensação ambiental. No Brasil, as punições têm sido mais severas, especialmente com aumento da fiscalização e compreensão do valor dos recursos naturais para o planeta e a própria saúde dos seres humanos. No caso da Perdigão, o acordo chegou à casa dos R$ 5 milhões. Sinal de que não dá mais para as empresas deixarem as falhas de lado.
É o que explica a promotora do Ministério Público de Goiás, Sandra Garbelini, que tem apresentado o projeto como um case de sucesso de um TAC. Segundo ela, é importante que cada estado utilize as medidas punitivas para trazer o melhor benefício para o local:
- É preciso compensar a natureza e o número de pessoas atingidas. A pergunta na hora de definir um TAC é "qual o melhor ganho para o meio ambiente em cada localidade?".
Não dá para pedir apenas para uma empresa construir um viveiro de mudas, ou preservar mais dez metros de mata. Há boas soluções que têm fundamento jurídico.
Em Rio Verde, a Perdigão movimenta boa parte da economia local, baseada na pecuária extensiva e criação de grãos. Boa parte desses produtores de grãos são fornecedores da companhia, para alimentação de seus animais. Logo, além da responsabilidade por conta do dano causado, não deixa de existir um duplo compromisso com a cidade. Além do georreferenciamento, a companhia assumiu ainda o compromisso de construir um sistema de captação de águas dentro do parque industrial, que foi cumprido. Procurada pela equipe de reportagem, a Perdigão não concedeu entrevista sobre o assunto.

O Globo, 19/10/2010, Razão Social, p. 18

As notícias aqui publicadas são pesquisadas diariamente em diferentes fontes e transcritas tal qual apresentadas em seu canal de origem. O Instituto Socioambiental não se responsabiliza pelas opiniões ou erros publicados nestes textos. Caso você encontre alguma inconsistência nas notícias, por favor, entre em contato diretamente com a fonte.