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Papa abordará temas polêmicos na América Latina

O Globo, Sociedade, p. 37
05 de Jul de 2015

Papa abordará temas polêmicos na América Latina
Conflitos em fronteiras e relação com indígenas estão na pauta de visita a três países

Renato Grandelle

RIO - O primeiro Papa latino-americano da História volta ao continente hoje para uma visita de sete dias a três países. Durante suas passagens por Equador, Bolívia e Paraguai, Francisco dedicará parte de seus 22 discursos a temas espinhosos como meio ambiente, conflitos em fronteiras, relações da Igreja com povos indígenas e o histórico local de governos autoritários.
Esta é a primeira visita planejada pelo Pontífice à América Latina. Sua passagem anterior pelo continente, na Jornada Mundial da Juventude, no Rio, há dois anos, foi inicialmente concebida para o Papa Bento XVI, que viria a renunciar meses antes da viagem.
Francisco escolheu a dedo os países por onde passará. Equador, Paraguai e Bolívia estão entre as economias mais pobres do continente. Neste último, um em cada quatro habitantes vive com menos de US$ 2 por dia, segundo o Banco Mundial.
- É mais uma demonstração de que Francisco é o Papa das periferias, já que esses países são excluídos mesmo no cenário latino-americano - avalia Andrew Chesnut, professor de Estudos Religiosos da Universidade Virginia Commonwealth (EUA). - Além disso, são três nações com grande população indígena, aquela que mais tem abandonado a Igreja Católica nas últimas décadas.
FOLHAS DE COCA CONTRA ALTITUDE
Outro sinal da aproximação do Pontífice com os povos indígenas está na própria maneira com que pretende encarar cidades a até 4 mil metros de altitude. Francisco pediu para mascar folhas de coca, consideradas sagradas em países andinos. O papamóvel também contará com um tubo de oxigênio.
De acordo com teólogos, a aproximação com os povos indígenas é um sinal da disposição de Francisco de estancar o enfraquecimento da Igreja Católica no continente, onde tem perdido fiéis para religiões neopentecostais.
- Enquanto o catolicismo cresce na Ásia e na África, seu declínio é muito grave na América Latina, onde estão 40% dos fiéis do mundo - alerta Chesnut. - No Brasil, por exemplo, a religião deve ser superada pelas igrejas protestantes até 2030.
Professora do Departamento de Teologia da PUC-Rio, Maria Clara Bingemer diz que o catolicismo já não é hegemônico na América Latina, mas que Francisco deu novo fôlego à Igreja no continente.
- Há projeções de que ele teria contido a perda de fiéis, mas ainda são apenas dois anos de pontificado. É muito cedo para saber.
Maria Clara, no entanto, indica como Francisco tenta levar seu discurso ao continente. O primeiro sinal foi diplomático - com sua intermediação, Cuba e EUA reataram relações interrompidas há mais de 50 anos. Agora, o Papa expõe sua formação jesuíta. Honrando sua fama de representante dos pobres, anotou na sua agenda encontro com idosos no Equador, uma visita à violenta prisão boliviana de Palmasola e a um bairro pobre em Assunção, no Paraguai. Nos países que também contam com trechos da floresta amazônica, lembrará sua encíclica divulgada no mês passado - a primeira da História da Igreja dedicada ao meio ambiente - e os conflitos pelas riquezas da mata.
- Há uma gama de países poderosos mirando os recursos da Amazônia - lembra Maria Clara. - E a ligação entre o prejuízo ao meio ambiente e a miséria é inegável. Por causa dela e de problemas de fronteira, a migração é cada vez maior entre os países do continente.
O padre Leandro Chiarello, diretor da Faculdade de Teologia da PUC-RS, concorda com a ligação entre os discursos ambientais e assistenciais.
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- A encíclica foi um grito para a Humanidade, mas o Papa a dirigiu nitidamente para os mais pobres, entre eles muitos povos da América Latina - ressalta. - Ainda em sua época como bispo argentino, Francisco dizia como os problemas ambientais da Amazônia afetavam as geleiras do Sul do continente. Falar de problemas ambientais para os pobres na periferia é a tônica de seu pontificado.
ÚLTIMOS AJUSTES
Como parte dos preparativos para a recepção ao Papa, a Justiça boliviana julgou na semana passada mais de 250 casos de detentos da superlotada penitenciária de Palmasola, onde os 5.300 presos estão divididos entre facções. Segundo o jornal local "El Deber", as atividades papais serão decididas de acordo com "o tipo e quantidade de possíveis atividades a desenvolver com os presos".
Já o diário paraguaio "Última hora" destacou, em sua edição de quinta-feira, que camponeses reivindicam um diálogo direto com Francisco. No Paraguai, 2,6% de proprietários rurais concentram 85,5% das terras agrárias.

O Globo, 05/07/2015, Sociedade, p. 37

http://oglobo.globo.com/sociedade/religiao/papa-abordara-temas-polemico…

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