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País não tem plano para desapropriação

FSP, Dinheiro, p. B3
16 de Mai de 2006

País não tem plano para desapropriação

EDUARDO SCOLESE
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

O Palácio do Planalto já dá como certa a desapropriação em massa dos fazendeiros brasileiros na Bolívia, mas, por outro lado, não possui nenhum plano emergencial para remanejá-los para terras nacionais.
Por enquanto, segundo a Folha apurou, o Planalto quer apenas ganhar tempo, à medida que aguarda o presidente Evo Morales assinar os decretos e os projetos de lei que regulamentam a nacionalização das terras bolivianas e dão início à reforma agrária.
O teor dessa nova legislação é que dá a certeza ao Planalto de que fazendeiros (sojicultores e pecuaristas, principalmente) e trabalhadores rurais brasileiros dificilmente terão como escapar da desapropriação na Bolívia. De acordo com os bolivianos, são oito decretos e um projeto de lei com o objetivo de reverter ao país as terras que não cumprem uma função econômica e social ou cujos títulos de propriedade tenham sido obtidos de forma ilegal.
Relatos locais levados a integrantes do governo federal indicam uma realidade de fragilidade documental, ambiental e trabalhista dos brasileiros que exploram as terras bolivianas, o que, na prática, tende a dificultar qualquer tipo de contra-argumentação do Planalto com a Bolívia.
Cerca de cem famílias brasileiras são responsáveis por 35% da produção de soja boliviana, e o governo Evo Morales estima haver centenas de proprietários do Brasil explorando ilegalmente áreas na longa fronteira comum.
Na última semana, integrantes do governo que buscaram informações sobre a situação dos produtores e agricultores brasileiros na Bolívia receberam relatos pouco animadores. Ouviram, por exemplo, sobre a fragilidade dos documentos das terras nas mãos dos brasileiros. Em sua maioria, seriam títulos de posse não-renováveis e válidos só por determinado período. Os fazendeiros também estariam desobedecendo a cláusulas ambientais, como a devastação indiscriminada para o avanço da soja, e trabalhistas, como a exploração degradante da mão-de-obra local.
Com isso, os brasileiros aparecem vulneráveis diante de diferentes pontos do pacote, que inclui a regularização dos títulos de posse, contenção à expansão da fronteira agrícola promovida por produtos de exportação (principalmente a soja), a tese da desapropriação da terra pelo não-cumprimento da função social, a expropriação de fazendas que tenham trabalhadores em situação análoga à escravidão e a expulsão de proprietários estrangeiros da zona de 50 km de fronteira.
Na prática, desde que soube da articulação de Morales para nacionalizar suas terras, o Planalto apenas tomou uma decisão: a de não retaliar, por exemplo, com um processo de fiscalização da situação de famílias bolivianas em propriedades rurais no Brasil.
No Planalto, deve ser criado nas próximas semanas um GT (Grupo de Trabalho) interministerial para o tema. O grupo teria como primeiro objetivo fazer um levantamento dos brasileiros que trabalham em fazendas bolivianas. Depois, localizar lotes vagos em projetos de assentamentos da reforma agrária para encaixá-los.
Outro papel desse GT será o de encontrar soluções para os fazendeiros. O governo teme que, caso tenham mesmo de deixar a Bolívia, procurem extensas áreas da região amazônica para criar novas plantações de soja, o que é negativo no aspecto ambiental. O governo boliviano divide os brasileiros entre os sojicultores radicados no departamento de Santa Cruz e os que exercem atividades ilegais na zona fronteiriça.

FSP, 16/05/2006, Dinheiro, p. B3

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