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O último contrabando em MPs

OESP, Notas e Informações, p. A3
21 de Set de 2009

O último contrabando em MPs

Cabe perfeitamente a classificação de "monstrengo" dada pelo vice-líder do PSDB no Senado, Álvaro Dias (PR), ao projeto que resultou da grande quantidade de emendas acrescentadas à Medida Provisória (MP) no 462 e que foi aprovado pelo plenário. Editada pelo governo para permitir a destinação de R$ 1 bilhão aos municípios como compensação pelas perdas dos repasses do Fundo de Participação dos Municípios, a MP já tinha sido desfigurada durante sua tramitação na Câmara, também com a aprovação de várias emendas de iniciativa dos parlamentares, e passou por novas e profundas mudanças no Senado. O senador Dias tentou adiar a decisão do Senado, mas foi voto vencido. Para ele, o texto aprovado, pela disparidade de temas que trata, é "um escárnio à juridicidade".

Por causa das mudanças, o projeto voltou para a Câmara. Agora, os deputados só poderão aprovar ou rejeitar as alterações feitas no Senado. Não podem mais acrescentar emendas de seu interesse político-eleitoral. Mas o que deputados e senadores já conseguiram incluir no texto é mais do que suficiente para justificar o tom irônico com que o senador Valter Pereira (PMDB-MS) se referiu a ele: "Essa MP parece mais a feira do Paraguai, tanto é o contrabando de emendas nela."

A MP 462 foi a última, segundo entendimento do presidente da Câmara, deputado Michel Temer (PMDB-SP), na qual se permitiu acrescentar emendas dispondo sobre temas não tratados no texto original. Por isso, os deputados - e, em seguida, os senadores - aproveitaram para nela incluir tudo o que era de seu interesse imediato. Reconheça-se que a versão original já era um convite para o acréscimo de temas, pois, além de permitir a transferência de recursos federais para prefeituras cujas receitas foram afetadas pela crise, elevava a participação da União no Fundo de Garantia para a Construção Naval e preservava os créditos do Banco Central no caso de quebra de bancos, retirando-os da massa em liquidação.

As medidas contidas nos 10 artigos da MP foram mantidas, mas ao texto original os deputados acrescentaram 13 artigos. Entre as novidades aprovadas pela Câmara estão mudanças na política ambiental e isenção de contribuição previdenciária de empresas de reflorestamento. Até mesmo dispositivos que, colocados em textos anteriores, nem chegaram a ser votados ou foram vetados pelo presidente da República voltaram na versão aprovada pela Câmara, como a dispensa de licenciamento ambiental obrigatório nas obras de pavimentação, adequação e ampliação de rodovias federais existentes. O relator do projeto na Câmara, deputado Sandro Mabel (PR-GO), também introduziu no texto uma mudança nos juros da dívida renegociada pelos contribuintes que aderiram ao mais recente programa de renegociação aprovado pelo governo, e autorizou o parcelamento em até 120 meses das dívidas dos municípios com a União.

Entre os acréscimos feitos no Senado estão, por exemplo, a redução de praticamente 94% (de 2,674 milhões de hectares para 167,3 mil hectares) da área da Floresta Nacional de Roraima; a fixação de prazo de cinco dias para a empresa devolver lixo que tenha importado sem autorização; a permissão para as empresas exportadoras que não utilizaram o benefício do crédito-prêmio do IPI entre 1983 e 1990 fazê-lo agora; a inclusão de mais um porto (em Ilhéus, na Bahia) ao Plano Nacional de Viação; e a autorização para o governo doar até 70 mil toneladas de feijão de estoques públicos para a população "em situação de insegurança alimentar".

Não há praticamente nenhum vínculo entre esses assuntos que justifiquem seu tratamento num mesmo projeto. A inclusão de temas desconexos nos projetos de conversão das medidas provisórias já ocorreu outras vezes e o resultado das transfigurações pelas quais essas MPs passaram em razão das emendas "contrabandeadas" pelos parlamentares ficou conhecido como "árvore de Natal".

No caso da MP 462, os senadores exageraram tanto que o deputado Sandro Mabel - que, como relator, foi responsável pela maioria das emendas aprovadas pela Câmara e relatará também a versão aprovada pelo Senado - reagiu com ironia: "Falaram que eu tinha feito uma árvore de Natal, e veja o que Senado fez."

OESP, 21/09/2009, Notas e Informações, p. A3

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