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O PAC e o meio ambiente

CB, Opinião, p. 19
Autor: GOLDEMBERG, José
14 de Fev de 2007

O PAC e o meio ambiente

José Goldemberg
Professor do Instituto de Eletrotécnica e Energia da USP

O Plano de Aceleração do Crescimento anunciado recentemente pelo governo prevê investimentos de cerca de R$ 500 bilhões nos próximos quatro anos em obras de infra-estrutura como portos, rodovias, ferrovias, aeroportos, saneamento e energia. No último item, a intenção é instalar 12 milhões de kilowatts de energia elétrica (o que equivale a uma Itaipu), 14 mil quilômetros de linhas de transmissão e 4.500 quilômetros de gasoduto.

Entre todas as obras previstas no PAC, não há a menor dúvida de que são as de energia que têm maiores impactos ambientais. Hoje, essa é uma área em que existem sérios conflitos entre desenvolvimento e preservação ambiental. Os problemas são bem conhecidos:

Se a opção for construir usinas termoelétricas que usam carvão - como ocorreu de fato num dos recentes leilões - elas originam problemas de poluição local, uma vez que o carvão brasileiro possui impurezas de enxofre e outras, sem falar nas emissões de gases de efeito estufa. Conceder licenças ambientais para usinas a carvão não é fácil no mundo todo e provavelmente o mesmo vai ocorrer no Brasil.

Se a opção for nuclear, existem os problemas bem conhecidos do que fazer com os resíduos radioativos que também são discutidos no mundo todo. Em particular nos Estados Unidos, que têm cerca de 100 reatores nucleares em funcionamento, nenhum novo reator foi construído desde 1985 (antes do acidente de Chernobil) e um dos motivos é a falta de acordo sobre a construção de um reservatório definitivo para o lixo nuclear. Já existem cerca de 70 mil toneladas desse "lixo" e a solução que seria depositá-lo em cavernas profundas em Yucca Mountain, no estado de Nevada, já se arrasta por mais de 10 anos.

Se a opção for hidroelétrica, sobretudo no importante aproveitamento do Rio Madeira (e outros na Amazônia), existem os problemas decorrentes da inundação de áreas onde vivem populações tradicionais ou indígenas, além de florestas densas.

A existência de problemas não significa que não possam ser resolvidos, mas a tarefa exige esforços consideráveis. Na área federal, o órgão licenciador é o Ibama, e estados têm alguma liberdade de ação exceto em projetos interestaduais em que o Ibama é chamado a intervir.

O que temos presenciado nos últimos anos é que a lentidão na concessão de licenças ambientais é considerada responsável pelos atrasos que podem colocar em risco o suprimento de energia elétrica nos próximos anos. Mesmo que essa percepção seja injusta em alguns casos, existe a ação do Ministério Público que, com grupos ambientalistas, levam o problema para a esfera do Judiciário, onde o governo pouco pode fazer. O presidente da República declarou na reunião de Davos que os aproveitamentos do Rio Madeira serão licenciados de "qualquer maneira", mas a decisão não é fácil de cumprir.

Em base na nossa experiência como secretário do Meio Ambiente do Estado de São Paulo nos últimos 5 anos, a estratégia para resolver os problemas ambientais não é queda-de-braço entre "desenvolvimentistas" e "ambientalistas", mas uma ação que envolva dois componentes: os empreendedores, quer públicos (como a Eletronorte), quer privados, precisam se conscientizar que os projetos têm de ser mais bem preparados incluindo a variável ambiental no próprio projeto e não como problema a ser resolvido depois da obra concluída.

Compensações ambientais adequadas precisam ser previstas incluindo reassentamento de populações afetadas mesmo que elas aumentem o custo do projeto. Os órgãos ambientais - principalmente o Ibama - precisam melhorar seu desempenho técnico não apenas negando licenças, mas se engajando ativamente com os empreendedores para melhorar o projeto durante a sua análise.

Essas considerações valem para todos os tipos de projetos previstos no PAC. Se não forem devidamente levadas em conta e solucionadas, a lentidão atual dos licenciamentos ambientais vai continuar. Por mais que o governo queira executar obras - mesmo se tiver recursos para tal - elas não sairão do papel.

O Professor José Goldemberg foi Secretário do Meio Ambiente do Estado de são Paulo de 2002 a 2006

CB, 14/02/2007, Opinião, p. 19

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