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O novo macaco da família

Isto É, Ciência, Tecnologia & Meio Ambiente, p. 96-98
03 de Mai de 2006

O novo macaco da família
Fósseis encontrados na região amazônica completam a árvore evolutiva dos primatas brasileiros e mostram que eles são muito mais velhos do que se imaginava

Por Julio Wiziack

O Brasil tem a maior variedade de macacos do mundo, mas é um dos países que menos localizavam vestígios desses primatas. Esse atraso acaba de ser recuperado com a descoberta de fósseis de duas importantes espécies. Trata-se dos macacos Solimoae acrensis e Acrecebus fraileyi, revelados através da análise de um par de dentes e fragmentos de mandíbula desenterrados na região de Patos, a cerca de 200 quilômetros de Rio Branco, no Acre. Esses mais novos membros da família viveram nessa área há aproximadamente nove milhões de anos. É um recorde de antigüidade porque, antes deles, os fósseis mais antigos não tinham sequer 15 mil anos.
Os novos animais, encontrados pelos pesquisadores Mario Alberto Cozzuol (Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul) e Richard Kay (Universidade Duke, dos EUA), pertenciam à família dos atelíneos, grupo do qual fazem parte os maiores macacos do continente. Pelas contas de Cozzuol, o Solimoae acrensis pesava cerca de seis quilos e tinha a altura de um macaco-barrigudo ou de macaco-aranha (cerca de 60 centímetros), seus parentes mais distantes na linha evolutiva. O Acrecebus fraileyi pesava aproximadamente 20 quilos e era quatro vezes maior que um macaco-prego - ou seja, chegava a medir 2,80 m de altura.
Com a descoberta das novas duas espécies, os cientistas já começam a esclarecer um dos grandes mistérios da paleontologia: países como a Argentina e a Bolívia, que não têm muitos macacos vivos "para contar a história", são justamente os que mais encontram restos de primatas pré-históricos. Na Patagônia, por exemplo, há registros de 12 milhões de anos, e na Bolívia existem registros de 26 milhões de anos. Para os estudiosos, essas evidências são um forte suporte às teorias que afirmam que a macacada chegou à América há cerca de 40 milhões de anos. A América do Sul não estava presa à América do Norte nessa época, algo que só aconteceu há três milhões de anos. Esse imenso bloco de terra ficava dançando entre o oceano Atlântico e o oceano Pacífico e, ao dar uma encostada na África, os macacos de lá pularam para cá. "O litoral do sudeste deve ter registros dessa chegada", presume Cozzuol. Segundo ele, somente dessa forma é possível explicar as semelhanças entre os primatas do Brasil e os primatas da África.
O imbróglio dessa rede de parentescos fica mais complicado quando se leva em conta um crânio de sete milhões de anos encontrado recentemente no Chade. Para surpresa da comunidade científica, a análise desse crânio revelou que ele poderia ser tanto de um chimpanzé quanto de um hominídeo, nome que se dá às espécies que evoluíram do macaco até formar o homem atual. Com todos os avanços recentes no campo da genética, sabe-se que 98% dos genes humanos são iguais aos genes dos chimpanzés e os neurocientistas já provaram que eles também são inteligentes. "Nossos mecanismos bioquímicos e nervosos são extremamente parecidos", diz Irvênia Prada, professora de neurociência animal da Universidade de São Paulo.
Um belo exemplo disso é a "atriz" Chita, grande atração dos filmes de Tarzan nas décadas de 1930 e 1940. Ela é um desses prodígios simiescos. Aos 74 anos, Chita entrou para o Guinness book, o livro dos recordes, como o chimpanzé mais velho do planeta e há pouco tempo recebeu homenagens em um festival de cinema da Califórnia - muito embora a sua última aparição na tela tenha sido em 1967. Na verdade, homenageava-se a "lucidez" e a longevidade da macaca. Em Washington, o chimpanzé Washoe é a atração de um instituto que se tornou célebre depois que o seu fundador, o psicólogo americano Roger Fouts, provou que essa espécie de macaco pode entender diversas palavras que nós falamos, através da linguagem dos sinais. Nesse jogo de semelhanças e diferenças, a ciência consegue aos poucos recompor os passos da nossa evolução. Temos inevitavelmente de passar pelos macacos para entender o que somos hoje. O Brasil deu um largo passo trazendo um novo e bem-vindo macaco para a família.

Isto É, 03/05/2006, Ciência, Tecnologia & Meio Ambiente, p. 96-98

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