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O futuro da energia no Brasil

OESP, Especial, p. H1-H16
Autor: ZYLBERSZTAJN, David
21 de Abr de 2006

O futuro da energia no Brasil
A auto-suficiência do País em petróleo é motivo de orgulho para os brasileiros,mas qual é o grau de dependência do Brasil nas demais fontes de energia?

A data é mais que oportuna. Na mesma semana em que a cotação do barril do petróleo no mercado internacional encostou nos US$ 73, a Petrobrás põe em funcionamento hoje - dia em que se comemora a luta dos inconfidentes contra a dependência externa - a P-50, plataforma de exploração de petróleo de US$ 1,5 bilhão que permitirá ao País produzir mais que o suficiente para atender ao consumo interno.
Significa que, agora, a economia brasileira deixa de ficar exposta diretamente aos efeitos de crises externas provocadas por conflitos bélicos ou intempéries, causas de periódicas instabilidades na cotação do combustível que move a economia mundial.
Não é pouca coisa. Mas há outras conquistas dignas de comemoração.
A P-50, além de apresentar inovações tecnológicas em suas 77 mil toneladas, empregou em sua construção, direta ou indiretamente 16 mil brasileiros.
Erguida sobre o navio petroleiro Felipe Camarão, aposentado da Frota Nacional da Petrobrás, o equipamento vai garantir uma mudança significativa nos resultados das contas do País. Em 2004, o Brasil teve um déficit comercial em petróleo e derivados de US$ 3 bilhões. No ano passado, o déficit já caiu para US$ 132 milhões. Este ano, haverá superávit de mais de US$ 2 bilhões, o primeiro da história.
Esta edição especial, porém, não se limita à conquista hoje anunciada com direito a festa política. As páginas a seguir traçam um retrato completo da matriz energética brasileira e das perspectivas do setor para os próximos anos. Traumatizados pelo apagão de 2001, os brasileiros ainda enfrentam o risco de falta de energia para garantir o crescimento nos próximos anos.
Há investimentos em projetos de geração que dependem da superação de empecilhos ambientais e burocráticos.
No setor nuclear, o futuro também é incerto. Aguarda-se uma definição quanto à retomada da Usina de Angra 3, investimento que já consumiu US$ 750 milhões e precisa de mais US$ 1,8 bilhão para ser concluído.
No mercado de álcool, melhor alternativa renovável ao petróleo, o Brasil ainda está sujeito há problemas de abastecimento, como o que ocorreu nos últimos meses, no período da entres safra.
A disparada do preço do combustível nos postos obrigou o governo a intervir no mercado e alterar a mistura de álcool à gasolina, por falta de estoques reguladores.
Mas o álcool brasileiro, apesar da recente crise, é cobiçado por países como Estados Unidos e Japão e atrai hoje investimentos de mais deR$ 10 bilhões em 50 novas usinas.
O País busca também outras fontes renováveis como a energia solar, eólica e até mesmo na eletricidade gerada a partir das ondas do mar.
Em uma outra frente, o programa de produção de biodiesel mobiliza agricultores em um projeto que prevê a produção de mais de um bilhão de litros por ano a partir de 2008.
Por lei, o governo criou um novo mercado de combustível ecológico obrigando a mistura gradativa de biodiesel ao diesel comum.
Iniciativas como essas, com planejamento e investimento adequados, podem garantir a longevidade da auto-suficiência do Brasil em petróleo.

Brasil conquista independência no mercado de petróleo
Sonho de mais de meio século torna-se realidade e o País passa a produzir o suficiente para atender ao consumo
Irany Tereza
Na semana em que o petróleo bate picos de preço de US$ 72 o barril, com projeção de US$ 71 no mercado futuro para o mês de maio, o Brasil anuncia a conquista da auto-suficiência em produção. Ou seja, o País passa a extrair de suas jazidas um volume de óleo superior ao total de combustíveis que o mercado interno consome. É uma independência econômica internacional importante e não por acaso a data escolhida para anúncio foi o 21 de abril, Dia de Tiradentes, mártir da luta contra a coroa portuguesa.
Foi uma jornada longa, que atravessou, ao menos, 12 diferentes gestões governamentais e que teve seu ponto de aceleração nos anos 80, logo após a descoberta dos campos gigantes no litoral do Rio de Janeiro, na Bacia de Campos. Hoje, com a perspectiva de novas fronteiras de produção, especialmente nas Bacias de Santos e do Espírito Santo, o setor de petróleo é a mais promissora atividade econômica nacional.
Em quatro anos, os investimentos da Petrobrás somaram R$ 107 bilhões, inlcuindo a previsão de gastos para 2006. Segundo a Organização Nacional da Indústria do Petróleo (Onip), empresas privadas despejarão mais US$ 16,9 bilhões (ou cerca de R$ 36 bilhões) até 2010.
Este ano, pela primeira vez desde sua fundação, há 53 anos, a Petrobrás deixará de integrar a coluna das empresas que contribuem para o déficit na balança comercial brasileira e passará para o grupo do superávit. De cara, com uma participação em torno de US$ 3 bilhões nas exportações líquidas (exportação menos importação), como estima o presidente da estatal, José Sérgio Gabrielli.
Ele acredita que a auto-suficiência, que chega dentro do prazo previsto no cronograma oficial, está na verdade atrasada. "Poderíamos ser auto-suficientes há dois anos, não fossem problemas conjunturais, como atrasos em plataformas e outras questões."
O mais grave problema para a produção foi o naufrágio da P-36, em março de 2001, que iniciaria a produção no campo gigante de Roncador. Por uma falha de projeto, o enorme equipamento afundou, matando 11 trabalhadores.
Outras plataformas vieram depois. E as que ganharam os louros de representarem o marco da auto-suficiência foram a P-43 e a P-48, que entraram em operação no ano passado, e a P-50, que será acionada hoje, pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Além de ter solucionado o problema estrutural da conta-petróleo - uma intrincada equação que tinha como elementos a Petrobrás e o Tesouro e envolvia cálculos sobre débitos com subsídios ao transporte de combustíveis -, o País vive um momento excepcional no mercado, como lembra o consultor Jean-Paul Prates, da Expetro.
"Alcançar a auto-suficiência neste momento de alta histórica de preço do petróleo tem um imenso valor macroeconômico, mas para o Brasil ainda é mais especial. Além de ser uma nova fronteira mundial de investimentos em energia, o País se apresenta ao mundo como líder nato na indústria de biocombustível, que é o que vai fazer o preço do petróleo baixar daqui 15, 20 anos", declara Prates.
Em 2004, a Petrobrás deixou de ser a única produtora de petróleo em território nacional, com o início da operação da anglo-holandesa Shell no Campo de Bijupirá e Salema, na Bacia de Campos, em parceria com a estatal brasileira. Agora, com o funcionamento da P-50, a espanhola Repsol entra, também com a Petrobrás, na produção do Campo de Albacora-Leste. Ainda estão na fila as americanas Devon, Chevron e El Paso.
"Estamos realizando dois sonhos: o da auto-suficiência brasileira e o de ser a empresa estrangeira parceira deste processo", declara João Carlos de Luca, presidente da Repsol no Brasil. O executivo, que trabalhou na Petrobrás por 30 anos, acompanhou de perto toda a evolução na produção, desde os 180 mil barris/dia do Campo de Garoupa, em 1974. "Para mim, é uma emoção muito particular. Dos momentos das várias conquistas na Petrobrás e agora, quando as empresas estrangeiras começam a criar realmente raízes no País."
Para Luca, há agora um grande desafio, que é o de manter a auto-suficiência. Ele calcula que, para não haver queda no ritmo de produção, será preciso pôr em operação ao menos uma plataforma de petróleo por ano. "É uma chance de desenvolvimento de reservas extraordinária. Um novo marco de oportunidade de negócios."
Para especialistas, ainda há grandes possibilidades de descobertas de novas reservas que poderão adicionar produção nos próximos 15 anos. Hoje, o Brasil tem 13,2 bilhões de barris de reservas provadas de óleo equivalente (petróleo e gás). Segundo estudo das consultorias britânicas Wood Mackenzie e Fugro Robertson, o País ainda tem a descobrir reservas de 18 bilhões de barris de óleo equivalente em águas profundas.
Para Jean-Paul Prates, é hora de as empresas privadas engrossarem os investimentos tradicionalmente feitos pela Petrobrás em pesquisas e exploração. "O setor de petróleo é um mercado de risco. Esse investimento não é tarefa da Agência Nacional de Petróleo."
As reservas provadas são suficientes para garantir a produção por 16 anos, segundo projeção da Petrobrás. O geólogo Giuseppe Bacoccoli, que fez carreira na estatal, calcula que, para manter no nível atual a relação entre reserva e produção, é preciso descobrir um campo gigante, com pelo menos 800 milhões de barris, a cada ano.
Uma das grandes apostas da companhia, são as reservas recém-descobertas de óleo leve (aquele com alto grau API, medida internacional de qualificação do óleo), que tem valor comercial maior, por representarem custos mais baixos de refino. A partir de 2006, a produção de óleo leve da estatal ultrapassará os 150 mil barris diários. Atualmente, quase todo o petróleo extraído dos campos nacionais é pesado, com grau API em torno de 20. O valorizado petróleo árabe tem em torno de 50 API.
Bacoccoli lembra que o desafio de manter a auto-suficiência será maior à medida em que o País alcance taxas de crescimento econômico desejadas, acima de 5% ao ano. "O consumo de combustíveis no Brasil é muito baixo, o que acelerou o processo de auto-suficiência", afirmou. Segundo ele, o consumo nacional é de 4 barris/ano por habitante, enquanto em países como Espanha e Itália, esta relação chega perto dos 12 barris. Nos Estados Unidos, o consumo per capita é de 25 barris/ano. "Se o brasileiro consumisse como o espanhol, precisaríamos de três vezes mais petróleo para sermos auto-suficientes", compara.

Preço dos combustíveis não cai

Os preços da gasolina, diesel e gás de cozinha manterão a mesma linha de acompanhamento do mercado internacional, mantido a uma certa distância de tempo. Ou seja, a auto-suficiência não trará alívio para o bolso do consumidor, na hora de encher o tanque do carro. Mas mesmo os maiores críticos da política de preços da Petrobrás consideram que este não é mesmo o objetivo da conquista de uma produção que atenda plenamente ao consumo interno.
"A gasolina não deve mesmo baixar por causa disso. Não tem nada a ver uma coisa com a outra. O importante agora é que o Brasil está protegido. Se, por exemplo, o Irã detonar uma bomba atômica e isso elevar o preço do barril para além de US$ 100, o abastecimento no País continua garantido", diz Adriano Pires, do Centro Brasileiro de Infra-Estrutura (CBIE). Mesmo considerando um avanço a conquista da auto-suficiência, ele continua questionando os critérios de acompanhamento internacional de preços feito pela Petrobrás. "O tempo de repasse se altas ou quedas de preços é irregular, muito subjetivo. A empresa alega sempre está esperando a definição de um patamar. O que cobro é coerência".

No gás, País ainda é dependente
Pelo menos até o fim da década, metade do que é consumido no Brasil terá de ser importado da Bolívia

Nicola Pamplona

A auto-suficiência na produção de petróleo não vai reduzir a dependência brasileira do gás natural importado. Estima-se que, pelo menos até o final da década, o gás boliviano continue representando metade do mercado nacional do combustível - excluindo o consumo interno em instalações da Petrobrás.
Fruto de um histórico desinteresse pelo desenvolvimento de reservas de gás, a necessitade de importação manterá o País vulnerável a crises sociais e políticas do seu principal fornecedor, a Bolívia.
"Vamos ter de acender uma vela para São Pedro e outra para Evo Morales (presidente da Bolívia)", brinca o consultor Giuseppe Bacoccoli, ex-funcionário da Petrobrás e hoje professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).
Bacoccoli refere-se aos riscos de falta de energia no final da década, quando o País estará mais dependente das usinas termoelétricas. "Ou chove muito e não precisamos ligar as térmicas, ou o Morales libera o fornecimento de gás", completa.
Os recentes acontecimentos na Bolívia mostram que a torcida não vai ser fácil. Depois de nacionalizar, em 2005, as reservas concedidas a empresas estrangeiras a partir de 1996, o governo boliviano ameaça tomar para si o controle dos campos locais de petróleo e gás. No centro das discussões, está o desejo de ampliar suas receitas com as exportações do combustível para Brasil e Argentina.
Uma coisa é dada como certa: o preço do gás vai subir. A partir de agosto do ano passado, a Petrobrás começou a reduzir os descontos que vinha dando às distribuidoras para quem vende o combustível, com o objetivo de conter o crescimento do consumo, uma vez que as perspectivas para o fornecimento futuro não são boas.
INCERTEZAS
Segundo dados da Associação Brasileira das Distribuidoras de Gás Canalizado (Abegás), o Brasil estará consumindo 104 milhões de metros cúbicos por dia do combustível em 2010. A produção nacional, de acordo com a Petrobrás, estará em 84,5 milhões de metros cúbicos por dia. Parte desse volume, no entanto, será destinado ao consumo interno da Petrobrás, em refinarias e instalações de produção. A expectativa, portanto, é que as importações da Bolívia sejam ampliadas para além dos 30 milhões de metros cúbicos por dia do contrato atual.
No mês passado, a Transportadora Brasileira do Gasoduto Bolívia-Brasil (TBG) iniciou o processo de expansão do duto, recebendo propostas de cinco empresas interessadas em importar mais 36 milhões de metros cúbicos. Mas, diante das declarações do governo boliviano sobre a nacionalização das reservas, o processo é incerto.
"As discussões sobre o mercado de gás estão 20 anos atrasadas", decreta Bacoccoli, lembrando que a lei que pôs fim ao monopólio na produção nacional de petróleo foi aprovada em 1997 e só agora, nove anos depois, o País discute uma lei para o gás natural. Ele se recorda que a busca por gás foi posta em segundo plano durante anos no País, que centrou seus esforços para reduzir a dependência das importações de petróleo, principalmente depois dos choques mundiais da década de 70.
"Falta coordenação nos planejamento do setor energético. Os formuladores de políticas pensam mais em eletricidade e a Petrobrás, sozinha, pensa no gás", avalia o presidente da Abegás, Romero de Oliveira e Silva.
A Petrobrás promete agilizar o desenvolvimento de novas reservas de gás no País, principalmente na Bacia de Santos, e espera, em 2010, já ter 15 milhões de metros cúbicos por dia do Campo de Mexilhão para colocar no mercado.
Para a coordenadora de Projetos de Energia da Fundação Getúlio Vargas (Ebape/FGV), Goret Paulo, o importante é diversificar as fontes de suprimento para evitar dependência excessiva de regiões específicas. "O gás de Santos é uma alternativa, a importação de gás natural liquefeito para o Nordeste, outra."
Para ela, a Bolívia pode continuar como supridora de gás para o País, mas a exposição brasileira às reservas bolivianas deve ser reduzida. "O Brasil deve à Bolívia o desenvolvimento de um mercado para o gás natural, que antes não existia", afirma. Silva, da Abegás, reclama incentivos do governo para a ampliação da rede de transporte do combustível, com o objetivo de desenvolver novos mercados.
LOGÍSTICA
O Brasil tem hoje grandes reservas de gás que não são utilizadas por falta de capacidade de transporte. Trata-se do campo de Urucu, em meio à floresta amazônica, a cerca de 700 quilômetros de Manaus. Urucu produz pouco mais de 8 milhões de metros cúbicos por dia, mas 7 milhões são reinjetados nos poços. O restante é transformado em gás liquefeito de petróleo (GLP), o popular gás de botijão, que abastece parte da Região Norte.
O gás da Amazônia não vai resolver o problema das Regiões Sul e Sudeste, uma vez que não há gasodutos interligando a Amazônia ao restante do País. Mas pode garantir uma economia de até R$ 2 bilhões na Conta de Consumo de Combustíveis (CCC), taxa cobrada na conta de luz de cada brasileiro para subsidiar a geração térmica a óleo no Norte do País. Este ano, a CCC vai consumir R$ 4,5 bilhões.
A conta seria menor se o Gasoduto Coari-Manaus, projetado no final dos anos 90, estivesse pronto. A Petrobrás, porém, enfrentou obstáculos ambientais e políticos, além de pressões dos empreiteiros que atrasaram as obras. O novo cronograma prevê o início das operações no final de 2007, pondo fim a uma espera que já dura 18 anos: desde 1988 a estatal produz gás no campo, sem conseguir vendê-lo.
"Estamos sendo irresponsáveis em deixar de pensar em planejamento para o setor de gás só porque, neste momento, temos garantia de oferta", reclama o presidente da Abegás.
As discussões sobre a lei do gás ficaram em segundo plano nos últimos meses, depois do acirramento da crise com a Bolívia. A grande preocupação, hoje, é se o Brasil terá suprimento suficiente e a que preços. "Mais cedo ou mais tarde o governo boliviano vai perceber que o gás só traz riqueza se for vendido para alguém. E o Brasil é o principal parceiro", diz Goret.

Futuro do programa nuclear brasileiro é incerto
Construir ou não Angra 3 é uma discussão que promete ser longa; Dilma levanta inviabilidade econômica

Clarissa Thomé

Enquanto o País alcança a auto-suficiência em petróleo, no setor nuclear o futuro ainda é incerto. A expectativa é que o presidente Lula anuncie ainda este ano a retomada da Usina de Angra 3, investimento que já consumiu US$ 750 milhões e precisa de mais US$ 1,8 bilhão para ser concluído. O assunto deve voltar a ser discutido na próxima reunião do Conselho Nacional de Política Energética (CNPE), no mês que vem.
A construção da nova usina ganhou força em dezembro, após o leilão de energia térmica em que os preços ficaram próximos do que era estimado pelo governo para o custo de geração térmica nuclear (R$ 140 por MW/h). Novo estudo do Ministério de Minas e Energia mostrou que esse valor caiu para R$ 138 por MW/h e que a usina pode ser concluída em seis anos e meio. Angra 3 foi incluída ainda no Plano Decenal de Expansão da Energia Elétrica 2006-2015.
Outro ponto que favorece a retomada da usina é o fato de o País ter se tornado detentor do ciclo do combustível nuclear. A primeira etapa da fábrica de enriquecimento de urânio das Indústrias Nucleares do Brasil já está pronta e em teste. "Com a construção de Angra 3 vai aumentar a demanda pelo urânio enriquecido, barateando custos e viabilizando nossa indústria nuclear", afirma o presidente da Associação Brasileira de Energia Nuclear (Aben), Edson Kuramoto.
As sucessivas crises na Bolívia podem também ajudar à retomada de Angra 3, aposta o secretário de Energia do Estado do Rio, Wagner Victer, um dos integrantes do CNPE. "O País não pode depender da importação do gás boliviano. Angra 3 substituiria uma térmica a gás com consumo de 6 milhões de m3, 20% do que é importado."
A ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, que se opunha à construção de Angra 3 por causa da inviabilidade econômica, já havia deixado a reunião do CNPE, no último dia 6, quando foi apresentado o novo estudo feito pelo MME. Os argumentos de viabilidade financeira, no entanto, não convencem a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva. "Não basta que a questão dos aspectos econômicos seja resolvida. Ainda não se tem uma solução adequada e segura para os resíduos. Trabalhamos muito para que se tenham outras alternativas de energia renovável para o suprimento do País.

A revolução dos bicombustíveis
Motor democrático, que permite optar entre álcool ou gasolina, é divisor de águas na indústria automobilística

Cleide Silva

O Brasil é um dos países com mais opções de combustível para abastecer os veículos. Gasolina, álcool, gás, diesel ou biodiesel movimentam carros, picapes, caminhões e ônibus. Recentemente, o País desenvolveu a inédita tecnologia flex, que mistura algumas dessas substâncias e já está presente em 1,2 milhão de automóveis, ou 5% da frota circulante. A conta indica que a frota nacional, incluindo caminhões e ônibus, é de 23,2 milhões de veículos, volume que cresce em média 3% ao ano.
A gasolina ainda é o combustível mais usado. Do total de veículos, 71% têm motores movidos com o produto derivado do petróleo. O carro movido a álcool, que nos anos 90 correspondia a 30% da frota nacional, hoje está em 14% dos modelos.
Carros que aceitam um único combustível vão perder participação gradativa no mercado e dar espaço ao bicombustível. Versões movidas apenas a álcool desapareceram. Hoje, os modelos novos estão adaptados à tecnologia flex e rodam com gasolina ou álcool.
A tendência futura é o motor de combustível único desaparecer, diz Sven Dinklage, coordenador de um estudo sobre a frota brasileira feito pelo Sindicato Nacional dos Fabricantes de Autopeças (Sindipeças). O estudo aponta que, em 2004, os modelos flex representavam 2% do total de carros em circulação, participação que subiu para 5% em 2005 e deve dobrar de tamanho novamente este ano.
O primeiro carro bicombustível, um Volkswagen Gol, foi lançado em março de 2003. Hoje, 99% da linha de produtos da VW vendida no mercado interno têm esse tipo de motor.
"O bicombustível é um divisor de águas na indústria pois, além de ser alternativa mais amigável ao meio ambiente do que a gasolina, é um motor democrático: permite ao cliente escolher o melhor combustível no momento de abastecer, seja por razões econômicas ou preferências pessoais", diz o gerente de desenvolvimento de motores da VW, João Alvarez Filho.
A General Motors, que hoje tem 95% da sua linha equipada com a tecnologia bicombustível lançará o Celta 1.4 FlexPower no segundo semestre. A Fiat também tem 95% dos seus produtos com motorização flexível. As demais montadoras adotam a tecnologia gradativamente. Em março, 77,6% dos carros vendidos no País eram flex.
Até o fim do ano passado, a maioria dos donos de veículos flex enchia o tanque com álcool, por ser mais barato que a gasolina. Nos últimos meses, com a alta do preço do combustível, por causa da entressafra da cana, houve certa confusão no mercado e a indústria teve de ir à campo explicar que a vantagem do bicombustível é justamente a liberdade de escolha. "A indústria nunca vendeu o carro flex como carro a álcool", diz o vice-presidente da GM, José Carlos Pinheiro Neto. Circunstancialmente, afirma ele, o álcool é mais barato.
Com o flex, diz Pinheiro Neto, o consumidor não fica preso a um combustível, correndo risco de deixar o carro na garagem, como ocorreu na época do Proálcool. "Antes, o consumidor precisava decidir que carro iria comprar, se a álcool, a gasolina. Hoje, ele pode comprar o veículo e usar qualquer um dos dois", diz o executivo.
Dono de um modelo Meriva flex adquirido em março de 2004, o professor e diretor de escolas em Marília (SP), João Dejato diz que a vantagem de usar álcool diminuiu. "Naquele período eu gastava R$ 60 para ir até São Paulo. Hoje, gasto cerca de R$ 160".
Naquela época, lembra ele, o preço do litro do álcool equivalia a 40% da gasolina. Hoje, corresponde a mais de 70%. "Espero que o início da safra de cana neste mês ajude os preços a baixarem", afirma Dejato, que ainda assim prefere um modelo flex a ter outro movido apenas com um combustível.
A indústria agora desenvolve motores flexíveis para caminhões e ônibus, que poderão ser abastecidos com diesel ou gás. O estudo do Sindipeças mostra que o diesel é usado em 10% da frota de veículos, participação estável desde 2000. O biodiesel, mistura de diesel com óleo de mamona, também começa a ser adotado no País.

Frota movida a gás já passa de 1,1 milhão

Outra opção que ganha espaço na matriz de combustíveis é o gás natural (GNV). A frota brasileira passou de 144,9 mil veículos em 2000 para 1,117 milhão em março deste ano. É a maior frota por país. A Argentina tem 1,5 milhão de veículos e o Paquistão tem 700 mil. No mundo todo há 4,7 milhões de carros movidos a GNV, segundo a Associação Brasileira das Empresas Distribuidoras de Gás Canalizado (Abegás). "O Brasil tem 1,2 mil postos de abastecimento", diz o vice-coordenador do Comitê de GNV do Instituto Brasileiro do Petróleo (IBP), Francisco Barros. Apesar da crise com a Bolívia, de onde o País recebe boa parte do gás, ele não vê riscos de desabastecimento. O consumo está por volta de 4,3 milhões de m3 ao dia. Em 2010, a projeção é chegar a 10 milhões de m3, suficiente para abastecer 2 milhões de carros. A cada ano são convertidos de 180 mil a 200 mil veículos. "Nesse cenário não há problema de abastecimento pois há novos investimentos no setor."
Além das conversões, duas montadoras, Volkswagen e GM, oferecem modelos tricombustível, prontos para rodar com álcool, gasolina ou gás. Em setembro, a Fiat lançará o Stilo tetracombustível, adaptado também à gasolina pura, o que elimina mudanças de produto para exportação no Mercosul. O problema do gás é o espaço que o cilindro ocupa no porta-malas. As montadoras estudam alternativas como instalação em baixo do banco do passageiro ou próximo ao tanque de combustível, mas nenhuma solução está prevista no curto prazo.

Produção de álcool vive era de euforia
Problemas com abastecimento não afetam projetos para novas usinas

José Maria Tomazela

O setor sucroalcooleiro do Brasil começa a viver o "terceiro grande salto" e sua indústria de base está preparada para atender à expansão, segundo o empresário José Luiz Olivério, vice-presidente de Operações da Dedini. Ele chama de "grande salto" o desafio de gerar estrutura e equipamentos para processar 570 milhões de toneladas de cana-de-açúcar na safra brasileira de 2010. No ano passado, as usinas moeram 386 milhões de toneladas.
Trata-se de uma nova expansão ocasionada por três fatores simultâneos, segundo Olivério. O primeiro, a crescente demanda de álcool no mercado interno por causa do sucesso dos veículos bicombustíveis. O segundo, o grande interesse mundial pelo álcool por utilizar matéria-prima renovável, e o terceiro, o crescimento nas exportações do açúcar, estimulado pelas ações contra o subsídio ao produto europeu.
Olivério, que integra a Câmara Setorial da Cadeia Produtiva do Açúcar e do Álcool, ligada ao Ministério da Agricultura, lembra que os dois primeiros saltos foram dados, respectivamente, pela criação do Proálcool, em 1975, e pela conquista do mercado internacional para o açúcar, a partir de 1995.
No primeiro período, o Brasil passou de uma safra de 90 milhões de toneladas/ano, para 220 milhões de toneladas. No segundo, saiu de uma produção de 8 milhões de toneladas de açúcar para 27 milhões de toneladas em 2004. "A conseqüência direta disso é que o País se tornou o maior produtor mundial de cana, de álcool e de açúcar, e também o maior exportador desses produtos."
Com o novo ciclo de expansão, a previsão oficial para a safra de 2010 é tida por ele como conservadora. "Foi feita em 2004 e precisa ser revista", disse. Isso porque o sucesso do carro flex está sendo maior do que o previsto, assim como o interesse mundial pelo álcool."
O executivo assegura que a indústria brasileira tem condições de fornecer estrutura e equipamentos para a moagem de 184 milhões de toneladas de cana a mais nos próximos 4 anos. "Não será necessária a importação."
Cerca de 40% desse volume será atendido com a expansão das 347 usinas atuais, que operaram na safra 2005/06. Outros 60% - ou 110 milhões de toneladas, vão exigir a construção de 70 usinas. Até o final do próximo ano, 30 novas unidades entram em operação. Outras 30 já são projetos irreversíveis para 2008 e 2009. As outras 10 devem operar em 2010, mas Olivério acredita que o número será extrapolado. "Nós, da Dedini, temos 109 consultas para novas usinas."
A indústria nacional tem capacidade para instalar de 30 a 40 usinas novas por ano. A Dedini responde pela metade desse volume. No ano passado, a empresa faturou R$ 700 milhões, dos quais 45% no setor de açúcar e álcool. "Este ano trabalhamos com orçamento de R$ 830 milhões, mas devemos faturar mais."

A auto-suficiência não é suficiente

David Zylbersztajn

O Brasil é um dos poucos países (se não o único) com relevante grau de industrialização que tenha saltado diretamente da era da madeira para a era do petróleo, sem conhecer o apogeu do carvão mineral.
No entanto, o petróleo sempre povoou os anseios e as lutas nacionais, tanto no âmbito técnico quanto no político. Até hoje pretexto para os principais conflitos internacionais, o petróleo desde sempre prestou-se, em nosso País, para motivar apaixonados debates.
A criação da Petrobrás, há mais de 50 anos, foi precedida de todos os tipos de escaramuças. Os desafios de Monteiro Lobato a Getúlio Vargas (que valeram a Lobato uma temporada na prisão), a campanha do 'Petróleo é Nosso' e o acirrado confronto entre trabalhistas (que propuseram a criação da estatal) e de liberais (que impuseram o monopólio!) levaram o Brasil a desenvolver uma atribulada e bem-sucedida trajetória no setor de hidrocarbonetos.
Essa trajetória foi percorrida através de pouco mais de quatro décadas de monopólio da Petrobrás e, nos últimos dez anos, por um setor aberto a outras companhias, nacionais e estrangeiras, concessionárias da União no exercício do monopólio da exploração econômica da cadeia produtiva do petróleo e do gás.
Teria sido a Petrobrás mais eficiente se, ao ser criada, não estivesse sob a proteção do monopólio (como na proposta inicial de Vargas)? Teríamos sido mais bem-sucedidos caso fosse adiante a proposta de Monteiro Lobato, de um setor aberto ao setor privado, desde os primórdios? Dadas as circunstancias históricas, jamais seremos capazes de responder a estas perguntas.
Inegavelmente, tivemos, ao longo da existência da Petrobrás, a demonstração inequívoca de brasileiros capazes de criar um dos mais bem-sucedidos exemplos, no mundo, de desenvolvimento de capacitação humana e tecnológica no setor de óleo e gás.
Quando da abertura do setor a outros agentes, através de alteração constitucional, em 1995, reações iradas atribuíam tal movimento a um bem urdido plano destinado a enfraquecer e, posteriormente, privatizar a Petrobrás.
A realidade foi bem diversa: a empresa vem, sucessivamente, melhorando seus resultados, tanto em volume, quanto em valor. Seus lucros são crescentes e sua capacidade de investimento, inédita. A indústria nacional parapetroleira é cada vez mais pujante e competitiva internacionalmente. Diversos mecanismos de apoio fiscal e institucional foram criados para dar suporte à empresa brasileira.
Nunca houve tantos recursos para a área de ciência e tecnologia, assim como para a formação de recursos humanos e geração de empregos. A nova política de distribuição das participações governamentais (royalties e participação especial) aumentou dezenas de vezes o afluxo de recursos a Estados e municípios. Foi acelerado o conhecimento geológico e geofísico das bacias sedimentares brasileiras. E, por fim, mas não menos importante, foi criada a Agencia Nacional do Petróleo (ANP), que consolidou no Brasil a política de concessões, de regulamentação e de controle das atividades da indústria de óleo e gás no Brasil.
No momento em que se comemora a auto-suficiência de petróleo, ao lado das justas e necessárias homenagens às diversas gerações que por mais de um século, lograram levar este País à ponta tecnológica das atividades da mais poderosa indústria mundial, algumas lembranças não podem ser negligenciadas: (1) Atingimos nossa capacidade de produzir o petróleo em volume, que necessitamos. Porém ainda estamos aquém da nossa autonomia quanto aos produtos derivados. (2) O fato de atingirmos a auto-suficiência, além dos esforços da Petrobrás, é devido ao baixo crescimento de nossa economia nos últimos anos. (3) Pequena parte dessa autonomia se deve a algumas centenas de milhares de barris de álcool produzidos no País.
No entanto, é justo o ufanismo que se estabelece neste momento. Poucos são os países industrializados capazes de ostentar o grau de independência em relação ao petróleo, como ocorre no Brasil. Independência acompanhada de conhecimento e recursos humanos autônomos.
Mas, devagar com o andor.
Em primeiro lugar não é adequada a assunção de paternidade quando muitos são aqueles a quem pode ser atribuído este resultado. E será irresponsável a postura de negligenciar o uso adequado de um recurso finito.
Pregar a abundância é colocar em risco as gerações futuras. O uso exagerado e ineficiente, além da exploração predatória, gera impactos nefastos ao meio ambiente, comprometendo a qualidade de vida de nossos filhos e netos.
Portanto, se, no presente e com justiça, o governo pretende homenagear um importante fato da história brasileira, deve ter o cuidado de não desprezar e ignorar o passado e muito menos menosprezar o futuro.
David Zylbersztajn, ex-diretorgeral da Agência Nacional de Petróleo, é consultor e sócio da DZ Negócios em Energia

Fontes alternativas ganham espaço
País investe em combustíveis verdes como o biodiesel, cuja produção chegará a 7,5 bilhões de litros/dia em 2010
Amauri Barnabé Segalla
A escalada do preço do barril do petróleo é apenas uma das razões para a necessidade de utilização de energias alternativas. Petróleo e seus derivados são grandes poluidores, as principais áreas produtoras estão localizadas em países potencialmente conturbados e as jazidas do planeta são finitas, embora não se saiba quando o óleo deixará de jorrar das profundezas da Terra.
"Não é possível pensar em desenvolvimento no futuro próximo sem considerar a idéia de fontes alternativas", diz José Luz Silveira, diretor-científico do departamento de fomento à pesquisa da Universidade Estadual de São Paulo (Unesp).
Um dos grandes desafios dos pesquisadores é desenvolver produtos capazes de substituir os combustíveis atuais. O Brasil tem sua parcela de contribuição. Aqui surgiram os motores automobilísticos a álcool e o biodiesel, que tem seduzido pesquisadores do mundo inteiro. O biodiesel é um combustível derivado da reação entre um óleo vegetal (obtido da soja, do fruto do dendê, da mamoma, do babaçu, do amendoim e do algodão, entre outros 40 produtos) com um álcool etílico (o metanol ou o etanol).
"Sua produção é relativamente simples e barata", diz Expedito Parente, que patentou o biodiesel no País em 1977 (hoje o combustível já é de domínio público).
A principal vantagem do biodiesel é que ele reduz, em média, em até 15% a emissão de poluentes. No Brasil, o governo criou uma política de incentivo ao produto, estimulando a criação de empresas como a Brasil Ecodiesel, que deverá produzir este ano 100 milhões de litros do chamado combustível verde.
Por lei, todo o diesel consumido no Brasil deverá ter, em sua composição, 2% do biodiesel até 2008 e 5% em 2013. Estima-se que, em 2010, o País esteja capacitado para produzir 7,5 bilhões de litros, o equivalente a 20% do consumo nacional de diesel. Segundo projeções, isso representará, por ano, economia de R$ 10 bilhões nas importações de combustível.
Além de estudar novas possibilidades de combustíveis, os pesquisadoress vêm investindo em tecnologias capazes de proporcionar alternativas de geração elétrica. O mundo consome hoje algo como 320 bilhões de quilowatts-dia por habitante - e esse número irá triplicar nos próximos 100 anos. Ou seja: se com o consumo atual o homem destrói a natureza de forma implacável, o que será do planeta se nós utilizarmos três vezes mais energia do que hoje?
A energia eólica, que consiste em gerar energia a partir da força do vento, tem um potencial colossal. Nos Estados Unidos, país recordista em consumo de energia no mundo, a matriz eólica responde por apenas 2% do total utilizado pelos americanos. Estima-se que a participação chegará a 20% em 2020. Esse mercado movimenta globalmente US$ 600 bilhões e cresce à impressionante média de 30% ao ano.
No Brasil, o maior parque eólico da América Latina foi parcialmente inaugurado na quarta-feira em Osório, no Rio Grande do Sul. O empreendimento irá quadruplicar a energia eólica produzida atualmente no País. A potência instalada será de 150 megawatts. O parque receberá investimentos de R$ 674 milhões, com recursos do Banco Nacional deDesenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e de um consórcio formado por bancos. "A energia eólica é ecologicamente correta, tem eficiência semelhante à de qualquer outra forma de produção de energia e nunca termina", diz Telmo Magadan, diretor da CIP Brasil, uma das empresas sócias do empreendimento.
Outra forma de energia verde é a biomassa. No Brasil, sua principal utilização é por indústrias de papel e celulose, que aproveitam o resíduo da madeira para gerar energia. Usinas de açúcar também usam os resíduos que sobram principalmente na produção do álcool. "O problema da biomassa é que a atual tecnologia usada no Brasil é muito limitada", diz o professor Sérgio Valdir Bajay, do departamento de Energia da Unicamp. "A contribuição desse método para a geração de energias alternativas ainda é muito pequena."
Uma terceira opção para a geração elétrica é a energia solar. À primeira vista, a impressão que se tem é que se trata da forma de captação de energia barata. Afinal, o sol é gratuito e está disponível para todos. Não é bem assim. Para captar a energia solar, são necessários investimentos em equipamentos que quase sempre inviabilizam os projetos.
A energia solar exige aportes de US$ 4 mil por quilowatt gerado, contra US$ 3 mil da energia eólica e US$ 2 mil do modelo tradicional no Brasil, a energia hidrelétrica. "Por isso, existem pouquíssimos projetos sérios de geração de energia a partir do Sol", afirma o professor Sérgio Valdir Bajay.
Outro projeto em andamento no Brasil, baseado na captação de energia tradicional, são as chamadas Pequenas Centrais Hidrelétricas (PCH). Semelhantes aos métodos utilizados nas grandes hidrelétricas, diferenciam-se apenas por se tratar de sistemas pequenos, de baixa potência. Em geral, são instalados em locais próximos a regiões ribeirinhas, aproveitando o fluxo natural de um rio ou riacho. No Brasil, as PCH funcionam principalmente em Minas Gerais, por sua característica topográfica.

'Biodiesel vai revolucionar o Brasil e o mundo'
Poucos países no mundo têm um potencial tão grande para a produção de biodiesel quanto o Brasil. Terras produtivas, mão-de-obra abundante, tecnologia de ponta, tudo isso faz do País um dos players mundiais no desenvolvimento dos chamados combustíveis do futuro. O biodiesel é o principal deles.
Criada há dois anos, a Brasil Ecodiesel é a empresa brasileira que mais investe na produção de biodiesel. "No futuro próximo, esse combustível substituirá o petróleo e provocará uma revolução no Brasil e no mundo", diz o presidente do conselho da companhia, Jório Dauster, ex-embaixador e ex-presidente da Vale do Rio Doce.
Em 2004, a empresa investiu R$ 16 milhões na instalação de uma unidade produtora em Floriano, no Piauí, que tem capacidade para fabricar 38 milhões de toneladas por ano de biodiesel a partir, principalmente, da mamoma. A unidade industrial obecede parâmetros estabelecidos pelo governo, que oferece isenção fiscal para quem investir no setor. Hoje, 700 famílias de agricultores participam do programa em uma área de 18 mil hectares.
Além de investir no Piauí, a Brasil Ecodiesel tem unidades em outros 11 Estados. Recentemente, a empresa apresentou um projeto para produzir 100 milhões de litros por ano de biodiesel em Rosário do Sul, no Rio Grande do Sul. Serão aplicados R$ 20 milhões na planta que será instalada na cidade gaúcha. "Como sou um homem vivido, posso dizer que o biodiesel provocará grandes transformações sociais e econômicas no País, gerando renda e divisas com a produção de um combustível ecologicamente correto."
A Petrobrás também analisa a possibilidade de investir em usinas de biodiesel. Uma equipe estudará o assunto. No primeiro leilão de biodiesel realizado no Brasil pela Agência Nacional do Petróleo (ANP), no ano passado, a Petrobrás comprou 100% dos 70 milhões de litros vendidos. Atualmente, existem no Brasil apenas cinco empresas habilitadas a processar o biodiesel.

Na força dos ventos, energia inesgotável
Entra em operação em dezembro, em Osório, no Rio Grande do Sul, um dos maiores parques eólicos do mundo
José Maria Tomazela
Os ventos que sopram de norte a sul do País representam uma fonte inesgotável de energia limpa, durável e de baixo impacto ambiental. A partir deste ano, a força dos ventos passa a ser também importante alternativa como matriz energética do Brasil. Entra em operação em dezembro um dos maiores parques de geração eólica do mundo, em Osório, no Rio Grande do Sul.
Construída pela empresa Ventos do Sul S.A., sociedade formada pela Wobben Windopower,subsidiária da alemã Enercon, pela Enerfin Enerventos, do grupo espanhol Elecnor, e pela brasileira CIP Consultores Internacionais, a usina eólica de Osório terá capacidade instalada de 150 megawatts.
A energia é suficiente para abastecer uma cidade de 1 milhão de habitantes e representa quatro vezes o que já é produzido de energia eólica no País. As 11 pequenas usinas de vento que já funcionam no litoral do Nordeste, do Paraná e Santa Catarina geram, juntas, pouco mais de 28 megawatts.
A Ventos do Sul está investindo R$ 674 milhões nas obras, iniciadas em novembro do ano passado. Do total, R$ 105 milhões são financiados pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), e o restante, por um consórcio de bancos liderado pelo Banco do Brasil. A empresa fechou contrato com a Eletrobrás para a venda de toda sua produção por um período de 20 anos.
O parque eólico de Osório reúne três conjuntos de geração - Sangradouro, Osório e dos Índios - cada um com 25 torres de 98 metros de altura, com rotores de três pás de 35 metros, formando cataventos de 70 metros de diâmetro. Cada torre, com altura equivalente à de um edifício de 33 andares, tem capacidade para gerar 2 megawatts.
A Wobben, que participa com 9% do projeto de Osório, é pioneira na exploração da energia eólica na América do Sul. A empresa instalou sua fábrica de aerogeradores em Sorocaba, interior de São Paulo, em 1995, quando o uso da energia dos ventos no Brasil era apenas uma vaga promessa. Para comprovar que a produção era viável, a Wobben construiu pequenas usinas no Ceará, passando a atuar como fornecedora de energia independente. Os parques eólicos pioneiros funcionaram no final da década de 90, em Taíba e São Gonçalo do Amarante, Ceará, com capacidade de 5 megawatts.
Com o Programa de Apoio Financeiro a Investimentos em Fontes Alternativas de Energia (Proinfa), a empresa passou a desenvolver novos projetos, sobretudo no Nordeste. Está em construção uma usina de 49,3 megawatts em Rio do Fogo, no Rio Grande do Norte, e outros empreendimentos serão iniciados ainda este ano. O potencial desse mercado levou a Wobben a instalar uma fábrica de torres em Pecém, no Ceará, com cerca de 400 funcionários. Em Gravataí (RS), construiu outra unidade de produção de torres, com 170 empregados. A unidade de Sorocaba, com 500 funcionários, foi ampliada e concentra a produção de 5 linhas de aerogeradores. A empresa faturou R$ 200 milhões no ano passado, exportando cerca de 60% da produção para Europa e Ásia.

A eletricidade que vem do mar
Governo do Ceará abre licitação para a compra da primeira usina que aproveita ondas para gerar energia
Alberto Komatsu
Depois de cinco anos de estudos e investimento de pouco mais de meio milhão de reais, o País vai assistir no mês que vem ao nascimento de um projeto pioneiro de geração de energia renovável.
O governo do Estado do Ceará vai abrir licitação em maior para a construção da primeira fase de uma usina que aproveita as ondas do mar para gerar eletricidade.
O projeto está sendo desenvolvido pela Coordenação dos Programas de Pós-Graduação de Engenharia (Coppe), da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), com o apoio da Eletrobrás e da Secretaria da Infra-Estrutura (Seinfra) cearense.
"O que nós estamos tentando fazer como diferencial é que o Brasil tenha pleno domínio de todos os componentes dessa usina. Ou seja, nós achamos importante que essa usina não tenha caixa preta. Que ela seja fácil de fabricar aqui no País e tenha facilidade de manutenção. Esse é o grande segredo do sucesso do projeto: ela tem de ser simples", afirma o professor Segen Stefen, do Programa de Engenharia Oceânica da Coppe.
O valor da licitação está estimado em R$ 3,5 milhões, que é o custo total da primeira etapa da obra, incluindo a parte estrutural. "Estamos nos últimos detalhes do fechamento da licitação, por conta da avaliação estrutural. A parte técnica do edital já está pronta", afirma o coordenador de energia da Seinfra, Adão Linhares.
COMO SERÁ
A licitação vai escolher a empresa que construirá dois módulos da usina, cada um composto por um flutuador com braço de sustentação e bomba hidráulica. Uma câmara hiperbárica e um gerador também integram a fase inicial do empreendimento. Nessa estapa de monitoramento, a capacidade de geração de energia será de 50 quilowatts (kW), que serão usados para iluminar o pier próximo ao Porto de Pecém, onde será erguido o projeto.
O professor da Coppe diz que a geração de energia com o aproveitamento das ondas do mar é simples. Segundo ele, as ondas movimentam os flutuadores, que por sua vez acionam bombas hidráulicas que enviam a água para a câmara hiperbárica (uma espécie de vaso de pressão) por meio de uma rede de dutos. Essa câmara simula uma queda d'água de 500 metros. O jato de água aciona uma turbina convencional, conhecida como Pelton, que conectada a um gerador produz a eletricidade que pode ser integrada a uma rede de transmissão convencional.
A etapa inicial, conta o professor Stefen, deverá durar de 18 a 24 meses. A usina completa terá 20 módulos e o seu custo dependerá dos resultados das experiências que serão feitas. A capacidade de geração de energia está estimada em 500 kW, suficientes para alimentar 200 residências, ou 2 mil casas fora do horário de pico.
O professor estima que o litoral brasileiro tem potencial para suprir 15% do total de energia elétrica consumida no País, de 400 milhões de MW hora por ano. O litoral cearense foi escolhido, explica o professor, porque os ventos alíseos da região contribuem para a formação de ondas quase o ano inteiro.
O professor Luiz Augusto Horta, do Instituto de Recursos Naturais da Universidade Federal de Itajubá, diz que a energia gerada por ondas é uma forma de energia eólica, pois as ondas são formadas com a ajuda de ventos. "Esse tipo de energia não vai fazer um aporte importante à capacidade de geração de energia do País, mas está na fase inicial e tem potencial muito grande", considera.

Questão ambiental é prioridade
Depois de dois desastres em 2000, volume de óleo vazado nas operações da Petrobrás caiu drasticamente
Roberta Pennafort
TASSO MARCELO/AE - 18/3/2001O ano 2000 é considerado um divisor de águas na história da Petrobrás. Dois gravíssimos desastres ecológicos, ocorridos em instalações da empresa no Rio de Janeiro e no Paraná num espaço de seis meses, causaram incomensuráveis danos à natureza e, também, à imagem da estatal. Era hora de mudar radicalmente a forma como se lidava com a questão ambiental. Seis anos depois, embora novos acidentes tenham ocorrido, a companhia se orgulha de atingir a auto-suficiência em petróleo tendo conseguido um lugar de destaque por seus bons resultados no setor de meio ambiente.
O volume de óleo e derivados vazados em operações no Brasil e no exterior caiu drasticamente de lá para cá: dos vergonhosos 5,98 milhões de litros, em 2000, para 269 mil litros, em 2005. "Ainda não chegamos onde queríamos, mas temos evoluído bastante. Nenhuma empresa no mundo obteve nosso resultado em termos de vazamento nos últimos anos", diz Ricardo Azevedo, gerente executivo de Segurança, Meio Ambiente e Saúde (SMS). No ano passado, a divisão contou com verba de R$ 2,8 bilhões. Atualmente, a Petrobrás é a empresa que mais investe na área no Brasil.
A gerência de SMS foi criada depois do impacto dos vazamentos de 2000. Em janeiro daquele ano, 1,3 milhão de litros de óleo combustível foram derramados na já poluída Baía de Guanabara. O material saiu de um duto que liga a Refinaria Duque de Caxias ao terminal da Ilha D'Água.
A mancha negra se estendeu por 40 quilômetros quadrados e atingiu a Área de Preservação Ambiental (APA) de Guapimirim, conhecida como o "pantanal fluminense", por sua rica fauna. As cenas de dezenas de biguás agonizando, envoltos em óleo, eram a imagem da tragédia. O ecossistema foi tão afetado que precisaria de uma década para se restabelecer, afirmaram ambientalistas, à época.
Apenas seis meses depois, mais um revés: quantidade ainda maior de petroléo, 4 milhões de litros, foi despejada nos Rios Barigüi e Iguaçu, este o principal do Estado do Paraná, durante operação de bombeio na Refinaria Getúlio Vargas.
A empresa foi acusada de negligenciar o sistema de segurança, o que teria contribuído para a ruptura de uma junta de expansão de uma tubulação da refinaria e causado aquele que seria o maior desastre ambiental em rio já registrado no território nacional. A companhia acabou detectando falha humana e demitiu quatro funcionários.
Em 1984, quase duas décadas antes, um terrível acidente, ainda mais dramático, por ter resultado em 93 mortes, já havia manchado a imagem da Petrobrás. Foi na Vila Socó, uma comunidade pobre de Cubatão (SP), dizimada depois que um duto da estatal liberou 700 mil litros de gasolina. Ao acender de um fósforo, 1.200 barracos, construídos sobre um mangue que, por sua vez, ficava em cima dos dutos, foram queimados. Os desabrigados chegaram a 2.500 pessoas. Hoje, a localidade, que voltou a ser conhecida como Vila São José, está recuperada (em parte, graças a recursos da Petrobrás e de outras empresas)
REESTRUTURAÇÃO
Naquela época - e também em 2000 -, a empresa já dispunha de determinados procedimentos que tinham como objetivo evitar vazamentos. Mas eram iniciativas fragmentadas. Nem de longe configuravam uma política determinada pela direção, como passou a ser seis anos atrás.
"Transformamos o limão na limonada", afirma Ricardo Azevedo. "Passamos por momentos difíceis. Os acidentes de 2000 causaram grande prejuízo à nossa imagem e ao nosso negócio e, se continuassem acontecendo, poderiam comprometer a sobrevivência da empresa."
O caminho em direção à excelência na área ambiental não é livre de obstáculos. Mesmo depois da implantação dos programas de segurança, que renderam à Petrobrás certificações de qualidade reconhecidas internacionalmente, os acidentes não cessaram definitivamente.
Em março de 2001, a plataforma P-36, que ficava na Bacia de Campos, no norte Fluminense, afundou. A estrutura foi irreversivelmente abalada por explosões provocadas por vazamentos de gás de tubulações. Onze funcionários morreram.
Apesar dos percalços, não se pode negar os avanços obtidos. Além da redução do volume de material vazado, a taxa de afastamento de empregados em decorrência de acidentes (TFCA) caiu 70% desde 2000.
Os nove centros de defesa ambiental instalados no País aumentaram a capacidade de resposta da empresa em caso de necessidade. E, para prevenir rupturas, 10 mil quilômetros dos dutos mais importantes - e críticos - passaram por processo de reparo e automatização.
Em termos de poluição atmosférica, a Petrobrás passou a fazer um controle das emissões de resíduos de suas instalações. E, em 2005, foram investidos US$ 750 milhões no programa Diesel 500, que visa à redução de 75% no teor de enxofre desse combustível.

Estatal assume falhas, mas contesta multas
De 64 autuações feitas pelo Ibama, a Petrobrás recorreu de 45 delas, e 5 já estão em cobrança judicial
Apesar de investir alto na prevenção de novos acidentes, a Petrobrás parece não estar disposta a pagar pelos erros do passado. A maior parte das multas aplicadas pelo Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) por desastres ocorridos entre os anos de 2000 e 2005 não teve o pagamento efetuado até hoje. Neste período, as punições ultrapassaram a cifra de R$ 350 milhões, de acordo com levantamento feito pelo órgão a pedido do Estado.
As sanções se deveram, principalmente, a derramamentos de óleo de dutos e navios e à operação de equipamentos e realização de atividades sem licença. Em caso de dano ambiental, o objetivo é levantar recursos para recuperar a área degradada. Das 64 multas que constam da lista do Ibama, a estatal recorreu de 45 delas, sendo que 5 já estão sendo cobradas na Justiça.
"A Petrobrás tem um enorme passivo ambiental e poderia dar um belo exemplo pagando o que deve", critica o biólogo Mario Moscatelli, que trabalha pela recuperação de manguezais da Baía de Guanabara há uma década. Ele acompanhou bem de perto o drama vivido em janeiro de 2000. "Até hoje, o manguezal cheira a óleo", conta Moscatelli. "A poluição também prejudicou o desenvolvimento da vegetação, que não está tão exuberante quanto poderia estar."
O episódio rendeu à empresa multa de R$ 51 milhões. O então presidente Henri Philippe Reichstul fez mea-culpa pública: "A Petrobrás fez o estrago e vai pagar", declarou ele. Não pagou tudo o que devia, segundo a Fundação Onda Azul, uma das ONGs encarregadas de cuidar da revitalização de manguezais.
Carlos Henrique Alves, diretor de Relações Institucionais da entidade, afirma que os recursos não foram repassados totalmente. "Ficou acertado que seriam destinados R$ 2,5 milhões dos R$ 51 milhões para o projeto, mas só recebemos R$ 1,5 mihão. O restante sumiu", conta. "O Ibama tem sérios problemas de fiscalização, precisa se aperfeiçoar." A Petrobrás informa ter pago o valor integral.
Já o depósito dos R$ 225 milhões de multa pela poluição dos Rios Barigüi e Iguaçu, no Paraná, a empresa admite não ter feito . A estatal recorreu ainda da punição por ter usado dispersantes químicos para conter o óleo que vazou quando do afundamento da P-36 - o Ibama cobra R$ 2,5 milhões. De acordo com a empresa, o órgão autorizou a utilização do material.
O gerente-executivo de Segurança, Meio Ambiente e Saúde, Ricardo Azevedo, afirma que a empresa não foge de suas responsabilidades. Mas, muitas vezes, a competência de determinados órgãos para multá-la é contestada, como no caso do acidente do Paraná (há situações em que as instâncias federal, estadual e municipal decidem autuá-la ao mesmo tempo).
Com relação às 33 multas de R$ 1,4 milhão de 2002 por operação de plataformas sem licença, ele acredita haver um mal-entendido no tocante à lei de crimes ambientais, de 1998: a Petrobrás entende que tinha permissão para usar as plataformas antes da lei e que isso basta; o Ibama, não.

OESP, 21/04/2006, Especial, p. H1-H16

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