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O crescimento pede licença ao licenciamento ambiental

CB, Opinião, p. 23
Autor: SALES, Claudio J. D.
05 de Jul de 2007

O crescimento pede licença ao licenciamento ambiental

Claudio J. D. Sales
Presidente do Instituto Acende Brasil

Mantido o atual cenário de emissão de licenças ambientais, o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) não passará de uma carta de intenções, porque faltará energia para gerar o crescimento desejado por todos. Movido pela necessidade de viabilizar as obras do PAC, o governo federal decidiu dividir o Ibama em dois. Tal estratégia tira do foco os problemas não reconhecidos pelo governo: falta de competência gerencial e imperfeições da legislação.

Pelo discurso oficial, o Ibama dividido poderia se concentrar nos licenciamentos ambientais e na fiscalização, já que não teria mais sob sua responsabilidade as Unidades de Conservação e Biodiversidade. No entanto, essa decisão peca por não reconhecer que o licenciamento não é mais ágil porque não existe um padrão de responsabilização que dê aos servidores públicos incentivos de compromisso com cronogramas.

Os licenciadores ambientais não são reconhecidos ou responsabilizados por cumprir ou não os prazos e respondem, criminalmente, como pessoas físicas, pelos processos de licenciamento que conduzem. O licenciador que dedicou meses à análise de um processo, ao aprová-lo, pode ser condenado à prisão caso um promotor discorde do seu parecer. Portanto, esses servidores têm todos os incentivos para negar os licenciamentos.

Além dessa distorção institucional, a morosidade na análise dos processos e os pedidos de complementações aos estudos também contribuem para os atrasos. Nos últimos 10 anos, segundo estudo do Banco Mundial, o prazo médio para se obter a primeira licença - licença prévia - para usinas hidrelétricas tem sido de 39 meses. Uma média incompatível com as metas do PAC. As usinas do Rio Madeira e de Estreito são exemplos eloqüentes.

O processo de licenciamento ambiental das usinas do Rio Madeira começou em 2004 e só em junho de 2005 o Ibama aprovou o relatório que orientaria a elaboração dos Estudos de Impacto Ambiental (EIA). A aprovação deveria ter ocorrido 30 dias após a abertura do processo. Depois da entrega dos EIA, em janeiro de 2006, o Ibama pediu complementações e, quando todos esperavam a emissão (ou não) da licença, o Ibama pediu nova complementação, 16 meses após a entrega dos EIA. Somados todos os prazos, são quase três anos sem nenhuma decisão.

Já o caso da usina de Estreito (prevista para entrar em operação em novembro de 2010) fere a racionalidade e o respeito às instituições. Mesmo com o empreendimento aprovado pelo Ibama (a licença que autoriza o início da obra foi emitida em dezembro de 2006) depois de seis anos de análise, a obra foi paralisada por determinação da Justiça do Maranhão, com base em supostos impactos sobre uma comunidade indígena distante 140km da usina. Ao fazê-lo, a Justiça desconsiderou os estudos realizados e a avaliação feita por especialistas indicados, em momento anterior, pelos próprios índios.

Para que serve o licenciamento ambiental quando, após todos os estudos e aprovações, a Justiça desconsidera as análises técnicas e esvazia a autoridade das instituições que se mobilizaram para respeitar a legislação vigente? Há saída para o (falso!) impasse "desenvolvimento versus meio ambiente", ou os brasileiros estão condenados a ficar sem energia?

Em primeiro lugar, o tempo de licenciamento ambiental poderia ser menor se o Ibama respeitasse as normas que ele próprio estabeleceu na Instrução Normativa 65/2005, norma que define todo o procedimento de licenciamento ambiental e prevê os prazos que nunca foram respeitados. Em segundo lugar, há aprimoramentos à legislação bastante bem-vindos no projeto de lei (embutido no PAC) que define as competências do licenciamento ambiental já previstas no artigo 23 da Constituição.

Finalmente, a alteração dos artigos da Lei de Crimes Ambientais (que prevê a detenção do funcionário que emitir licença "em desacordo com as normas ambientais") ofereceria sinais corretos de responsabilização aos licenciadores e introduziria incentivos para a aprovação responsável das licenças. As três medidas acima agilizam o processo de licenciamento sem sacrificar o respeito ao meio ambiente, às leis e às instituições democráticas. O crescimento e o desenvolvimento, educada e legalmente, pedem licença ao licenciamento ambiental.

CB, 05/07/2007, Opinião, p. 23

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