VOLTAR

O big brother da floresta

O Globo, Rio, p. 15
25 de Jun de 2005

O big brother da floresta
Parque Nacional da Tijuca será monitorado por satélite a partir do ano que vem

Os funcionários do Parque Nacional da Tijuca, que penam para percorrer os 3.953 hectares incrustados no meio do Rio de Janeiro, vão ganhar a ajuda de um big brother na fiscalização ambiental. O Ibama acabou de fechar um convênio com o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) que permitirá a criação de um sistema de monitoramento para a unidade com imagens de satélite. A tecnologia possibilitará analisar a região num detalhamento de até 25 metros quadrados - suficiente para flagrar um acampamento de caçadores na mata.
É a primeira vez que uma unidade de conservação do Ibama é monitorada com um sistema via satélite. Se a experiência der certo, segundo o Ibama, poderá ser repetida em outros parques.
Sistema permitirá mapear agressões
O convênio, no valor de US$250 mil, prevê a criação de um programa de computador exclusivo para receber as imagens via satélite e processá-las com as informações colhidas no campo pelos 15 analistas ambientais do parque. A equipe receberá treinamento e equipamentos na própria unidade para operar a nova tecnologia. O sistema começará a ser implementado em um mês e tem previsão de ser lançado no primeiro trimestre de 2006. O convênio já foi assinado, mas uma solenidade com a presença de diretores do Ibama e do BID está programada para os próximos dias na unidade.
A diretora do parque, Sônia Peixoto, explica que o programa identificará as ameaças através das imagens, que serão recebidas pelo satélite Landsat a cada três meses. A sobreposição de fotos no computador detectará com precisão o avanço dos impactos ambientais. O sistema, no entanto, vai mais longe:
- Não é uma simples análise de fotografias de satélite. Vamos criar um programa de computador que trabalha a imagem automaticamente junto com estudos sócio-ambientais, diagnósticos de fauna e flora, ou seja, todas as informações atualizadas para a gestão do parque. Com isso, será possível saber, por exemplo, qual é a área mais crítica para reflorestamento, onde há o maior desmatamento do entorno e outros dados que, apenas com a fiscalização em campo, são difíceis de controlar, sobretudo numa unidade urbana como a da Tijuca.
O software vai funcionar em computadores que serão instalados na própria administração da unidade, no Alto da Boa Vista. As imagens de satélite, diz ela, possibilitarão a criação de uma série histórica do mapeamento dos problemas.
O diretor de ecossistemas do Ibama, Valmir Ortega, considera o projeto simbólico pelo fato de o Parque Nacional da Tijuca estar localizado dentro de um grande centro urbano.
- É um grande desafio devido às pressões constantes, de todos os lados, sofridas pelo parque. Vamos aproveitar para qualificar a gestão da área, para que possamos repetir a experiência em outras unidades do Brasil - comemora o diretor do Ibama, acrescentando que pretende propor parcerias com outros órgãos públicos, como a Prefeitura do Rio.
A verba saiu do Fundo Francês de Cooperação Técnica para Atividades de Consultoria e Treinamento, administrado pelo BID. O responsável pelo setor de meio ambiente do banco, Marco Antônio Mendes, diz que a proposta surgiu de uma demanda apresentada pelo Ibama:
- A parceria integra os esforços do BID para garantir a qualidade ambiental nos países da América Latina e do Caribe.
O monitoramento vai servir basicamente para coibir as principais agressões ao parque. Ivan Amaral, presidente da ONG Grupo Terra Limpa, que atua há seis anos na unidade fazendo recuperação e manutenção de trilhas, além de mutirões de limpeza na mata, reconhece o valor da nova tecnologia, mas diz que a administração tem que estar mais bem capacitada para utilizá-la de forma adequada:
- É sempre bom trazer novidades tecnológicas para o parque. A região sofre uma pressão urbana muito grande: é caçador, fogo, desmatamento, entre outros problemas. Agora, o sistema de monitoramento só vai funcionar a partir do momento em que a administração estiver realmente capacitada. Não adianta identificar o problema e não ter meios para combatê-lo.
Ecoturismo deve ser desenvolvido
O convênio com o BID prevê também a formulação de novas ferramentas de gestão para o parque. Valmir Ortega espera, com isso, levar para a unidade benefícios como o desenvolvimento do ecoturismo:
- Também temos como desafio fortalecer a capacidade de gestão do parque, gerando benefícios, por exemplo, para o ecoturismo. Por isso o plano de manejo da unidade está sendo revisado, de modo que possibilite alguns avanços. Vamos falar com a Secretaria de Patrimônio da União para rever a situação de alguns imóveis localizados no parque, como o Hotel das Paineiras, para sabermos em que condições uma licitação poderia ser feita. Ele voltaria a funcionar e geraria recursos para o parque.

Desmatamento dobrou entre anos 70 e 90
A pressão sobre o Parque Nacional da Tijuca só aumenta com o crescimento do Rio. A unidade sofre, sobretudo em seu entorno, com favelização, loteamentos irregulares, caça a animais silvestres e incêndios. É tanto impacto que um estudo do Laboratório de Geo-Hidroecologia (GeoHeco) da UFRJ revelou que o índice de perda florestal dobrou no maciço entre as décadas de 70 e 90 - de meio para um quilômetro por ano.
No ano passado, um decreto da União aumentou a área protegida em 23%: de 3.200 para 3.953 hectares. O parque, antes formado por Floresta da Tijuca, pela Serra da Carioca e pelo Maciço da Gávea, ganhou a Serra dos Pretos Forros, o Morro da Covanca, a Vila Rica (perto da Pedra do Andaraí) e o Parque Lage.
As pressões no Maciço da Tijuca são comuns há séculos. No século 19 a paisagem era dominada por cafezais, mas já havia defensores da natureza. Em 1861, o Barão do Bom Retiro autorizou o reflorestamento da região e encarregou o major da Guarda Nacional Manoel Archer da tarefa.

O Globo, 25/06/2005, Rio, p. 15

As notícias aqui publicadas são pesquisadas diariamente em diferentes fontes e transcritas tal qual apresentadas em seu canal de origem. O Instituto Socioambiental não se responsabiliza pelas opiniões ou erros publicados nestes textos. Caso você encontre alguma inconsistência nas notícias, por favor, entre em contato diretamente com a fonte.