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Novo modelo para balanco social

OESP, Negocios, p.B26
23 de Fev de 2005

Novo modelo para balanço social
Os indicadores internacionais do GRI passam por reformulação para serem entendidos pelo mercado

Os parâmetros internacionais para formulação de relatórios de sustentabilidade - que no Brasil são também chamados de balanços sociais - oferecidos pela organização internacional Global Reporting Initiative (GRI) estão prestes a se tornar mais acessíveis. Os relatórios concebidos dentro do modelo GRI são conhecidos por sua complexidade, pois aliam as dimensões econômicas, ambientais e sociais das empresas em mais de 190 indicadores. Agora, o modelo vai passar por uma ampla reformulação que deverá estar disponível para uso das empresas em 2006.
Os primeiros indicadores do modelo GRI foram formulados em 1997, quando a entidade foi criada, e tem sido aprimorados até então. Em 2002, foi lançada a segunda geração, que incorporou a agenda dos direitos humanos na realidade corporativa. Agora, os desafios serão tornar mais simples a declaração das informações e aproximar os relatórios sociais do mercado financeiro.

Na semana passada, o executivo-chefe do GRI, Ernst Ligteringen, esteve no Brasil, na sede da Natura, em Cajamar (SP) para apresentar algumas dessas mudanças. A reformulação, que o GRI está chamando de terceira geração dos indicadores, ou G3, mantém o caráter voluntário das recomendações - as empresas optam por escolher esse modelo de balanço. A diferença é que agora tudo poderá ser feito online, a partir de uma plataforma tecnológica no website do GRI, com a criação de uma linguagem de programação específica.

"Nossa intenção é tornar os relatórios focados na performance das empresas, mais fáceis de serem usados e também auditados", explica Ligteringen. "E também possibilitar comparações entre relatórios de uma mesma empresa em diferentes países, o que será útil para detectar possíveis distorções entre o que é feito na matriz e nas filiais ao redor do mundo."

Outra novidade é a inclusão de protocolos técnicos voltados a setores específicos. Eles permitirão a comparação do desempenho socioambiental entre empresas do mesmo segmento de atuação. A intenção é aumentar a penetração dos balanços GRI em áreas como setor automotivo, telecomunicações, mineração, serviços financeiros, turismo e órgãos governamentais.

O objetivo da organização é aproximar os relatórios socioambientais do mercado financeiro, para que eles sejam tão importantes quanto os balanços financeiros na avaliação de risco (rating) e definição de investimentos.

Muda também o modelo de negócios do GRI, que passa a ser um provedor de serviços para o público, como análise e consultoria em sustentabilidade. A organização não cobra nada pelo uso do seu modelo de balanço, mas se mantém graças ao financiamento de 200 membros, entre empresas (Alcan, Shell, Microsoft e BP Group) e outras entidades. O objetivo é investir 9 milhões na formulação da terceira geração de indicadores, em tecnologias e novos modelos de negócios.

Hoje, em todo o mundo, 630 empresas usam o modelo GRI em seus relatórios. No Brasil, são seis empresas - Petrobrás, Natura, CPFL, McDonald's, Souza Cruz e Usiminas. Mais comuns por aqui são os modelos propostos pelo Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas (Ibase) e pelo Instituto Ethos, este bebido na fonte do GRI.

O Global Reporting Initiative se esforça para colocar a responsabilidade social nas estratégias de negócios das empresas, diferenciando o conceito da ação filantrópica. Para isso, formular relatórios é o primeiro passo. "O papel do GRI não é julgar se as empresas têm resultados bons ou ruins e, sim, fornecer as ferramentas para que forneçam informações ao mercado", diz Ligteringen.

Para Joe Sellwood, sócio da Atitude, empresa de consultoria em desenvolvimento sustentável, a simplificação dos indicadores é bem-vinda, porque muito esforço e recursos são gastos na elaboração de relatórios complexos. Ele afirma que a responsabilidade corporativa no Brasil, após o boom dos últimos quatro anos - quando mais empresas passaram a alardear suas ações - agora está prestes a entrar em uma nova fase, de consolidação como estratégia de negócio. "Depois da fase da experimentação, precisamos de um segundo boom, para que a responsabilidade corporativa caminhe além do marketing", afirma Sellwood.

Resultados das ações são questionados
Empresas querem iniciativas mais atreladas aos negócios

O maior questionamento, por parte do comando das empresas, sobre os resultados dos investimentos em responsabilidade social, está levando as companhias a avaliarem o grau de envolvimento entre as ações que praticam e suas estratégias de negócios. Partindo desse princípio, a Atitude, consultoria especializada em desenvolvimento sustentável, vai reunir 10 grandes empresas em um trabalho inédito no Brasil, que será assessorado pela AccountAbility, organização internacional que fornece padrões para uma contabilidade mais ética e transparente. Entre as que já aguardam o início dos trabalhos, estão Philips, Avon e HP, mas o grupo reunirá representantes de setores variados.
A idéia, conforme explica Luis Eduardo Iseppe, sócio da Atitude, é inverter o processo tradicional de avaliação da responsabilidade social nas empresas, que parte da formulação de relatórios sociais para diagnosticar os quesitos em que as empresas estão falhando. "Nossa proposta é primeiro olhar para os negócios da empresa, para avaliar o que é mais crítico. Depois, direcionar os programas em responsabilidade social para um foco estratégico, ligado aos negócios", explica.

Segundo ele, há diversos segmentos da economia que pedem esse tipo de avaliação. "A indústria de alimentação, por exemplo, está às voltas com o problema crescente da obesidade e vai ter de aprender a lidar com isso. O mesmo acontece com a farmacêutica, que está sendo cobrada em relação à uma atitude mais preventiva", diz Iseppe.

Há desafios a serem superados para as empresas de energia, face aos altos preços do petróleo e às questões como o aquecimento global, e também nos setores de mineração, siderurgia e construção civil, causadoras de grande impacto ambiental. Outro setor que enfrenta situação delicada é a indústria de tabaco, com as crescentes restrições aos fumantes no mundo todo. "Está na hora de as empresas perceberam que responsabilidade social é sobretudo manter os negócios a médio e longo prazo", diz.

O esforço para colocar a responsabilidade social na agenda das empresas inclui iniciativas de capacitação e até de e-learning (aprendizado via internet). É o caso do curso on-line sobre responsabilidade social e competitividade sustentável que o Banco Mundial, por meio de seu Instituto, já lançou em uma centena de países. Agora, em parceria com a Câmara Brasil-Alemanha e o InWent (organismo de cooperação internacional para transferência de conhecimentos) o curso estará disponível para profissionais de diferentes segmentos, por intermédio da Fundação Getúlio Vargas (FGV-Eaesp). Para tornar possível sua gratuidade, a Câmara Alemã e o InWent investiram R$ 100 mil no lançamento do programa.

Para o coordenador internacional da iniciativa, Djordjija Petkoski, diretor de governança corporativa do Banco Mundial, o programa permite troca de experiências entre participantes de vários países e setores de atuação, estudos de casos e discussões sobre aplicação dos conceitos. "Por isso, é importante a parceria com escolas de negócios como a FGV, que preparam os futuros gestores das empresas", afirma.

Petkoski, que já trabalhou em dezenas de mercados emergentes - Ásia, América Latina e ex-URSS - ressalta a importância da cooperação entre os países pobres para que a responsabilidade corporativa saia da retórica para a prática.

"As empresas dos países com economias em desenvolvimento têm de estar conectadas. Isso não significa que tenham de ser dependentes umas das outras", observa. Ele cita o exemplo do México, onde o programa reuniu mais de 800 profissionais em discussões sobre estratégias de responsabilidade social, e cuja expertise pode servir para o Brasil. Informações sobre o programa podem ser encontradas no site www.csrwbi.org. .

OESP, 23/02/2005, Negócios, p.B26

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