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Novas atitudes perante as questoes ambientais

CB, Opiniao, p.21
Autor: ASSIS, Alexandre Camanho de
03 de Ago de 2005

Novas atitudes perante as questões ambientais
Alexandre Camanho de Assis
Procurador Regional da República
Nas últimas décadas, a questão ambiental conectou-se definitivamente aos direitos fundamentais, não somente pela progressiva consciência do homem quanto a seu poder-dever sobre a Terra, mas porque o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado tem direta vinculação com a sadia qualidade de vida de todos.
Em todo o mundo, o aumento populacional e a falta de planejamento urbano têm tornado as cidades crescentemente sedentas. Indústria e agricultura, que consomem a quase totalidade das águas doces disponíveis, esgotam seus resíduos sem responsabilidade. Atividades predatórias vêem-se favorecidas pela fiscalização precaríssima e pela insensibilidade das autoridades públicas.
Com isso, prejudica-se a sadia qualidade de vida: percentual expressivo de internações nos hospitais públicos, bem assim de óbitos, deve-se ao consumo de água contaminada. Saúde, no Brasil, é dever do Estado; assim, as verbas que poderiam ser destinadas à infra-estrutura e recursos humanos naquela área são literalmente sangradas nessas despesas. Ciclo perverso — segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), para cada R$ 1 investido em saneamento, o governo economizaria R$ 5 em gastos com serviços de saúde.
Portanto, novas práticas precisam ser adotadas pela sociedade, para assegurar a preservação da natureza. O modelo vigente, que entregou o meio ambiente ao Estado, é hoje notoriamente falido, reclamando expressivas alterações.
A participação social efetiva na gestão dos recursos naturais é um dos vetores para novo paradigma de política ambiental. Embora leis mais recentes já tenham um perfil mais democrático, suas regras muitas vezes não são aplicadas, diferidas por estratagemas governamentais que objetivam manter conveniente exclusividade no controle de tais recursos.
A responsabilidade sobre essas atividades deve ser cobrada, acima de tudo, pela própria sociedade. A consciência do colapso do modelo atual precisa originar nova cidadania: é urgente que a transitoriedade dos governos, sua invariável inoperância, sua inabalável incompetência e a derrocada moral da política tradicional propiciem a gênese de nova postura cidadã, ainda mais engajada, perante os problemas nacionais.
Devem-se exigir, do Legislativo, instrumentos legais mais adequados à realidade socioambiental, como os marcos regulatórios de saneamento básico e de gestão de resíduos sólidos, assim como a adoção do princípio do poluidor-pagador, para internalizar nos custos da produção os prejuízos até agora só suportados pela sociedade. Tais reclamos devem ser dirigidos diretamente aos parlamentares, fazendo valer a representatividade que os anima e legitima.
Do Executivo, demande-se maior rigor no licenciamento, na fiscalização e na repressão criminal e das atividades perniciosas à natureza. Seus agentes precisam responder com isenção, seriedade e presteza às denúncias dos cidadãos, sem que sua atuação pareça um enorme favor ao contribuinte. Conveniências políticas, interesses financeiros clandestinos e seus beneficiários devem ser ostensivamente repudiados pela sociedade. Procedimentos administrativos que autorizem atividades potencialmente lesivas podem e devem ser monitorados por qualquer interessado, à luz do princípio da publicidade e do direito de petição aos poderes públicos, assim como transferências de verbas para aplicação em projetos de infra-estrutura e saneamento básico.
Judiciário e Ministério Público devem ser cobrados na celeridade, para que problemas ambientais de enfrentamento imediato não terminem nos escaninhos, com prejuízos irreversíveis à sociedade, à saúde e ao meio ambiente, preponderando razões financeiras. O direito de representação precisa ser exercido perante o Ministério Público, com cobrança de providências; compor associações civis é garantia de poder provocar o Judiciário sem a necessidade de qualquer instituição pública interposta.
Promover formas não-estatais de solução de conflitos, como a mediação e a arbitragem; capacitar agentes comunitários e investir na educação; apostar no poder da mobilização social e redefinir o papel do Estado. São tarefas que estão ao nosso alcance, independentemente do agente público de plantão. Assistimos à derrocada de um modelo, mas a responsabilidade do porvir é nossa: à nossa frente só há o futuro — fazê-lo melhor do que o exaurido presente depende unicamente de nós e das escolhas que fizermos.

CB, 03/08/2005, p. 21

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