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A natureza agradece

CB, Cidades, p. 38
21 de Mar de 2010

A natureza agradece
Fabricante de bebidas lança amanhã campanha de mobilização para o uso consciente da água. Primeira bacia hidrográfica adotada é a do Paranoá, onde se encontra o reservatório de Corumbá IV, responsável por abastecer o Distrito Federal

Daniel Brito

Ao lado da roça de milho, depois da plantação de mandioca, onde aranhas grandes armam suas teias e repousam entre os galhos da mata ciliar, corre preguiçosamente o córrego Crispim. Fica dentro da Chácara 46, no Setor Leste do Gama. Lá moram o pedreiro Luiz Adão Pereira, 46 anos, a dona de casa Maria do Rosário da Costa, 54, e os dois filhos do casal, Luiz Henrique, 16, e Rafael, 13. A proximidade não é o suficiente para a família ter muito apego ao curso d'água.

O problema é que a margem do Crispim não é tão bucólica quanto a área que o cerca. Sacos plásticos presos às raízes, garrafas e copos feitos do mesmo material "estacionados" nas pedras.

Tamanha sujeira não surge da casa de Adão e Maria do Rosário, mas das ruas do Gama. Enxurradas levam o lixo para dentro do córrego. A água tem até a aparência de limpa, mas os moradores da chácara não se arriscam a mergulhar por ali. Nem sequer molhar os pés em dia de calor.

Houve um tempo em que nem na aparência o Crispim era atraente. "Saía um cheiro horrível e uma espuma branca cobriu ele todo", relembra, assustada, Rosário.

Sem saber a quem recorrer, descobriu ela que a solução estava na vizinhança. Convocaram uma reunião com técnicos da Companhia de Bebidas das Américas (AmBev), cuja fábrica localizase a 500 metros do portão da chácara, e pediram providências.

"Semanas depois, já não tinha mais cheiro ruim nem espuma", diz a dona de casa.

Apesar de não ser a responsável pela sujeira no Crispim, a AmBev é interessada direta na boa conservação do córrego. Por menor que possa parecer, o curso d'água pode influenciar no processo de fabricação das cervejas.

O Crispim segue mansamente até o rio Alagado, que deságua no Ponte Alta, já na divisa sudoeste do Distrito Federal com Goiás.
Esse vai ao encontro do Corumbá e desemboca no reservatório de Corumbá IV. É dali que sai a matéria-prima dos produtos da fábrica no Gama.
Para não ver o pequeno incidente que ocorreu na casa de Adão e Rosário tomar proporções catastróficas, a AmBev vai lançar, no Parque Ibirapuera, em São Paulo, o Movimento Cyan - Quem vê a água enxerga seu valor. Trata-se de uma campanha de mobilização para o uso consciente da água. A primeira bacia hidrográfica adotada pela multinacional é a do Paranoá, na qual está compreendido o reservatório de Corumbá IV. O projeto é feito em parceria com o braço brasileiro da ONG suíça WWF (sigla em inglês para Fundo Mundial para a Natureza). A organização mantém projeto semelhante, chamado Água para a vida.
Parceria com a UnB
Sete equipes, cada uma com até cinco pessoas, vão monitorar rios e córregos da microbacia do Corumbá. Serão moradores da região, funcionários voluntários da fábrica, técnicos do WWF, pesquisadores do Centro de Recuperação de Área Degradada da Universidade de Brasilia (UnB). Alunos de escolas do Gama também podem participar. Eles receberão um kit com vasilhas e pastilhas para coletar amostras de água e aferir a qualidade. Se comprovada a baixa qualidade, pesquisadores da UnB projetarão um trabalho de recuperação.
Corumbá será monitorada por três anos. "Vamos aprender como se faz esse trabalho no Distrito Federal para levarmos a outros reservatórios do país", explica Sandro Bassili, gerente nacional de Meio Ambiente da AmBev.
"Queremos sair daqui a três anos e ver que o projeto será mantido", emenda. A dona de casa Maria do Rosário espera poder usufruir do pequeno trecho do Crispim que passa dentro de sua chácara. "Se ficar limpo, vamos poder tomar banho nele. Com responsabilidade, claro", prevê.
A fábrica da AmBev no Setor Leste do Gama é uma das maisantigas do Brasil. Fundada em 1968, emprega atualmente 311 pessoas. Produz anualmente 220 milhões de unidades de cervejas Skol, Antárctica e Brahma que são distribuídas no Distrito Federal.
Investimento de R$ 44 mi
Diferentemente do monitoramento da microbacia de Corumbá IV, o Movimento Cyan, que será lançado amanhã pela AmBev em São Paulo, não tem prazo para terminar. Somente em 2010, a multinacional de bebidas programou o investimento de R$ 44 milhões. Parte desses recursos servirá para analisar o volume de água limpa utilizado na cadeia de produção de seus produtos.
"Vamos calcular desde a quantidade de água utilizada para irrigar a cevada no campo até a que lava o copo para que se sirva uma cerveja", explica Sandro Bassili, gerente nacional de meio ambiente da AmBev. "Queremos saber qual elo dessa cadeia consome mais para podermos fazer um trabalho de conscientização com aquela determinada área", acrescenta. A tecnologia para medição virá de parceria com o câmpus de São Carlos da Universidade de São Paulo (USP) e com a ONG holandesa Water Footprint Network.
Bassili conta que há 18 anos a multinacional investe em sistemas de gestão ambiental. Em 2009, conseguiu reduzir a quantidade de água por litro de cerveja e de refrigerante. Para a bebida alcoólica, foram necessários 3,9 l para cada 1.000ml, contra 4,11 l até 2008. O que representou uma economia de 2,4 bilhões de litros.
De acordo com cálculos da gerência de meio ambiente da AmBev, 14 bilhões de litros d'água deixaram de ser utilizados nas fábricas do país desde 2002. "O suficiente para abastecer o DF por um ano", compara. "Agora, sentimos a necessidade de dar um passo para fora do portão das fábricas e por isso surgiu o Cyan", justifica.
Dentro do projeto há o programa Menos 1 litro. No blog do Cyan (www.blogcyan.com.br), a AmBev disponibilizará um aplicativo com sugestões para economizar. Cada litro sem desperdício ficará registrado.
(DB)

Dia Mundial da Água

Criado pela Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas em 1993, o dia é celebrado em 22 de março em todo mundo. O Brasil concentra 13,7% das bacias hídricas do planeta, a maior parte na Amazônia. O Pantanal, nos estados de Mato Grosso e Mato Grosso do Sul, é a maior área alagada em continente e é prioridade em conservação de biodiversidade aquática. Já o Distrito Federal tem o estância de Águas Emendadas, que concentra o nascimento de rios que se encontram com três grandes bacias do país: do Tocantins, de São Francisco e do Paraná.

CB, 21/03/2010, Cidades, p. 38

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