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Na Amazônia, programa transforma conservação em bom negócio

GQ Globo - https://gq.globo.com/um-so-planeta/noticia
25 de Jul de 2021

Na Amazônia, programa transforma conservação em bom negócio
O programa Florestas de Valor é destaque em 2021 quando o assunto é aliar floresta e comércio sustentável. A meta? Oferecer uma alternativa definitiva ao garimpo e extração iliegal de madeira

LEONARDO ÁVILA TEIXEIRA
25 JUL 2021

Para cada 1 real investido, 7,94 reais são gerados. Essa é a métrica usada pela Petrobrás sobre o retorno ambiental em 2021 do programa Florestas de Valor, que nasceu como um projeto da ONG Imaflora em 2013 e hoje já abarca um conjunto de ações miradas na Bacia Amazônica, ao mesmo tempo região de floresta mais úmida do mundo, e um pedaço do planeta que - devido ao desmate e queimadas - pode estar perdendo sua capacidade de sequestrar carbono da atmosfera.
A conta acima tenta quantificar impactos variados, humanos e ambientais, e é cara para o programa, que olha a preservação florestal como questão de bom negócio. Uma ideia que não é única - motivando desde o crescimento de sistemas agroflorestais ao turismo sustentável e gestão de recursos junto a fazendeiros na Mata Atlântica. Trata-se da chamada bioeconomia, uma filosofia que alia conhecimento dos bens naturais a um uso responsável dessas matérias-primas. "Para nós, a bioeconomia está muito fundamentada em uma economia a partir de atividades sustentáveis", diz Leo Ferreira, um dos gestores do Florestas de Valor. "É um modelo de desenvolvimento que concilia geração de renda e conservação", conclui.
Para tanto, o programa trabalha com empresas e cooperativas com o objetivo de apoiar certas cadeias produtivas locais, tocadas por indígenas e quilombolas em áreas protegidas. "Muitas dessas comunidades já têm relação comercial, no sentido de já comercializarem seus produtos", explica Leo. "Mas no geral, existe muita informalidade nessa cadeia, e muitas vezes elas recebem um valor muito baixo pela sua produção através das dinâmicas locais", diz o gestor, fazendo referência, por exemplo, à grande quantidade de atravessadores que levam essa produção para fora da floresta. Hoje, cerca de 2.108 pessoas são impactadas por ações do programa em desenvolvimento profissional e pessoal, além de geração de renda.
Leo é responsável pelo trabalho do grupo no norte do Pará, em uma região conhecida como Calha Norte do Rio Amazonas - lar de 20 milhões de hectares de floresta preservada. Por lá, a introdução da semente do cumaru há uns 7 anos é emblemática. Trabalho que ganhou corpo através de uma parceria com a fabricante de cosméticos Lush em 2017. No mesmo ano, pequenos produtores da região conseguiram escoar cerca de uma tonelada da matéria-prima, natural da Amazônia, em uma relação direta com a empresa, a um valor 23% superior ao cumaru vendido via atravessadores locais. "Quando o produtor percebe que a comercialização em dois ou três anos da semente de uma dada árvore se torna mais rentável que a madeira dessa mesma árvore, ele passa a notar que existe uma alternativa", diz Leo.
O cumaru, cujo aroma lembra a baunilha e é usado tanto na culinária quanto pela indústria de cosméticos, também se relaciona a outro objetivo do Florestas de Valor: ajudar comunidades e pequenos produtores a realizarem o manejo saudável da floresta, diversificando o plantio sem impactar em suas tradições. "Tem muitas áreas [na Amazônia] em que são praticadas culturas únicas, como a roça da mandioca. Através das ações do projeto, aliadas a uma perspectiva econômica dessa produção, trazemos uma alteração na dinâmica desses grupos, passando a introduzir espécies perenes que também tenham interesse comercial", diz o gestor. Em outros cantos da floresta, pequizeiros e mangabeiras também costumam ser plantadas em conjunto com a mandioca.
O programa não é o único na Bacia a reunir conhecimentos locais e propor inovações em cultivo. Trabalho feito pelo Instituto Socioambiental (ISA) na região do Xingu, cujo resultado foi publicado em abril por pesquisadores e lideranças indígenas no jornal científico Frontiers, também exemplifica o potencial dessa estratégia. "A pesquisa mostrou como é importante considerar as causas que podem estar levando à degradação de ambientes, de forma preventiva, ao invés de simplesmente tentar investir em técnicas de restauração baseadas numa lógica que é diferente e que não dialoga com o manejo local", diz ao UOL o engenheiro florestal Marcos Vinícius Schmidt, principal autor do paper.
Somada à introdução de métodos de colheita que não envolvem o uso do fogo (foram, até o momento, 180 hectares preparados pelo programa na Calha Norte, em um esquema que evita a criação de focos acidentais de incêndio), o plano do Florestas de Valor é oferecer alternativas econômicas à tradicional figura do garimpeiro e do madereiro ilegal. Velhas práticas que Leo acredita serem inviáveis não só ambientalmente, mas economicamente. "Muitas vezes essas atividades podem até gerar um retorno econômico em um longo prazo, mas elas comprometem os próprios recursos dos quais dependem", diz. "Elas não se sustentam, e aí precisam se mover para outras regiões".

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