OESP, Economia, p. B18
14 de Dez de 2005
Mercado de capitais agora tem índice de empresas sustentáveis
Carteira da Bovespa reúne ações de 28 companhias com forte atuação socioambiental
Andrea Vialli
O mercado de capitais brasileiro entrou firme na era da responsabilidade social. No início deste mês, a Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa) lançou o Índice de Sustentabilidade Empresarial (ISE), que reunirá uma carteira só com ações de empresas consideradas sólidas a longo prazo, com forte desempenho financeiro e nos quesitos sociais, ambientais e de governança corporativa.
Fruto de uma parceria entre a Fundação Getúlio Vargas, o International Finance Corporation (IFC) e mais oito entidades, o ISE é um passo importante para o mercado de capitais, uma vez que é o primeiro índice com esse perfil em toda a América Latina. Entre os chamados países emergentes, apenas a Bolsa de Johanesburgo, na África do Sul, havia lançado índice semelhante, em 2003.
De acordo com Ricardo Nogueira, superintendente de Operações da Bovespa, o ISE teve como inspiração índices dos Estados Unidos e da Europa. O mais conhecido deles, o Índice Dow Jones de Sustentabilidade (DJSI), existe desde 1999 e foi um marco no movimento das finanças sustentáveis. Dois anos depois, a Bolsa de Londres e o jornal Financial Times lançaram o FTSE4Good, que igualmente serviu de inspiração para o ISE. "Não é só um índice de empresas com boas práticas em responsabilidade social, mas sobretudo de empresas duradouras a longo prazo", diz.
A escolha das 28 empresas de 12 diferentes setores que compõem o ISE - representadas por uma carteira de 34 ações, ordinárias e preferenciais - durou dois anos. A princípio, foram escolhidas 121 empresas com as 150 ações mais líquidas listadas na Bovespa. Em seguida, essas empresas foram submetidas a um minucioso questionário, elaborado pelo Centro de Estudos em Sustentabilidade da Fundação Getúlio Vargas (GVces), que levou em consideração critérios de meio ambiente, aspectos sociais e de governança corporativa.
"Pesquisamos a metodologia dos índices semelhantes existentes fora do País e também os modelos para relatório social, como os do Ethos, Ibase e GRI", explica Mario Monzoni, coordenador do GVces. A exemplo das carteiras internacionais, o Índice da Bovespa não é estanque - anualmente serão feitas revisões, e novas empresas poderão fazer parte.
RETORNO
Para as empresas, ingressar no Índice traz um retorno que ainda não pode ser quantificado, uma vez que a valorização da carteira só é perceptível no médio prazo. "O Índice Dow Jones de Sustentabilidade levou cerca de três anos para ter as ações mais valorizadas, mas hoje tem melhor desempenho que o Dow Jones convencional", diz Ricardo Nogueira, da Bovespa. Mas o retorno institucional é inegável, uma vez que as empresas listadas consolidam uma imagem de solidez.
A inclusão em índices com esse perfil costuma ainda dar maior segurança ao investidor, em especial os institucionais, como fundos de pensão e fundações, além dos gestores estrangeiros. Para José Luiz Acar Pedro, diretor de Relações com Investidores do Bradesco, um dos bancos escolhidos para integrar o ISE, o compromisso da instituição com a questão social, aliado ao desempenho financeiro - o banco lucrou R$ 4,051 bilhões de janeiro a setembro - foram decisivos para integrar o Índice. "Não houve surpresa para nós, dado o histórico de engajamento social do banco", diz Pedro.
Só a Fundação Bradesco, que completa 50 anos no ano que vem, é responsável pela manutenção de 107 mil alunos em escolas próprias, com altos índices de aprovação. Segundo o executivo, integrar o ISE deve aumentar ainda mais a visibilidade da empresa e a liquidez das ações, além de trazer um reflexo positivo para o clima interno da empresa. "Nossos acionistas de longa jornada se mostraram satisfeitos, pois o ISE comprova que o banco busca a perenidade", completa.
O fortalecimento do mercado de capitais brasileiro é outro ponto positivo do Índice, na opinião de Ana Cecília Bittencourt, gerente de Mercado de Capitais e Relações com Investidores da Embraer. "A participação em índices de sustentabilidade é eficaz na atração e manutenção de gestores de recursos", diz. "Isso é fundamental para o desenvolvimento das empresas brasileiras." A Embraer entende do assunto - por três anos, integrou o Índice Dow Jones de Sustentabilidade. Segundo Ana Cecília, foi o conjunto das práticas da empresa que garantiu o ingresso no ISE.
Um dos pontos polêmicos do ISE é se seriam excluídas de antemão as empresas de setores considerados delicados, como tabaco, bebidas alcoólicas e armamentos. Embora índices como o Dow Jones não excluam esses setores, o assunto gerou polêmica durante os dois anos em que o ISE foi formatado. Muitas ONGs, em especial ligadas à saúde, eram favoráveis à exclusão dessas empresas antes mesmo que o índice fosse criado, mas prevaleceu o senso do mercado. "Não era a opinião do investidor, que está preocupado com a sobrevivência da empresa a longo prazo", diz Ricardo Nogueira.
Bem antes de lançar o Índice de Sustentabilidade Empresarial, a Bovespa já havia criado um mecanismo de atuação social, a Bolsa de Valores Sociais (BVS), que funciona de modo semelhante ao tradicional mercado de capitais. O objetivo era gerar recursos para custear projetos de ONGs brasileiras nas áreas de infância, saúde e educação, entre outras. As ONGs listam seus projetos, que são analisados por uma equipe de especialistas em terceiro setor e educação. Os projetos ficam à disposição dos "investidores sociais" no site www.bovespasocial.com.br, que podem escolher para quem vão fazer as doações. Atualmente, a BVS tem 30 projetos listados. O mais recente deles, do Instituto Criança é Vida - voltado para educação em comunidades pobres - visa dar orientação sexual para crianças e pré-adolescentes paulistanos. O tema, pouco abordado nas escolas públicas, era uma demanda das educadoras das creches.
Atuação social marca trajetória da Bovespa
Bem antes de lançar o índice de Sustentabilidade Empresarial, a Bovespa já havia criado um mecanismo de atuação social, a Bolsa de Valores Sociais (BVS), que funciona de modo semelhante ao tradicional mercado de capitais. 0 objetivo era gerar recursos para custear projetos de ONGs brasileiras nas áreas de infância, saúde e educação, entre outras. As ONGs listam seus projetos, que 'são analisados por uma equipe de especialistas em terceiro setor e educação. Os projetos ficam à disposição dos "investidores sociais" no site www.bovespasocial.com.br, que podem escolher para quem vão fazer as doações. Atualmente, a BVS tem 30 projetos listados. O mais recente deles, do Instituto Criança é Vida - voltado para educação em comunidades pobres - visa a dar orientação sexual para crianças e pré-adolescentes paulistanos. 0 tema, pouco abordado nas escolas públicas, era uma demanda das educadoras das creches.
OESP, 14/12/2005, Economia, p. B18
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