VOLTAR

"A luta continua"

Isto E, Brasil, p.39
05 de Mai de 2004

"A luta continua"
Cassados, o senador Capiberibe e sua mulher, a deputada Janete, tentam reverter a decisão do TSE

LUIZA VILLAMÉA

No Brasil, a cassação de um político costuma ter reflexos dos mais favoráveis. Antes de tudo, é símbolo de depuração e transparência na política. A máxima, cultivada na história nacional contemporânea, foi quebrada na semana passada, quando o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) cassou, por quatro votos a dois, os mandatos do senador João Alberto Capiberibe (PSB-AP) e de sua mulher, a deputada Janete Capiberibe (PSB-AP). Com base no testemunho de duas eleitoras do Amapá, que denunciaram ter recebido R$ 26 cada uma para marcar o nome dos parlamentares nas umas, o casal foi condenado por compra de votos nas eleições de 2002. Se a decisão não for revertida, ele será o primeiro senador cassado do País.
Capiberibe conta que, ao ouvir a decisão, voltou mais de três décadas no tempo. "Tive a mesma sensação de estar imobilizado por uma camisa-de-força que senti quando fomos presos em 1970", afirma. Na época, o casal integrava a organização clandestina Aliança Libertadora Nacional (ALN), do líder guerrilheiro Carlos Marighella. Como Janete estava grávida de oito meses, deixava a cidade de Belém (PA), junto com o marido, para escapar da perseguição do governo militar. Na primeira barreira montada pela polícia, os planos do casal foram interrompidos. A carreira política, no entanto, continuou, mesmo depois de dez anos de exílio. Quando governador do Amapá (19942002), Capiberibe se destacou por investir no desenvolvimento sustentável da região. Janete, que já exerceu três mandatos como deputada estadual, é forte candidata à Prefeitura de Macapá nas próximas eleições.
Originalmente, a denúncia contra o casal foi feita ao Tribunal Regional Eleitoral (TRE), no Amapá, pelo ex-senador Gilvan Borges, do PMDB, que perdeu as eleições para Capiberibe, e por Jurandil Juarez, também do PMDB, candidato derrotado à Câmara dos Deputados. Como o TRE julgou a denúncia improcedente, Borges e Juarez recorreram à instância superior. Em sua defesa no TSE, os Capiberibe apresentaram uma gravação na qual as duas eleitoras assumem que receberam "uma mixaria" para acusar o casal e pedem R$ 20 mil para mudar o depoimento. Não surtiu efeito. Para tentar manter seus mandatos, eles agora vão apelar ao Supremo Tribunal Federal. "Minha revolta é que tudo não passa de uma armação política", reclama Janete. "Nossa cassação interessa ao PMDB, cujo maior expoente no Estado é o senador José Sarney."
No processo que culminou na cassação dos parlamentares, também há referência à apreensão de R$ 15.495 na casa de duas militantes do PSB e uma relação de nomes. Não há, no entanto, nenhum vínculo entre essas militantes e as duas eleitoras que dizem ter recebido os R$ 26 em troca do voto. Embora com minoria no TSE, os Capiberibe vêm recebendo apoios de peso. Entre os dispostos a testemunhar a favor deles estão o compositor Chico Buarque de Hollanda e Danielle Mitterrand, viúva do presidente francês François Mitterrand. Na semana passada, ainda abalada com a decisão do TSE, Janete comentou que tem esperança de recuperar o mandato. "Se não der, tudo bem", comentou. "A luta continua", completou, usando uma palavra de ordem típica dos anos de chumbo.

Isto É, 05/05/2004, Brasil, p. 39

As notícias aqui publicadas são pesquisadas diariamente em diferentes fontes e transcritas tal qual apresentadas em seu canal de origem. O Instituto Socioambiental não se responsabiliza pelas opiniões ou erros publicados nestes textos. Caso você encontre alguma inconsistência nas notícias, por favor, entre em contato diretamente com a fonte.